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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.19 no.3 São Paulo jul./sept 2021  Epub 17-Dic-2021

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2021v19i3p962-968 

Editorial

EDITORIAL DA REVISTA e-CURRICULUM

Antonio CHIZZOTTIi 
http://orcid.org/0000-0002-2752-2330

Marina Graziela FELDMANNii 
http://orcid.org/0000-0003-3008-2636

i Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. E-mail: anchizo@uol.com.br

ii Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. E-mail: feldmnn@uol.com.br


A edição da primavera da Revista e-Curriculum precisou superar o clima de incertezas, que perdurou no segundo semestre do ano: acirramento político crescente, hesitação vacinal perdurante, tensão econômica ameaçadora, manifestações públicas induzidas, criando uma polarização social em torno do domínio ideológico e sanitário, traduzido pelo confronto entre as orientações científicas para a superação imediata da pandemia, condição indispensável para a realização da vida privada e social, tendo como parâmetro, de um lado, os fundamentos e as propostas, derivadas da ciência e da pesquisa, a fim de debelar a ameaça sanitária, e, de outro, um movimento negacionista das orientações científicas, protagonizado por agentes públicos, com apoio nas redes sociais, que induziram multidões de crédulos a desqualificar e, até, contestar as mais elementares providências para a preservação da vida. Nessa polarização entre o conhecimento científico e a credulidade provocada, mais de meio milhão de vidas foram perdidas, muitas delas, pais e mães de famílias numerosas, outros, arrimos de famílias, trabalhadores indispensáveis e jovens promissores. O custo humano e social da ignorância exacerbada tornou-se símbolo de uma tragédia humana nacional.

Esse ambiente tenso do ano e do semestre encontrou pesquisadores que se empenharam na construção de um conhecimento fundamentado, traduziram suas descobertas e propuseram caminhos viáveis para o desenvolvimento da educação nacional. Os dezoito artigos que compõem a presente edição, oriundos da demanda espontânea de diferentes regiões do Brasil, atestam o empenho dos autores na construção de uma vida solidária em tempos incertos e conturbados.

O artigo de Carla Maria Nogueira de Carvalho, Juliana Cordeiro Soares Branco e Larissa Costa de Almeida investiga o currículo de um curso de Pedagogia, relacionando a formação obtida com as necessidades vivenciadas na prática profissional. As autoras procuram, ainda, identificar o grau de adequação do currículo vivenciado com as demandas do mercado de trabalho. Por meio da abordagem quali-quanti, o texto evidencia que o ambiente de formação docente é um espaço de múltiplas tendências e de múltiplas referências, em que os saberes se apresentam ora fragmentados e desarticulados, ora articulados, buscando alternativas para uma nova relação pedagógica e maior coerência com as necessidades da prática profissional e das demandas do mercado.

Ao analisarem os avanços e os retrocessos das Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores, Andreia Cristina Metzner e Alexandre Janotta Drigo comparam os documentos de 2015 com os de 2002, na perspectiva de profissionais de Educação Física. Com amostra composta por 20 desses profissionais, a pesquisa descritiva-analítica de cunho qualitativo indica que, na perspectiva de seus participantes, as novas Diretrizes Curriculares agrupam e aprofundam pontos dispersos ou descritos de forma superficial nas Resoluções anteriores. O texto ainda traz temáticas atuais e reafirma que os cursos de licenciatura têm como objetivo a formação de professores para atuarem na Educação Básica. Aponta, também, para a possibilidade da segunda licenciatura e/ou da complementação pedagógica.

Maria Amélia Santoro Franco e Aline D. N. Mascarenhas analisam, por meio de estudo de natureza ensaística, a recente Resolução Nº 2, de 20 de dezembro de 2019, do Conselho Nacional de Educação (CNE), que estabelece a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica. Com o objetivo de desvelar as intencionalidades político-ideológicas contidas no referido documento, as autoras indicam que o ideário proposto se pauta em uma compreensão tecnicista da docência, ancorado na pedagogia neoliberal que se reverbera no campo da profissionalização docente. Isso induz a práticas reducionistas de formação e as reconduz a uma concepção instrumental e acrítica da didática e ao retrocesso epistemológico da pedagogia das competências de cunho behaviorista.

O trabalho de Helena do Socorro Campos da Rocha e Cristina Lúcia Dias Vaz trata da aplicabilidade do Afrofuturismo na Educação com a metodologia ativa CartoDiversidade em turmas de Formação de Professores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA) - campus Belém. O artigo visa mostrar como a CartoDiversidade promove o empoderamento de forma criativa e inovadora no trato com a diversidade etnicorracial, por meio da produção de materiais didáticos afrofuturistas. Valendo-se da cultura Maker, a CartoDiversidade configura-se em uma metodologia ativa que torna alunos e alunas protagonistas de sua aprendizagem ao inserir suas vozes e narrativas em produtos educacionais autorais, podendo ser estendida e adaptada a todos os componentes curriculares.

Ao indagarem sobre as percepções de coordenadores de curso de graduação em Ciências Biológicas, em uma universidade pública do Paraná, acerca do processo formativo curricular para a docência, Ana Rita Levandovski, Roberta Negrão de Araújo e Marinez Meneghello Passos buscam, por meio da Análise de Conteúdo, identificar expressões relacionadas aos saberes docentes na formação do licenciado, por meio das entrevistas realizadas com três professores exercendo a função de coordenadores pedagógicos. Ao considerarem que os saberes docentes são compreendidos pelo conjunto de saberes decorrentes da formação acadêmica e de suas vivências no cotidiano profissional, foi possível observar a especificidade de cada curso e as particularidades e as subjetividades da gestão.

O artigo de Cintia Gomes da Silva, Roseane Maria de Amorim e Laura Cristina Vieira Pizzi objetiva trazer uma discussão acerca da formação inicial dos professores e das professoras do curso de Pedagogia em uma universidade pública brasileira e sua relação com o contexto da Lei Nº 11.645, de 10 março de 2008. Ao indagarem se a formação inicial do curso de Pedagogia vem suscitando discussões quanto à diversidade cultural e, mais especificamente, sobre os povos indígenas, as autoras trazem a discussão sobre o currículo que permeia a formação desses docentes. Ressaltam, ainda, que a questão das diferenças e da diversidade cultural na formação inicial desses profissionais necessita de discussões teóricas, práticas e produção de materiais didáticos que apoiem os novos docentes no maior domínio dessa temática.

O trabalho de Lucimara Aparecida Faustino Custódio, Camila Mugnai Vieira e Ieda Francischetti descreve um roteiro que pode nortear a construção de situações-problema para a análise da dimensão social em cursos na área da Saúde cujos currículos utilizam a Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP). O roteiro constitui-se de eixos que caracterizaram o perfil dos personagens e os contextos das situações-problema, como identificação, espaço, área de competência, vigilância em saúde, condições de vida, acesso aos serviços de saúde, vínculo, autonomia e diversidades e vulnerabilidades. Realizado por meio da análise documental, o inventário descritivo é utilizado para analisar 69 situações-problema e seus respectivos guias, disparadores dos processos de ensino e de aprendizagem em uma faculdade pública paulista.

João Augusto dos Reis Neto e Maria Jaqueline de Grammont partem da constatação de que os currículos, tanto da Educação Básica quanto os de formação docente, ainda são construídos em uma perspectiva colonial e colonizadora, eurocentrado e excludente. Diante disso, os autores discutem as possibilidades para a construção de um currículo inspirado na cosmovisão afro-brasileira, centrada na figura do orixá Exu, como forma de resistência à colonialidade. Os pesquisadores dialogam, para tal, com os estudos pós-coloniais afro-latinoamericanos, com o pensamento social afro-brasileiro e as epistemologias ancestrais do povo de santo. Analisam, também, as tensões sobre o currículo e anunciam as possibilidades de resistência e de criação de um currículo diverso, polifônico e multicultural, por meio de um estudo teórico de caráter bibliográfico.

Ao analisarem o movimento de desconstrução da escola pública por meio de discursos pautados na perspectiva neoliberal, que entende a educação não como direito social, mas como produto, Márcia Maria Rodrigues Uchôa e Jerry Adriano Villanova Chacon abordam a concepção de currículo em uma perspectiva crítica. Para tal, os autores apresentam denúncias e anúncios com relação aos desafios curriculares pautados em uma perspectiva ética e de justiça social. Por meio de pesquisa bibliográfica, mostram que o currículo concebido criticamente, com a participação de todos os elementos que compõem o espaço escolar, rompe com a tradição voltada exclusivamente à transmissão de conhecimentos, porque entende que a educação não é neutra, tampouco o currículo, uma vez que transmite concepções e produz identidades.

O artigo de Bruna Sola da Silva Ramos - “Cartas a Paulo Freire: Denúncias de Opressão, Anúncios de Liberdade” - lida com a cena epistolográfica constituída pelo universo dos livros-carta de Paulo Freire e tecida em uma pesquisa-formação orientada pela leitura-escrita de cartas pedagógicas. O texto mostra que, por meio de um estudo coletivo dos livros epistolares do autor, um grupo de 30 estudantes em formação para a docência, no interior de uma universidade pública, desenvolveu uma experiência fundamentada na escrita de cartas-resposta a Paulo Freire, as quais se constituíram em instrumento para a “escuta” do encontro entre a voz freireana e a voz de professores/as em formação. Como fruto do movimento formativo-investigativo, os resultados apontam um duplo movimento de leitura crítica da realidade: de denúncias, compondo a tríade desumanização-opressão-violência; e de anúncios, compondo a tríade amar-lutar-esperançar. A autora aponta também que permanecem, na visão de professores/as em formação, as lutas que Paulo Freire anunciou e viveu, bem como a força de um pensamento propositivo e esperançoso de anúncio de liberdade e de bem viver.

Ao analisarem uma proposta educacional alternativa, Rosiana da Silva Novaes de Paula e Elize Keller-Franco investigam “em que medida tal experiência em andamento traz elementos para uma inovação curricular na Educação Básica”. Com abordagem qualitativa, os resultados do Estudo de Caso, constituído por observação, análise documental e entrevista semiestruturada, indicam que o currículo em andamento se identifica com as teorias curriculares críticas e com a abordagem curricular integrada, repercutindo na superação da disciplinaridade e a seriação, dois núcleos que têm se mantido intactos no currículo hegemônico. Os autores apontam, ainda, que a inovação curricular é marcada pela complexidade e pela possibilidade de conceber e fazer outra escola, outra educação e um novo currículo.

Augusto Monteiro Ozorio e Antonio Chizzotti analisam o papel da instituição escolar na sociedade contemporânea, assim como o propósito da disciplina de Geografia nos currículos escolares. Os autores discutem a escola como instituição pública e o currículo escolar como forma de controle e de política pública a serviço da criação da noção de pertencimento à ordem mundial condizente ao modo urbano industrial. Por meio do método materialista dialético, empregando uma pesquisa bibliográfica sobre a institucionalização da escola e do currículo escolar, os pesquisadores alternam escalas de análise a fim de vislumbrar o papel do ensino de Geografia na criação e no estabelecimento do nacionalismo como forma de consolidação da noção de pertencimento ao mundo contemporâneo marcado pela onipresença dos Estados Nacionais. Apresentam, ainda, uma contribuição para a discussão curricular acerca do significado e da importância do ensino dessa disciplina no ambiente escolar quanto ao fortalecimento do debate sobre as possibilidades no processo de implementação da recente Base Nacional Comum Curricular (BNCC) brasileira.

O trabalho de Victor Hugo Nedel Oliveira e Daniel Giordani Vasques versa sobre a iniciação científica como importante estratégia de aprendizagem na escola básica. Objetivando construir um estado de conhecimento das pesquisas sobre iniciação científica na escola, os autores apresentam os resultados de uma pesquisa no banco de dados do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) que considera dez produções. Dessa forma, o texto apresenta as potencialidades da iniciação científica para os estudantes, sendo possível considerar, a partir do estudo, que o conhecimento sobre as práticas de iniciação científica é indicado como uma estratégia com grande potencial pedagógico.

A investigação realizada por Ramon de Oliveira e Amanda Felix da Silva apresenta a importância da escola para os projetos de vida dos jovens do Ensino Médio Integrado. Realizada mediante questionários e entrevistas com estudantes do último ano do Ensino Médio de uma instituição da rede estadual de Pernambuco, os autores trazem como resultados: o reconhecimento dos jovens sobre a importância da escola para seus projetos de vida; a necessidade de outra dinâmica no interior da escola; o anseio dos estudantes por serem mais ouvidos e partilharem suas dúvidas e incertezas com os professores; seu interesse por ingressar no Ensino Superior, mesmo aqueles oriundos de curso técnico; e a indicação dos professores como a maior interferência da escola em seus projetos de vida.

No artigo de Stephane Silva de Araujo, Guilherme Stefan e Maria Cecilia Lorea Leite, é analisada uma imagem da justiça produzida por um docente de um curso de Direito, na busca por compreender sensibilidades jurídicas potencializadas no contexto curricular. São problematizados os sentidos expressos pela imagem e a possibilidade de estar alicerçada em processos de normalização dos estudantes no currículo de futuros bacharéis e operadores da justiça na sociedade. A discussão, elaborada no âmbito de uma pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), tem como inspiração a formação docente dos profissionais que atuam no curso de Direito e se alicerça na análise iconológica, segundo o Método Documentário de Interpretação, e nas teorizações acerca dos sentidos de justiça, conforme suas instituições e seu contexto local.

O artigo de Rosely Danin, Luciana Pinto Rangel e Maria Luiza Rheingantz Becker traz um estudo do Estado da Arte sobre o alcance e a utilização das teorias de Jean Piaget quanto à “Tomada de Consciência e Autonomia” em produções acadêmicas brasileiras relacionadas à área de Educação. Expõe um mapeamento em bancos de periódicos da Scientific Electronic Library Online (SciELO) e do Banco de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da Educação, assim como na Schème: Revista Eletrônica de Psicologia e Epistemologia Genéticas, com foco em artigos publicados nos últimos dez anos (2009-2019). O texto indica que as produções que se utilizam dos conceitos piagetianos se concentram nas instituições de Ensino Superior das regiões Sul e Sudeste do país. Provoca indagações sobre a escassez de estudos que apresentam esse aporte teórico a respeito do acesso e do estudo das obras do período mais tardio de Piaget e lança aos estudiosos da Epistemologia Genética o desafio de aumentar sua divulgação.

As pesquisadoras Rosilei Ferrarini e Patrícia Lupion Torres, objetivando analisar os diferentes usos das tecnologias digitais em práticas pedagógicas inovadoras, com fundamentos e análises no paradigma da complexidade, realizaram um estudo de caso, em colégios de Ensino Médio. Por meio da análise da proposta pedagógica e da aplicação de entrevista e questionário aos atores do processo, as autoras criam um sistema de categorias de análise com triangulação dos dados com base em José Carlos Morgado. A partir disso, as pesquisadoras identificam uma prática pedagógica inovadora que concilia o ensino com pesquisa e resolução de problemas em metodologia própria. Indicam, sobretudo, o desenvolvimento de um currículo temático interdisciplinar, não seriado, visando à transdisciplinaridade, além do uso efetivo de dez ferramentas digitais.

O Ensino a Distância (EaD) é o foco do estudo de Tatiana de Cassia Nakano, Rodrigo Hipolito Roza e Allan Waki de Oliveira. Em seu artigo, os autores apresentam o importante espaço que essa modalidade de ensino vem adquirindo nesses tempos de isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus. Destacam que, no Brasil, essa modalidade de ensino foi adotada como alternativa para garantir a continuidade dos processos de ensino e de aprendizagem. No entanto, importantes mudanças foram provocadas, tanto em relação ao seu público-alvo, quanto na vida de diversos atores, dentre eles professores, alunos e pais, devido às adequações necessárias no período sanitário emergencial atual.

A Revista e-Curriculum apresenta com satisfação mais uma edição de sua publicação, agradecendo a todos os avaliadores que colaboraram na análise e na apreciação crítica dos artigos, possibilitando, assim, a produção de mais esse número.

setembro de 2021

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