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Revista e-Curriculum

On-line version ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.20 no.1 São Paulo Jan./Mar 2022  Epub May 06, 2022

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2022v20i1p40-69 

Dossiê Temático CURRÍCULO, DIVERSIDADE E DIFERENÇAS CULTURAIS

Educação e diversidade nas percepções de professores e gestores escolares

Education and diversity in the perceptions of teachers and school managers

Educación y diversidad en las percepciones de profesores y directores de escuela

Crislane Barbosa AZEVEDOi 
http://orcid.org/0000-0003-3456-0025

Bernard CHARLOTii 
http://orcid.org/0000-0001-8725-4238

i Pós-doutora em Educação e Professora Associada da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: crislaneazevedo@yahoo.com.br - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-3456-0025.

ii Doutor em Educação, Professor Titular Emérito da Universidade Paris 8 e Professor voluntário da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: bernard.charlot@terra.com.br - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0001-8725-4238.


Resumo

Buscou-se analisar percepções de professores de História e de gestores de escolas públicas sobre a relação entre educação e diversidade, bem como sobre escola inclusiva. Em perspectiva qualitativa, pautou-se em pesquisa bibliográfica e realização de entrevistas analisadas à luz de Bardin (2009). Teoricamente, fundamentou-se em Chartier (1990) e em Charlot (1979, 2013, 2020). Para além da esfera cultural, diversidade não se confunde com diferenças, assim, considera origens, permanências e implicações das desigualdades. As percepções dos profissionais demonstraram a necessidade de apropriação dos fundamentos da educação inclusiva e das atuais discussões acadêmicas, políticas públicas e diretrizes curriculares sobre diversidade, bem como aprofundamento de processos formativos tendo em vista mudanças em percepções e práticas profissionais materializadas no currículo.

Palavras-chave: escola inclusiva; educação e diversidade; gestão escolar; percepções docentes; diversidade e diferença

Abstract

We sought to analyze the perceptions of History teachers and public school managers on the relationship between education and diversity as well as on inclusive school. In a qualitative perspective, it was based on bibliographic research and interviews analyzed in the light ofBardin's (2009) perspective. Theoretically, it was based onChartier (1990) and onCharlot (1979,2013,2020). Beyond the cultural sphere, diversity is not to be confused with differences, thus, it considers the origins, permanence and implications of inequalities. The professionals' perceptions demonstrated the need to appropriate the foundations of inclusive education and current academic discussions, public policies and curriculum guidelines on diversity, as well as deepening training processes in view of changes in professional perceptions and practices materialized in the curriculum.

Keywords: inclusive school; education and diversity; school management; teaching perceptions; diversity and difference

Resumen

Buscamos analizar las percepciones de profesores de Historia y gestores de escuelas públicas sobre la relación entre educación y diversidad, así como sobre la escuela inclusiva. En una perspectiva cualitativa, se basó en investigaciones bibliográficas y entrevistas analizadas a la luz de la perspectiva deBardin (2009). Teóricamente, se basó enChartier (1990) y enCharlot (1979,2013,2020). Más allá del ámbito cultural, la diversidad no debe confundirse con las diferencias, por lo que considera los orígenes, la permanencia y las implicaciones de las desigualdades. Las percepciones de los profesionales demostraron la necesidad de apropiarse de los fundamentos de la educación inclusiva y de las actuales discusiones académicas, políticas públicas y directrices curriculares sobre diversidad, así como profundizar los procesos de formación frente a los cambios en las percepciones y prácticas profesionales materializados en el currículo.

Palabras clave: escuela inclusiva; educación y diversidad; gestión escolar; enseñar percepciones; diversidad y diferencia

1 INTRODUÇÃO

Tratar da relação entre diversidade e educação significa atentar para sujeitos (e instituições de ensino) reais em processo de desenvolvimento e, portanto, com vivências marcadas por desigualdades sociais, preconceitos e discriminações de variadas origens (étnicas, sexuais, socioeconômicas, condição de deficiência etc.) com repercussões que levam a contextos abusivos de violência e, obviamente, com implicações nos processos de aprendizagem. Para compreender como esses processos são considerados no âmbito escolar, partiu-se da seguinte questão: quais as percepções de profissionais da educação (professores e gestores escolares) de escolas públicas sobre educação e diversidade? Assim, buscou-se analisar percepções de professores de História e de gestores de escolas públicas do País, especificamente, do estado do Rio Grande do Norte, sobre a relação entre educação e diversidade tendo em vista a promoção de uma escola inclusiva.

Salienta-se a importância do papel do gestor escolar para que o tema tenha condições de ser discutido política e pedagogicamente no âmbito geral da escola. Igualmente relevante é a articulação entre as questões de diversidade e ensino de História pelas particularidades da área que desembocam, entre outras ações, em processos de constituição de identidades. Diversidade, aqui, não se limita à esfera cultural e não se confunde com as diferenças, portanto, considera as origens, as permanências e as implicações das desigualdades.

A pesquisa pautou-se em uma perspectiva teórica qualitativa, conforme Ludke e André (2015), com foco no modo como os sujeitos percebem o ambiente em que estão inseridos, como se relacionam com ele e como interpretam suas vidas e experiências. A construção e os procedimentos de análise de dados tomaram como base, além de pesquisa bibliográfica, a realização de entrevistas com os sujeitos da pesquisa1 analisadas à luz da perspectiva da análise de conteúdo de Bardin (2009) seguindo as suas três fases: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados. Assim, a partir da leitura inicial das narrativas dos gestores e professores, chegou-se às categorias: diversidade demarcada, diversidade superficialmente ampliada e inclusão delimitada.

A análise das percepções dos sujeitos levou em consideração o que Chartier (1990) considera como representações. Essas são constituídas a partir de conhecimentos adquiridos e experiências vivenciadas pelo sujeito. Alimentadas por constantes processos de apropriação, desembocam em práticas individuais e sociais. O entendimento sobre a instituição escola, por sua vez, pautou-se nas proposições de Charlot (1979, 2013, 2020) que se relacionam aos processos de ensino entendidos como atividade intelectual marcada (ou não) por sentido e prazer. Os resultados da pesquisa seguem aqui organizados em três seções. Na primeira, explicitam-se as políticas curriculares voltadas para questões de diversidade e inclusão e apresentam-se referências quanto aos sujeitos da pesquisa. Em seguida, discorre-se sobre as percepções de gestores escolares sobre educação, diversidade e escola inclusiva. Por fim, o foco segue na análise das percepções de professores de História sobre o tema.

2 POLÍTICAS CURRICULARES E OS SUJEITOS DA PESQUISA

A produção acadêmica sobre o tema “diversidade e educação” avançou muito, sobretudo, após a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) na década de 1990 (BRASIL, 1998), ganhando força nos anos seguintes à publicação da Lei federal 10.639/2003 e suas diretrizes e orientações curriculares (BRASIL, 2004; 2006; 2009a) no que diz respeito às relações étnico-raciais. A atenção à temática, de modo geral, deve ser direcionada a todos os segmentos do nível básico da educação e com atenção aos seus diferentes aspectos. O mesmo pode ser dito, por exemplo, em relação à educação ambiental (BRASIL, 1999; 2012) e à educação sexual (BRASIL, 2005; 2007a; 2007b; 2007c; 2013). Os três temas compuseram as propostas dos temas transversais relativos aos PCN: Pluralidade cultural, Meio ambiente, Saúde, Orientação sexual, além de Ética, Trabalho e Consumo. Em que pese a atenção ao público escolar da educação especial, orientações legais quanto à inclusão datam, também, da década de 1990, com ampliação nos primeiros anos do século XXI (BRASIL, 1994; 2008; 2011; 2015).

Portanto, referências diretas, relacionadas e contínuas sobre a relação entre diversidade e educação integram o contexto político brasileiro desde a década de 1990, momento de pressão mundial decorrente da cobrança pelo cumprimento de acordos internacionais relativos ao combate às desigualdades. Além, obviamente, do contexto interno marcado por reivindicações dos movimentos sociais fortalecidos desde a década de 1970. Entretanto, ações fragmentadas marcaram os anos do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

A vitória de Luís Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais de 2002, com apoio dos movimentos sociais, sobretudo, o movimento negro e de mulheres, sinalizou para novas possibilidades de ações no âmbito das políticas públicas voltadas, por exemplo, para questões de raça, gênero e sexualidade. No primeiro ano de governo, foram criadas a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) e a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir). Entre as muitas ações, no que se refere à educação, destaca-se a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas de educação básica, em 2003 (Lei 10.639). No ano seguinte, foi criada a Secretaria de Educação continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad), posterior, Secretaria de Educação continuada, Alfabetização e Diversidade e Inclusão (Secadi) (2004-2019).

O tratamento diferenciado aos assuntos de diversidade no governo Lula resultou em “uma variedade sem precedentes de programas dirigidos ao enfrentamento dos problemas decorrentes do racismo e direcionados para a diversidade”. Contudo, “a defesa da diversidade e a luta pela igualdade racial passaram a fazer parte da retórica do governo”, mas não foram, efetivamente, elevadas ao status de política de Estado, como lembram Rodrigues e Abramowicz (2013, p. 27). As ausências de coordenação interministerial e adequada comunicação entre os programas podem ter contribuído para isso. As repercussões desses dois fatores podem ser sentidas na resistência ao assunto por parte de cidadãos brasileiros, inclusive, profissionais da educação. Mas não se pode deixar de considerar que, positivamente, as ações governamentais possibilitaram maior abertura para a participação de grupos tradicionalmente excluídos das políticas públicas de modo geral. Isso leva à reflexão sobre a importância e necessidade de construção de um novo currículo escolar, de uma nova educação, de uma nova sociedade, de um novo Estado, sobretudo, em um momento em que se assiste a um desmonte na educação, orquestrado pelo atual governo federal (2019-2022), com reflexos diretos nas políticas e programas sobre a diversidade e inclusão materializado no fechamento da Secadi no primeiro dia útil do governo Bolsonaro.

O fato é que as políticas públicas, orientações e diretrizes curriculares nacionais no âmbito da diversidade, sobretudo as publicadas entre 2004 e 2015, estimulam a promoção de experiências coletivas e de caráter colaborativo. Também sinalizam para a convivência respeitosa e de valorização da diversidade na sociedade via formação escolar. Diante de uma sociedade marcada por contradições e violência, é preciso que a escola atente para as diretrizes curriculares nacionais voltadas para questões de inclusão e diversidade. É preciso que os profissionais intelectuais que nela trabalham, formando as novas e futuras gerações, apropriem-se das propostas de trabalho presentes em tais diretrizes curriculares, instrumentalizando-se para melhor lidar com as relações sociais na escola, por vezes marcadas por preconceito e discriminação. Em síntese, de falta de leis e diretrizes curriculares contra a reprodução de preconceitos e discriminação no ambiente escolar o Brasil não padece, ainda que, atualmente, assista-se a uma mudança nesse estado de coisas decorrentes de alterações nas orientações do Ministério da Educação pós-20192.

Tendo em vista compreender como as discussões sobre o assunto têm acompanhado profissionais da Educação, buscou-se verificar as percepções de gestores e de professores quanto tema. No intuito de deixar mais claras as interpretações dos gestores e melhorar a sua identificação, mas mantendo o anonimato, foram utilizadas as seguintes denominações para efeito de identificação: “Gestor 1” ou “Gestora 1”, mantendo-se a identificação de sexo; “EM” ou “EE”, para identificação se de escola municipal ou de escola estadual; e, “E-1”, “E-2”, “E-3” e, assim, sucessivamente para identificação da ordem cronológica de realização das entrevistas. O mesmo processo de identificação foi adotado para os professores de História.

Dos 20 (vinte) gestores entrevistados, 06 (seis) são homens e 14 (quatorze) são mulheres. Todos possuem licenciatura, predominando a formação em Pedagogia (oito) e Matemática (quatro), seguidas pelas formações em Letras (quatro), História (dois), Geografia (um) e Educação Física (um). Na ocasião da entrevista, a Gestora 6 (EE, E-10) contava com dez anos de experiência em gestão escolar. Os demais possuíam tempo variável entre um e seis anos. A Gestora 5 (E-9) e a Gestora 14 (E-20) foram as únicas com menos de um ano à frente do cargo na ocasião das entrevistas. Apenas quatro gestores afirmaram possuir curso de especialização e somente uma, mestrado em Educação. Os atuais gestores das escolas públicas estaduais e municipais, situadas em Natal (RN), são profissionais que, de modo geral, por meio de processos eleitorais, assumem a função de gestor por dois anos. São, ainda, professores com formações acadêmicas variadas. A tradição disciplinar que permeia os currículos de cursos de licenciatura, por vezes, afasta possibilidades formativas de caráter mais interdisciplinar e transversal, dificultando o trabalho com questões de ensino reais do campo de trabalho dos futuros professores e gestores, como as questões relativas à diversidade. Destaca-se, por essa razão, a importância desta pesquisa.

Em relação aos professores de História, dos 15 que retornaram com a autorização para uso da entrevista, 07 (sete) são homens e oito (oito) são mulheres3. Todos possuem licenciatura em História. A maioria atua no ensino de História entre 08 (oito) e 17 (dezessete) anos. Uma minoria diferencia-se no tempo de docência. O Professor 4 (E-7) alega possuir 28 anos e o Professor 7 (E-12) declara ter 30 anos de docência na disciplina, quando da realização da entrevista no primeiro semestre de 2021. Com exceção das Professoras 5 (EM, E-10) e 8 (EE, E-15) que possuem a licenciatura e o bacharelado na mesma área: História, os demais possuem uma segunda graduação em área diferente e/ou pós-graduação lato ou stricto sensu. Os professores de História participantes da pesquisa têm, portanto, qualificação profissional para atuação em suas funções. Possuem a experiência da formação continuada, seja ela mais voltada à experiência da prática docente via especializações, seja ela direcionada à pesquisa mediante mestrado ou doutorado. Essa formação stricto sensu, ainda que não voltada para a formação do professor, proporciona ao profissional um amadurecimento teórico que, se bem utilizado, pode possibilitar melhorias profissionais no âmbito da docência e da gestão escolar. Diante de um quadro como esses, o que pensam e o que se pode esperar em termos de práticas pedagógicas voltadas para questões de diversidade?

3 DIVERSIDADE DEMARCADA E INCLUSÃO DELIMITADA

Considera-se a escola como palco de um possível processo de formação cultural e de autonomia do sujeito no sentido atribuído por Charlot (2002, 2013, 2020), de que a educação/escola deve servir para evitar a barbárie e, para tanto, precisa associar atividade intelectual com sentido e prazer pelo saber. Assim, a educação deve voltar-se à consolidação de um processo de humanização e emancipação dos sujeitos, tendo em vista a vida em uma sociedade solidária. Nesse processo, questões sobre diversidade precisam ser consideradas e não na perspectiva do apelo à tolerância, mas na da problematização das diferenças e das consequentes relações sociais que a sustentam e que as transformam em objeto de discriminação, dominação e negação de direitos relativos a diferentes aspectos (sexualidade, relações étnico-raciais etc.). Atentar para a diversidade é pensar em uma escola inclusiva. A sua construção requer atitudes e convicções contextualizadas de seus agentes e propostas educativas concretas, viáveis e colaborativas desenvolvidas por toda a comunidade escolar.

E o que pensam os gestores escolares e professores de História de escolas públicas do Rio Grande do Norte sobre o assunto? De pronto, a relevância da atuação em prol do respeito ao público escolar é a premissa encontrada em suas narrativas, mas, muitas vezes, não avançando ao ponto de tocar no que, de fato, é a diversidade, a inclusão e o tratamento às diferenças. Problemas de âmbito geral no domínio sobre o assunto, efetivamente, resultam em limites no seu tratamento. Verifica-se o mesmo problema quanto à inclusão. As percepções sobre inclusão de muitos dos gestores e professores participantes da pesquisa demonstram confusão entre a perspectiva da escola integrativa e a da escola inclusiva. Rodrigues (2006) e Mendes (2006) salientam a necessidade de diferenciação entre integração e inclusão Na escola integrativa, os alunos com diferentes tipos de dificuldades, para além daqueles alunos com deficiências, eram ignorados como público de inclusão.

Mesmo que pesquisas de profissionais independentes ou aquelas contratadas pelo Ministério da Educação (BRASIL, 2009b) relacionem problemas como evasão e fracasso escolar e consequências da violência simbólica decorrentes de preconceitos e discriminação vividos por alunos nas escolas, verifica-se que ainda faltam conhecimentos e/ou compromisso de parte de gestores e professores para coordenar atividades relativas à diversidade e promover práticas docentes e de gestão com caráter inclusivo. Diversidade e escola inclusiva, reiteradamente, aparecem como demarcadas, destinadas ao público da educação especial.

De modo geral, questionados sobre o papel do gestor escolar no tratamento da diversidade na escola e sobre suas realizações em relação ao assunto, os gestores consideram o seu papel como essencial. Suas percepções apontam para a necessidade do respeito à diversidade na escola, no entanto, voltado para alunos com deficiência, por vezes, confundidos com alunos com necessidades educacionais especiais (GESTORA 4, EE, E-8; GESTOR 5, EE, E-11; GESTOR 2, EE, E-3; GESTORA 8, EE, E-13, GESTORA 12, EE, E-18). Houve, ainda, quem considerasse a diversidade um tema polêmico ou como algo complicado visto que há grupos que a defendem de modo limitado ao seu próprio coletivo, o que termina por causar mais exclusão (GESTOR 4, EE, E-6; GESTOR 3, EE, E-4).

Entre os gestores, houve quem avançasse na demonstração das suas percepções, ora fazendo relações com a comunidade escolar (GESTORA 14, EM, E-20) ora exemplificando aspectos como a condição de “religião” ou “cor” como sendo integrantes das discussões sobre diversidade. Assim foi que a Gestora 3 (EE, E-7) defendeu que o gestor tem que ser o mediador para a efetivação do “respeito às diferenças” e do “aceitar as diferenças”. Nesse sentido, supõe-se ausência de conhecimento sobre o assunto e, por consequência, da função destrutiva embutida em expressões como “aceitar as diferenças” ou “tolerar as diferenças”.

Ao falar em aceitar ou tolerar as diferenças, é preciso que se tenha consciência quanto a conceitos como diversidade, diferença e desigualdades, em decorrência do fato de que as relações sociais e culturais no Brasil nunca foram caracterizadas pelo respeito ao outro. Marcadas por relações de poder e hierarquização, revestidas de preconceito e discriminação, têm como resultado a negação de direitos a determinados grupos sociais, sobretudo, afro-brasileiros, indígenas, pessoas com deficiência, aquelas que se declaram homossexuais assim como as pessoas mais pobres e as mulheres. Portanto, vive-se em uma sociedade racista, não inclusiva, homofóbica e machista, aspectos que marcam as interações até mesmo com as crianças que, desde a mais tenra idade começam a sentir o peso da violência simbólica a que são submetidas tanto no espaço privado quanto no público, no qual se pode incluir a escola.

No limiar da terceira década do século XXI, em que se fortalecem discursos pós-humanistas e transhumanistas, que apontam a substituição da espécie humana por uma espécie biotecnológica, torna-se ainda mais necessário questionar as relações sociais marcadas pela diversidade e pela diferença. Tais termos não são sinônimos nem noções neutras. Clareza na distinção conceitual objetiva a promoção de processos formativos mais adequados nas escolas, nos quais tenham vez os valores e o sentido da vida. Ter consciência sobre a diversidade implica não homogeneizar as diferenças. Significa problematizá-las com o intuito de promover uma sociedade e escolas mais justas, solidárias, inclusivas.

Discutir sobre diversidade significa considerar que discursos e práticas devem ir além de um apelo ao respeito e à tolerância, como se o suposto diferente tivesse que ser, no máximo, tolerado. Compreender como se constituiu a sociedade brasileira e as marcas das relações sociais no país é condição para a tomada de consciência e engajamento político e pedagógico na construção de uma educação e de uma escola inclusiva. Conhecer sobre a história da educação brasileira e sobre a história do país não é, portanto, obrigação somente dos professores de História (cujo domínio de conhecimentos deve ultrapassar em muito isso), mas, sim, de todo e qualquer profissional da Educação, a exemplo dos gestores escolares.

O silenciamento quanto à problematização das diferenças, como declaram Abramowicz, Rodrigues e Cruz (2011), favorece a construção da “heteronormatividade”, bem como da “estética branca” como modelo do adequado e belo. Nesse sentido, aos “diferentes” restaria a tolerância. Ou seja, sem que as origens e os usos feitos sobre as diferenças no Brasil sejam questionados e contextualizados, as relações de poder terminam por classificar, normalizar e hierarquizar a partir da definição de determinado padrão de identidade.

Em âmbito escolar, é preciso que se planeje e intervenha curricularmente. Em vez de simples aceite, é preciso discutir para desnaturalizar os processos de exclusão a que foram alvo milhões de brasileiros ao longo da história. Considerar as diferenças como um dado comum não significa considerá-las como um dado natural (sem implicações de ordem política, cultural e socioeconômica), do que resultaria discriminação em um país como o Brasil. Dessa forma, promover-se-iam condições para a apropriação de conhecimentos capazes de explicar o sentido deletério que carregam expressões como “aceitar os diferentes” ou “tolerar as diferenças”. Profissionais da educação, como intelectuais e formadores, não podem ser ingênuos. O domínio das políticas públicas e diretrizes curriculares do âmbito da diversidade ajuda nesse processo de qualificação tão imperioso tendo em vista a necessidade de conscientização sobre representações sociais e relações culturais.

Nesse aspecto, destaca-se a importância do entendimento da prática do profissional da Educação como prática social, assim, comprometida com a transformação das estruturas sociais opressivas. Nesse sentido, o cuidado com as implicações teóricas na prática docente é fundamental. Trata-se mesmo de atenção aos fundamentos da educação na orientação do fazer docente tanto na atuação em sala de aula quanto na gestão maior da escola.

Em decorrência de posturas pós-humanistas, ou mesmo da vivência em uma sociedade neoliberal, abre-se caminho para propostas curriculares, sobretudo, no âmbito da formação de professores. Estas propostas apontam para a minimização dos fundamentos da educação na formação dos futuros docentes, formação esta que termina sendo marcada pela instrumentalização e pelo consequente empobrecimento das condições de discussão e proposição curriculares na escola4 voltadas para questões de diversidade. Disso podem resultar iniciativas profissionais que se resumem a pedir tolerância, e, em última instância, contribuição para que se mantenham inalteradas as hierarquias entre grupos sociais, mantendo-se parte desses como hegemônicos.

Aceitar ou tolerar o outro difere de reconhecer e respeitar a sua condição de ser humano, sujeito universal. Como registra Bittar (2009, p. 555), “a melhor forma de respeito à condição humana é a garantia do reconhecimento da reserva de lugar para a diferença do outro”. Não existe alteridade sem diversidade (diversidade étnica, cultural, ideológica, estética...)”. Nessa perspectiva, se é levado a praticar uma visão de mundo descentrada que possibilita transitar intersubjetivamente entre sujeitos e experiências. Não se deve perder de vista que a diversidade dos seres humanos é fundamental à condição humana. Isso não deve ser confundido com o pretenso discurso de que todos são iguais social e politicamente. Dessa forma é que a busca pelo direito à diferença pode ser considerada como um exemplo de reação à intenção de padronizar valores, atitudes e comportamentos, homogeneizando a todos. Pensar em dignidade requer considerar os dois direitos: o da igualdade jurídica e o do direito à diferença. “O direito à diferença está baseado na ideia de que todos são diferentes entre si; e, propriamente, isto é ser humano, em sua singularidade” (BITTAR, 2009, p. 555).

Do ponto de vista antropológico, não há oposição entre universalismo e direito à diferença, desde que os dois sejam corretamente entendidos. Todos são Sapiens, membros da mesma espécie, com o mesmo equipamento genético básico. Há sete milhões de anos, divergiram aos poucos os que iam se tornar o gênero Homo e os que seriam os chimpanzés. O gênero Homo existiu sob forma de várias espécies humanas, que coexistiram em um mesmo período, compartilharam o planeta Terra, às vezes, por dezenas de milhares de anos. Desde a extinção de Neandertal, há aproximadamente 28000 anos, Sapiens é a única espécie humana no planeta, a última representante de Homo. Paradoxalmente, ao mesmo tempo, é a derradeira espécie de um gênero em via de extinção e que conquistou quase todo o planeta, construindo mundos humanos bem diferentes do meio original do antepassado comum aos homens e aos chimpanzés. Os humanos são uma só espécie, independentemente de cor, sexo, cultura. São todos resultados da mesma aventura da evolução, uma aventura improvável e que não poderia ser repetida na mesma forma. Deste ponto de vista, existe, ou deveria existir, uma solidariedade fundamental entre os seres humanos, por condição antropológica (CHARLOT, 2020).

Mas Homo evoluiu e Sapiens foi possível por conseguir sair da floresta tropical inicial, migrar fora da África e construir mundos humanos novos - pelo melhor e, às vezes, pelo pior. Sapiens pode viver no deserto e, também, em espaços gelados, isto é, em meios radicalmente diferentes da floresta tropical original. Essa diferenciação de Homo começou antes de Sapiens, quando Homo erectus saiu da África, há mais de um milhão de anos, e invadiu, aos poucos, novos espaços. Neandertal conquistou uma Europa que ainda era gelada e Sapiens, entre 40000 e 28000 anos before present, como dizem os paleoantropólogos, substituiu Neandertal, apesar de vir de terras quentes. Ou seja: por condição antropológica mesma, Sapiens só existe, sem ainda ter-se extinguido, porque criou seus mundos de sobrevivência e crescimento, físicos e culturais, e esses mundos, por condição geográfica e histórica, são, inevitavelmente, diferentes. Sendo assim, por um lado, o pertencimento de todos a uma espécie comum é o fundamento de um verdadeiro universalismo. O outro deve ser visto como um ser humano com mesma dignidade e mesmos direitos fundamentais, e se adotar um pseudouniversalismo que pretende impor a todos o mesmo modo de ser humano. E, por outro lado, a construção na história de mundos humanos e formas diversas de humanidade é o fundamento de um verdadeiro direito à diferença, aquele que reconhece a diferença como um direito universal e não como um pseudodireito que pretende fazer uso de algum privilégio pelo fato de pertencer a uma categoria específica.

Portanto, universalismo e direito à diferença são duas formas complementares e solidárias de dizer a condição humana. Ademais, existe uma terceira forma: a singularidade de cada ser humano, que tem o mesmo genoma dos outros Sapiens, que compartilha com alguns deles diferenças comuns, mas que, também, por se construir em uma história pessoal que o singulariza enquanto sujeito, é irredutivelmente original. A singularidade é a forma última da diferença. Assim, por condição antropológica, a educação é, indissociavelmente, humanização, socialização e singularização. E o contrário desses três processos tem o mesmo nome: barbárie, ou seja, a recusa de reconhecer o outro na sua plena humanidade (CHARLOT, 2020). Considera-se que esse deveria ser um dos fundamentos das políticas curriculares, bem como das propostas de currículo elaboradas pelas próprias escolas.

Silenciar sobre ou ignorar o desrespeito à diversidade e às diferenças dentro das escolas levará o aluno a uma visão negativa da instituição de ensino, da vida em sociedade ou até de si mesmo. Na falta de uma clara proposta curricular e um efetivo processo formativo, os alunos seguem livres para relacionarem-se sem qualquer orientação. Se proveniente de um quadro social problemático, parte deles lançará mão de atos desrespeitosos que, sem controle, poderão crescer e instaurar um quadro de violência na escola. Sem um projeto curricular de prevenção ou intervenção sobre essa violência decorrente da não compreensão e aceitação das diferenças, tanto essas quanto a própria violência poderão ser banalizadas, contribuindo, assim, a própria escola e seus profissionais, para processos de inferiorização do outro, o aluno, que, por sua vez, aprenderá, na escola, que na vida deve ser cada um por si. Agindo dessa forma, a escola coloca-se como “instrumento a serviço das forças sociais alienantes” (CHARLOT, 1979, p. 212).

No que se refere à escola inclusiva, a quase totalidade dos gestores afirmou ser as suas respectivas escolas, inclusivas. Para tanto, justificam-se declarando o atendimento ao público da educação especial, tratado como sendo aquele com necessidades especiais (GESTORA 3, EE, E-7; GESTORA 6, EE, E-10; GESTORA 8, EE, E-13; GESTOR 4, EE, E-6; GESTOR 5, EE, E-11). Houve quem avançasse em sua narrativa afirmando ser a escola inclusiva por estar aberta a toda comunidade, sem distinção de sexo, raça etc. (GESTORA 4, EE, E-8), apesar da resistência de parte das famílias a determinados temas, a exemplo, da sexualidade (GESTORA 5, EE, E-9) ou dos limites impostos pelas restritas condições de trabalho (GESTOR 3, EE, E-4; GESTOR 5, EE, E-11). As exceções a esse estado de coisas ficaram por conta da Gestora 13 (EE, E-19) e da Gestora 14 (EM, E-20), que apontaram a inclusão como algo a envolver a todos, bem como a necessidade de planejamento de atividades capazes de atingir diferentes necessidades de aprendizagem.

A análise das percepções dos gestores apontou, de modo geral, a diversidade como algo demarcado e a inclusão como algo delimitado a um grupo circunscrito de pessoas. Essas limitações à parte do público da educação especial, tomado como sinônimo de “alunos com necessidades especiais”, é denunciadora de equívocos conceituais. Não há o entendimento de que as necessidades especiais são próprias de qualquer discente e que, ao longo da vida escolar, todos estarão passíveis de possuir algumas delas, que, por sua vez, podem ter diferentes causas: pedagógicas, psicossociais, neurobiológicas, físicas etc. o mesmo se referindo ao seu tempo de duração. O domínio conceitual ajuda os profissionais da Educação a melhor encaminhar as suas práticas ao que, de fato, requerem os alunos. Esse domínio pode ser obtido, por exemplo, por meio da leitura dos documentos oficiais das políticas públicas sobre o assunto, publicados no âmbito do Ministério da Educação, entre 1990 e 2015.

Educação inclusiva constitui-se em um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola. Por isso que, independentemente de determinações institucionais quanto a ações e projetos a serem executados nas escolas, as pessoas e os profissionais que lidam com os alunos precisam ser inclusivos. O movimento mundial pela inclusão é uma ação política, social e pedagógica, em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos e aprendendo sem nenhum tipo de discriminação.

É preciso que os profissionais da Educação dominem o assunto em seus variados aspectos e, preferencialmente, tenham se apropriado do tema em processos coletivos de formação, adquirindo condições de (re)definir princípios, revisar pontos de vista, ressignificar ideias a fim de poderem construir propostas curriculares reais para o seu público escolar. Tanto a formação inicial quanto a continuada daqueles que assumem a gestão da escola articulada com a temática da diversidade e suas diretrizes pode ser um dos caminhos para tanto. No contato com gestores de escolas localizadas em Natal (RN), constatou-se a ausência de conhecimentos e experiências formativas continuadas sobre o assunto, o que pode provocar, ainda que não intencionalmente, um silenciamento das questões sociais e escolares decorrentes de problemas no trato com a diversidade, as diferenças e a inclusão.

A narrativa da maioria dos gestores distancia-se de uma perspectiva inclusiva, posto que considera a diversidade somente quando ela assume o caráter de deficiência. Isso demonstra que as suas percepções sobre inclusão confundem-se com a perspectiva da escola integrativa (e não, inclusiva), na qual os alunos com outros e diferentes tipos de dificuldades (para além das deficiências) não eram considerados como público geral da escola inclusiva. As percepções do sujeito são frutos de representações elaboradas ao longo de sua vida e em diferentes processos de apropriação de conhecimentos, saberes e experiências teóricas e práticas. Os conhecimentos, vivências e interesses dos sujeitos implicam na maneira como cada um assimila as novas informações e experiências que a vida proporciona, levando-os à construção de diferentes práticas e representações. Essas últimas, portanto, envolvem os conhecimentos dos indivíduos e suas ações. Alimentadas por constantes processos de apropriação, resultam em práticas tanto individuais quanto sociais, conforme Chartier (1990).

Dessa maneira é que se foi possível chegar a diferentes percepções dos gestores e compreender que elas resultam de variadas vivências, muitas delas, individuais. Assim, também, é que se torna possível pressupor como a escola tem, de fato, lidado com a experiência da diversidade e da inclusão, a partir do perfil da sua gestão. Os processos de apropriação e de práticas do Gestor 4 (E-6), por exemplo, o conduziram no caminho do não reconhecimento das diferentes identidades com implicações negativas para o ambiente escolar. Segundo ele:

Infelizmente a diversidade que se prega hoje e se vê dentro até das escolas, como eu tive alguns casos aqui, é da menina chegar pro menino e dizer assim: “você tem que fazer o teste drive, pra vc saber se gosta de menino ou de menina” onde está a diversidade aí, real, que é o social, que é a necessidade? Aí pregam isso como sendo a diversidade, não! eu tenho que aceitar a diversidade como os diferentes, mas só alguns diferentes, então eu vejo que a exclusão começa na própria diversidade. A diversidade exclui os diversos, porque tem diversos que não gostam de determinadas coisas, mas eles são obrigados, porque se não ele são excluídos dessa diversidade que, entre aspas, que querem transmitir pra a sociedade. Então, o papel do gestor é poder policiar, não é bem policiar, é poder orientar essas pessoas pra a real diversidade e não pra a diversidade arraigada em único grupo, “eu faço diversidade porque o meu grupo está precisando” (GESTOR 4, EE, E-6).

A variedade de comportamentos dos alunos e que indica a necessidade de formação é característica de um cenário escolar, portanto, de um ambiente no qual devem existir orientações sistematizadas no âmbito da diversidade e da inclusão. No entanto, a falta, ou, paradoxalmente, o excesso de um suposto zelo pode comprometer propostas pedagógicas mais proativas no combate a preconceito e discriminação. Nas palavras do Gestor 4, ele precisaria orientar as pessoas para que a diversidade não fosse fator de exclusão, denotando uma apropriação problemática sobre a diversidade.

Não reconhecer que as identidades se constituem múltiplas no espaço social e, consequentemente, não abordá-las como temática no espaço educacional, contribui para que as diferenças existentes entre os próprios alunos possam levá-los a práticas como preconceito, discriminação e todo o tipo de intolerância (LEITE, 2014). Muito dessa postura intransigente tem sido considerada como motor capaz de alimentar práticas de violência, a exemplo do bullying que, por isso, pode ser considerado, entre outros aspectos (desrespeito, falta de intervenção etc.), como resultado da não aceitação das diferenças. Desconsiderar a temática de modo ampliado contribui para a inexistência de discussões sobre lutas e estruturas sociais reais, consequentemente, a escola não prepara os alunos para engajar-se nas lutas sociais destinadas a transformação social.

Considerar de modo genérico, sem um exercício de problematização, pode fazer com que o conceito de diversidade seja esvaziado a ponto de significar uma simples manifestação simpática às diferenças. Ao discutir, no âmbito educacional, não se pode cair nessa limitação conceitual que leva a comunidade escolar a uma orientação política de simplificação das diferenças e silenciamento sobre as desigualdades, comprometendo os propósitos de uma escola inclusiva. Daí a importância de conhecer o que pensam, também, professores de escolas públicas sobre o tema, sobretudo, daqueles cujas práticas e conteúdos escolares possuem relação direta com processos de compreensão e construção de identidades.

4 INCLUSÃO DELIMITADA E OS LIMITES DE UMA PERCEPÇÃO SUPERFICIALMENTE AMPLIADA SOBRE DIVERSIDADE

Apesar de mais próximos a discussões sobre os processos de constituição das sociedades e de construção de identidades, atualmente, os professores de História precisam lidar com dificuldades que muitos alunos têm quanto à percepção do tempo, análise histórica e à relação entre história e memória. A rapidez das mudanças e a dinamicidade das relações, bem como a facilidade do acesso à informação por vezes vulnerável (descontextualizada, inverídica, fake) são marcas dos dias atuais e oferecem um problema aos profissionais da História, uma vez que favorecem ao público escolar, em última instância, processos de esquecimento do que poderia ser essencial para a própria compreensão de si e de seu lugar no plano social. Isso fragiliza a problematização e a apropriação de conhecimentos sobre diversidade. Pode, ainda, alimentar processos de alienação, crise de identidades, negação de direitos e outros problemas sociais inadmissíveis em uma sociedade e em uma escola inclusiva. Por isso, buscou-se saber como os professores de História percebem esse cenário.

Os docentes participantes da pesquisa foram questionados sobre: o papel do professor de História com relação ao respeito à diversidade na escola; o que, como professor de História, vem fazendo ou pretende fazer em relação ao assunto; e, como define as suas práticas pedagógicas em termos de inclusão (se são ou não inclusivas e por quais razões).

Nas narrativas dos professores, destacaram-se, por exemplo, percepções mais ampliadas sobre diversidade, por vezes associada à formação do cidadão e a uma percepção de inclusão como algo mais restrito, relativo a uma parte do público da educação especial: os alunos com deficiência (não citando aqueles com transtornos globais do desenvolvimento ou com altas habilidades/superdotação). Diante do exposto, as categorias “diversidade superficialmente ampliada” e “inclusão delimitada” seguiram na condução da análise dos dados relativos às percepções dos professores de História.

De modo geral, os professores defenderam como fundamental o seu papel no tratamento do assunto na escola, por vezes associando-o à formação do cidadão ou a possibilidade de mudanças de atitudes e valores. No entanto, ao discorrerem sobre as práticas docentes, as narrativas seguiram genéricas, não conseguindo materializar qualquer exemplo de prática pedagógica promotora e valorizadora da diversidade (PROFESSORA 02, EM, E-2; PROFESSOR 1, EE, E-3; PROFESSORA 3, EE, E-5; PROFESSOR 2, EE, E-4; PROFESSOR 3, EE, E-6; PROFESSOR 5, EE, E-8; PROFESSORA 4, EE, E-9). Houve aqueles que afirmaram tratar-se de um compromisso social do professor de História (PROFESSOR 4, EE, E-7) e aquele que apontou a desconstrução de preconceitos como sendo o propósito do trabalho com a diversidade (PROFESSOR 6, EE, E-11). Mas sobre como o compromisso era cumprido ou por meio de que práticas os preconceitos tendiam a ser descontruídos via aulas de História, nada foi explanado.

Ao serem questionados sobre como desenvolviam suas práticas, o que imperou foi a afirmação de que trabalhavam de acordo com os conteúdos da disciplina, mas sem que qualquer prática pedagógica fosse exemplificada, muito menos demonstrada variedade de iniciativas. A exceção a isso ficou por conta da Professora 5 (EM, E-10) que declarou pronta e objetivamente que: “é algo que eu nunca pensei, sobre diversidade”. Portanto, em que pese a narrativa geral apontar uma ampliação no que se compreende por diversidade, tal compreensão não tem se materializado em práticas valorizadoras da diversidade e capazes de contextualizar as diferenças.

Escola onde se vivencia respeito e valorização dos sujeitos pode ser considerada aquela em que há espaço constante, no currículo, para questões de diversidade. Se no decorrer do ano letivo, discussões sobre sexualidade, racismo, relações étnico-raciais e/ou de gênero, por exemplo, encontram condições de ocorrer, problemáticas podem ser discutidas, conceitos podem ser historicizados, representações podem ser ressignificadas tendo em vista mudanças nas práticas e relações sociais. A problematização permitiria condições de dar aos alunos a possibilidade da conscientização sobre as diferenças e os seus processos constitutivos que de natural, nada têm. Contudo, o que se verifica, diante das pesquisas desenvolvidas sobre pluralidade cultural e preconceito racial na escola, por exemplo, é que, por muito, os que a fazem têm dificuldade em lidar com a diversidade e as diferenças e, por isso, ainda que não intencionalmente, terminam por silenciar sobre o assunto, reforçando a violência (ROMÃO, 2001; CAVALLEIRO, 2000; CASTRO; ABRAMOVAY, 2006; OLIVEIRA; ABRAMOWICZ, 2010; MARTINS; GERALDO, 2013; MARQUES, ALMEIDA; SILVA, 2014; FELICIANO, 2018).

Do mesmo modo, pesquisas realizadas sobre percepções e práticas docentes quanto ao tratamento do tema sexualidade na escola (integrante do universo da diversidade) apresentam limites no trabalho desenvolvido nas instituições de ensino, parte deles apontando a necessidade da formação docente para lidar com o tema (QUIRINO; ROCHA, 2012; GONÇALVES, FALEIRO; MALAFAIA, 2013; BADALOTTI; TONDIN, 2015; MARTINI, 2016; LOURINHO et al., 2017; VIEIRA; MATSUKURA, 2017; COSTA et al., 2009; FURLANETTO et al., 2018; BARBOSA; FOLMER, 2019). É como se a padronização dos sujeitos, que termina por resultar em aniquilação das questões sociais, proporcionasse-lhes mais segurança, tranquilidade, conforto. Em plena terceira década do século XXI, lidar com a diversidade e com a diferença ainda é um grande desafio a ser vencido pelos que fazem a educação escolar.

É preciso que, sobretudo, crianças e adolescentes percebam, na escola, um espaço de desenvolvimento e conscientização, no qual podem experimentar a mudança, tenham exercitadas suas capacidades em prol de melhorias para a sua vida e da sua coletividade. Mais do que o acesso a um suposto ensino de qualidade pautado na atenção ao desenvolvimento de competências e habilidades e em conteúdos escolares unificados, como defendem os propositores da BNCC (BRASIL, 2018), os alunos precisam sentir-se acolhidos e valorizados nas suas especificidades e compreenderem que os usos inadequados que muitos fazem das diferenças e que lhes tornam alvos de preconceito e discriminação são construtos históricos, sociais e políticos e que, por isso, são passíveis de ressignificação. Isso eles só vão perceber a partir da demonstração da capacidade de iniciativas para mudanças e pelo compromisso, sobretudo, dos seus professores. Sem dúvidas, a formação docente inicial e a formação continuada precisam possibilitar aos professores condições de pensar a educação para a diversidade. Mas, tão importante quanto é que os professores decidam se abrir, de forma sensível, para lidar com o outro, o diferente, lembrando que em termos de diferenças, todos o são de algum ponto de vista e, por isso, não nos resta outra mais adequada alternativa do que a busca reiterada pela promoção de uma escola inclusiva.

No que se refere às escolas e às práticas pedagógicas inclusivas, os professores apresentaram uma visão explicitamente mais estreita, muito próxima daquilo que expuseram os gestores escolares no sentido da associação com parte do público-alvo da educação especial (alunos com deficiência) tratado como sinônimo de aluno com necessidades educacionais especiais. A perspectiva que aparece ampliada quando se refere à diversidade, ainda que superficialmente por não materializar-se em exemplos práticos, fecha-se ao falar de práticas inclusivas (PROFESSORA 1, EM, E-1; PROFESSORA 2, EM, E-2; PROFESSOR 1, EE, E-3; PROFESSOR 6, EE, E-11). Avanços, quanto a esse sentido, podem ser vistos apenas nas considerações de dois docentes. O Professor 5 (EE, E-8), ainda que de modo genérico, sinaliza que a inclusão está para além das deficiências e, para tanto, trabalha com atividades que envolvem arte e a Professora 4 (EE, E-9) que, ao definir mais claramente o público da escola inclusiva, declara que em suas aulas enfatiza negros e indígenas como população-alvo do seu trabalho inclusivo, ainda que não explicite como isso se materializa por meio de suas práticas pedagógicas. Apesar de limitar-se a esse público ao pensar em diversidade e inclusão, suas percepções e possíveis práticas não deixam de fazer sentido, considerando o quantitativo populacional que ambos os grupos representam no País e pelo fato, constatado em pesquisas, de persistir, mesmo em âmbito escolar, preconceito e discriminação étnico-racial.

Em que pese a defesa pelo Professor 2 (EE, E-4) de que o tema da diversidade deve ser trabalhado por todos os docentes da escola, tendo em vista a formação do cidadão, suas próprias percepções sobre inclusão não avançam, semelhante aos demais professores. São suas as seguintes palavras:

A gente vai tentando, vai avaliando o que dá certo, o que não dá. Mas acredito que ainda tem muita coisa nas minhas práticas que possa ser revistas, revistas no sentido de que acredito que nem sempre são tão positivas. Isso principalmente devido à formação que a gente não é levado a pensar nessas ocasiões, né? Dessas situações, mas a gente sempre tenta fazer com que as práticas sejam inclusivas (PROFESSOR 2, EE, E-4).

A justificativa para a não realização ou limites de determinadas ações recai sobre a formação. Mas seria a formação inicial? No caso em tela, é possível que não, uma vez que o Professor 2 (EE, E-4), além de formado em História (licenciatura), tem especialização em “História, cultura africana e afro-brasileira” e mestrado profissional em “Ensino de História”. Toda essa formação não lhe proporcionou condições para pensar sobre diversidade e práticas pedagógicas inclusivas? Sem dúvida, a formação acadêmica é necessária, mas sozinha não promoverá transformações das práticas. É preciso disponibilidade e disposição para propor e executar projetos de ensino, conforme as necessidades formativas dos alunos, bem como para participar de discussões e debates na escola tendo em vista o planejamento que, atento às questões sociais, não descuidará das discussões sobre diversidade e diferenças.

Portanto, se a formação é necessária, do mesmo modo o é a experiência de aprendizagem docente nas escolas a partir das demandas próprias da comunidade escolar. Sem formação docente adequada, bem como o estabelecimento de tempos e espaços na escola (com o apoio da equipe gestora) para estudos e discussões sobre a relação entre educação, diversidade e inclusão, por mais bem intencionados que sejam ou estejam os professores, o que se materializará será uma escola e uma educação pseudoinclusiva.

Além disso, precisa-se considerar que a formação docente é um empreendimento complexo visto que não depende, apenas, de condições objetivas das práticas formativas sejam elas iniciais ou continuadas. Muito influencia o caráter intersubjetivo da formação e sua relação com os processos de apropriação e construção de representações do sujeito que apontam para diferentes tempos e espaços formativos, o que explica, em parte, o fato de colegas licenciandos de uma mesma turma/curso decidirem ou não pela continuidade na profissão, bem como o fato de os futuros profissionais, uma vez em exercício, sentirem-se realizados ou frustrados na profissão, seguirem instigados a inovar ou a reproduzir práticas. As múltiplas interpretações dos sujeitos, assim como as suas diferentes ações, relacionam-se com as suas representações e os seus processos de apropriação. O importante é que, durante a formatura, não se perca de vista os desafios do exercício profissional e a necessidade de formação teórica e metodológica sobre eles ao longo de toda a carreira profissional.

Em suas narrativas acerca do caráter inclusivo das suas práticas pedagógicas, os docentes não avançaram para além do genérico. Ainda assim, insistiram em declarar o contrário. A exceção a isso, mais uma vez, ficou a cargo da Professora 5 (EM, E-10). Apesar de, também, limitada ao público da educação especial, declarou: “Não considero as minhas práticas inclusivas, caso você esteja se referindo a alunos da educação especial, né?”.

Por um lado, houve quem responsabilizasse o Estado e as condições estruturais da escola pelo trabalho não realizado (PROFESSOR 3, EE, E-6; PROFESSOR 4, EE, E-7); mas houve quem, ao discorrer comparativamente sobre suas experiências em escolas públicas e privadas, elogiasse as condições de trabalho na escola pública, sobretudo, em função da presença da sala de recursos multifuncionais, do Atendimento Escolar Especializado ou da presença de professores auxiliares (PROFESSOR 7, EE, E-3; PROFESSORA 6, EE, E-13).

Fato é que, uma coisa é reconhecer a importância do tema, como denunciam as narrativas docentes; outra é apropriar-se adequadamente dele e investir na melhoria de suas práticas pedagógicas a fim de atender ao diversificado público escolar.

Trabalhar com alunos com costumes, etnias e valores diferentes é um desafio inerente ao cotidiano do professor, bem como de todos os sujeitos que atuam e transitam no ambiente escolar. Por conseguinte, todos precisam se dispor a rever seus conceitos e suas atitudes em relação à realidade sociocultural que permeia o ambiente escolar (CILIATO; SARTORI, 2015, p. 70).

A fim de aprofundar a compreensão sobre as percepções dos docentes, questionou-se sobre que documentos oficiais já haviam lido sobre inclusão, sobre educação inclusiva e o que consideravam sobre eles. As respostas atingiram, apenas, a Constituição de 1988 (PROFESSOR 7, EE, E-12) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (PROFESSORA 6, EE, E-13). Apesar do esforço narrativo de grande parte dos professores, responsáveis por longas respostas, exemplos de documentos oficiais não apareciam em suas palavras. Mas a falta de conhecimento sobre as políticas públicas e curriculares sobre questões de diversidade e inclusão era já uma evidência clara, independentemente de respostas a tal questionamento.

Apesar de extensa produção nacional e internacional, o desconhecimento docente foi a marca das narrativas dos professores de História. Sobre tal produção, é possível citar vários exemplos. Além da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, os princípios da educação inclusiva pautam-se em outros exemplos de documentos de reconhecimento e aprovação internacionais, tais como: a Declaração dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiências (1975), a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), a Declaração Mundial de Educação para Todos (1990), a Declaração de Salamanca (1994) e a Declaração Interamericana para a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (1999). Em termos nacionais, a existência de políticas orientadoras e determinações legais também são uma realidade, como demonstram o(a): Constituição Federal (1988); Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei n. 9.394 (1996); Política Nacional de Educação Especial (1994); Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001); Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (2006); Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008); Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial (2011); e, Lei da Inclusão da Pessoa com Deficiência (2015).

A produção documental decorrente das discussões sobre o tema data, portanto, de meio século. Natural é, assim, o fato de considerar-se senso comum a defesa de uma escola inclusiva, ainda que lhe faltem noções específicas sobre o assunto. Aos profissionais da Educação, diferente do cidadão comum, a apropriação acerca das políticas e orientações curriculares oficiais sobre diversidade e inclusão precisa ser efetiva, possibilitando que o seu domínio seja consistente e direcionado para propostas curriculares próprias e transformadoras na escola. Contudo, tal conhecimento não pode ser constatado junto aos professores participantes da pesquisa. A delimitação da percepção docente sobre escola inclusiva denuncia o nível de conhecimento que possuem sobre a matéria: nível de senso comum.

Verifica-se que a maior parte dos professores não compreende que a escola inclusiva é aquela que respeita e responde às necessidades educativas de todos os alunos, independentemente da sua condição ou não de deficiência. Conclusão semelhante à de outras pesquisas. Seja com atenção às percepções de professores sobre educação e práticas pedagógicas inclusivas, seja em relação a aspectos históricos do movimento de inclusão, pesquisadores como Kassar (2016), Gomes e Rey (2007), Barbosa e Souza (2010), Almeida e Naiff (2011), Cantarelli e Genro (2016), bem como Kitahara e Custódio (2017) enfatizam que, apesar da legislação orientar a promoção de projetos e programas plurais, a existência de ações restritivas nas escolas é, ainda, comumente encontrada. Essas ações são marcadas por resistências, preconceitos e falta de formação, acarretando em uma valorização de uma cultura dominante pela não valorização das diferenças.

Concorda-se, assim, com Felipe e França (2014) quando declaram que a valorização e o tratamento adequado à diversidade, portanto, a promoção de uma escola inclusiva, seria algo possível, a partir do momento em que se reconhecesse a diferença como algo construído social e politicamente e, a partir disso, o assunto fosse tomado como ponto de partida para intervenções formativas na escola, portanto, considerado premissa curricular. Nesse sentido, reitera-se a importância de que os fundamentos das políticas curriculares, assim como as propostas de currículo elaboradas pelas próprias escolas atentassem para a educação entendida como articulação entre humanização, socialização e singularização, como meio para o respeito à diversidade e à diferença.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tratar de escola inclusiva é voltar-se à escola para todos e na qual se reconhece e respeita a diversidade. Isso vem de longa data. Mas a permanência de percepções e práticas limitadas conceitualmente e que pode incidir em preconceito e discriminação no ambiente escolar é, ainda, uma realidade em muitas escolas do País. Por isso a importância de se conhecer, no princípio da terceira década do século XXI, o que pensam profissionais da educação sobre aspectos relacionados ao tema diversidade e educação.

Conhecer o que gestores escolares e professores de História pensam sobre o assunto permite condições para a compreensão dos possíveis entraves e, também, pensar sobre os caminhos a adotar em favor de uma escola verdadeiramente inclusiva. Para que essa seja uma realidade, não basta que o Estado estruture prédios e envie materiais didáticos, nem mesmo a proposição de cursos de formação seria suficiente. Práticas pedagógicas, seja na gestão seja na docência, requerem a ocorrência de mudanças comportamentais com atitudes constantemente proativas de todos os profissionais que fazem a escola, capazes de promover mudanças curriculares na instituição de ensino. Um trabalho docente inclusivo, valorizador da diversidade constitui-se em um processo e não em uma determinação. Exige proposição, vivência e avaliação curricular autorais e contextualizadas. Isso é uma necessidade também em relação ao que muitos professores salientaram, ao longo da pesquisa, como sendo o respeito à diversidade uma premissa da formação do cidadão.

Mas como ter como horizonte a cidadania se a diversidade na percepção de gestores e professores, em grande medida, atrela-se ao público da educação especial? Como formar um cidadão se as práticas pedagógicas não são inclusivas? Seguindo a perspectiva charlotiana, torna-se preciso questionar: o que significa essa cidadania quando a escola funciona na lógica do individualismo? Como formar o suposto cidadão se a escola vive e ensina sob moldes contraditórios. Se diz uma coisa e faz outra? (CHARLOT, 2020). Ainda que não seja a intenção dos seus profissionais, na ausência de respeito à diversidade e de práticas inclusivas, a leitura que o aluno faz é que, na vida, deve ser “cada um por si”, uma vez que na escola, onde deveria ser acolhido, respeitado e ter seu desenvolvimento alimentado, ele não tem suas particularidades sequer identificadas e compreendidas. “Apela-se para um conceito político para represar os efeitos sociais de uma lógica socioeconômica. No melhor dos casos, trata-se de um anacronismo, decorrente da ignorância” (CHARLOT, 2013, p. 276).

Para a promoção de uma escola inclusiva, para além da formação docente e do cumprimento dos encargos políticos, estruturais e formativas do Estado, são determinantes as ações curriculares diárias dos seus profissionais, orientadas por uma postura de alteridade frente aos seus alunos e suas demandas, bem como disposição para, como todo e qualquer profissional, buscar por si mesmo melhorias na própria formação. O silêncio dos profissionais, diante da construção de estereótipos e atitudes de preconceito e discriminação, torna a escola espaço de produção ou reprodução de violência por promover ou reforçar assimetria nas relações entre os sujeitos. Como salienta Tardif (2000) sobre a necessidade docente de conhecer sobre currículos e programas, bem como Masetto (1998) acerca do entendimento do professor como um construtor e gestor do currículo, conclui-se que reflexão constante e apropriação de conhecimentos sobre o assunto é condição para a efetivação de uma escola inclusiva e base para a construção e gestão de propostas curriculares reais.

Apesar do avanço das orientações curriculares, desde a década de 1990, escolas brasileiras ainda permanecem excludentes. A diversidade parece seguir ignorada e os conflitos decorrentes de uma não aceitação das diferenças, ocultos ou silenciados. Em vez de considerada como elemento de riqueza e trabalhada em prol do desenvolvimento social e cultural de todos, limita o processo de emancipação dos sujeitos em formação pela omissão diante de tensões ou mesmo pela reprodução de preconceito e discriminação. Se a escola é uma instituição também voltada para a formação para a cidadania, como afirmam muitos docentes de História de escolas públicas de Natal (RN), ela deve, necessariamente, comprometer-se com a educação para a diversidade.

REFERÊNCIAS

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NOTAS:

1 A pesquisa considera o respeito aos procedimentos éticos estabelecidos para a pesquisa científica. Após a transcrição e leitura das entrevistas, os participantes assinaram documento intitulado “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido de Entrevista”, no qual foram explicitados: dados da pesquisa e de contato para outros eventuais esclarecimentos, benefícios e inexistência de riscos pela participação na pesquisa bem como a garantia do anonimato dos sujeitos e suas respectivas instituições de ensino.

2 Exemplo disso são as alterações propostas para a produção dos livros didáticos. A nova gestão do Executivo federal já no seu primeiro dia útil de trabalho (02.01.2019) mudou o edital do Programa Nacional do Livro Didático em andamento e cuja entrega dos livros, por isso, já estava prevista para o ano 2020. Foi retirado o item que impedia a exposição de publicidade, bem como erros de revisão e impressão nos livros. As mudanças tornaram desnecessária a apresentação de referências bibliográficas, abrindo margem para que informações não provenientes de pesquisas científicas tivessem sua veiculação permitida nas obras. Com atenção direta às questões de diversidade, permaneceu a proibição de veiculação de qualquer discriminação, estereótipo ou preconceito. Mas foram retiradas as exigências de que: ilustrações retratassem “adequadamente a diversidade étnica da população brasileira, a pluralidade social e cultural do país”; de que o livro tivesse que “promover positivamente a cultura e a história afro-brasileira, quilombola, dos povos indígenas e dos povos do campo, valorizando seus valores, tradições, organizações, conhecimentos, formas de participação social e saberes”. Parte do critério de avaliação relativo à mulher também foi retirada, qual seja, a que determinava que os livros dessem “especial atenção para o compromisso educacional com a agenda da não-violência contra a mulher”. Ver: SBPC. Ao mudar edital para livros didáticos, governo Bolsonaro retira exigência de bibliografia e passa a permitir propaganda. SBPC na mídia. 09 de janeiro de 2019. Disponível em: http://portal.sbpcnet.org.br/noticias/ao-mudar-edital-para-livros-didaticos-governo-bolsonaro-retira-exigencia-de-bibliografia-e-passa-a-permitir-propaganda/ Acesso em: 27 de mar. 2021.

3 A intenção era realizar 20 entrevistas a gestores e 20 a professores. No entanto, somente 15 professores retornaram com a autorização para uso da entrevista. Considera-se que o contexto da pandemia com todas as medidas que afetaram a vida pessoal e profissional dos docentes foi um complicador para a participação dos professores desde o momento do aceite em participar da pesquisa, passando pela realização da entrevista e, por fim, chegando à revisão das transcrições dos áudios e a autorização da sua concessão pelos professores. Além do sofrimento a que foram acometidos decorrentes da pandemia da Covid-19, os professores tiveram que, em curto espaço de tempo, repensar suas práticas profissionais mediante a adoção de tecnologias da informação e comunicação para alimentar o denominado ensino remoto, cujo primeiro complicador por vezes foi o próprio acesso a essa tecnologia, distante para parcela dos docentes e dos seus alunos. A complexa mudança foi responsável por uma tomada excessiva de tempo de atividades de parte dos docentes, que precisaram replanejar suas vidas, adequando-se a novas rotinas pessoais, familiares e mesmo estruturais em suas residências, uma vez que muitos foram aqueles que tiveram que “instalar” uma sala de aula dentro da sua própria casa, tendo que administrar no mesmo tempo e espaço, vida pessoal e familiar, afazeres domésticos e vida profissional.

4 Ver, por exemplo, a atual proposta para a formação docente no país, intitulada de Base Nacional de Formação de Professores centra-se no exercício da prática, no desenvolvimento de competências e habilidades a fim de adequar a formação aos propósitos da BNCC (BRASIL, 2018), claramente, um retrocesso em termos curriculares.

Recebido: 20 de Junho de 2021; Aceito: 16 de Julho de 2021

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