1 INTRODUÇÃO
As Tecnologias de Comunicação e Informação (TIC) têm influenciado profundamente os rumos da educação em todo o mundo. O século XXI começa com uma mudança de paradigma nas práticas com relação à educação on-line (BOZKURT, 2015). Diante da emergência de uma agenda de educação de qualidade, efetivamente inclusiva e equitativa (UN, 2015), componente-chave na obtenção das competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida (COUNCIL OF THE EUROPEAN UNION, 2018), e num mercado cada vez mais globalizado e competitivo, muitas Instituições de Ensino Superior (IES) têm investido em cursos na modalidade a distância (GAEBEL; ZHANG, 2018), atendendo aos milhões de estudantes a que esses meios permitem aceder. Percebe-se ainda que a proposta metodológica do ensino híbrido em que há convergência do melhor da educação presencial com a educação on-line tem crescido nas universidades em todo o mundo (GAEBEL et al., 2014; FREDERICKSEN, 2017). Nos contextos português e brasileiro, grande parte das IES tem procurado introduzir pedagogias e práticas que fazem uso das TIC, associadas à utilização de plataformas de eLearning ou Learning Management System (LMS), seja para a oferta de cursos em e-learning (realizados totalmente on-line e por meio da web), seja para o desenvolvimento decursos em b-learning (desenvolvidos parcialmente em regime presencial e parcialmente mediante acesso pela internet)(DIAS, 2010; DIAS et al., 2015; MILL, 2015).
De igual modo, múltiplos indicadores internacionais alertam de forma intensa para o crescimento que existirá no domínio da aprendizagem e da formação on-line, decorrente, sobretudo, de duas grandes tendências atuais: (i) o crescente e generalizado acesso e utilização da tecnologia, nomeadamente da tecnologia móvel e serviços baseados na web; (ii) a necessidade de a população ativa se manter atualizada/requalificada ao longo da vida, requerendo-se assim novos formatos de resposta formativa por parte das instituições para atender à demanda do Lifelong Learning ou Aprendizagem ao Longo da Vida, conceito que se reporta à necessidade de cada cidadão obter e manter o conjunto certo de aptidões e competências para conservar/melhorar os atuais níveis de vida, sustentar elevadas taxas de emprego e fomentar a coesão social à luz da sociedade e do mundo do trabalho perspectivado para o amanhã (COUNCIL OF THE EUROPEAN UNION, 2018). Detecta-se hoje que a idade-padrão dos estudantes do Ensino Superior tem se alterado e que maiores modificações deverão ser esperadas no futuro. De acordo com estudos recentes do Pew Research Center (2016), 73% dos adultos em idade ativa consideram-se atualmente lifelong learners (aprendentes ao longo da vida), 36% deles são estudantes-trabalhadores. Outrossim, começam a ser numerosos os estudantes já diplomados que procuram o Ensino Superior para conseguir certificação para uma segunda profissão, bem como estudantes que se inscrevem em cursos de curta duração para atualização profissional, e ainda estudantes que buscam atualização profissional orientada ao conhecimento aplicado/saber prático e para os quais a obtenção de grau demonstra ser irrelevante.
De modo geral, as experiências têm mostrado que a Educação a Distância (EaD) pode contribuir para elevara qualidade e a relevância do Ensino Superior (EUROPEAN COMMISSION, 2016), tornando-o mais inclusivo, alinhado às mudanças sociais vigentes e mais inovador em matéria de utilização efetiva de novos e mais ricos recursos didáticos e educacionais (INAMORATO DOS SANTOS, 2019).
No Brasil, a EaD tem alcançado um crescimento bem mais significativo do que a presencial. Os dados do último Censo da Educação Superior, de 2018, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), mostram que, entre 2008 e 2018, as matrículas em cursos de graduação a distância aumentaram 182,5%, enquanto na modalidade presencial o crescimento foi apenas de 25,9% nesse mesmo período. Em 2018, o número de matrículas na modalidade a distância foi superior a dois milhões, representando uma participação de 24,3% do total de matrículas de graduação. Destas, 91,6% nas instituições privadas e 8,4% nas instituições públicas (INEP, 2018).
Acredita-se que esse aumento no crescimento das matrículas em cursos a distância seja resultado das alterações promovidas pelo Ministério da Educação (MEC) na legislação brasileira (última atualização pelo Decreto n.º 5.622/2005), a fim de ampliar a oferta de Ensino Superior no País para atingir a Meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE), que exige elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida em 33% da população entre 18 e 24 anos (BRASIL, 2014). O novo marco regulatório instituído pela Resolução n.º 1, de 11 de março de 2016, trouxe novas perspectivas às IES para a gestão de programas de EaD no Ensino Superior, enfatizando os documentos institucionais como base para estruturar a EaD na IES, os cursos e a situação dos profissionais que nela atuam (VIEIRA; TEIXEIRA, 2019). Em seguida, o Decreto n.º 9.057/2017 veio possibilitar às IES ampliar a oferta de cursos de graduação e pós-graduaçãolato sensu a distância, sem a oferta simultânea de cursos presenciais, ao mesmo tempo que regulamentou a oferta de cursos a distância para o Ensino Médio e para a Educação Profissional Técnica de nível médio. Posteriormente, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) publica a Portaria n.º 275/2018 em que autoriza as IES a oferecer pós-graduação stricto sensu a distância. Logo após, a Portaria n.º 2.117/2019 amplia para 40% a carga horária a distância de graduações presenciais de Ensino Superior, o que favoreceu a consolidação do ensino híbrido no Brasil.
Em Portugal, reconhecendo a EaD como um modelo alternativo e eficaz para a qualificação superior de estudantes fora da idade de referência, o Conselho de Ministros aprovou, em setembro de 2019, o regime jurídico do Ensino Superiora distância, introduzindo assim, pela primeira vez em Portugal, princípios e regras para a organização e o funcionamento dessa modalidade de Ensino Superior (DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2019). Até então, a EaD era referenciada na legislação portuguesa, nomeadamente na Lei de Bases do Sistema Educativo (artigo 16.º do Decreto-lei n.º 46/1986, 14 de outubro), como modalidade de oferta educativa e formativa destinada a públicos que não encontravam no ensino presencial resposta adequada às características de mobilidade familiar ou outras resultantes de situações pessoais de natureza temporária, tendo sido estendida aos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ao ensino secundário pelo artigo 2.º da Portaria n.º 85/2014, de 15 de abril, de modo complementar a outras ofertas curriculares desses níveis de ensino. Apesar de existente no Ensino Superior, foi só recentemente, pelo Decreto-lei n.º 83/2019, de 21 de fevereiro, que se estabeleceram definições operativas relativamente ao Ensino Superiora distância, sendo este referido nesse documento como
[...] um modelo alternativo e efetivo para a qualificação superior de estudantes fora da idade de referência [...] (e referente a) situações em que as unidades curriculares que são ministradas nesta modalidade correspondam a mais de 75% do total da parte curricular do respetivo curso (p. 2-3).
No que ao e-learning diz respeito, os dados possíveis de encontrar relativamente ao número de ingressos no contexto português remetem, quase exclusivamente, para a realidade da Universidade Aberta (UAb)1, sendo imensamente reduzida a representatividade das restantes IES portuguesas nesse domínio. De acordo com o relatório encomendado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior em 2009 (HASAN et al., 2009) e em estudos posteriores (BENTO; SOUSA, 2012; DIAS et al., 2015), o que se encontra estabelecido são iniciativas tímidas das universidades tradicionais portuguesas.
Por consulta aos dados oficiais, patentes on-line no site da Direção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência (DGEEC), verifica-se que, nos últimos anos, o número total de estudantes a frequentar o Ensino Superior em regime on-line tem decrescido. Há cerca de uma década, o volume de estudantes a frequentar o ensino a distância no contexto português rondava 3% do total de estudantes em 2009 (HASAN; LAASER, 2011), e, desde então, a tendência nesses números tem sido de decréscimo.
A democratização do acesso ao Ensino Superior é, indubitavelmente, importante e necessária, porém é fundamental identificar fatores contributivos para a permanência discente e para a qualidade do processo formativo a distância. A educação on-line apresenta especificidades e desafios para além do ensino presencial e, portanto, requer metodologias que contemplem e respeitem sua singularidade. Nesse âmbito, a formação docente para o desenvolvimento de competências digitais é fator primordial para inovar e garantir a qualidade das práticas pedagógicas que ocorrem em ambientes virtuais de aprendizagem.
Entre os indicadores de qualidade em EaD propostos por Netto, Giraffa e Faria (2010) e corroborados por Vieira (2018) e Vieira e Teixeira (2019), destaca-se exatamente o perfil docente, suas caraterísticas e competências. Para os autores, a qualidade dos cursos na modalidade a distância depende, principalmente, dos recursos humanos envolvidos, da atuação do corpo docente e da qualidade da tutoria oferecida. Essa qualidade se traduz, para além do conhecimento do conteúdo, na competência técnica com relação ao uso de plataformas e dos recursos virtuais, na capacidade de organizar e orientar didaticamente o processo de ensino-aprendizagem a distância, na presença virtual regular e na habilidade para ler e escrever com fluência em ambientes digitais. Portanto, a interação e a qualidade da formação mediadas pelas TIC na EaD estão diretamente vinculadas à competência digital dos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem (OLIVEIRA; COELHO; VIEIRA, 2017).
A percepção desse contexto motivou as autoras a procurar traçar um perfil dos docentes que exercem atividades de docência on-line no Ensino Superior, em dois países falantes de língua portuguesa, Brasil e Portugal, e, adicionalmente, analisar as diferenças encontradas entre os docentes dos dois países. Apresentam-se aqui resultados parciais da pesquisa em questão, obtidos a partir da aplicação de um questionário a docentes universitários que exercem sua prática pedagógica em ambientes virtuais vinculados a IES públicas ou privadas, procurando-se encontrar resposta para as seguintes questões: 1. Qual o perfil dos profissionais que atuam como docentes em disciplinas e/ou cursos on-line no Ensino Superior, no Brasil e em Portugal? 2. Que diferenças existem entre eles? 3. Há formação formal desses docentes universitários para a docência on-line? Se sim, como se constitui essa formação? 4. Em que medida as IES ofertantes de cursos on-line propiciam formação a seus docentes para a docência on-line?
A estrutura deste artigo está organizada em quatro tópicos. A introdução temática apresentada até aqui, seguida pelos aspectos metodológicos, objetivos de investigação e os instrumentos de recolha de dados, sendo, na sequência, apresentados e discutidos os resultados encontrados e, por fim, as considerações finais.
2 METODOLOGIA DA PESQUISA
Este artigo apresenta um estudo quantitativo, de natureza descritiva e não experimental, baseado numa amostra aleatória simples, não probabilística, realizado em outubro e novembro de 2019. Para a recolha dos dados empíricos da investigação, foram elaborados no google forms dois questionários constituídos de questões fechadas e abertas, um específico para o contexto brasileiro e outro para o contexto português, ainda que de estrutura idêntica no que tange às questões e opções de resposta. Os questionários direcionavam-se aos docentes que atuam em unidades curriculares, cursos ou programa de graduação ou pós-graduação que apresentem uma dimensão de lecionação on-line, decorrendo assim, parcial ou totalmente, a distância. Nessa etapa, procurou-se identificar o perfil dos professores que exercem atividade docenteon-lineno contexto do Ensino Superior, no Brasil e em Portugal, visando ainda distinguir seus percursos formativos e competências atuais.
No intuito de obter dados de um maior número de docentes do Ensino Superior que exercem a docência on-line, foram enviados e-mails a cerca de 300 coordenadores institucionais de EaD de universidades públicas e privadas no Brasil [cujos endereços foram obtidos a partir de consulta ao sistema e-MEC (BRASIL, 2020) e sites das IES], bem como a elementos das equipas reitorais das Universidades e Institutos Politécnicos portugueses. Os e-mails em causa solicitavam a colaboração deles na divulgação do questionárioon-lineaos docentes das respectivas IES que exercem atividade docente on-line em programas de graduação e/ou pós-graduação.
O conjunto de dados resultantes foi planilhado no Microsoft Excel 2013. Todos os itens de resposta fechada e passíveis de análise quantitativa foram codificados e exportados para o software estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 26.0, para análise descritiva e inferencial dos dados. Para a análise descritiva, foram utilizadas medidas de tendência central e de dispersão: frequências, médias e desvios-padrão, bem como o cálculo de proporções.
Foram conduzidas análises estatísticas para verificar diferenças entre os dois países em função das seguintes variáveis relativas aos docentes: (a) sexo; (b) idade; (c) formação pedagógica; (d) tempo de experiência no Ensino Superior presencial; (e) tempo de experiência na docência on-line; (f) exercício de outra atividade profissional, além da docência on-line; (g) atividade atual no domínio da EaD; (h) outra experiência anterior com EaD; (i) formação frequentada para a docência on-line; e (j) tipologia de formação frequentada para a docência on-line. Também se constataram diferenças em função de variáveis relativas às IES: (k) categoria administrativa; (l) modalidade de oferta de cursos predominantes; (m) tempo de oferta de cursos/disciplinas on-line; (n) oferta de formação docente para atuação on-line.
3 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
Considerando as questões de investigação anteriormente enunciadas, apresenta-se em seguida uma análise comparativa dos resultados correspondentes à caracterização dos participantes, a caracterização da educação on-line veiculada pelas IES e o perfil dos docentes que exercem a prática pedagógica em ambientes virtuais.
3.1 Caracterização dos Participantes
A amostra é constituída por 277 docentes do Ensino Superior, sendo 236 (85,2%) docentes brasileiros e 41 (14,8%) docentes portugueses, com representatividade de IES públicas (67,5%) e privadas (32,5%) dos dois países. Os participantes são predominantemente do gênero feminino (57,8%), com faixa etária entre 35 e 54 anos de idade (62,5%). No Brasil, a faixa etária predominante situa-se entre os 35 e 44 anos (35,6%) e em Portugal, acima de 55 anos (46,3%).
Quanto à formação, os docentes que constituem a amostra são majoritariamente doutores (50,6%), seguidos de mestres (32,1%), e os restantes são especialistas (13,3%) ou graduados (4,0%). Em seu percurso formativo, 22% não obtiveram formação pedagógica; os demais alcançaram-na no curso de licenciatura (44,8%), em curso de pós-graduação em docência do Ensino Superior (16,2%) ou em cursos de outra natureza (17%).
Relativamente à experiência docente, verifica-se que a maioria apresenta mais de cinco anos de experiência no Ensino Superior presencial (66,5%). Destes, 18,6% dos docentes brasileiros e 39% dos docentes portugueses atuam no ensino há mais de vinte anos. No entanto, como docentes e/ou tutores on-line, 51,3% têm menos de cinco anos de experiência, correspondendo a 53% dos docentes brasileiros e 41,5% dos docentes portugueses. Por outro lado, 28,9% atuam há mais de dez anos na docência on-line, sendo 28% docentes brasileiros e 34,1% docentes portugueses. Pode-se inferir aqui que os docentes universitários que exercem a docência on-line em Portugal possuem mais experiência docente, tanto no presencial quanto na EaD, que os docentes universitários no contexto brasileiro.
De acordo com os dados recolhidos, somente 11,2% desses docentes não exercem outra atividade profissional além da docência on-line (10,6% brasileiros e 14,6% portugueses); 57,4% atuam também em cursos e/ou disciplinas presenciais (56,3% brasileiros e 63,4% portugueses) e 31,4% em outros cargos (33,1% brasileiros e 22% portugueses). Constata-se que tanto no contexto brasileiro quanto no contexto português os respondentes, em sua maioria, atuam concomitantemente na educação presencial e na EaD, sendo poucos os que têm a docência on-line como atividade exclusiva.
A caracterização dos participantes da pesquisa está detalhada na Tabela 1.
País | Brasil | Portugal | Global | |||
---|---|---|---|---|---|---|
N | % | N | % | N | % | |
Sexo | ||||||
Feminino | 134 | 56,8 | 26 | 63,4 | 160 | 57,8 |
Masculino | 102 | 43,2 | 15 | 36,6 | 117 | 42,2 |
Idade | ||||||
Até 24 anos | 2 | 0,8 | 0 | 0 | 2 | 0,7 |
Ente 25 e 34 anos | 32 | 13,6 | 2 | 4,9 | 34 | 12,3 |
Entre 35 e 44 anos | 84 | 35,6 | 9 | 22,0 | 93 | 33,6 |
Entre 45 e 54 anos | 69 | 29,2 | 11 | 26,8 | 80 | 28,9 |
Acima de 55 anos | 49 | 20,8 | 19 | 46,3 | 68 | 24,5 |
Formação acadêmica | ||||||
Licenciatura/Bacharelado | 11 | 4,7 | 0 | 0 | 11 | 4,0 |
Pós-Graduação/Especialização | 32 | 13,6 | 5 | 12,2 | 37 | 13,3 |
Mestrado | 82 | 34,7 | 7 | 17,1 | 89 | 32,1 |
Doutorado/Doutoramento | 111 | 47,0 | 29 | 70,7 | 140 | 50,6 |
Possui formação pedagógica? | ||||||
Não | 51 | 21,6 | 10 | 24,4 | 61 | 22,0 |
Sim, no curso de licenciatura | 111 | 47,0 | 13 | 31,7 | 124 | 44,8 |
Sim, em curso de pós-graduação | 41 | 17,4 | 4 | 9,8 | 45 | 16,2 |
Sim, outro | 33 | 14,0 | 14 | 34,1 | 47 | 17,0 |
Tempo de experiência no Ensino Superior presencial | ||||||
Sem experiência | 25 | 10,6 | 1 | 2,4 | 26 | 9,4 |
Menos de 5 anos | 57 | 24,2 | 10 | 24,4 | 67 | 24,2 |
Entre 5 e 10 anos | 48 | 20,3 | 6 | 14,6 | 54 | 19,5 |
Entre 11 e 15 anos | 34 | 14,4 | 5 | 12,2 | 39 | 14,1 |
Entre 16 e 20 anos | 28 | 11,9 | 2 | 7,3 | 31 | 11,2 |
Mais de 20 anos | 44 | 18,6 | 16 | 39,0 | 60 | 21,7 |
Tempo de experiência na docência on-line | ||||||
Menos de 1 ano | 30 | 12,7 | 3 | 7,3 | 33 | 11,9 |
De 1 a 3 anos | 53 | 22,5 | 9 | 22,0 | 62 | 22,4 |
De 3 a 5 anos | 42 | 17,8 | 5 | 12,2 | 47 | 17,0 |
De 6 a 9 anos | 45 | 19,0 | 10 | 24,4 | 55 | 19,9 |
Mais de 10 anos | 66 | 28,0 | 14 | 34,1 | 80 | 28,9 |
Exerce outra atividade profissional além da docência on-line? | ||||||
Não | 25 | 10,6 | 6 | 14,6 | 31 | 11,2 |
Sim, docência em curso/disciplina presencial | 133 | 56,3 | 26 | 63,4 | 159 | 57,4 |
Sim, outro cargo na área educacional | 46 | 19,6 | 5 | 12.2 | 51 | 18,4 |
Sim, outro cargo fora da área educacional | 32 | 13,5 | 4 | 9,8 | 36 | 13,0 |
Fonte: As autoras.
3.2 Caracterização das IES Abrangidas pela Pesquisa
A amostra obtida contempla informações de 92 IES brasileiras, o que corresponde a aproximadamente 3% do universo de universidades, centros universitários, faculdades e institutos federais, tendo em vista um total de 3.161 IES cadastradas no e-MEC (BRASIL, 2020) em janeiro de 2020. Entre os dados obtidos, a maioria (66%) corresponde a uma IES pública e 34% a uma IES privada. No contexto português, a amostra obtida incluiu 17 instituições, correspondendo a aproximadamente 16% do universo de universidades e politécnicos, considerando 107 IES identificadas no site da Direção-Geral do Ensino Superior (DGES, 2020). A maioria das IES abrangidas é pública (78%), sendo 22% privada.
Somente 10% das IES às quais os respondentes estão vinculados atendem especificamente ao público interessado em EaD, ou seja, oferta cursos totalmente a distância, sendo este valor de 10,2% no Brasil e 9,8% em Portugal. Cabe salientar que esse percentual para Portugal corresponde exclusivamente aos respondentes da Universidade Aberta portuguesa, única IES que oferece exclusivamente cursos de educação superior a distância no contexto português. Das demais Instituições, 71,5% ofertam tanto cursos presenciais quanto totalmente a distância, sendo 73,3% das IES no Brasil e 61% das IES em Portugal; e18,4% são instituições tradicionalmente presenciais e que têm ofertado disciplinas parcialmente a distância, sendo 16,5% das IES no Brasil e 29,2% das IES em Portugal. Esse dado aponta para uma maior adoção de práticas híbridas no contexto dos respondentes portugueses em relação aos brasileiros.
Concernente ao tempo no qual as IES ofertam cursos e/ou disciplinas na modalidade a distância, apenas 4% apresentam oferta formativa on-line há menos de um ano. Das demais, 23,8% trabalham com EaD entre dois a cinco anos, 26,4% entre seis e nove anos e 45,8% há mais de dez anos. Percebe-se aqui uma diferença entre os dois contextos: no Brasil, os dados apontam que 48,8% das IES ofertam cursos e/ou disciplinas a distância há mais de dez anos, enquanto em Portugal esse valor não vai além dos 29,2%.
No que diz respeito à promoção de formação dos docentes para a atuação on-line, 17% das IES não propiciam e/ou não propiciaram formação para a docência on-line de seus docentes e/ou tutores, sendo isso verdade para 13,5% das IES no Brasil e 36,6% em Portugal. Por outro lado, 69% das IES proporcionam formação docente para a docência on-line em ações de formação de curta duração (51,3% das IES em Portugal) ou cursos de aperfeiçoamento (72% das IES no Brasil) desenvolvidos pela própria IES; 5,4% em ações de formação de curta duração ou cursos de aperfeiçoamento desenvolvidos por outras entidades (6% das IES no Brasil e 2,4% das IES em Portugal); e 8,7% em cursos de pós-graduação (8,5% das IES no Brasil e 9,7% das IES em Portugal).
Os resultados anteriormente reportados encontram-se detalhados na Tabela 2.
País | Brasil | Portugal | Global | |||
---|---|---|---|---|---|---|
N | % | N | % | N | % | |
Categoria administrativa da IES | ||||||
Público | 155 | 66,0 | 32 | 78,0 | 187 | 67,5 |
Privado | 81 | 34,0 | 9 | 22,0 | 90 | 32,5 |
Modalidade predominante na oferta de cursos na Educação Superior | ||||||
Apenas e-learning | 24 | 10,2 | 4 | 9,8 | 28 | 10,1 |
Apenas presencial com oferta de disciplinas parcialmente a distância | 39 | 16,5 | 12 | 29,2 | 51 | 18,4 |
Tanto presencial quanto e-learning | 173 | 73,3 | 25 | 61,0 | 198 | 71,5 |
Há quanto tempo a IES oferta cursos e/ou disciplinas a distância? | ||||||
A menos de um ano | 10 | 4,2 | 1 | 2,4 | 11 | 4,0 |
Entre 2 e 5 anos | 52 | 22,0 | 14 | 34,2 | 66 | 23,8 |
Entre 6 e 9 anos | 59 | 25,0 | 14 | 34,2 | 73 | 26,4 |
Acima de 10 anos | 115 | 48,8 | 12 | 29,2 | 127 | 45,8 |
A IES em que atua propicia a formação de seus docentes para a educação on-line? | ||||||
Não | 32 | 13,5 | 15 | 36,6 | 47 | 17,0 |
Sim, ações de formação ou cursos de aperfeiçoamento desenvolvidos pela IES | 170 | 72,0 | 21 | 51,3 | 191 | 69,0 |
Sim, ações de formação ou cursos de aperfeiçoamento em outras entidades | 14 | 6,0 | 1 | 2,4 | 15 | 5,4 |
Sim, curso pós-graduação na IES | 18 | 7,7 | 3 | 7,3 | 21 | 7,6 |
Sim, curso pós-graduação em outra IES | 2 | 0,8 | 1 | 2,4 | 3 | 1,1 |
Fonte: As autoras.
Deduz-se, a partir desses dados, que as IES brasileiras têm se empenhado mais do que as IES portuguesas na qualificação de seus docentes para atuação on-line, tanto pela quantidade de oferta de formação quanto pela carga horária das ações de formação propiciadas.
3.3 Formação e Prática Pedagógica em Ambientes Virtuais
Com relação às atividades exercidas pelos respondentes no domínio da EaD, 51,3% executam todas as funções docentes relativas à implementação de uma dada disciplina, isto é, a elaboração do material didático, as atividades de aprendizagem e as avaliações, bem como o acompanhamento, a orientação, a motivação e a monitorização dos discentes em suas atividades acadêmicas desenvolvidas no ambiente virtual de aprendizagem (AVA). A realidade descrita verifica-se para 49,2% dos respondentes brasileiros e para 63,4% dos respondentes do contexto português. Dos demais, 21,3% realizam somente a tutoria on-line, ou seja, acompanham, orientam, motivam e avaliam continuamente os discentes em suas atividades acadêmicas desenvolvidas no AVA, sendo os valores bastante distintos nos dois países analisados, 24,2% dos respondentes brasileiros e 4,9% dos respondentes portugueses; 6,5% (7,2% dos respondentes brasileiros e 2,4% dos respondentes portugueses) organizam a sala virtual da disciplina a partir de material didático elaborado por outro docente, preparam as atividades de aprendizagem e avaliações e orientam os discentes em suas atividades acadêmicas desenvolvidas no AVA; 4% (3,8% dos respondentes brasileiros e 4,9% dos respondentes portugueses) elaboram o material didático das disciplinas (textos, livros, atividades, exercícios); 3,6% (3,0% dos respondentes brasileiros e 7,3% dos respondentes portugueses) produzem aulas em vídeo/videoaulas para as disciplinas; 5,1% (4,7% dos respondentes brasileiros e 7,3% dos respondentes portugueses) orientam trabalhos científicos on-line (artigos, dissertações, teses). Constata-se aqui que, no contexto português, os docentes que atuam on-line são, majoritariamente, responsáveis por todas as funções docentes relativas à disciplina que leciona, ao passo que no contexto brasileiro as atividades docentes relativas a uma disciplina são exercidas por diversos profissionais.
Entre os respondentes, 8,3% exerceram a docência on-line em anos anteriores (8,0% dos respondentes brasileiros e 9,7% dos respondentes portugueses), porém, atualmente, exercem outra função no contexto da EaD, majoritariamente, funções de coordenação (curso, tutoria, polo ou institucional de EaD).
Antes de atuar na docência on-line, 39% dos docentes não possuíam nenhuma experiência anterior em EaD e 29,6% tinham vivência apenas como alunos a distância. Esses valores apresentam ligeiras variações nos dois países sob análise, sendo 39,4% dos respondentes brasileiros e 36,6% dos respondentes portugueses sem experiência anterior em EaD, ao passo que 28,4% dos respondentes brasileiros e 36,6% dos respondentes portugueses tiveram vivência na EaD apenas como alunos. Dos demais, 9% haviam atuado como tutor presencial (todos no Brasil), 10,8% como coordenador pedagógico e/ou curso (11,9% dos respondentes brasileiros e 4,8% dos respondentes portugueses) e 11,6% em outros cargos como revisor didático, orientador de trabalho de conclusão de curso, entre outros (9,7% dos respondentes brasileiros e 22,0% dos respondentes portugueses).
Relativamente à sua formação para o exercício da docência on-line, 64,3% dos respondentes participaram de algum curso oferecido pela IES em que atuam/atuaram, sendo 64,9% no contexto brasileiro e 61,0% no contexto português. Outros 22,4% buscaram essa formação por iniciativa e custo próprios (22,0% brasileiros e 24,4% portugueses). Quanto ao tipo de formação realizada, somente 3,6% dos respondentes possuem doutoramento na área de EaD e e-learning (3,4% brasileiros e 4,9% portugueses), 2,9% têm Mestrado em EaD (1,7% brasileiros e 9,8% portugueses), 1,1% possuem graduação na área (0,8% brasileiros e 2,4% portugueses) e 21% realizaram uma pós-graduação ou curso de especialização na área da EaD, com carga horária superior a 180 horas (22,5% brasileiros e 12,2% portugueses). No que diz respeito ao total de horas de formação frequentadas no domínio da EaD, verifica-se que 2,5% dos respondentes, que correspondem a 17,1% dos portugueses, não havendo respondentes do Brasil, participaram de ações de formação de curta duração com carga horária de até 6 horas;16,6% participaram de ações de formação ou cursos de aperfeiçoamento com carga horária entre 6 e 30 horas (destes, 16,5% eram brasileiros e 17,1% portugueses); 20,6% participaram de ações de formação ou cursos de aperfeiçoamento com carga horária entre 30 e 90 horas (21,7% brasileiros e 14,6% portugueses); e 18,4% participaram de ações de formação ou cursos de aperfeiçoamento com carga horária entre 90 e 180 horas (20,3% brasileiros e 7,3% portugueses). Contudo, 13,3% dos docentes (13,1% brasileiros e 14,6% portugueses) não tiveram nenhuma formação para atuação na docência on-line.
Para identificar a área do conhecimento em que atuam como docente on-line, no contexto brasileiro, tomou-se como base a tabela de áreas do conhecimento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) disponível na Plataforma Lattes (CNPq, 2019), e no contexto português, a tabela de Área de Estudos e Curso da Direção-Geral de Ensino Superior (DGES, 2019). Verificou-se que, entre os respondentes brasileiros, registra-se predominância de atuação nas áreas das Ciências Humanas (37,8%) e Ciências Sociais Aplicadas (24,5%), e entre os respondentes portugueses, na área de Ciências da Educação e Formação de Professores (39%) e na área de Humanidades, Secretariado e Tradução (14,6%).
Os valores percentuais referidos relativamente às atividades exercidas pelos respondentes e à sua formação para a docência on-line são sistematizados na Tabela 3.
País | Brasil | Portugal | Global | |||
---|---|---|---|---|---|---|
N | % | N | % | N | % | |
Atividade atual do respondente na Educação a Distância | ||||||
Todas as funções docentes | 116 | 49,2 | 26 | 63,4 | 142 | 51,3 |
Todas as funções docentes, exceto material didático | 17 | 7,2 | 1 | 2,4 | 18 | 6,5 |
Tutoria on-line | 57 | 24,2 | 2 | 4,9 | 59 | 21,3 |
Elaboração de material didático | 9 | 3,8 | 2 | 4,9 | 11 | 4,0 |
Produção de aulas em vídeo/videoaulas | 7 | 3,0 | 3 | 7,3 | 10 | 3,6 |
Orientação de trabalhos científicos | 11 | 4,7 | 3 | 7,3 | 14 | 5,1 |
Coordenação | 12 | 5,1 | 1 | 2,4 | 13 | 4,7 |
Outra | 5 | 2,1 | 2 | 4,9 | 7 | 2,5 |
Nenhuma atualmente | 2 | 0,8 | 1 | 2,4 | 3 | 1,1 |
Experiência anterior em EaD antes de atuar na docência on-line | ||||||
Não | 93 | 39,4 | 15 | 36,6 | 108 | 39,0 |
Sim, como aluno | 67 | 28,4 | 15 | 36,6 | 82 | 29,6 |
Sim, como tutor presencial | 25 | 10,6 | 0 | 0 | 25 | 9,0 |
Sim, como coordenador | 28 | 11,9 | 2 | 4,8 | 30 | 10,8 |
Sim, outro | 23 | 9,7 | 9 | 22,0 | 32 | 11,6 |
Possui formação para a docência on-line? | ||||||
Não | 31 | 13,1 | 6 | 14,6 | 37 | 13,3 |
Sim, em curso oferecido pela IES | 153 | 64,9 | 25 | 61,0 | 178 | 64,3 |
Sim, por iniciativa e custo próprio | 52 | 22,0 | 10 | 24,4 | 62 | 22,4 |
Tipo de formação para o exercício da docência on-line | ||||||
Nenhuma formação | 31 | 13,1 | 6 | 14,6 | 37 | 13,3 |
Ação de formação -CH até 6 horas | 0 | 0 | 7 | 17,1 | 7 | 2,5 |
Ação de formação - CH entre 6 e 30 horas | 39 | 16,5 | 7 | 17,1 | 46 | 16,6 |
Ação de formação - CH entre 30 e 90 horas | 51 | 21,7 | 6 | 14,6 | 57 | 20,6 |
Ação de formação - CH entre 90 e 180 horas | 48 | 20,3 | 3 | 7,3 | 51 | 18,4 |
Graduação em EaD e/ou e-learning | 2 | 0,8 | 1 | 2,4 | 3 | 1,1 |
Pós-Graduação em EaD e/ou e-learning | 53 | 22,5 | 5 | 12,2 | 58 | 21,0 |
Mestrado em EaD e/ou e-learning | 4 | 1,7 | 4 | 9,8 | 8 | 2,9 |
Doutoramento em EaD e/ou e-learning | 8 | 3,4 | 2 | 4,9 | 10 | 3,6 |
Fonte: As autoras.
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Nesta seção, procura-se explorar os resultados apresentados, tendo como norte os objetivos deste estudo: a identificação do perfil dos docentes que exercem atividade docenteon-lineno contexto do Ensino Superior, no Brasil e em Portugal, com análise das diferenças e proximidades entre os dois países nesse quesito, a sistematização de conhecimento sobre a formação formal para a docência on-line obtida por esses docentes e sobre a oferta de suas IES nesse domínio.
No grupo do Brasil, embora os profissionais que atuam como docente em disciplinas e/ou cursos on-line no Ensino Superior sejam, em sua maioria, mestres (34,7%) ou doutores (47,0%), o percentual de docentes que não têm formação pedagógica revelou-se assinável (21,6%). Essa realidade é verificada também no grupo de Portugal, constituída majoritariamente por doutores (70,7%), porém com um percentual de docentes sem formação pedagógica maior (24,4%). Essa limitação na formação pedagógica de muitos docentes universitários, seja em exercício na modalidade presencial, seja on-line, é uma questão que requer atenção dos gestores institucionais, pois confirma o já apontado por Pretto e Riccio (2010), de que, sendo especialistas em sua área de conhecimento específica sem formação sólida no campo educacional, tais docentes tenderão a desconhecer as concepções de currículo, as metodologias de ensino, as abordagens pedagógicas ou as formas de aprendizagem adequadas à cultura contemporânea.
No tocante ao tempo de experiência docente, os respondentes do grupo de Portugal revelam possuir mais experiência docente, tanto no presencial quanto no virtual, do que os docentes do grupo do Brasil. Aexígua experiência docente no Ensino Superior presencial (35%) e a ausência de experiência anterior na EaD antes de sua imersão na docência on-line (39,5%) constituem um aspecto frágil no contexto brasileiro. Esses docentes exercem a docência on-line sem as habilidades e competências peculiares da EaD e sem os saberes docentes adquiridos ao longo da prática presencial, isto é, os “saberes construídos na prática profissional da docência”, denominados por Tardif (2012) de “saberes experienciais ou práticos”.
Por sua vez, no grupo de Portugal, apesar de um percentual significativo de docentes ter experiência no Ensino Superior presencial inferior a cinco anos (27%) e/ou não possuírem experiência anterior na EaD antes de atuarem na docência on-line (36,6%), um percentual expressivo (39%) tem mais de vinte anos de experiência docente no presencial. Essa trajetória na profissão do docente é importante, pois os conhecimentos, as competências e as habilidades são adquiridos efetivamente na prática do docente, em sua história de vida e em todo o contexto em que exerce suas atividades (GONÇALVES, 2009). No entanto, a experiência docente na modalidade presencial e o domínio do conteúdo específico não são suficientes para garantir o sucesso da lecionação na modalidade on-line. Mesmo docentes com ampla experiência no ensino presencial têm, muitas vezes, a tendência de transpor práticas educativas tradicionais para o ambiente on-line (GONZÁLEZ-SANMAMED; MUÑOZ-CARRIL; SANGRÀ, 2014; DAVIDSON, 2019). Embora os saberes adquiridos ao longo da prática profissional docente sejam importantes, a docência on-line envolve competências diferentes das requeridas nas salas de aulas tradicionais e exige que os docentes desenvolvam conhecimentos e novas habilidades conducentes à criação de experiências de aprendizado tecnologicamente mediadas que se revelem significativas e bem-sucedidas (CHING; HSU; BALDWIN, 2018). Sob essa ótica, é essencial a formação contínua para a docência on-line de modo a desenvolver saberes docentes que contemplem as especificidades da EaD, bem como dos ambientes tecnológicos que as suportam (SILVA; CILENTO, 2014).
Esse é um aspecto positivo no contexto brasileiro. Grande parte dos docentes indica possuir formação para a docência on-line (87%), obtida em cursos de aperfeiçoamento com carga horária entre 30 e 180 horas (44%) ou em curso de pós-graduação lato sensu na área da EaD e/ou e-learning (22,5%), assegurados por cursos oferecidos pela IES (65%) ou por iniciativa e custo próprio (23%). Esse dado mostra que muitos docentes têm buscado essa formação a fim de conhecerem as peculiaridades e as especificidades da docência on-line e, ainda, que as IES brasileiras têm propiciado formação para a docência on-line a seus docentes, o que contrapõe o revelado por estudos anteriores que assinalam que a expansão da modalidade on-line não tem sido acompanhada de formação docente adequada (SILVA; CILENTO, 2014). Ademais, na maioria dos casos, o docente começa a atuar em cursos on-line sem ter conhecimento das possibilidades trazidas pelas redes tecnológicas (PRETTO; RICCIO, 2010).
No contexto português, a maioria dos docentes também indica possuir formação para a docência on-line (85%), porém um percentual significativo (49%) obteve-a em cursos de formação de curta duração, em cursos de formação com carga horária entre 6 e 90 horas (32%) ou mesmo em workshops de carga horária inferior a 6 horas (17%). De acordo com Wilson (2012), cursos de curta duração são reconhecidos como apropriados para fornecer novas habilidades técnicas, porém o desenvolvimento profissional conseguido se concentra mais nos aspectos tecnológicos do e-learning do que propriamente nas abordagens pedagógicas para este requeridas.
No que diz respeito à promoção de formação e qualificação de seus docentes para as especificidades da docência on-line, pode-se afirmar que, com base nos resultados obtidos na amostra, genericamente as IES representadas no estudo têm propiciado formação a seus docentes e/ou tutores. Contudo, as IES brasileiras têm proporcionado mais formação a seus docentes e/ou tutores (86,5%) do que as IES portuguesas (63,4%). O desenvolvimento do corpo docente para a educação on-line é um aspecto crítico para a qualidade de programas de Ensino Superior on-line. Logo, é imprescindível que as IES desenvolvam e implementem atividades de formação dos docentes para atuação no on-line quando da transição do ensino presencial para o b-learning ou e-learning.
Até a data da pesquisa, o tempo de exercício da docência on-line nos dois países é inferior a três anos em um terço dos respondentes, o que revela uma limitada prática em EaD desses docentes. Contudo, 34% dos respondentes do grupo de Portugal têm mais de dez anos de experiência, enquanto no contexto brasileiro esse percentual é de 28%. Considerando-se que a EaD no Brasil abrange um espectro muito maior de IES e de profissionais envolvidos do que em Portugal, o menor percentual de docentes com mais de dez anos de atuação on-line no grupo do Brasil pode estar associado à grande rotatividade de profissionais, principalmente no âmbito do sistema UAB, decorrente da desvalorização e precariedade do trabalho do docente/tutor, firmada por contratos de trabalho precário (MILL, 2016; VIEIRA, 2018).
É importante ressaltar aqui uma diferença entre os dois países com relação às atividades exercidas no âmbito da docência on-line. No contexto português, a maioria dos docentes que atuam on-line sinaliza executar todas as funções docentes relativas à disciplina que lecionam (elaboração do material didático, atividades de aprendizagem e avaliações; acompanhamento, orientação, motivação e avaliação dos discentes em suas atividades acadêmicas desenvolvidas no AVA; e outras), sendo poucos os que exercem apenas a tutoria on-line ou produção de material didático ou videoaulas. Por outro lado, no contexto brasileiro, um percentual bem maior realiza somente a tutoria on-line, e o planejamento da disciplina, a elaboração de material didático, a produção de videoaulas, entre outras, apresentam-se como atividades sob responsabilidade de outros profissionais, docentes e/ou não docentes, que integram uma equipe multidisciplinar configurada no modelo brasileiro como um dos referenciais de qualidade para cursos a distância (BRASIL, 2007). Nesse modelo, não apenas um único docente, mas vários profissionais docentes, atuam juntos no processo de ensino e aprendizagem. Essa organização do trabalho docente na EaD, denominada por MILL (2014) de “polidocência”, acarreta em si o exercício de múltiplas funções por parte do docente (autor, formador, tutor virtual, tutor presencial, coordenador, orientador), além de retirar deles parte de sua autonomia no trabalho, o que se entende que poderá favorecer a desprofissionalização e desvalorização docente (baixa remuneração), na medida em que suas atividades e todo o processo de ensino e aprendizagem são fragmentados (VELOSO; MILL, 2018).
Importa assinalar ainda que a área do conhecimento predominante de atuação docente on-line nos dois contextos é a de Ciências Humanas e Sociais, que engloba os cursos das Ciências da Educação e Formação de Professores, Ciências Sociais e Humanidades. No Brasil, esse dado pode ser justificado pelas políticas governamentais de incentivo da EaD no País para alargamento do acesso ao Ensino Superior direcionado a programas de formação inicial e continuada de professores para educação básica (VIEIRA, 2018).
Em síntese, a análise dos resultados evidencia que a amostra que participou neste estudo apresenta alguma homogeneidade, não havendo diferenças assinaláveis quanto ao perfil docente (na população-alvo) entre os dois países. Entretanto, quanto aos aspectos formativos para a docência on-line propiciados pela IES, percebe-se uma maior valorização institucional no contexto brasileiro em relação ao contexto português.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando as medidas adotadas pelo Ministério da Educação para consolidar e alavancar a EaD no Brasil, o regime jurídico do Ensino Superior ministrado a distância recentemente aprovado em Portugal (CONSELHO DE MINISTROS, 2019) e o processo de institucionalização e regulação da EaD nas IES dos países lusófonos em curso, algumas mais avançadas e outras em estágio embrionário (VIEIRA, 2018), estudos que identifiquem o perfil docente do professor universitário que atua na docência on-line, os desafios vivenciados e práticas bem-sucedidas na transposição da modalidade presencial para a modalidade a distância on-line, poderão contribuir para a promoção de políticas institucionais de formação para a docência on-line, de forma a propiciar a incorporação qualitativa do e-learning ou b-learning na rotina acadêmica de instituições universitárias culturalmente com práticas pedagógicas presenciais.
Nessa perspectiva, este estudo analisou o perfil de uma pequena amostra de docentes que atuam em ambientes virtuais de aprendizagem em Instituições de Ensino Superior no Brasil e em Portugal, quanto à sua formação (acadêmica, pedagógica e nas especificidades do on-line) e experiência docente (presencial e virtual). No tocante à formação docente, importa salientar que, conforme as respostas de uma parte considerável dos respondentes, a busca pela formação nessa área tem sido de iniciativa do docente, apontando para uma ausência de valorização institucional da qualificação para e/ou da educação on-line, principalmente no contexto português. Constata-se que nos dois países em estudo várias IES propiciam a formação de seus docentes para a docência on-line, porém muitas o fazem em cursos de formação de curta duração, não suficientes para o desenvolvimento de habilidades e competências técnico-pedagógicas inerentes à educação on-line. Esse aspecto reforça a necessidade de investimento institucional na formação dos professores para a docência on-line, reconhecendo-se que a qualidade dos cursos no Ensino Superiora distância está intimamente correlacionada com as práticas pedagógicas on-line do docente.
Tendo em conta a reflexão apresentada e dada a natureza exploratória deste estudo, considera-se primordial o aprofundamento de outras dimensões dele. Nesse sentido e na sequência deste, perspectiva-se analisar as respostas da segunda parte do questionário on-line aplicado, no que diz respeito aos principais desafios enfrentados pelo docente na transposição do presencial para a educação on-line e à percepção deles sobre os conhecimentos, as competências e as habilidades que precisam adquirir e/ou aprimorar para a qualidade pedagógica de sua prática na educação on-line.