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Revista e-Curriculum

versão On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.19 no.4 São Paulo out./dez 2021  Epub 12-Abr-2022

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2021v19i4p1791-1812 

Artigos

Pesquisa com os cotidianos: 1 um extrato dialógico no curso de Pedagogia

Research with everyday life:a dialogic extract in the Pedagogy course

Investigación con los cotidianos:un extracto dialógico en el curso de Pedagogía

Ester Maria de Figueiredo SOUZAi 
http://orcid.org/0000-0001-5992-0184

Marlene Moreira XAVIERii 
http://orcid.org/0000-0003-0147-485X

i Doutora em Educação. Professora Plena da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb). Docente do curso de Licenciatura em Letras e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGED) e do Programa de Pós-Graduação em Letras: Cultura, Educação e Linguagens. Pesquisadora da área de Linguagem, Currículo e Estudos do Discurso. E-mail: efigueiredo@uesb.edu.br - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0001-5992-0184.

ii Mestre em Educação pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb). Pedagoga e pesquisadora do Grupo de Pesquisa Linguagem e Educação (GPLEd) da Uesb. E-mail: marlene.xavier@uesb.edu.br - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-0147-485X.


Resumo

Neste trabalho, propõe-se a interpretar, em narrativas docentes do curso de Pedagogia, no interior da disciplina Currículo e Programas, a mobilização do enunciado cotidiano como índice discursivo da formação. A análise dos enunciados amparou-se nos estudos nos/dos/com os cotidianos, apostando na confluência da Análise Dialógica do Discurso (BRAIT, 2006, 2012) com os conceitos de estratégias e táticas (CERTEAU, 1996, 2008). As narrativas foram tomadas para extração e interpretação dos enunciados que expuseram a apropriação da práxis na esfera do currículo. Os resultados corroboram a compreensão de que a noção de dialogia e os conceitos cotidianistas potencializam os conhecimentos criados nas redes dos sujeitos praticantes da escola.

Palavras-chave: Cotidiano; Currículo; Dialogia; Enunciado

Abstract

In this work, it is proposed to interpret, in teachers’ narratives of the Pedagogy course, within the discipline Curriculum and Programs, the mobilization of daily enunciation as a discursive index of training. The analysis of enunciations was supported by studies in/of/with everyday life, betting on the confluence of Dialogical Discourse Analysis (BRAIT, 2006,2012) with the concepts of strategies and tactics (CERTEAU, 1996,2008). The narratives were taken to extract and interpret the enunciations that exposed the appropriation of praxis within the curriculum domain. The results support the understanding that the notion of dialogue and everyday concepts enhance the knowledge created in the networks of the school subjects.

Keywords: Daily life; Curriculum; Dialogue; Enunciation

Resumen

En este trabajo, se propone interpretar, en narrativas docentes del curso de Pedagogía en el interior de la disciplina Currículo y Programas, la movilización del enunciado cotidiano como índice discursivo de la formación. El análisis de los enunciados se apoyó en los estudios en los/ de los/ con los cotidianos, apostando por la confluencia del Análisis Dialógico del Discurso (BRAIT, 2006,2012) con los conceptos de estrategias y tácticas (CERTEAU, 1996,2008). Las narrativas fueron tomadas para extracción e interpretación los enunciados que expusieron la apropiación de la praxis en la esfera del currículo. Los resultados corroboran la comprensión de que la noción de dialogía y los conceptos cotidianistas potencian los conocimientos creados en las redes de los sujetos practicantes de la escuela.

Palabras clave: Cotidiano; Currículo; Dialogía; Enunciado

1 INTRODUÇÃO

O cotidiano é aquilo que nos é dado cada dia (ou que nos cabe em partilha), nos pressiona dia após dia, nos oprime, pois existe uma opressão do presente

(CERTEAU, 2008, p. 31).

A epígrafe instiga-nos a mobilizar e apostar no cotidiano bem como no referencial certeauniano para interpretarmos os cenários discursivos do currículo. Certeau (2008) buscou compreender as artes de fazer dos sujeitos ordinários, quer dizer, como o homem comum lida com as situações cotidianas nos diferentes espaçostempos. A maneira como o autor aborda o cotidiano desconstrói a ideia de mera repetição e nos chama atenção para fatos negligenciados em muitas das pesquisas em educação.

As experiências entrelaçadas nos processos de vida e de formação apontam que vivemos um tempo de mudanças significativas na educação. Essas mudanças redesenham o contexto educacional e exigem-nos reposicionamentos ético, estético e político frente às propostas hegemônicas dos currículosformação. Para tanto, traçamos uma rede de discursos teóricospráticos, mergulhando na vida ordinária, a fim de realizar uma análise dos movimentos dialógicos dos currículos praticados no processo de constituição da professoralidade por meio de uma confluência teórico-metodológica entre Bakhtin e Certeau. Conforme Pereira (2013), a professoralidade refere-se ao que o professor está sendo e ao que poderá vir a ser, a partir das experiências vivenciadas, da formação, da autoformação e dos saberes e das aprendizagens docentes.

Caminhando na contracorrente dos discursos hegemônicos, assumimos os currículosformação como um processo em rede, que inclui fios de diferentes dimensões da vida. Nesse sentido, acreditamos que é necessário enveredarmos esforços para enfrentarmos as propostas educacionais que inviabilizam as diferenças em prol dos interesses do mercado de trabalho. Como uma das formas de enfrentamento, apostamos na pesquisa nos/dos/com os cotidianos.

Dispusemo-nos a expor resíduos de uma pesquisa realizada no âmbito da tessitura dos currículosformação, conforme (XAVIER, 2017), quando de nossa opção em tomar o curso de Pedagogia do Programa de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor), no Estado da Bahia, como cenário para interpretação de processos dialógicos da formação docente e, assim, desdobrarmos seus resíduos, neste texto, para pensarmos o currículo e a formação para além das produções teóricas. Para isso, guiamo-nos por novas maneiras de ver, dizer, sentir e ouvir, (des)tecendo a proposta metodológica a partir dos referenciais cotidianistas, os quais nos possibilitaram novas compreensões sobre o cotidiano e a importância de criar táticas em meio às estratégias hegemônicas. Para tanto, apostamos nas esferas circulantes do conceito de dialogia bakhtiniano e nos estudos do cotidiano escolar. Dessa forma, estamos interessadas na linguagem ordinária “[...] para cotejá-la com outros enunciados, fazendo emergirem mais vozes para uma penetração mais profunda no discurso, sem silenciar a voz que fala em benefício de um já dito que se repete constantemente” (GERALDI, 2015, p. 9).

Por isso, apostamos, como composição metodológica, o cotejo com Ferraço, Alves, Bakhtin e Certeau, empreendendo a análise dos dados por meio de uma convergência dos pressupostos teóricos do modelo polemológico (CERTEAU, 2008) e de produções que revozeiam o dialogismo nas pesquisas em educação.

2 ARTES DE FAZER UMA PESQUISA COM OS COTIDIANOS

Entrelaçando fios dialógicos, interrogamos: O que é o cotidiano? Diferentemente da ideia de cotidiano como algo repetitivo, monótono e desprovido de imaginação, como muitos ainda argumentam, Certeau (2008) defende a força de uma arte invisibilizada e criada no cotidiano por sujeitos ordinários e que extrapola o instituído. É ilusão concebermos que nos parece repetitivo, porque somos atravessados por acontecimentos inesperados que nos conduzem a novos posicionamentos diante da vida. Seus estudos nos intencionaram a tecermos novas maneiras de compreender a lógica do cotidiano, as redes de saberes e os fazeres dos sujeitos ordinários (CERTEAU, 2008), bem como a linguagem produzida no cotidiano escolar. Segundo Certeau (2018, p. 31):

O cotidiano é aquilo que nos é dado cada dia (ou que nos cabe em partilha), nos pressiona dia após dia, nos oprime, pois existe uma opressão do presente. Todo dia, pela manhã, aquilo que assumimos, ao despertar, é o peso da vida, a dificuldade de viver, ou de viver nesta ou noutra condição, com esta fadiga, com este desejo. O cotidiano é aquilo que nos prende intimamente, a partir do interior. É uma história a meio-caminho de nós mesmos, quase em retirada, às vezes velados. [...]. É um mundo que amamos profundamente, memória olfativa, memória dos lugares da infância, memória do corpo, dos gestos da infância, dos prazeres.

Questionamos os currículos que nos tornam quem somos: Sujeitos produzidos por uma realidade a priori ou que se produzem no desenrolar dos acontecimentos? Se o cotidiano é um entrelaçamento das redes de conhecimento, como podemos aceitar as concepções hegemônicas de currículosformação que desconsideram essas redes e os diferentes contextos escolares em que os currículos são praticados? Como demonstrarmos a importância dos conhecimentos criados no cotidiano? De que forma os pressupostos cotidianistas nos ajudam a pensar as pesquisas em educação? Que procedimentos adotarmos para produção e análise de dados nas pesquisas nos/dos/com os cotidianos. Zaccur (2003, p. 192) ressalta que pesquisar os cotidianos “[...] não se trata de aplicar uma teoria, mas de recorrer a ela para nos ajudar a ler as pistas”, fazendo um caminho ao caminhar, seguindo indícios e dados aparentemente negligenciáveis.

Ao tecerem e ampliarem os fios sobre a pesquisa com os cotidianos, Oliveira e Sgarbi (2008, p. 17) enfatizam que “[...] todos nascemos e nos criamosformamos cotidianistas, quando entendemos que o cotidiano pode ser conceituado como a maneira habitual de vivermos, em múltiplos e variados espaços estruturais [...] em que nos tornamos o que somos dia após o outro”. A esse conceito “universal” somam-se, é claro, os produtores construtores tecedores de conhecimento no cotidiano da humanidade. Portanto, somos tecelãs, mas não só isso: o cotidiano tece-nos, somos tecidos por ele, além de tecê-lo.

Retomando o diálogo com Zaccur (2003, p. 178), destacamos que o “[...] cotidiano, em sentido próprio, significa ‘cada dia’, aberto a encontros e desencontros, ao previsível e ao imprevisível, ao repetível e ao irrepetível. Em sentido figurado, no entanto, cotidiano significa o que é comum, habitual, familiar”. Assim, rompemos com a lógica cartesiana de pesquisar à luz de uma teoria. Como Alves (2001), inspiramo-nos a tecer novos conhecimentos e, “viramos de ponta cabeça” a relação da lógica cartesiana de pesquisar.

Conforme Alves e Oliveira (2002), os primeiros estudos sobre o cotidiano escolar foram desenvolvidos nos Estados Unidos na segunda metade do século XX, trazendo valiosas contribuições para pensarmos a escola como um mundo indissociável dos demais contextos da vida. A partir da década de 1980, os estudos com os cotidianos ganharam notoriedade no campo do currículo, principalmente a partir dos trabalhos das professoras Nilda Alves e Regina Leite Garcia, as quais têm como principal interlocutor o francês Michel de Certeau, além de outros autores referendados, como Michel Foucault, Gilles Deleuze, Félix Guattari e o sociólogo português Boaventura de Souza Santos (LOPES; MACEDO, 2011). A vida cotidiana é criativa e reinventa-se permanentemente, sobressaindo uma concepção distinta do senso comum, que vê o cotidiano apenas como repetição e reprodução do instituído. Ao descrever as artes de fazer dos praticantes, Certeau (2008) defende as práticas e os usos como subversores das estratégias das instituições tecnocratas e culturais.

Para os teóricos cotidianistas, a exemplo de Ferraço (2008), faz-se necessário rompermos com amarras que sustentam uma fragmentação do conhecimento:

A dicotomização sujeito/objeto; a busca pela objetividade e neutralidade do conhecimento; a ênfase nas quantificações dos processos com vistas a uma dimensão de cientificidade e a análise da realidade pautada em princípios de hierarquia, linearidade, causalidade (FERRAÇO, 2008, p. 26).

Assumimos que o objeto de pesquisa não preexiste, isto é, não está esperando para ser descoberto, mas é produzido com o outro, sujeitos que pesquisam (nós) e os sujeitos pesquisados (professores). Nessa perspectiva, os escritos de Certeau configuram-se como um importante referencial para compreendermos as lógicas do cotidiano, instigando-nos a ouvir o outro e como o outro se constitui por meio da linguagem, concebendo-o como produtor ativo de conhecimento.

Alves (2001) induz-nos a “decifrar o pergaminho” por meio de cinco movimentos e a adotarmos uma postura epistemológica nas pesquisas com os cotidianos: sentimento de mundo: tomarmos as teorias como limites e não como apoio na tessitura do conhecimento; virarmos de ponta cabeça; apreendermos novas maneiras de captar e registrar os acontecimentos; bebermos em todas as fontes: reconhecermos a importância da cultura narrativa e o uso de múltiplas linguagens para a criação de conhecimentos; narrarmos a vida e literaturizarmos a ciência; e, por fim, o Ecce femina, que nos convoca a assumirmos uma atitude exotópica, a percebermos os atos dos praticantes para sentirmos o que eles sentem no cotidiano da escola. Ao dialogizar com Alves (2001), Oliveira (2007, p. 111) afirma que

[é] um referencial epistemológico novo, que é também um novo referencial político, na medida em que essa concepção de conhecimento e de formação, ao recuperar a indissocialidade entre saberes considerados no pensamento ocidental não apenas diferentes, mas sobretudo, desiguais, permite questionar a base de legitimação da dominação contemporânea: a superioridade do saber científico sobre as demais formas de conhecimento [...]. [...] a noção de conhecimentos em redes e do próprio enredamento entre as diferentes formas de inserção social dos sujeitos sociais pressupõe a existência de um diálogo permanente entre diferentes sujeitos e instâncias sociais na criação de conhecimento. Ou seja, os conhecimentos são produzidos coletivamente.

Os cinco movimentos apontados por Alves (2001) recompõem-nos, enquanto sujeitos formados sob a “égide” de um paradigma simplificador, e abrem-nos ao acaso, ao dito e ao interdito, contrapondo-nos a ideia de verdade única que nos paralisam em meio à multiplicidade. Para Garcia (2003, p. 11), “[...] a ciência não é a verdade - como por um tempo acreditávamos -, mas apenas a busca permanente da verdade”. Isso nos leva a compreender a pesquisa não como a busca de uma verdade única e cristalizada, mas de múltiplas e provisórias verdades. Defendemos que os currículosformação não se restringem a espaçostempos limitados e precisos. Levamos em conta, ainda, o tempo da experiência, das interações sociais, valorizando o modo como os sujeitos agem, reagem e interagem nos processos formativos.

Os cotidianos praticados, no desenrolar dos acontecimentos, expõem resíduos conceituais da práxis em meio às redes de conhecimento, compreendendo que “[...] a pesquisa no cotidiano não pretende apenas construir explicações para os fenômenos encontrados, mas procura aprofundar a compreensão sobre a realidade numa perspectiva dialógica vinculada a processos de intervenção” (ESTEBAN, 2003, p. 199-200).

Ao narrarmos histórias, enfrentamos a ordem discursiva que engendra a ideia de superioridade dos conhecimentos teóricos sobre os práticos. Entretanto, como produzir os dados, analisá-los e apresentá-los frente à complexidade das relações dos sujeitos cotidianos, dos discursos entrelaçados com o outro e ir de encontro ao projeto moderno de ciência que prega o tudo conhecer e o tudo desvendar? A importância das redes de subjetividades que constituem o que somos e o quanto elas dizem sobre nós e sobre o outro compõem os acontecimentos em meio ao mundo vivido. Conforme Geraldi (2015), apesar da determinação do método empregado, precisamos reconhecer que, para fazermos descobertas surpreendentes nas Ciências Humanas, é preciso desobedecermos aos métodos cristalizados, porque outros são os objetos sobre os quais se debruça o pesquisador.

Souza (2016) expõe que a invenção de objetos e a criação teórica encontram, na confluência entre concepção de linguagem sociointeracionista e trabalho como processo e produção de cultura, uma ancoragem para perspectivar estudos com currículo e linguagem:

“[...] a interrelação entre currículo e linguagem, a partir dos paradigmas pós-estruturalistas, ganhou destaque nas políticas curriculares. De imediato, exige-se precisar qual concepção de linguagem se impõe e se expõe, quando se busca discursivizar acerca dessas” (SOUZA, 2016, p. 148).

Nesse processo, buscamos, nos enunciados teóricospráticos, pistas para interpretarmos a formação, destacando pontos de concordância e de contraposições discursivas, em narrativas docentes. Ao cotejarmos os textos com outros textos, fomos reatualizando e inventando novos conhecimentos na interação com o outro.

3 MODELO POLEMOLÓGICO DE CERTEAU EM CONFLUÊNCIA COM O DIALOGISMO BAKHTINIANO

Em A invenção do cotidiano: artes de fazer, Michel de Certeau buscou subverter a ordem dominante que impõe como a sociedade deve agir, pensar e, principalmente, consumir. Conforme o autor, além dessa ordem existe outra inventada todos os dias pelos sujeitos ordinários. Certeau (2008), assim, denominou a ordem dominante de estratégias e a outra (dos sujeitos ordinários) de táticas, abordagem central em seu modelo polemológico.

Focando-se nos conhecimentos práticos tecidos no cotidiano, os teóricos do discurso pós-estruturalista defendem que “tudo é prática”, inclusive o discurso, enfatizando a importância de ouvirmos o outro, que se constitui, sobretudo, pela linguagem ordinária e/ou pela linguagem em uso. Por isso, apostamos na escuta das vozes que tecem as teorias das práticas (CERTEAU, 1996) e se entrelaçam no cotidiano, trazendo-as para pensarmos os currículos praticados na constituição da professoralidade.

Para tanto, apostamos em uma confluência dos estudos de Certeau com proposições teóricas de Bakhtin (2003), especificamente em seu conceito de dialogismo, quando realça que o outro é a composição de tantos outros e pressupõe que a linguagem carrega seus sentidos produzidos na interação verbal, ou seja, nas situações concretas de exercício da linguagem. O pensamento bakhtiniano permite-nos pensar a linguagem não apenas no que ela tem de sistêmico, mas de observá-la em uso, na combinatória dessas duas dimensões, como uma forma de conhecermos o ser humano, suas atividades, sua condição de sujeito múltiplo, sua inserção no social, no cultural pela linguagem.

Sobral (2009) sublinha que, para Bakhtin, a vida, o mundo concreto, é a vida de sujeitos concretos, é a vida prática; que não podemos perder de vista os atos concretos realizados por sujeitos em situações que as teorias não podem abarcar, aproximando-se do movimento de virar de ponta cabeça (ALVES, 2001) nas pesquisas com os cotidianos, quer dizer, compreendendo as teorias como limite e não como apoio na tessitura do conhecimento. Nesse sentido, os sujeitos constituem-se na relação com o outro, em um processo dialógico, tornando o discurso do outro uma rede trançada com tantos outros discursos.

Nessa tessitura de fios, apostamos em uma confluência entre as extrações de Certeau e a Análise Dialógica do Discurso (ADD), inserida em Bakhtin (2010), conforme exposto em Brait (2006, 2012). Essa aposta teórica destaca os movimentos dialógicos dos currículos praticados no processo de constituição da professoralidade. Não há palavra que não se dirija a alguém, nem discurso que não inclua, em sua estrutura, a presença do outro, seja no modo como dizemos algo, na entonação dada ao dito ou nas palavras escolhidas em função dos interlocutores. Nessa perspectiva, a natureza dos enunciados dos currículosformação é dialógica, porque o sujeito que diz chama o dizer do outro, em processos de alteridade, nas situações cotidianas do exercício/da constituição da professoralidade.

Desse modo, a ADD pode “[...] contribuir para o reconhecimento do constitutivo papel da linguagem nas atividades humanas e, portanto, nas diferentes ciências que têm o sujeito e sua alteridade como objeto de estudos” (BRAIT, 2006, p. 16). Ainda, conforme a autora, Bakhtin representa, hoje, uma das maiores contribuições para os estudos da linguagem. A ADD aborda o estudo dos aspectos da vida do discurso que ultrapassam os limites da linguística e, por isso, “[...] diz respeito a uma concepção de linguagem, de construção e produção de sentidos necessariamente apoiadas nas relações discursivas empreendidas por sujeitos historicamente situados” (BRAIT, 2012, p. 10). Para a autora:

Ninguém, em sã consciência, poderia dizer que Bakhtin tenha proposto formalmente uma teoria e/ou análise do discurso [...]. Entretanto, também não se pode negar que o pensamento bakhtiniano representa, hoje, uma das maiores contribuições para os estudos da linguagem, observada tanto em suas manifestações artísticas como na diversidade de sua riqueza cotidiana. Por essa razão, mesmo consciente de que Bakhtin, Volochinov, Medvedev e outros participantes do que atualmente se denomina Círculo de Bakhtin jamais tenham postulado um conjunto de preceitos sistematicamente organizados para funcionar como perspectiva teórico-analítica fechada ainda que o conjunto das obras do Círculo motivou o nascimento de uma análise/teoria dialógica do discurso (BRAIT, 2006, p. 9-10).

Ao direcionarmo-nos para uma confluência da ADD com o modelo polemológico de Certeau, intentamos abdicar de concepções de pesquisa instituídas pelo poder hegemônico e apostar na transdisciplinar e na tessitura do conhecimento, usando um modo não autorizado pelas regras do jogo acadêmico para cotejarmos discursos com os professores do Parfor. No entanto, conforme Geraldi (2015, p. 11), o abandono dos métodos consagrados pela academia “[...] não significa abandonar o rigor, significa abrir-se para a multiplicidade dos sentidos possíveis diante da complexidade das coisas, das gentes e de suas relações”. Para isso, talvez tenhamos de suspeitar de algumas das promessas da ciência moderna, não para riscá-la do mapa, mas para nos arriscarmos por outros percursos de produção de conhecimento.

Para tanto, abrimo-nos ao diálogo com o outro, captando as confluências dos discursos teóricospráticos para compreendermos o outro e nos fazermos compreendidos por meio do conceito de dialogismo em Bakhtin. Para o autor, a noção de dialogismo não incorpora a ideia de causa e consequência; não é linear, mas é rede, na medida em que o define como o discurso produzido a partir do entrelaçamento de outros discursos.

Virando de ponta cabeça (ALVES, 2001), afastamo-nos de propostas metodológicas fechadas na aplicabilidade e na validação de teorias e assumimos outro rigor metodológico, buscando traçar novos fios com Certeau e Bakhtin para problematizarmos a nossa questão, posicionando-nos como um outro ativo no diálogo com os dados (discursos).

Amorim (2001) propõe que o pesquisador seja hóspede e anfitrião no processo de investigação, sendo, no primeiro momento, aquele que é recebido e acolhido pelo outro, ao mesmo tempo em que se abre para a escuta do outro, mantendo o distanciamento necessário para compreensão do objeto.

O conceito de dialogismo em Bakhtin aproxima-se do que Certeau chama de conversas ordinárias, que são “[...] práticas transformadoras de situações de palavra, de produções verbais, em que o entrelaçamento das posições locutoras instaura um tecido oral sem proprietários individuais, as comunicações de uma comunicação que não pertence a ninguém” (CERTEAU, 2008, p. 50). Nesse sentido, Ferraço (2011) assinala que a busca de Certeau por estabelecer uma proximidade com o outro na pesquisa não resulta em uma abordagem centrada no indivíduo, mas vai ao encontro do que se passa entre as pessoas.

Amorim (2001) esclarece que, para Bakhtin, dialogismo não é diálogo. “O diálogo coloca em cena dois centros discursivos [...], não é a presença física de dois locutores e de dois enunciados que constitui o princípio dialógico, mas sim a presença de duas ou mais vozes no interior de um mesmo enunciado de um mesmo locutor” (AMORIM, 2001, p. 139-140). Ainda conforme Amorim (2001), para que não haja interpretações equivocadas com relação ao conceito de dialogismo em Bakhtin, é preferível usarmos o termo “polifônico”. Dessa forma, para Bakhtin e Volochínov (2010), dialogismo e polifonia configuram-se enquanto conceitos fundamentais quando compreendemos o discurso não sob o aspecto da fala individual, mas como um entrelaçamento de discursos que, veiculados socialmente, se realizam nas e pelas interações entre sujeitos.

Ao focar seu interesse nas práticas cotidianas, Certeau (2008) situa seu campo de discussão distinguindo os conceitos de lugar e de espaço. Lugar, para ele, “[...] é a ordem (seja ela qual for) segundo a qual se distribuem elementos nas relações de coexistência” (CERTEAU, 2008, p. 201). Já o espaço é “[...] um lugar praticado” (CERTEAU, 2008, p. 202). Nesse sentido, o uso que os sujeitos fazem dos currículos no processo de se constituírem professores se torna o espaço praticado. O autor busca representar os modos de resistência adotados em uma guerra, apontando as estratégias como a arte dos fortes e as táticas como a arte dos fracos. Certeau faz uma distinção entre estratégias e táticas, definindo-as diferentemente da maneira habitual da qual estamos acostumados a empregá-las. A estratégia é “[...] o cálculo (ou a manipulação) das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder (uma empresa, um exército, uma cidade, uma instituição científica) pode ser isolado” (CERTEAU, 2008, p. 99). São ações planejadas e impostas assim como pressupõem um lugar apto de ser limitado como algo próprio (“próprio” é uma vitória do lugar sobre o tempo) e de ser a base de onde se pode administrar as relações com uma exterioridade de alvos ou de ameaças. Enquanto isso, as táticas são as astúcias dos fracos, dos sujeitos insubmissos às ordens impostas;

[...] é movimento “dentro do campo de visão do inimigo”, como dizia von Bullow, e no espaço por ele controlado. Ela não tem, portanto, a possibilidade de dar a si mesma um projeto global nem de totalizar o adversário num espaço distinto, visível e objetivável. Ela opera golpe por golpe, lance por lance. Aproveita as “ocasiões” e delas depende, sem base para estocar benefícios, aumentar a propriedade e prever saídas. O que ela ganha não se conserva. Este não lugar lhe permite sem dúvida mobilidade, mas nunca docilidade aos azares do tempo, para captar no voo vigilante, as falhas que as conjunturas particulares vão abrindo na vigilância do poder proprietário. Aí vai caçar. Cria ali surpresas. Consegue estar onde ninguém espera. É astúcia (CERTEAU, 2008, p. 100).

Certeau explicita que, aos modos de uma guerra, os sujeitos cotidianos convivem diariamente com estratégias impostas pelos fortes, aproveitando as brechas deixadas pelo outro para transgredirem o instituído por meio das táticas, ações que conseguem em momentos oportunos e favoráveis e que não têm como forma o discurso, mas a própria decisão. As táticas são, portanto, saberes sem discursos, sem escrituras e que se administram e se controlam de acordo com a ocasião. Assim sendo, cabe pensarmos nas estratégias e nas táticas entrelaçando os discursos em meio aos movimentos mencionados por Alves (2008), decifrando histórias que se inscrevem sobre outras (CERTEAU, 2008).

Por isso, no contexto de nossa formação, dispomo-nos a ouvir o outro, as múltiplas vozes que habitam os discursos, focando nas práticas tecidas e compartilhadas pelos sujeitos para tentarmos superar uma abordagem centrada no indivíduo. Partindo desses pressupostos, não nos coube fazermos uma mera descrição dos acontecimentos, mas produzirmos o objeto com os tantos outros presentes ou silenciados nos discursos cotidianos dos currículos praticados, procurando compreender os elementos constitutivos não apenas dos discursos, mas também do ser e do agir humano. Segundo Amorim (2001, p. 283):

O dialogismo do texto se produz porque as vozes do diálogo ordinário, aquela da co-presença e da interação, param de falar. A força do conceito de dialogismo reside exatamente no ponto em que distingue Bakhtin de uma abordagem interacionista. A intensidade dialógica se dá como tensão interior a um mesmo enunciado e para ouvi-la ou fazê-la falar, é preciso fazer calar toda falação, todo diálogo exterior.

Em Certeau encontramos, também, a preocupação com a alteridade, com a palavra do outro - o patois durante a Revolução Francesa, o possuído, o estrangeiro, o místico - e com as formas utilizadas pelos sujeitos para se apropriarem dos códigos e dos lugares que lhes são impostos para subverterem as regras, a fim de comporem novas formas - as invenções do cotidiano. Essa aproximação dos autores da linguagem em uso (BAKHTIN, 2003) ou das conversas ordinárias (CERTEAU, 2008) motivou-nos, mais uma vez, a apropriarmo-nos dos discursos dos sujeitos cotidianos sobre os currículos praticados no processo de constituição da professoralidade, cientes de que teceríamos redes que nos constituem tal como sujeitos inacabados, os quais pulsam mais forte do que qualquer análise que façamos deles (FERRAÇO, 2003).

Bakhtin (2003) contribui para refletirmos sobre o discurso ao conceber a linguagem como constituidora do sujeito e/ou como uma corrente contínua que se estabelece em um fluxo permanente de diálogos que relacionam o que está sendo dito ao que veio antes e ao que lhe sucederá. Conforme o autor, “[...] o enunciado sempre cria algo que, antes dele, não existia, algo novo e irreprodutível, algo que está relacionado com um valor [...]. Entretanto, qualquer coisa criada se cria sempre a partir de uma coisa dada [...]. O dado se transfigura no criado” (BAKHTIN, 2003, p. 348).

Esse espaço de manobra previsto por Bakhtin (2003) na criação do novo a partir do já dado pode significar a brecha por onde o sujeito ordinário de Certeau (2008) reintroduz a possibilidade de ruptura ou de subversão da ordem. Dessa maneira, podemos supor que, para Bakhtin e Certeau, o discurso se movimenta no mundo concreto das ações rotineiras diante da possibilidade de novas combinações de enunciados, não necessariamente falas inaugurais, mas um reordenamento daquilo que está posto. Assim como Bakhtin, Certeau propõe que o sentido está necessariamente vinculado ao cotidiano da linguagem e não apenas à sua produção institucional.

4 BEBENDO EM OUTRAS FONTES: SOBRE O USO DOS ENCONTROSCONVERSAS E DAS NARRATIVASIMAGENS

No cotidiano, há inventividade para além das ações rotineiras. Na vida de todo dia, não há como fazermos tudo sempre igual; precisamos produzir novos conhecimentos, modificando a maneira habitual de realizarmos pesquisas, especificamente no campo da educação. Aos poucos, fomos concretizando nosso desejo, mergulhando nas múltiplas e complexas relações do cotidiano, o que exigiu o uso de fontes diferenciadas para a pesquisa. Para Alves (2001, p. 27), isso significa

[...] a ampliação e a complexificação do que vamos considerar como fonte de conhecimento. Para além daquilo que pode ser grupado e contado (no sentido de numerado), como antes aprendemos, vai interessar aquilo que é “contado” (pela voz que diz) pela memória: o caso acontecido que parece único (e que por isto o é) a quem o “conta”; o documento (caderno de planejamento, caderno de aluno, prova ou exercício dado ou feito etc.) raro porque guardado quando tantos iguais foram jogados fora porque “não eram importantes” e sobre o qual se “conta” uma história diferente, dependendo do trecho que se considera; a fotografia que emociona, a cada vez que é olhada, e sobre a qual se “contam” tantas histórias, dos que nela aparecem ou estão ausentes e da situação que mostra ou daquela que “faz lembrar”.

Inspirados pelo movimento de beber em todas as fontes (ALVES, 2001) para lidarmos com a diversidade cotidiana, ouvimos os sujeitos atribuindo uma importância considerável às multivozes presentes, garantindo a legitimidade desses discursos. “Não por uma questão de ‘boa vontade’ ou ‘gratidão’, mas por uma condição de as pesquisas ‘com’ os cotidianos não se tornarem estéreis, tediosas, soníferas ou, no máximo, como as propriedades da água: insípida, incolor e inodora” (FERRAÇO, 2003, p. 168), ampliando e complexificando o que consideramos como fonte de conhecimento ( ALVES, 2001).

Para tanto, fazemos uso dos encontrosconversas e das narrativasimagens para trazermos à tona as artes de fazer (CERTEAU, 2008), que se tecem na relação com o outro e a relevância desses procedimentos como “[...] potência de expressão da complexidade das redes tecidas pelos sujeitos praticantes do currículo” (FERRAÇO, 2008, p. 31). Chamamos de encontrosconversas os registros dos professores realizados nos encontros da disciplina para identificarmos aspectos das redes de significados ali compartilhadas. Segundo Certeau (2008, p. 50):

A arte de conversar, as retóricas da conversa ordinária, são práticas ordinárias de “situações de palavra”, de produções verbais onde o entrelaçamento das posições locutoras instaura um tecido oral sem proprietários individuais, as criações de uma comunicação que não pertence a ninguém.

Ferraço (2003) alerta para a necessidade de legitimarmos os discursos, pela relevância que possuem na tessitura do conhecimento.

Os textos e discursos elaborados e compartilhados pelos sujeitos cotidianos da pesquisa precisam ser pensados não como citações e/ou exemplos dos discursos dos autores/autoras que estudamos nas academias, mas como discursos tão necessários, legítimos e importantes quanto estes [...]. Não se trata de usar fragmentos, trechos das falas desses sujeitos como ilustrações dos nossos discursos, assim como fazemos com os discursos dos teóricos legitimados pela academia. Trata-se de entender que também, aqueles que vivem, de fato esses cotidianos são os legítimos autores/autoras dos discursos “com” os cotidianos (FERRAÇO, 2003, p. 168).

Com relação às narrativas, Alves (2000, p. 3) assinala que:

Após tantas pesquisas desenvolvidas no cotidiano e após tantas e tantas histórias narradas (ouvidas e contadas) foi possível começar a entender que, talvez, narrar seja o modo mesmo como, por um lado, se expressam os sujeitos sobre seu cotidiano sempre que desejam transmiti-lo e, por outro lado, pode ser, também, um dos métodos mais importantes para se organizar a história do cotidiano, melhor expressando-a e possibilitando seu melhor entendimento.

O uso das narrativas nas pesquisas em educação vem se mostrando um recurso potencializador para que os professores comuniquem os seus saberes e suas experiências. Para nós, em companhia de Larrosa (2004), acreditamos que o que acontece como experiência só pode ser interpretado narrativamente. O autor afirma:

É na história de nossas vidas que os acontecimentos ganham uma ordem e um sentido. É uma trama como articulamos os acontecimentos de nossa vida em uma sequência significativa. E é também em uma trama que construímos nossa própria continuidade, ou descontinuidade, ao longo dos acontecimentos de nossa vida. [...]. Não é que a minha conduta se deriva de quem sou, mas sim que os atributos que me caracterizam se derivam de quem sou, de minha forma de viver o que se passa. Por isso, a pergunta de quem somos só pode ser respondida contando alguma história [...]. Por outro lado, só compreendemos quem é a outra pessoa se compreendemos as narrativas que ela mesma faz de si ou os outros fazem dela (LARROSA, 2004, p. 17-18).

Logo, é preciso “[...] que eu incorpore a ideia que, ao narrar uma história, eu a faço e sou um narrador praticante ao traçar/trançar as redes dos múltiplos relatos que chegaram/chegam até a mim, neles inserindo, sempre, o fio do meu modo de contar” (ALVES, 2001, p. 32). Por isso, mobilizamos a produção de narrativas como uma possibilidade e como “[...] alternativa mais potente para o entendimento dos processos de invenção/resistência que são vividos na complexidade das redes tecidas pelos praticantes dos cotidianos” (FERRAÇO; ALVES, 2015, p. 312). De acordo com Alves (2005, p. 8):

Nessas pesquisas, ouvir uma narrativa ou olhar uma imagem (como escutar um som) traz, a cada um que ouve, dentro das redes de conhecimentos e significados a que pertencem, a possibilidade de “ver”, “sentir”, “entender”, e “ouvir” coisas muito diferentes. A questão é saber se isto significa, apenas, as dificuldades de uso desses recursos ou indica a ampliação de possibilidades na análise de uma dada situação, exigindo que incorporemos, necessariamente, a complexidade e potencialidade que cada acontecimento traz em si. Os que trabalham com as pesquisas nos/dos/com os cotidianos tendem a adotar essa segunda posição.

Em conformidade com os pressupostos teóricos defendidos por Ferraço e Alves (2015), mobilizamos o uso de imagens produzidas no percurso da pesquisa, a fim de movimentarmos a potencialidade dos enredamentos, dos fluxos das redes, inscrevendo sentidos nos acontecimentos vividos nos espaçostempos praticados. Experienciamos momentos significativos no curso de Pedagogia, na disciplina Currículo e Programas2, com um grupo de professores cursando a primeira Licenciatura. Como dever ético e político, focamos a proposta da pesquisa no tempo dos acontecimentos e do tornar-se professor. Importava não apenas trabalharmos conceitos sobre o currículo escolar, mas também nos abrirmos à arte de ensinarpesquisar com o outro. Pesquisar o cotidiano, no cotidiano e com o cotidiano é uma mudança de paradigma que não abandona o objeto de estudo, mas o humaniza, o que faz toda a diferença. Pesquisamos com o outro e não sobre o outro, somos todos sujeitos em processo. Com o outro, vivenciamos momentos de troca e defendemos que, dentre tantos acontecimentos tecidos nas redes cotidianas, os eventos curriculares se configuram por “[...] não serem produzidos apenas na escola nem ficarem a ela restritos” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 161).

Procurando entender o que se passa no cotidiano, mergulhamos nos movimentos dialógicos dos currículos praticados e nos posicionamos como sujeitos de dentro para problematizarmos não apenas por meio de teorias a priori, mas a partir de uma produção cotidiana no entremear das redes, quer dizer, por meio de uma perspectiva exotópica em que pesquisador e pesquisados usam o excedente de visão para captar da realidade o que outro não capta.

5 SOBRE OS CURRÍCULOS PRATICADOS NO COTIDIANO ESCOLAR

Diferentes estudos apontam a importância que os currículos praticados na Educação Básica exercem sobre a formação dos futuros professores. Para Alves (2010), os praticantes docentes, antes mesmo de terem o direito legal de serem professores, aprendem o ofício nas inúmeras aulas assistidas e compartilhadas durante toda a trajetória que os levou a escolher a profissão, em múltiplos contextos cotidianos. O Parfor de Pedagogia, (con)texto deste trabalho, foi possível mediante a parceria entre um munícipio baiano e a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), oferecendo a primeira Licenciatura para professores com formação em nível médio e que atuam na rede pública de ensino. Trata-se de um curso de Licenciatura na modalidade “fora de sede”.

No contexto da disciplina Currículo e Programas, com 75 horas, oferecida no 3º semestre do curso, sete professores com formação em Magistério, efetivos na rede pública municipal de ensino e atuantes na primeira etapa do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano), colaboraram com o pesquisa-formação. A disciplina compunha aspectos da abordagem de currículo intervindo com intencionalidade no processo de formação de professores, subsidiando-os com fundamentação teórica para uma ação reflexiva nos diferentes contextos formativos. Por meio de narrativas, os docentes expuseram histórias de vida e da docência ao rememorarem os processos formativos. No enredamento das vozes, compomos uma rede de fios teóricosmetodológicospráticos, concebendo as teorias como limite para as novas tessituras do conhecimento. Resulta em uma metodologia que antecede, que pensa antes o que poderá acontecer. Por isso, fomos dialogando com os professores, destacando pontos dos discursos para pensarmos os currículosformação em rede.

As lembranças transbordaram-se no ato de narrar. A narrativa de Renato3 apoderou-se de uma metáfora para poetizar sobre os seus tempos de escola, narrando a vida de um garoto, nascido em 1968, que chega à escola somente no final da década de 1970. Seu discurso sobre a escola revelou o aprisionamento de um sujeito que enfrentou grandes desafios para ter acesso à escola, mas que soube criar táticas de subversão a estratégias dominantes. Além disso, apontou movimentos de ação de um sujeito que percebia na escola um espaço de libertação por meio do conhecimento.

Como um passarinho que se liberta da gaiola, somente aos onze anos, sento-me pela primeira vez no banco de uma escola. Acolhido por um professor que também era agricultor, homem simples e sem formatura, de caráter meigo, porém um professor leigo. Que sofrimento e tortura alguém de pouca formação, eu pensava em desistir, quando um professor me pedia uma redação, coisa que eu jamais teria feito, até pensei que aquilo em mim fosse defeito, de meus deveres não realizar, pois a maior preocupação era de naquele ano não passar (Renato, professor aluno do Parfor).

Percebemos uma intrínseca relação de currículosformação que marcaram as ações cotidianas da escola e se entrelaçaram no processo de constituição da professoralidade. Os discursos revelaram a presença de um outro e suas contribuições nos processos formativos, refratando que nos tornamos professores na composição com tantos outros. Percebemos, nos discursos, traços sutis de resistência à hegemonia do conhecimento. As táticas (CERTEAU, 2008) foram criadas no processo de constituição da professoralidade, algo que é tecido na prática, no diálogo com o outro, sendo constituídos e constituintes na/e pela linguagem, conforme expressou Edvane:

Nos meus primeiros anos de estudo, já despertou em mim o gosto de um dia ser professor. Estudei em uma turma multisseriada, com colegas de diferentes idades - série, passei muita dificuldade no início de minha carreira estudantil, precisava estudar e ainda ajudar meu pai na roça (Edvane, professor aluno do Parfor).

Quando relembraram as experiências da Educação Básica, viram a escola como espaçotempo em que o sujeito pode se tornar alguém na vida. O discurso hegemônico, ao tempo que exclui grande parcela da população do acesso à escola, também desconsidera os conhecimentos tecidos fora da escola, tomando estes como verdade única.

Comecei minha vida escolar aos seis anos de idade numa turma multisseriada. Fui alfabetizada pela professora Evanilde Rosa Carneiro, que não tinha formação, era uma professora leiga, mas que realizava um bom trabalho na medida do possível, pois a sala de aula era a sala de sua casa (Elizete, professora aluna do Parfor).

Em minha infância, lembro-me que estudar era importante para aprender a ler, escrever e o mais importante para meus pais, “me tornar alguém na vida”, já que minha mãe era analfabeta e meu pai frequentou muito pouco a escola. Éramos oito filhos, mas somente eu concluí o segundo grau (Valdecarmem, professora aluna do Parfor).

Com isso, percebemos que os currículos praticados, o que de fato vai constituindo a nossa professoralidade, subverte o instituído, as estratégias institucionais, nos movimentos dialógicos dos currículos, nos discursos tecidos no cotidiano. Para Bakhtin e Volochínov (2010), a palavra não é abstrata, nem uma criação ou um exercício solitário de um indivíduo singular, ou ainda um ego surgido do desenvolvimento natural de suas potencialidades latentes, mas produto da interação verbal social que permite certas enunciações no contexto de suas possibilidades, diante dos interlocutores que se apresentam ou são convocados para o/no diálogo.

Nos discursos dos professoresalunos do Parfor, a ideia da professoralidade apareceu atrelada à compreensão de experiência, apesar de que, em muitos momentos, vincularam a experiência à prática, uma ideia que se contrapõe ao pensamento de Larrosa (2016). O autor defende que “[...] a experiência é o que me acontece [...], me constitui, me faz como sou, marca minha maneira de ser, configura minha pessoa e minha personalidade” (LARROSA, 2016, p. 48).

6 FIOS (IN)CONCLUSIVOS

Conscientes do nosso inacabamento como seres humanos e adotando uma posição discursiva, ética e política, que se filia ao dialogismo na pesquisa em currículo, buscamos valorizar os saberes práticos e o protagonismo, a autoria docente com nossos pares da escola. Aportados em referenciais bakhtinianos, adotamos a ideia de que nos constituímos por meio da linguagem entrelaçada com o outro nos movimentos dialógicos dos currículos praticados, defendendo o dialogismo como os discursos presentes no interior do discurso, na linguagem em uso (BAKHTIN, 2010), ou na linguagem ordinária (CERTEAU, 2008).

Para expressarmos o potencial das redes tecidas nos diferentes contextos da formação docente e sentirmos o cotidiano que pulsa, as narrativas, mais do que um dispositivo de pesquisa, foram tomadas como uma tática de enunciado, sobretudo como uma forma de percorrermos diferentes caminhos na tessitura do conhecimento.

Pesquisando com o outro, provocamos os aportes contemporâneos de pesquisa, compreendendo o objeto como sujeito para percebermos a realidade com outros textos, melhor dizendo, com as narrativas docentes que intercambiaram discursos passados, presentes e futuros. Para nós, a linguagem é algo vivo, movimentando-se e adquirindo sentidos na interação com o outro, permitindo-nos analisarmos o objeto no contexto sócio-histórico e político em que se insere.

Dessa forma, mobilizamos teorias disponíveis como limite, e não como apoio para validarmos uma suposta verdade; interpretarmos o mundo vivido por sujeitos ordinários, evidenciando compreensões abertas e mutáveis de verdade. Com isso, garantimos a relevância da nossa proposta metodológica e assumimos nossos limites, amarras e impossibilidades de propagarmos uma única verdade não como problemas, mas como uma condição necessária aos estudos com os cotidianos.

Com isso, apostamos nos usos que serão feitos das discussões sobre as pesquisas com os cotidianos, especialmente por considerarmos as redes de saberesefazeres em que estamos inseridos, bem como apontar táticas de emancipação e de libertação que poderão ser (re)inventadas por docentes dos mais diferentes níveis e modalidades de ensino.

Tal qual uma rede inacabada, sinalizamos que muitas coisas não foram ditas e outras ainda estão por dizer. Como os fluxos da vida - que, em certos momentos, nos exigem uma tomada de posição -, pretendemos que este trabalho contribua para pensarmos as pesquisas em educação e que possamos compor novos conhecimentos com as tantas vozes que nos tornam os sujeitos que somos.

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NOTAS

1 Este texto é decorrente de pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), no âmbito das discussões do Grupo de Pesquisa Linguagem e Educação (GPLEd).

2 Disciplina ministrada no âmbito do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor), da Uesb, quando se acordou com os professores em formação continuada a condição de partícipes da pesquisa. Nesse sentido, no curso de Pedagogia, na disciplina Currículo e Programas, dispomo-nos a vivenciar os percursos de formação para a pesquisa, ao compartilharmos conhecimentos no espaçotempo da sala de aula. Para isso, guiamo-nos por uma proposta metodológica sustentada no enquadre dos estudos do cotidiano e a importância de construirmos propostas contra hegemônicas de formação docente, criando táticas em meio às estratégias que revelam a dimensão autorreflexiva do próprio percurso formativo.

3 Optamos por nomear os partícipes do estudo com nomes fictícios.

Recebido: 30 de Agosto de 2020; Aceito: 12 de Abril de 2021

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