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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.20 no.1 São Paulo ene./mar 2022  Epub 06-Mayo-2022

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2022v20i1p372-393 

Artigos

Protótipo “Teaching English to Teachers” pela perspectiva de justiça social:a educação antirracista na formação de professores de línguas

Prototype “Teaching English to Teachers” from the perspective of social justice:anti-racist education in language teacher education programs

Prototipo de “Enseñanza del Inglés a los Maestros” desde la perspectiva de la justicia social:educación antirracista en los programas de formación de profesores de idiomas

Michele Salles EL KADRIi 
http://orcid.org/0000-0002-5836-4988

Thaísa Cristina ZANCOPÉii 
http://orcid.org/0000-0002-9489-7220

i Doutora em Estudos da Linguagem (UEL). Pós-doutora em Educação (UFES) e em Linguística Aplicada (UNICAMP). Professora associada na Universidade Estadual de Londrina. E-mail: mielkadri@hotmail.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-5836-4988.

ii Mestre em Letras Estrangeiras Modernas (UEL). Doutoranda em Estudos da Linguagem (UEL). Bolsista de Doutorado (Capes). E-mail: thaisazancope@gmail.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-9489-7220.


Resumo

Este artigo objetiva apresentar e analisar um protótipo (Teaching English to Teachers) para as aulas de línguas de programas de formação de professores de Inglês e analisar quais princípios de justiça social foram desenvolvidos e transpostos didaticamente. A proposta está embasada no ensino de línguas pela perspectiva da justiça social (FREIRE, 1974; ADAMS; BELL, 2016; BELL, 1997; ZEICHNER, 2008), na perspectiva do Pós-Método (KUMARAVADIVELU, 2003) e no conceito de material didático da proposta do web currículo (ALMEIDA, 2014) e dos protótipos (ROJO, 2017a). Os resultados apontam para diversos princípios da justiça social transpostos didaticamente. Concluímos que protótipos pensados a partir da perspectiva da justiça social e do pós-método para as aulas de língua inglesa têm potencial de propiciar práticas pedagógicas que contribuem para a construção de identidade docente com princípios ético-cidadãos.

Palavras-chave: justiça social; formação de professores; protótipos

Abstract

This article aims at presenting a prototype (Teaching English to Teachers) for language classes in English teacher education programs and analyzing which social justice principles were developed and didactically transposed. The proposal is based on the teaching of languages from the perspective of social justice (FREIRE, 1974;ADAMS; BELL, 2016;BELL, 1997;ZEICHNER, 2008), from the perspective of the Post-method (KUMARAVADIVELU, 2003) and the concept of didactic material from the web curriculum (ALMEIDA, 2014) and prototypes proposal (ROJO, 2017a). The results point to several principles of social justice transposed didactically. We conclude that prototypes thought from the perspective of social justice and post-method for English language classes have the potential to provide pedagogical practices that contribute to the construction of teaching identity with ethical-citizen principles.

Keywords: social justice; teacher education program; prototypes

Resumen

Este artículo tiene como objetivo presentar y analizar un prototipo (Teaching English toTeachers) para clases de idiomas en programas de formación de profesores de inglés y analizar qué principios de justicia social se desarrollaron y transpusieron didácticamente. La propuesta se basa en la enseñanza de idiomas desde la perspectiva de la justicia social (FREIRE, 1974;ADAMS; BELL, 2016;BELL, 1997;ZEICHNER, 2008), desde la perspectiva del Post-método (KUMARAVADIVELU, 2003) y el concepto de material didáctico de la propuesta de currículo web (ALMEIDA, 2014) y prototipos (ROJO, 2017a). Los resultados apuntan a varios principios de justicia social transpuestos didácticamente. Concluimos que los prototipos pensados desde la perspectiva de la justicia social y el método posterior para las clases de inglés tienen el potencial de proporcionar prácticas pedagógicas que contribuyan a la construcción de la identidad docente con principios éticos ciudadanos.

Palabras clave: justicia social: formación de profesores de inglês; prototipos

1 INTRODUÇÃO

Discorrer sobre justiça social implica, necessariamente, começar por Freire (1974), que nos remete a seu principal conceito: o reconhecimento de que vivemos em uma sociedade opressora e a urgência de educar para se combaterem os efeitos da opressão. Freire (1974) propõe uma educação igualitária e democrática por intermédio de pedagogias que enaltecem as experiências e culturas dos próprios alunos. Nessa mesma obra, o autor aborda explicações essenciais para o entendimento da necessidade de uma pedagogia dialógica e emancipatória do oprimido em oposição às classes opressoras. Ele aponta que tal pedagogia deve atender às perspectivas do oprimido, e não as do opressor, e que isso pode ser feito por meio de uma educação problematizante e participante, que capacite pela consciência crítica a fim de concretizar um movimento de liberdade.

Freire (1974) argumenta que é papel do professor propor mudanças na educação e facilitar a compreensão dessas forças opressoras. Para o autor, deve-se entender como as múltiplas ideologias são sócio-historicamente construídas, para que possam ser desafiadas e desconstruídas. Para ele, a mudança da educação bancária para a educação emancipatória veria os alunos como investigadores críticos, e não como “recipientes dóceis de depósitos” (FREIRE, 1974, p. 40). Parte, assim, da concepção de que a educação é caracterizada pela intencionalidade, alegando que ensinar é conscientizar e que criticar a realidade é uma luta pela transformação e concretização de sua liberdade.

Contudo, mesmo com o avanço das pesquisas que enfatizam um ensino de línguas pautado pela linguagem como prática social e pelas questões relacionadas a poder, ainda é comum encontrar aulas de línguas dos cursos de licenciatura para formação de professores de Inglês afastadas das questões que podem colaborar para a formação voltada para a justiça social. Esse papel político do professor de línguas já foi apontado por Leffa (2005), ao enfatizar que o professor deve ser um agente político engajado na tarefa de mostrar aos alunos que a aprendizagem de uma língua estrangeira está para além do linguístico e engloba múltiplos aspectos sociais, culturais e históricos.

Essa questão é reforçada pelas novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial de professores, que ressalta a necessidade de que currículos de formação de professores contribuam para a superação das forças opressoras e para o respeito à diversidade (BRASIL, 2015). Assim, em razão do desenvolvimento recente do contexto sócio-histórico-cultural que vivenciamos na educação de nosso país, o termo “justiça social” se apresenta ainda mais relevante. Por justiça social, neste trabalho, entendemos o reconhecimento dos sistemas de opressão sob os grupos marginalizados, desenvolvimento do senso de agência e responsabilidade social, a fim de criar mudanças sociais e assegurar que todos os indivíduos sejam capazes de interagir democraticamente uns com os outros.

Este trabalho, portanto, tem como objetivo expor e analisar um material didático (Teaching English to Teachers) para as aulas de línguas do curso de Letras-Inglês e verificar quais princípios de justiça social foram desenvolvidos e transpostos didaticamente. Assim, apresentamos o protótipo Teaching English to Teachers, cuja proposta é um ensino de línguas na formação inicial de professores pela perspectiva da justiça social (FREIRE, 1974; ADAMS; BELL, 2016; BELL, 1997; ZEICHNER, 2008), com base na perspectiva do web currículo (ALMEIDA, 2014) e dos protótipos (ROJO, 2017a), com o intuito de investigar quais as características de justiça social presentes nesse material.

Para tanto, primeiro apresentamos o referencial teórico que o embasa; em seguida, a metodologia de design do protótipo e da pesquisa em questão (LEFFA, 2003; FILATRO; PICONEZ, 2007), para, então, demonstrar o protótipo produzido, indicando os princípios de justiça social desenvolvidos em um material para o ensino de línguas na formação inicial de professores.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Perspectiva da justiça social

A educação antirracista se alinha com perspectivas que abrangem uma gama de questões para lidar com desigualdades, como a Pedagogia para Justiça Social (PJS). Para Bell (1997), a justiça social é caracterizada por uma justa distribuição de recursos que reconheça grupos e culturas marginalizadas, isto é, todos os membros da sociedade devem se sentir física e psicologicamente seguros, valorizados e respeitados. Assim, segundo a autora, a justiça social é, ao mesmo tempo, objetivo e processo: é objetivo porque busca a participação completa e equitativa de pessoas de todos os grupos sociais em uma sociedade mutuamente moldada, a fim de atingir suas respectivas necessidades; e é processo porque envolve mecanismos democráticos e engajadores, no intuito de afirmar a agência e a capacidade de trabalhar colaborativamente a favor de mudanças.

Hackman (2005) apresenta cinco componentes essenciais para a pedagogia voltada para a justiça social: domínio de conteúdo; pensamento crítico; análise da opressão; ação e mudança social; e reflexão pessoal. Esses elementos abordados pela autora facilitam o entendimento e a importância da justiça social na educação. O primeiro deles é o domínio de conteúdo. Por meio de informações reais e de uma contextualização histórica, os alunos poderão deixar de reproduzir ideologias dominantes e ir além do que geralmente é apresentado pela mídia e pelos livros didáticos. Com o domínio de conteúdo, os alunos poderão não somente examinar criticamente as informações, mas também dialogar sobre elas. Hackman (2005) acredita que a PJS envolve responsabilidade social, o que implica oportunidades para discussões e o contato com diferentes pontos de vista. De acordo com a mesma autora, as informações históricas trazem fatos limitados sobre as forças políticas, sociais e econômicas, criando e sustentando padrões ligados à opressão. Para ela, os alunos podem entender como os conteúdos trabalhados em sala de aula estão conectados a questões maiores da sociedade, ou seja, é possível que compreendam o verdadeiro significado da expressão “Pensar globalmente, agir localmente”.

Outro componente essencial para a PJS estudado pela autora é o pensamento crítico e a análise da opressão. De acordo com Hackman (2005), o conteúdo sozinho ainda é insuficiente para criar democracia e empoderamento na sala de aula. O conteúdo sem o contexto histórico, especialmente quando combinado com a falta de criticidade e de análise, resulta na incapacidade de desafiar e questionar temas significativos da opressão. Para a autora, em uma sala de aula voltada para a justiça social, todo conteúdo é motivo de debate e crítica. Argumenta, porém, que apenas pensar sobre a questão não é equivalente ao pensamento crítico. Segundo ela, é preciso trazer as informações por meio de diversas perspectivas, proporcionando uma expansão de ideias e questionamentos dos efeitos de poder e opressão. O terceiro componente citado pela autora é a ação e mudança social, cujo objetivo é mover os alunos do cinismo e da desesperança para a possibilidade. Conforme Hackman (2005), deve-se intencionalmente apresentar ferramentas que promovam a oportunidade de agir socialmente, pois muitos alunos, condicionados aos contextos educacionais atuais, são levados a se sentir acomodados e desesperançosos com a sociedade em que vivem. Hackman (2005) acredita que os professores podem ensinar a seus alunos que seus direitos como cidadãos exigem participação e voz. Nessa perspectiva, a reflexão pessoal do professor também é um elemento essencial para a PJS: professores precisam refletir criticamente a respeito de suas próprias práticas e estar abertos a novas possibilidades, pois a PJS começa a partir de indivíduos dispostos ao crescimento e à mudança.

Pela mesma perspectiva, Zeichner (2008) defende que a formação de professores para a justiça social tem potencial de ir além do discurso, no que se refere à parte acadêmica, e de fato propiciar real mudança social. No entanto, é preciso disponibilizar as ferramentas necessárias para que as comunidades estejam engajadas nesse propósito. Adams e Bell (2016) exploram os princípios pedagógicos que informam a prática educacional voltada para a justiça social: primeiro, é criar e manter um ambiente receptivo e inclusivo baseado em orientações claras e acordadas por todos os envolvidos. Considerando esse princípio, de acordo com as autoras, a maneira como as atividades começam é que dará o “tom” para as aulas e para as experiências de aprendizado. A PJS presta atenção especial em quão inclusivas serão as atividades e como os participantes serão recebidos e envolvidos.

Adams e Bell (2016) argumentam, ainda, que começar com a experiência dos participantes é uma etapa essencial e deve-se engajá-los imediatamente, de maneira informal, com o objetivo de trocarem experiências e descobrirem similaridades e diferenças entre si. Como as atividades voltadas à PJS são experienciais, elas enfatizam e promovem o respeito mútuo, a discussão de diferentes pontos de vista e a participação de todos.

Outro princípio abordado por Adams e Bell (2016) é o de auxiliar os participantes a reconhecerem suas múltiplas posições dentro dos sistemas de desigualdade, a fim de entenderem como a opressão opera em múltiplos níveis. Para a autora, por meio das atividades, os participantes percebem e exploram como suas próprias identidades sociais e seu contexto refletem suas visões de mundo. Pelo compartilhamento de suas experiências e vivências, podem refletir sobre suas diferenças e similaridades em suas respectivas identidades sociais. Para ela, durante as atividades, os participantes podem pessoalmente relacionar as diferentes formas de opressão e realizar conexões entre suas próprias experiências e as manifestações culturais da sociedade.

Antecipar, reconhecer e balancear os componentes emocionais e cognitivos do aprendizado também é um princípio da PJS, de acordo com Adams e Bell (2016). A justiça social é emocional e cognitivamente desafiadora pelo fato de explorar novas ideias, trazer conteúdos que poderão colidir com suas suposições sobre o mundo e refletir qual sua participação em perpetuar a injustiça. Os facilitadores devem se planejar para vários tipos de respostas que poderão surgir dos participantes.

Outro princípio, de acordo com Adams e Bell (2016), é recorrer ao conhecimento e às experiências dos participantes e do grupo para ilustrar e discutir os conteúdos de justiça social. Para ela, pelo fato de ser uma pedagogia experimental, a PJS deve abordar as próprias experiências dos participantes, para que as relações de poder e privilégios que vivenciam possam ser discutidas e analisadas.

Encorajar o engajamento ativo e a colaboração com as questões levantadas pelos participantes também é um princípio significativo para a PJS, pois está relacionado à relevância pessoal e ao diálogo. Dessa maneira, as atividades devem ocorrer em pares ou em grupos de diferentes formatos, pois instigam a interação social, a aprendizagem ativa, a reflexão e a ação. Por fim, promover e avaliar a autoconscientização, a aquisição de conhecimento e a capacidade de criar ações de mudança é o último princípio citado por Adams e Bell (2016). Deve-se reconhecer o progresso do participante e encorajar o planejamento colaborativo de projetos nas comunidades e instituições. A autoavaliação sobre o que foi adquirido também faz parte do processo, para que o participante possa refletir acerca dos impactos desse processo de aprendizagem.

Segundo Bell (1997), a opressão pode ser manifestada mediante racismo, privilégio branco, sexismo, heterossexismo, opressão trans, classismo, opressão religiosa, etarismo e capacitismo, por exemplo. Para a autora, todos os “ismos” estão conectados como um abrangente sistema de dominação e, em cada relação, há um grupo dominante e privilegiado e outro subordinado e marginalizado, isto é, em cada tipo de opressão, há diferentes e particulares formas de poder e privilégios.

Adams e Bell (2016) reforçam que os “ismos” (racismo, classismo, sexismo, etarismo, capacitismo) trazem as cinco fases da opressão: exploração, marginalização, dominação cultural, impotência e violência. Por essas atividades, os participantes têm acesso a exemplos cotidianos para ilustrar como as faces da opressão estão presentes nas instituições e nas comunidades das quais fazem parte. Por meio de discussões sobre os tópicos dos “ismos”, os participantes poderão refletir criticamente sobre suas próprias práticas e poderão perceber os sistemas de vantagens e desvantagens em que indivíduos de diferentes identidades sociais se baseiam e, assim, poderão desenvolver ações para discursarem sobre o assunto. Nesta proposta, focamos um desses “ismos”: o racismo, abordando-o pela perspectiva do letramento racial crítico e da educação antirracista.

2.2 Educação antirracista

Para Bell (1997), o termo “raça” é uma construção social, um conceito criado pela sociedade, e não uma realidade biológica. A autora expõe que a construção de raça como uma maneira de categorizar as pessoas tem uma longa história que ilustra como essa palavra tem sido usada para interpretar as diferenças humanas e justificar arranjos socioeconômicos que beneficiam os brancos e marginalizam os negros. Dessarte, para a autora, o termo “raça” impacta a vida das pessoas, psicológica e materialmente, de forma consequente e duradoura.

Bell (1997) menciona a importância de repensar as maneiras pelas quais o racismo é construído e reconstruído em diferentes períodos e contextos. Por meio da história, advoga que se pode entender como o racismo opera e criar alternativas e ferramentas importantes que interrompam e modifiquem essas relações.

Cavalleiro (2001) identificou oito estratégias para alcançar a educação antirracista em sala de aula. De acordo com a autora, deve-se reconhecer que há um problema racial na sociedade brasileira; refletir continuamente sobre o racismo e suas consequências no cotidiano da vida escolar; enfrentar qualquer atitude discriminatória e preconceituosa na sociedade e na escola; assegurar que as relações interpessoais são respeitosas; não rejeitar a diversidade dentro do ambiente escolar e usar a escola como um ambiente para promover a igualdade e encorajar a participação de todos; ensinar às crianças e aos adolescentes uma história crítica sobre os diferentes grupos que constituem a história brasileira; procurar materiais que contribuam com a extinção do eurocentrismo do currículo das escolas e que contemplem a diversidade racial; pensar na educação voltada para o reconhecimento da diversidade racial e sugerir ações que encorajem a autoconscientização dos alunos pertencentes a grupos discriminados.

Para Ferreira (2012), a prática do professor em referidas questões é muito relevante, pois, à medida que discutem sobre os temas, sentem-se desafiados. Para a mesma autora, seria necessário mais tempo a fim de preparar os professores para discussões como essa que aqui se realiza, pois muitos ainda evitam temas como o racismo por falta de preparo e melhor entendimento acerca do assunto.

Na próxima seção, apresentamos a perspectiva do web currículo.

2.3 Materiais didáticos na perspectiva do web currículo e os protótipos

Almeida (2014) caracteriza o web currículo como uma articulação, e não como uma justaposição de conteúdo. A autora argumenta que o web currículo não aborda somente o uso casual da tecnologia, mas também sua utilização de forma integrada às atividades em sala de aula. Pelas tecnologias digitais de informação, trabalho colaborativo e principalmente do protagonismo de todos os envolvidos, a mesma autora descreve o web currículo como uma integração entre o currículo estabelecido e as experiências já vivenciadas pelos próprios alunos. Nas palavras da autora, o web currículo:

Implica a incorporação das principais características desse meio digital no desenvolvimento do currículo. Isto é, implica apropriar-se dessas tecnologias em prol da interação, do trabalho colaborativo e do protagonismo entre todas as pessoas para o desenvolvimento do currículo. É uma integração entre o que está no documento prescrito e previsto [currículo estabelecido] com uma intencionalidade de propiciar o aprendizado de conhecimentos científicos com base naquilo que o estudante já traz de sua experiência (ALMEIDA, 2014, p. 1-2).

Pela mesma perspectiva, Rojo (2017b) afirma que os multiletramentos não podem ser considerados meros designs digitais, mas podem ser reconhecidos e analisados criticamente e, a partir disso, chegar ao redesign, que se refere “a uma produção que se apropria do disponível conhecido para criar sentidos transformados e transformadores” (ROJO, 2017b, p.10). Rojo e Moura (2012) propõem, pela obra Multiletramentos na escola, atividades de leitura crítica, análise e produção de textos com base no uso de novas tecnologias digitais. Portanto, os autores apontam que a pedagogia dos multiletramentos inclui “a grande variedade de culturas já presentes nas salas de aulas de um mundo globalizado” (ROJO; MOURA, 2012, p. 12).

Nesse sentido, Rojo (2017a) apresenta a alternativa de um material didático embasado no conceito de web currículo e na pedagogia de multiletramentos: os protótipos. De acordo com a autora, os protótipos são caracterizados como “materiais digitais navegáveis e flexíveis” (ROJO; MOURA, 2016, p. 19). Nesse modelo de material didático, o professor é capaz de preencher, modificar ou inserir conteúdos que possam atender suas demandas específicas dentro da sala de aula. Nas palavras de Rojo (2017a, p.18):

Um protótipo, em resumo, é um material navegável e interativo como explicado acima, mas com um discurso autoral/professoral que conduza os alunos a um trabalho digital aberto, investigativo e colaborativo, mediado pelo professor, e que abra a esse professor possibilidades de escolha de acervos alternativos ao acervo principal da proposta didática, de maneira a poder acompanhar o trabalho colaborativo dos alunos.

Assim, definidos como “esqueletos”, os protótipos são preenchidos e modificados de acordo com as particularidades do contexto identificadas pelo professor (ROJO; MOURA, 2016, p. 26). Rojo e Moura (2016, p. 26) consideram os protótipos como “uma solução intermediária entre as sequências didáticas e o professor produzir seus próprios materiais”. Os protótipos de ensino, de acordo com as autoras, diferenciam-se dos materiais didáticos disponíveis como a sequência didática (SD) e os objetos digitais (OD). Para elas, apesar de possuírem características similares a uma sequência didática, os protótipos são diferenciados por sua “arquitetônica vazada” (ROJO; MOURA, 2016, p. 19), podendo ser preenchida ou modificada pelo professor de acordo com as especificidades do contexto.

Os protótipos também se distinguem dos livros didáticos digitais interativos (LDDI). Rojo (2017a) descreve os LDDI como livros didáticos digitalizados que possuem diferentes mídias (vídeos, imagens estáticas ou em movimento, áudios, gráficos, infográficos, objetos 3D etc.) integradas como parte dos textos e atividades do próprio livro, não podendo ser alteradas. Em face das características dos LDDIs, Marsaro-Pavan (2017) aponta que é possível produzir livros digitais interativos, hipermidiáticos, multissemióticos e navegáveis levando em conta somente o discurso autoral/professoral, assim como um livro didático tradicional.

Considerando os materiais didáticos e o cenário atual do ensino de línguas, Lemke (2010) acredita que existe um grande paradigma entre a aprendizagem curricular e a aprendizagem interativa. Nesse mesmo sentido, Rojo (2012) defende a perspectiva dos multiletramentos na área de ensino de línguas, pois, atualmente, estamos vivenciando tempos de mudanças relacionadas não só a hábitos e valores, mas também ao modo como interagimos com o mundo (COPE; KALANTZIS, 2006).

Em razão dessas mudanças, autores têm sugerido a pedagogia de multiletramentos. Cope e Kalantzis (2006) definem esse termo como “a pedagogia do design”, por estar relacionada a todos os designs digitais disponíveis que podem ser utilizados (textos, vídeos, imagens, infográficos, games, aplicativos etc.). Para esses autores, a pedagogia dos multiletramentos busca representar a linguagem por meio de múltiplos canais de comunicação existentes, uma vez que tais autores acreditam que a escola deveria formar cidadãos flexíveis, capazes de se adaptarem às mudanças e que tenham uma postura ética com relação à diversidade.

3 METODOLOGIA

Nesta seção, explicitamos a metodologia do produto educacional, o qual foi elaborado com base na metodologia de desenvolvimento, pautada pelo design educacional (FILATRO; PICONEZ, 2007) e pelas fases da produção de um material didático, de acordo com Leffa (2003). Filatro e Piconez (2007) caracterizam o design educacional como uma série de etapas a fim de planejar, implementar e avaliar o produto educacional em desenvolvimento: análise; design; desenvolvimento; implementação; e avaliação. Pela mesma perspectiva, Leffa (2003) ressalta quatro fases essenciais para o desenvolvimento de um material didático: análise; desenvolvimento; implementação; e avaliação. Conforme os autores supramencionados, a fase de análise está relacionada a uma investigação de contexto, ou seja, à realização de um diagnóstico das necessidades educacionais encontradas. A participação no projeto de pesquisa “Transformando professores de inglês: uma proposta colaborativa de um material didático para a formação inicial de professores”,1 coordenado pela segunda autora, foi precursora no desenvolvimento do protótipo: pela definição dos objetivos e das características do material didático, estabelecido por formadores de professores de língua inglesa, elencamos as principais características do material desejadas para o contexto.

Assim, os primeiros encontros do grupo do projeto mapearam os princípios que guiaram a proposta do material e discutiram as necessidades do contexto de acordo com esses formadores. Por sua vez, a fase de design caracteriza-se pelo planejamento educacional por meio do levantamento de dados e de uma proposta de solução ideal. Nessa fase, realizamos o mapeamento de artigos, teses e dissertações sobre a área do ensino de línguas na perspectiva da justiça social, decidindo-nos pelos temas a esta ligados mais relevantes ao contexto dos professores em formação docente inicial da universidade. A fase do desenvolvimento, também citada por Leffa (2003), é distinguida pela criação do produto de acordo com o planejamento educacional. Aqui, foram preparadas as atividades do protótipo a fim de proporcionarem oportunidades de desenvolvimento das habilidades linguísticas, habilidades de letramento digital e reflexão do tema na perspectiva de justiça social. Portanto, pela identificação das necessidades do contexto, foram planejadas e desenvolvidas atividades com o objetivo de discutir os temas transversais relacionados à justiça social pelo uso de ferramentas tecnológicas.

A fase quatro, exposta por Filatro e Piconez (2007) e também mencionada por Leffa (2003), refere-se a implementação e aplicação do produto em ambiente adequado. Portanto, a pilotagem da primeira parte do protótipo desenvolvido ocorreu em um curso de formação de professores de Inglês de uma universidade estadual. O protótipo foi pilotado em duas turmas de um curso de Letras, cujo resultado pode ser verificado em Zancopé (2020). Por fim, a quinta fase da metodologia do design educacional de Filatro e Piconez (2007) propõe uma nova análise, também denominada por Leffa (2003) de avaliação, na qual a avaliação dos progressos conquistados e a efetividade da proposta educacional são postas à prova. Assim, por meio de questionário e observação de campo, foi possível avaliar o protótipo pelo ponto de vista dos professores em formação e do professor formador. Na próxima seção, apresentamos o protótipo produzido e o analisamos de acordo com o referencial da justiça social.

4 O PROTÓTIPO TEACHING ENGLISH TO TEACHERS

Nesta seção, apresentamos o protótipo produzido, na tentativa de demonstrar como os princípios de justiça social foram desenvolvidos em um material para o ensino de línguas na formação inicial de professores.

O Teaching English to Teachers trata-se de um protótipo para as aulas de língua inglesa para a formação inicial de professores de Inglês pela perspectiva da justiça social. Mediante diferentes atividades que contemplem as quatro habilidades do aprendizado de língua inglesa, além de desenvolver ferramentas crítico-analíticas pela perspectiva da justiça social para o trabalho com o racismo nas aulas de língua inglesa, um dos objetivos desse protótipo é promover possibilidades de desenvolvimento do letramento digital de professores de língua inglesa em formação inicial e potencializar a competência linguística, com as práticas pedagógicas e o uso de recursos digitais tecnológicos, no intuito de ampliar a vivência e a experiência na área acerca do tema racismo.

Assim, o material, apresentado em formato de protótipo,2 enfatiza o uso de ferramentas tecnológicas no processo ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras/adicionais, abordando diversas ferramentas tecnológicas de ensino que permitem que os professores em formação docente inicial possam preparar atividades que ressaltem o uso da língua como prática social, por meio do desenvolvimento do letramento digital nas aulas de língua inglesa.

O formato de protótipo permite que as unidades não sejam “fixas”, ou seja, como o material é editável, professores que desejam utilizar a unidade podem colaborar, recriar, refazer e adaptar as propostas (inclusive os enunciados) de acordo com o contexto em que atuam. Assim, por ter uma “arquitetônica vazada” (ROJO, 2017a), está materializado em um formato que propicia que o aluno o utilize no celular, responda no próprio celular e acesse múltiplos recursos semióticos. Caso o professor possua o Adobe Pro, este também pode alterar as instruções, os exercícios ou qualquer outra coisa que julgue necessário, complementando-o com links e sugestões disponíveis. Dessa maneira, o professor que usa o protótipo tem a possibilidade de coautoria.

O referencial teórico adotado na elaboração desse produto educacional, conforme explicitado na seção anterior, está relacionado ao ensino de línguas pela perspectiva da justiça social, no conceito de material didático na perspectiva do web currículo (ALMEIDA, 2014) e dos protótipos (ROJO, 2017a).

O protótipo também tem por base o pós-método (KUMARAVADIVELU, 2003) e seus parâmetros tridimensionais: particularidade, praticidade e possibilidade. Por meio de macro e microestratégias, o pós-método traz princípios derivados do contexto histórico, político e social dos aprendizes. Para Kumaravadivelu (2003), mediante as condições proporcionadas pelo pós-método de autonomia de professores e alunos e a relação estreita entre teoria e prática, optamos por utilizá-lo como base para a criação desse protótipo.

Com relação à justiça social, o pós-método enfatiza o uso da realidade do contexto social dos aprendizes, como situações que possam propor constantes questionamentos de suas próprias ideologias. Outro embasamento teórico para a construção desse protótipo é a linguagem como prática social. Também é objetivo desse protótipo a produção de atividades em sala de aula permeando tanto o contexto local como o global dos professores em formação. Mediante atividades que envolvam temas transversais e sejam permeadas nos embasamentos de letramento digital, os professores em formação inicial deverão aprender a estrutura da língua, relacionando-a com temas transversais e discussões dificilmente realizadas no contexto real, atualmente.

Para iniciar um tema transversal nesse protótipo, foram abordadas diferentes opiniões e concepções sobre o assunto. Primeiramente, foi trabalhado o conhecimento prévio dos professores sobre o tópico. Posteriormente, tiveram acesso a vídeos, reportagens, entrevistas e relatos relacionados ao tema, proporcionando engajamento em situações reais. Depois de leituras e informações, os professores em formação expressaram seus conhecimentos acerca do assunto e quais as respectivas opiniões iniciais a respeito do tema. Uma atividade de vocabulários trabalhados nos vídeos ou nos textos foi realizada para a compreensão de expressões citadas. Para a atividade de discussão, os professores foram apresentados a estruturas e expressões úteis para concordar ou discordar das ideias e opiniões expostas pelo grupo.

Pela abordagem de alguns referenciais teóricos, os professores iniciaram suas produções permeadas por ferramentas e recursos tecnológicos disponíveis, muitas vezes utilizados apenas para distrações do dia a dia, sem a reflexão de seu uso no processo ensino-aprendizagem, por exemplo, as redes sociais. Ao final de cada tema trabalhado, os professores em formação inicial criaram suas próprias atividades didáticas voltadas à inserção dos temas transversais no ensino de línguas. Abaixo, apresentamos como o protótipo está organizado, enfatizando cada seção do material e seu objetivo:

Quadro 1 Seções do material 

SEÇÃO DO MATERIAL OBJETIVO
Getting Started Nesta seção, o tópico da unidade é apresentado. Esta seção tem o objetivo de criar um ambiente receptivo e inclusivo na sala de aula. O professor formador deve dar instruções claras sobre como serão as atividades da unidade. As atividades, nesta seção, devem promover a troca de experiências a respeito do tópico e discussões acerca do conhecimento prévio dos participantes e seus diferentes pontos de vista.
Interaction Content Nesta seção, as atividades trabalhadas devem relacionar o cotidiano dos participantes com o tópico discutido. Por meio de atividades de compreensão oral, devem promover a reflexão crítica sobre suas próprias práticas na sociedade, com conteúdo que conecte suas próprias vivências, promovendo a percepção sobre os sistemas de vantagem e desvantagens.
To the point O objetivo desta seção é trabalhar a compreensão escrita e a aquisição de vocabulários relacionados ao tópico.
Let’s Reflect: Fair Balance O objetivo desta seção é apresentar diferentes pontos de vista sobre o tópico trabalhado por meio de atividades de compreensão oral e novos vocabulários referentes ao assunto. Nesta seção, os participantes deverão expressar seus próprios pontos de vista, utilizando expressões úteis apresentadas no material. Os debates têm o objetivo de desenvolver a produção oral dos participantes.
It’s your turn O objetivo desta seção é desenvolver as habilidades de produção escrita dos participantes por meio do compartilhamento de seus pontos de vista. As atividades visam à expressão de opiniões escritas, utilizando vocabulário e expressões linguísticas previamente adquiridos.
As a Teacher-citizen O objetivo desta seção é promover reflexão acerca do tópico e relacionar o assunto às práticas docentes. Abordar autores e textos acadêmicos sobre o tópico e proporcionar momentos de criação de atividades didáticas.
As a Citizen-teacher O objetivo desta seção é inserir o participante em um agir maior na sociedade. Propor a participação dos participantes na mudança social. Participar de grupos e movimentos para que possam agir globalmente.
Self-assessment O objetivo desta seção é autoavaliar a aquisição do conteúdo trabalhado. Reflexão sobre as capacidades adquiridas após as seções trabalhadas.

Fonte: as autoras.

As seções delineadas no Quadro 1 foram pensadas de acordo com os objetivos do material. O protótipo foi apresentado em formato digital3 podendo ser usado em celular ou computador, sem alteração de formato. Ademais, permite que o aluno responda no próprio material e que professores adéquem as instruções, se necessário.

O material foi implementado em um curso de Letras-Inglês, na modalidade digital. Foi adotada a perspectiva do Bring your own device (BYOD)4 ou, em português, traga seu próprio aparelho, que permite que o protótipo seja utilizado por contextos diferenciados que nem sempre possuem recursos tecnológicos à disposição. No caso da universidade em que o implementamos e em conversa com outros formadores de outras universidades, verificamos que, geralmente, os alunos em sala têm aparelho celular. A implementação ocorreu com professores em formação do 1.º ano do curso, durante cinco aulas de 1h45min cada, na disciplina de Língua Inglesa 1.

Considerando os princípios pedagógicos da PJS abordada por Adams e Bell (2016), a maneira como as atividades começam é o que dá o “tom” às aulas e às experiências de aprendizado. A PJS presta atenção especial em quão inclusivas serão as atividades e como os participantes serão recebidos e engajados. Segundo Adams e Bell (2016), a primeira atividade que os participantes realizam expressa suas impressões iniciais sobre o tópico e demonstra o nível de conforto que trabalharão com a proposta.

Adams e Bell (2016) também argumentam que o modo de introduzir a perspectiva aos participantes é uma etapa essencial e devemos engajá-los imediatamente, de maneira informal, com o objetivo de trocarem experiências e descobrirem similaridades e diferenças entre si. Como as atividades voltadas à PJS são experienciais, enfatizam e promovem o respeito mútuo, a discussão de diferentes pontos de vista e a participação de todos é essencial. Para a autora, nesse momento inicial, os participantes devem saber o que esperar de uma abordagem da PJS. No Quadro 2, apresentamos esses princípios e indicamos a seção do material em que esse princípio foi desenvolvido.

Quadro 2 Princípios do protótipo 

PRINCÍPIOS AUTOR PROTÓTIPO TEACHING ENGLISH TO TEACHERS EVIDÊNCIAS
Apresenta ferramentas críticas e analíticas necessárias para o entendimento da opressão e sua própria socialização dentro de grupos opressores. BELL (1997) Seção Getting Started, task 5, p. 2 Entender as diferenças entre os conceitos: estereótipo, preconceito, racismo, discriminação e discutir sobre eles
Envolve igualmente todos os grupos da sociedade e desenvolve o senso de agência e a capacidade de interromper padrões e comportamentos opressores em si mesmos. BELL (1997) Seção Interaction Content, task 2, p. 7 Discussão sobre quais estereótipos e preconceitos carregamos sobre diferentes grupos em decisões ou atitudes do dia a dia.
Propõe uma educação problematizante e participante por meio da conscientização crítica, a fim de concretizar um movimento de liberdade. FREIRE (1974) Todas as seções Pesquisas, discussões e compartilhamento de informações referentes ao privilégio branco, leitura sobre educação antirracista, conhecimento e participação no movimento Black Lives Matter at School.
Facilita a compreensão das forças opressoras na sociedade e como as múltiplas ideologias são sócio-historicamente construídas FREIRE (1974) Seção To the point, task 2, p. 9 Discussão sobre a definição do termo “racismo”, criação de uma nova definição e troca de experiências.
Conscientiza e critica a realidade, a fim de transformação. FREIRE (1974) Seção Interaction Content, task 1, p. 6 Discussão sobre situações de estereótipo, preconceito e racismo por meio de um vídeo de situações cotidianas.
Analisa a prática e reflete sobre os objetivos de aprendizagem. ADAMS E BELL (2016) Seção As a Teacher-citizen, tasks 1 e 2, p. 16 Discussão sobre educação antirracista, por meio de um texto acadêmico.
Posiciona os alunos a serem o centro do processo de aprendizagem. ADAMS E BELL (2016) Todas as seções Atuação ativa dos participantes, mediante discussões, diferentes opiniões e experiências vividas
Realiza uma contextualização histórica e aborda situações reais. HACKMAN (2005) Seções Getting Started, p. 2; Interaction Content, p. 6; To the Point, p. 8 Situações de estereótipo, preconceito e racismo. Explorar imagens históricas e relacionar aos conceitos.
Propõem questionamento a ideologias dominantes e o que geralmente é apresentado pela mídia e pelos livros didáticos. HACKMAN (2005) Seções It’s your turn, p. 15; As a Citizen, p. 17 Criação e participação de um fórum de discussão sobre privilégio branco e conhecimento e participação do movimento Black Lives Matter e Black Lives Matter at School.
Proporciona discussões e contato com diferentes pontos de vista. HACKMAN (2005) Seção Let’s Reflect, task 4, p. 14 Discussão e troca de diferentes opiniões sobre os assuntos discutidos.
Conecta os conteúdos trabalhados em sala a questões maiores da sociedade, criando democracia e empoderamento na sala de aula. HACKMAN (2005) Seção As a Citizen, tasks 1 e 2, p. 17 Conexão entre os movimentos Black Lives Matter, Black Lives Matter at School e a sala de aula.
Pensa globalmente e age localmente. HACKMAN (2005) Seção As a Citizen, tasks 2 e 3, p. 17-18 Participar do movimento Black Lives Matter at School.
Desafia e questiona temas significativos da opressão, proporcionando expansão de ideias e questionamentos sobre os respectivos efeitos na sociedade. HACKMAN (2005) Seções Getting Started, task 5, p. 5; Interaction Content, task 2, p. 7 Definição sobre os conceitos: estereótipo, racismo, preconceito e discriminação.
Ensina ferramentas que promovam a oportunidade de agir socialmente. HACKMAN (2005) Seção As a Teacher, task 1, p. 16 Utiliza as plataformas digitais para realização das atividades e motiva seu uso no processo ensino-aprendizagem.
Conscientiza sobre os direitos como cidadão e participação na sociedade. HACKMAN (2005) Seções As a Teacher, task 1, p. 16; As a Citizen, tasks 1 e 2, p. 17 Discussão sobre os princípios da educação antirracista e o movimento Black Lives Matter.
Contribui para a diminuição das desigualdades existentes entre as crianças das classes baixa, média e alta nos sistemas escolares. ZEICHNER (2008) Seção As a Citizen, task 2, p. 17 Conhecimento e participação no movimento Black Lives at School.
Disponibiliza as ferramentas necessárias para que as comunidades estejam engajadas na real mudança social. ZEICHNER (2008) Seção As a Citizen, tasks 2 e 3, p. 17-18 Conhecimento e participação no movimento Black Lives at School.
Propõe reflexão sobre a manipulação propiciada pelos grupos opressores. SANTOS (2018) Seção Getting Started, task 5, p. 5 Discussão e relação dos conceitos trabalhados e as imagens da atividade.
Discute como se opera a opressão nos indivíduos cultural, institucional e historicamente. BELL (1997) Seções Getting Started, task 5, p. 5; Interaction Content, task 1 p. 6 Entender os conceitos: estereótipo, preconceito, racismo e discriminação. Discussão sobre situações cotidianas relacionadas aos conceitos.
Promove a igualdade e encoraja a participação de todos. FERREIRA (2012) Seção To the Point, task 6, p. 11 Contribuição na plataforma Padlet sobre a expressão “Privilégio Branco”.
Considera as individualidades e os objetivos de aprendizagem de língua estrangeira dos participantes. KUMARAVADIVELU (2003) Todas as seções Uso da língua inglesa para a execução das atividades.
Compreende, identifica, analisa e considera diferentes alternativas para a solução de uma questão. KUMARAVADIVELU (2003) Seção Getting Started, task 3, p. 3 Discussão sobre os diferentes conceitos: estereótipo, discriminação, preconceito e racismo e os diferentes pontos de vista existentes.
Propõe questionamentos constantes sobre as próprias ideologias dos participantes. KUMARAVADIVELU (2003) Todas as seções Pensamento crítico sobre ações cotidianas e experiências vividas com relação aos conceitos trabalhados.
Promove o trabalho colaborativo e enfatiza o protagonismo de todos os envolvidos, por meio da integração entre o currículo estabelecido e as experiências já vivenciadas pelos participantes. ALMEIDA (2014) Seção It’s your turn, task 1, p. 5 Criação e participação ativa em um fórum de discussão sobre os conceitos trabalhados.
Apropria-se das tecnologias em prol da interação, colaboração e protagonismo dos participantes. ALMEIDA (2014) Todas as seções Uso das ferramentas digitais - Kahoot, Canva, Quizlet e Padlet - para a realização das atividades.
Propõe um trabalho digital aberto, investigativo e colaborativo e pode ser preenchido ou modificado, a fim de que possa atender a demandas específicas dos participantes. ROJO (2017a) Todas as seções Formato protótipo (PDF, interativo e colaborativo), que permite a adaptação para atender demandas específicas dos alunos.
Relaciona as questões sociais atuais dos contextos dos participantes. Princípios projeto Seção As a Citizen, task 1, p. 17 Discussão sobre o movimento Black Lives Matter.
Usa tecnologias no processo de aprendizagem de línguas estrangeiras. Princípios projeto Seções Getting Started, task 2, p. 2; To the Point, task 4, p. 10; To the Point, task 6, p. 11; As a Teacher, task 1, p. 16 Uso das ferramentas digitais - Kahoot, Canva, Quizlet e Padlet - e suas utilidades no processo ensino-aprendizagem.
Considera as implicações do estatuto do inglês como língua franca. Princípios projeto Seção Interaction Content, task 1, p. 6; Let’s Reflect, task 2, p. 12 Diferentes variações da língua inglesa nos vídeos trabalhados
Promove prática de sala de aula sempre ao final de cada unidade. Princípios projeto Seção As a Teacher, task 2, p. 16 Criação de uma atividade que englobe a educação antirracista e uma ferramenta tecnológica trabalhada.
Organiza o currículo com base na prática social e no “agir”. Princípios projeto Seção As a Citizen, tasks 1, 2 e 3, p. 17-19 Conhecer e participar do movimento Black Lives Matter at School.

Fonte: as autoras.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo, propusemo-nos a apresentar e analisar um protótipo (Teaching English to Teachers) para as aulas de línguas do curso de Letras-Inglês, com base nos princípios da PJS. O objetivo das atividades do protótipo foi proporcionar oportunidade de desenvolvimento de habilidades linguísticas, habilidades de letramento digital e conscientização do tema racismo pela PJS. Ao produzir um protótipo com esse fim e investigar os princípios contemplados no material, ressaltamos que ele apresenta ferramentas críticas e analíticas necessárias para o entendimento da opressão e que sua própria socialização dentro de grupos opressores envolve igualmente todos os grupos da sociedade e desenvolve o senso de agência e a capacidade de interromper padrões e comportamentos opressores em si mesmos. Ao mesmo tempo, propõe uma educação problematizante e participante, mediante a conscientização crítica, a fim de concretizar um movimento de liberdade; facilita a compreensão das forças opressoras na sociedade e de como as múltiplas ideologias são sócio-historicamente construídas; também conscientiza e critica a realidade, buscando fomentar a transformação. As análises efetuadas também demonstraram que o protótipo posiciona os alunos como o centro do processo de aprendizagem, rejeita o ensino como mera transmissão de conhecimento e desenvolve possibilidades para a tomada de decisões cotidianas por realizar uma contextualização histórica e abordar situações reais. Ainda, propõe o questionamento às ideologias dominantes e o que geralmente é apresentado pela mídia, proporciona discussões e o contato com diferentes pontos de vista e conecta os conteúdos trabalhados em sala a questões maiores da sociedade, criando democracia e empoderamento na sala de aula.

Além disso, tem potencial para ajudar o aluno (futuro professor) a pensar globalmente e agir localmente; para desafiar e questionar temas significativos da opressão, proporcionando expansão de ideias e questionamentos acerca dos respectivos efeitos na sociedade; e para ensinar ferramentas linguísticas que promovam a oportunidade de agir socialmente. Essas possibilidades podem contribuir para a conscientização dos direitos como cidadão e participação na sociedade e para a diminuição das desigualdades existentes entre as crianças das classes baixa, média e alta nos sistemas escolares, ao disponibilizar as ferramentas necessárias para que as comunidades estejam engajadas na real mudança social.

Com base nos resultados encontrados, concluímos que protótipos pensados a partir da PJS e do pós-método para as aulas de língua inglesa têm o potencial de propiciar práticas pedagógicas que contribuem para a construção de identidade docente com princípios ético-cidadãos. Essa nossa proposta coaduna-se com a perspectiva do pós-método, na qual professores se engajam na produção de materiais e se colocam na posição de autor. A condição pós-método tem como um de seus fundamentos a autonomia do professor, que passa a ser autor de sua própria prática e produtor de um conteúdo adequado ao contexto em que está inserido. Em nosso caso, somos formadoras pensando suas práticas em sala de aula. Kumaravadivelu (1994, p. 27) define a era do pós-método como um período em que se reconhece que não há métodos, pois as relações entre teoria e prática são reconfiguradas, empoderando, assim, os professores com relação a conhecimentos, habilidades e autonomia. Portanto, os professores podem conceber uma alternativa sistemática, coerente e relevante ao método.

REFERÊNCIAS

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NOTAS:

1 Este projeto propõe protótipos colaborativos para o ensino de línguas na formação inicial de professores. A proposta que aqui apresentamos refere-se a um dos materiais elaborados. Uma versão preliminar deste texto foi publicada na coletânea de TCCs do Mestrado Profissional em Letras Estrangeiras Modernas. Outras pesquisas têm investigado as affordances do material (EL KADRI; ZANCOPÉ, submetido).

2 Material disponível em: https://meplem.com.br/thaisa_zancope/.

3 Material disponível em: https://meplem.com.br/thaisa_zancope.

4Bring your own device (BYOD) descreve uma política adotada por empresas e espaços educacionais que dá a funcionários, alunos e professores a oportunidade de utilizar seus próprios aparelhos para acessar dados e informações da companhia em seu local de trabalho e/ou estudo. O uso do BYOD ganhou força principalmente diante do fato de que a maioria das pessoas usa equipamentos mais modernos. Alunos em escolas e universidades exigem o acesso ao conhecimento como e quando dele necessitam, em qualquer momento e em qualquer lugar, e empregando a tecnologia com a qual já estão familiarizados, ou seja, é o aluno quem cria seu espaço tecnológico de aprendizagem e exige da instituição educativa que adapte suas plataformas a esse espaço. Consequentemente, tornou-se também uma prática mais corriqueira em espaços educacionais.

Recebido: 30 de Junho de 2020; Aceito: 05 de Maio de 2021

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