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Revista e-Curriculum

On-line version ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.20 no.3 São Paulo July/Sept 2022  Epub Jan 02, 2023

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2022v20i3p950-955 

Editorial

Edição 20 (3) julho/setembro 2022

Maria Elizabeth Bianconcini de ALMEIDAi 
http://orcid.org/0000-0001-5793-2878

Marina Graziela FELDMANNii 
http://orcid.org/0000-0003-3008-2636

i Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP, Brasil. E-mail: bbethalmeida@gmail.com

ii Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP, Brasil. E-mail: feldmnn@uol.com.br


O volume 20, de número 3, da Revista e-Curriculum é lançado em meio às incertezas, aos temores e aos riscos provenientes da campanha eleitoral majoritária em andamento, perpassada por ataques à democracia, desrespeito à diversidade étnico-cultural, manifestações políticas violentas, ameaças de golpe, desmoralização das instituições e hostilidade à imprensa.

Nesse contexto hostil e intimidante, a Revista e-Curriculum mantém seu compromisso com a defesa da democracia, do diálogo intercultural e da tolerância, em busca de alternativas para a constituição da paz, da vida solidária, da justiça social e curricular, a favor da retomada do investimento na educação, na cultura e na produção da ciência.

Congruente com essa posição, a edição corrente oferece às leitoras e aos leitores um conjunto de artigos submetidos via demanda espontânea e analisados rigorosamente por pareceristas, que testemunham o distanciamento de uma visão educacional neutra, na qual as questões são investigadas segundo uma abordagem apartada do cenário político cultural, que afeta drasticamente a educação. Em contraposição a essa visão, os artigos da presente edição mostram-se banhados pelo lugar educacional, social e cultural que analisam, assumem diferentes metodologias, dialogam com conceitos pertinentes ao problema estudado, adensam e ampliam as inter-relações do currículo com as múltiplas culturas, seus instrumentos e seus signos, oferecendo relevantes referências para outras pesquisas e novas experiências, conforme retratado a seguir.

O retrato da produção científica sobre a diversidade cultural no contexto acadêmico educacional em Moçambique é realizado por Rosalino Subtil Chicote e Geraldo Vernijo Deixa, ao investigarem três revistas moçambicanas de Educação. Por meio do estado de conhecimento, os autores identificam quatro artigos que versam sobre a temática, dentre 349 artigos analisados. Os artigos apresentam uma sincronia com relação à diversidade cultural, mas também quanto aos aspectos teóricos e metodológicos. Os autores concluem que a temática possui uma imagem distante nas revistas e sugerem o incremento de pesquisas sobre diversidade cultural, a fim de que sejam asseguradas mudanças na Educação moçambicana.

O artigo de Ana Paula Schneider e Juracy Machado Pacífico pauta-se pela investigação da realidade de uma escola no interior da região Amazônica. Tece reflexões sobre as ações pedagógicas desenvolvidas pela instituição com vistas ao planejamento de práticas pedagógicas diferenciadas e integradoras aos estudantes indígenas na escola urbana. Por meio da metodologia da pesquisa-ação, as autoras estabeleceram uma intervenção na realidade. Elas apontam, como resultados, que a educação ideal para os estudantes indígenas em contexto urbano ainda está em construção, marcada pela ausência de conhecimentos em relação à educação decolonial e intercultural e à necessidade de trabalhar a Lei Nº 11.645, de 10 março de 2008.

Neusete Machado Rigo apresenta um estudo sobre o discurso da inclusão em documentos orientadores dos processos de inclusão escolar. A autora analisa como a valorização das diferenças e da diversidade compõe enunciados que atravessam os documentos e afetam os currículos escolares. Ela utiliza a análise documental e tem como referencial os estudos de Michel Foucault. Os documentos indicam uma perspectiva pelo direito à educação e coadunam, também, com os interesses do neoliberalismo contemporâneo ao fazer da inclusão uma estratégia para incluir os sujeitos nos jogos do mercado. A autora conclui que é necessário aos sistemas de ensino a incorporação em seus currículos da perspectiva da diferença.

Ao problematizar o ensino da Capoeira na escola como Patrimônio Cultural Imaterial, Bruno Otávio de Lacerda Abrahão, Maria Larissy da Cruz Parente e Alexsandro Gonzaga Rodrigues observaram uma desarticulação entre o reconhecimento de um patrimônio cultural com as políticas educacionais no Brasil. Isso ocorre mesmo com a sanção de leis que amparam o ensino da Capoeira na escola, como a Lei Nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). As conclusões informam que o ensino da Capoeira e o conhecimento sobre sua relação histórica com o Brasil deveriam ser amplamente abordados nas escolas brasileiras, principalmente no âmbito da Educação Física escolar.

O estudo de Regina Maria Ferreira da Silva Lima e Maria Aparecida Pereira Viana reflete sobre a mudança de paradigma educacional, a fim de se incorporar o currículo digital e as tecnologias à educação. Por meio da pesquisa explicativa e do método bibliográfico, os resultados obtidos apontam para a viabilidade de institucionalizar-se, nas universidades, o modelo de ecossistemas digitais de aprendizagem, utilizando-se do ensino híbrido, viabilizando a educação personalizada, o respeito às diferenças culturais e a consolidação do currículo digital.

A forma como as redes sociais são utilizadas por docentes, em perspectiva educativa, é o foco do trabalho de Eliane Nataline Santos e Simone Silveira Amorim. Elas promovem uma discussão analítica de cunho étnico racial a partir de imagens postadas no Facebook. A autoras utilizam o quadro de sistematização da percepção da imagem de Amorim e Kress em perspectiva crítica e, com base nos autores étnico-raciais, discutem o racismo que está imbricado no sistema educacional e que funciona como fator de exclusão social. As pesquisadoras alertam, ainda, para a importância das ações afirmativas como essenciais para a quebra da hegemonia e da monocultura das narrativas históricas.

Ao relatar o processo investigativo da construção e do desenvolvimento coletivo de uma Proposta Curricular para a Educação Básica em uma escola privada do município do Rio de Janeiro entre 2016 e 2019, Kátia Valéria Pereira Gonzaga oferece uma resposta às necessidades apontadas em um diagnóstico inicial que realizou quando assumiu a gestão da escola. O Projeto está assentado na socialização dos desafios colocados por uma nova realidade local e global contemporânea, baseada em conceitos tais como: interdisciplinaridade, cultura maker, pedagogia de projetos, sustentabilidade, metodologias ativas, web currículo, inovação e tecnologia.

O artigo de Raphael de França e Silva e Thema Panerai Alves analisou, por meio do método de estudo de caso, as possibilidades avaliativas e os indícios de consciência histórica, das produções de narrativas digitais em podcast, realizadas durante uma dinâmica de avaliação formadora, na disciplina de História da Educação no Brasil, ministrada a uma turma de Pedagogia. Os resultados obtidos revelaram que a avaliação foi capaz de identificar o desenvolvimento de conceitos substantivos, vislumbrando indícios de consciência histórica nas produções e favorecendo a criação, pelos estudantes, de uma representação narrativa acerca dos contextos históricos estudados.

Patrícia Giuriatti e Nilda Stecanella apresentam estudo sobre os direitos de aprendizagem e desenvolvimento para crianças pequenas no contexto da BNCC. As autoras rastreiam os marcos legais promulgados a partir de 1988, a fim de responder quais são as repercussões teóricas e práticas dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento contemplados nos campos de experiências na escola de Educação Infantil para repensar o ser criança em uma cultura de infância escolarizada. As autoras concluem apontando, como escape às experiências de infância, as seis ações estabelecidas na política curricular para os direitos de aprendizagem e desenvolvimento a serem efetivadas no contexto da escola de Educação Infantil: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se.

Ao investigarem sobre a importância do currículo de filosofia voltado ao ensino de Ética da Libertação direcionado a crianças, Nilda da Silva Pereira e Arnor da Silva Ribeiro abalizam as vivências éticas em uma instituição de Educação Infantil. A autora e o autor destacam os anseios, as vitórias e as dificuldades da proposta, apontando para o desenvolvimento crítico apresentado pelas crianças sobre o cuidado com o “Outro”. Indicam, ainda, que o obstáculo exposto na prática filosófica da escola ocorreu pela ausência de fundamento teórico na área e revelam que o problema foi solucionado, em parte, com a formação apresentada durante a pesquisa na instituição.

Robert Santos do Carmo e Michele de Freitas Faria de Vasconcelos, em seu artigo, lançam mão de uma personagem da literatura infanto-juvenil, o Tistu, do livro intitulado O Menino do Dedo Verde, para questionar as “ideias pré-fabricadas” do currículo escolar com o intuito de levar a pensar e promover uma transgressão metodológica, que desvia do caminho acadêmico, mercadológico, desenvolvimentista e moral. O autor e a autora buscam, dessa forma, “semear uma vida”, “revolvendo as terras” de um currículo e/ou de uma metodologia de pesquisa.

O trabalho de Pollyanna Regina Batista de Souza e Maria Carolina da Silva Caldeira analisa as questões de gênero identificadas a partir de uma pesquisa que investigou um grupo de crianças em uma experiência de educação integral que tem como característica que seus/suas participantes saiam do espaço escolar: o Programa Escola Integrada. Utilizando elementos da etnografia educacional e da análise de discurso foucaultiana, o estudo mostra como normas e ditos de gênero atuam nesse currículo, de maneira a definir e nomear performances como femininas e masculinas e como adequadas ou não à vivência na infância.

Marina Graziela Feldmann, Helga Porto Miranda, Cenilza Pereira Silva e Ana Lúcia Pereira Nunes apresentam uma reflexão a respeito da formação dos profissionais da Educação Infantil. Empregando a pesquisa-formação, as pesquisadoras tomam como ponto de partida o levantamento das necessidades formativas de professores, em uma perspectiva colaborativa, para construírem uma proposta formativa contemplando os anseios, os desafios e as necessidades desses profissionais. As autoras concluem que a formação se configurou como espaço de troca, partilha de experiências, de vivências, de construção de conhecimentos, de respeito das infâncias e da educação infantil.

A análise do currículo escolar e sua relação com novos conhecimentos emerge a partir das noções prévias de currículo coletadas junto aos estudantes de Licenciatura em Pedagogia e Ciências Biológicas pelo estudo de Adriana Fratoni dos Santos, Lucken Bueno Lucas, Marinez Meneghello Passos e Ana Lúcia Pereira. A partir da Análise Textual Discursiva, os resultados apontam para noções de currículo distantes das pesquisas recentes que investigam essa temática, a ideia do currículo como elemento fixo de base e de orientação do trabalho escolar, e a necessidade de melhorar a formação inicial de professores no que diz respeito a aspectos como compreensão, aplicação e flexibilidade dos programas curriculares, mediante uma perspectiva de sensibilidade do ensino frente ao contexto social vivido pela comunidade escolar.

A produção de currículos oficiais no estado do Ceará para a disciplina de Biologia foi investigada por Diego Adaylano Monteiro Rodrigues e Cláudia Christina Bravo e Sá Carneiro. Por meio da Análise Textual Discursiva, o autor e a autora identificaram a participação crescente de professores de escolas públicas na construção dos currículos estaduais. Também foram constatadas omissões e tensões na formulação das propostas, devido a distintos pensamentos curriculares e a relações de poder dos subgrupos que produziram os currículos.

Luiz Gustavo Bonatto Rufino e Samuel de Souza Neto analisam os principais desafios para a inserção de professores de Educação Física no início de carreira. Por meio da Análise de Conteúdo realizada com os dados obtidos nas entrevistas com sete professores formadores de universidades públicas do Estado de São Paulo, os autores concluem haver certo distanciamento entre formação e inserção profissional, incidindo nos professores em início de carreira. Além disso, apontam para a necessidade de políticas de acompanhamento de inserção de professores iniciantes que se apresenta como um desafio para universidades e escolas na atualidade.

A influência das diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) na elaboração da Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação) de 2019 foi investigada por Darlene Novacov Bogatschov, Gesilaine Mucio Ferreira e Jani Alves da Silva Moreira. O resultado expõe uma padronização da formação de professores com base no desenvolvimento de competências intelectuais e comportamentais, no sentido de alcançar a qualidade da educação. Para as autoras, com isso, visa-se sustentar as demandas do capitalismo em sua fase mundializada e financeira, impedindo o alcance da educação como prática social transformadora.

As linhas de descontinuidade observadas nas versões da Base Curricular Nacional com relação ao eixo Análise Linguística são estudadas por Denise Lino de Araujo e Jéssica Rodrigues Silva, por meio de pesquisa documental fundamentada na Linguística Aplicada e no Paradigma Indiciário. A análise comparativa identifica haver um processo de (re)contextualização do ensino de língua que, de modo geral, está vinculado ao paradigma contemporâneo de ensino.

O artigo de Luiz Martins Junior, Rosa Elisabete Militz Wypyczynski Martins e Julice Dias tece reflexões sobre a disciplina de Geografia no Ensino Médio a partir da proposta da BNCC de 2018. Problematiza o conjunto de conceitos, de conteúdos, de habilidades e de competências proposto no texto da BNCC, a qual visa a preparação do estudante para o mercado de trabalho, empobrecendo a sua formação e o seu desenvolvimento integral. O estudo conclui que a Geografia foi um dos componentes curriculares que perderam o caráter científico, além do pedagógico, ao ser tratada de forma reducionista.

O processo de regulamentação dos Grêmios Estudantis desenvolvido nas escolas estaduais paulistas no período entre 2013 e 2015 e a reflexão sobre a participação política e o protagonismo juvenil nas escolas foram estudados por Ricardo Gavioli de Oliveira, Maria Cecília Luiz e Camila Perez Silva. Os dados obtidos por meio de análise documental, questionários e grupos focais revelaram que, embora o trabalho desenvolvido tenha provocado vários tipos de participação nas escolas, o protagonismo juvenil, com ações e decisões coletivas e democráticas, ainda é limitado.

Em síntese, a atualidade e a diversidade dos temas que compõem esta edição da Revista e-Curriculum evidenciam a potência da Revista como referência para o diálogo e o compartilhamento do conhecimento sobre a educação, o currículo e suas relações com a cultura e a sociedade contemporânea.

A equipe editorial da Revista e-Curriculum agradece a dedicação, o rigor e o compromisso ético e estético de autores, pareceristas, equipe técnica editorial, conselho científico e suporte técnico e almeja que esta nova edição possa despertar diferentes modos de fazer e pesquisar educação e currículo em suas distintas dimensões!

Setembro de 2022

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