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Revista e-Curriculum

On-line version ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.20 no.4 São Paulo Oct./Dec 2022  Epub Jan 30, 2023

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2022v20i4p1750-1776 

Artigos

Compreensões de professores de ciências acerca de currículo:um olhar em contexto escolar

Science teacher understandings about curriculum:a look at school context

Entendimientos del profesor de ciencias sobre el currículo:una mirada al contexto escolar

Kelly Karine KREUZi 
http://orcid.org/0000-0003-1354-0607

Fabiane de Andrade LEITEii 
http://orcid.org/0000-0002-4967-233X

i Mestra em Ensino de Ciências - Universidade Federal Fronteira Sul - UFFS - Campus Cerro Largo/RS - Brasil. E-mail: kelly.kkk@hotmail.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-1354-0607.

ii Doutora em Educação nas Ciências. Professora do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências PPGEC - Universidade Federal Fronteira Sul - UFFS - Campus Cerro Largo/RS - Brasil. E-mail: fabianeandradeleite@gmail.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-4967-233X.


Resumo

O presente estudo teve como objetivo identificar compreensões acerca de currículo expressas por professores da área de Ciências da Natureza no Brasil. A pesquisa realizada é do tipo estudo de caso sob natureza qualitativa, em que foram analisados discursos de professores em atividade em uma escola pública do interior do estado do Rio Grande do Sul. Identificou-se as categorias: compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar, compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica e currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva. Destacamos que os professores da área de Ciências da Natureza evidenciam de forma mais recorrente uma compreensão conteudista-crítica. As compreensões indicam que os discursos curriculares se recontextualizam nos espaços escolares e ampliam o distanciamento do que é proposto em orientações curriculares brasileiras e o que é realizado em contexto da Educação Básica.

Palavras-chave: ensino de ciências; educação básica; conteudista-crítico

Abstract

This study aimed to identify understandings about the curriculum expressed by teachers in the field of Natural Sciences in Brazil. The research carried out is of the qualitative case study type, in which the speeches of teachers working in a public school in the interior of the state of Rio Grande do Sul were analyzed. The categories were identified: content-naive understanding of school curriculum, curricular comprehension under the content-critical perspective and school curriculum under a critical-reflexive understanding. We emphasize that teachers in the field of Natural Sciences show a content-critical understanding in a more recurrent way. The understandings indicate that the curricular speeches are recontextualized in the school spaces and increase the distance between what is proposed in Brazilian curricular guidelines and what is carried out in the context of Basic Education.

Keywords: science teaching; basic education; content-critical

Resumen

Este estudio tuvo como objetivo identificar los entendimientos sobre el currículo expresados por los profesores en el campo de las Ciencias Naturales en Brasil. La investigación realizada es del tipo de estudio de caso cualitativo, en el que se analizaron los discursos de los docentes que trabajan en una escuela pública del interior del estado de Rio Grande do Sul. Se identificaron las categorías: comprensión ingenua de contenido del currículo escolar, comprensión curricular desde una perspectiva crítica de contenidos y currículo escolar desde una comprensión crítico-reflexiva. Enfatizamos que los docentes en el campo de las Ciencias Naturales muestran una comprensión crítica de contenido de una manera más recurrente. Los entendimientos indican que los discursos curriculares se recontextualizan en los espacios escolares y aumentan la distancia entre lo propuesto en los lineamientos curriculares brasileños y lo que se realiza en el contexto de la Educación Básica.

Palabras clave: enseñanza de las ciencias; educación básica; contentista crítico

1 INTRODUÇÃO

Este artigo está constituído com base em nosso percurso de pesquisa, focado em explorar pesquisas relacionadas ao currículo escolar, em particular, no cenário contemporâneo em que é apresentada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Nesse sentido, nesta pesquisa, apresentamos uma investigação realizada com o objetivo de identificar compreensões de professores de Ciências, em atividade na Educação Básica, acerca de currículo. Da perspectiva histórica, a partir da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) 9394/96, inúmeras políticas curriculares são alvo de debates no panorama atual e vêm sendo produzidas visando melhorar a Educação Básica brasileira. Sob esse entendimento observamos que diferentes pesquisadores têm investigado o currículo como destaque em políticas educacionais (MOREIRA, 2002; LOPES, 2004; LOPES; MACEDO, 2011).

Frisamos que os estudos produzidos atravessam temáticas alusivas às compreensões curriculares dos professores no ensino de Ciências e, auxiliaram para reconhecermos, em estudos predecessores (KREUZ; LEITE, 2020a), três compreensões relevantes nos discursos de professores, quais são: conteudista-ingênua, conteudista-crítica e crítico-reflexiva. Apontamos que a categoria de compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar é “caracterizada nas pesquisas que indicaram compreensões de professores relacionando currículo com documentos, um artefato construído sem a participação dos professores” (KREUZ; LEITE, 2020a, p. 07). Igualmente, a compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica expõe uma “compreensão de professores relacionando o currículo com uma grade curricular organizada fora da escola, porém com indícios de algum reconhecimento, da relevância da sua participação no processo” (KREUZ; LEITE, 2020a, p. 08). E o currículo escolar, sob uma compreensão crítico-reflexiva,

caracteriza compreensões mais qualificadas de currículo, em que os professores se reconhecem no processo de construção curricular. Nessa compreensão curricular um dos elementos centrais é a reflexão, ao refletir sobre a sua prática, acerca do currículo que está compondo a sua atividade, o currículo vai sendo construído pelo próprio professor, ao se dar conta do que precisa melhorar, do que pode fazer diferente, do que deve adaptar à sua realidade e a de seus alunos (KREUZ; LEITE, 2020a, p. 08).

Por isso, tendo conhecimento de que as proposições, ao longo dos últimos anos, têm sido (re)criadas nos ambientes escolares, inserimos no debate questões que nos desafiam a refletir sobre a maneira como essas modificações curriculares têm acontecido e afetado as compreensões curriculares de professores em exercício. Julgamos o debate necessário considerando a perspectiva atual, em que está ocorrendo a introdução de um novo documento no contexto escolar - a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), concluída e divulgada para a comunidade educacional brasileira em 2017/2018 momento em que despertou múltiplas discussões na seara educacional. Nesse contexto, nos desafiamos a examinar os discursos de professores, que forjam novos significados dentro dos ambientes escolares. Com esse propósito, acreditamos que os documentos curriculares, tais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e a BNCC, são políticas curriculares brasileiras e, assim, podem se mostrar vulneráveis nas áreas em que emergem e se recontextualizam (LOPES, 2005).

Partindo dessas reflexões, identificamos a importância e a contemporaneidade da pesquisa aqui proposta, ao ser produzida em âmbito escolar, levando em consideração as novas proposições curriculares que têm atingido o contexto escolar, a contar de 2019/2020. Sinaliza ser uma oportunidade em que os espaços escolares são permeados por reflexões sobre um novo currículo para as áreas e que o mesmo se encontra no auge das discussões, formando e reformando opiniões e posicionamentos, requerendo atenção por parte de professores e pesquisadores da área.

Estabelecer uma temática de pesquisa envolvendo o currículo escolar constitui um desafio imediato, enquanto temos em nosso País diversos contextos que, resultam em múltiplas interpretações e inquietações de compreensões abstratas de currículo. Essas compreensões têm potencial para representarem obstáculos no modo de entender a política curricular e mesmo a dimensão do próprio currículo na esfera educacional, com base em pesquisas evidenciando a compreensão de currículo dos docentes que demonstram inseguranças na interpretação das políticas (LOPES, 2005). Defendemos que o professor é protagonista de sua prática e, pode, portanto, inventar e reinventar de forma permanente a sua técnica, procurando reduzir a distância entre o contexto local e global, com isso, assumindo-se como autor de seu próprio currículo, identificando-se como integrante dele.

Nessa direção, pensar sobreas construções curriculares em momentos de formação de professores, especialmente, explorar suas elocuções em relação a produção curricular em âmbito escolar, focalizando, nesse contexto o ensino de Ciências, obriga-nos a fazer menção e problematizar, ainda que de forma sutil, as carências e imperfeições das formações envolvendo currículo em todos os níveis. Particularmente, nos preocupa a ausência de oportunidades em que professores e futuros professores possam refletir, julgar e construir seus entendimentos de maneira mais segura e eficiente.

Nesse contexto, esta pesquisa foi direcionada pela seguinte indagação: quais as compreensões de professores de Ciências, em atuação na Educação Básica, acerca de currículo no Brasil? Sob a intenção de encontrarmos argumentos para este questionamento apresentamos considerações de professores, em exercício na Educação Básica, sobre o currículo no ensino de Ciências.

Assim, expomos, a seguir, a metodologia da pesquisa, na sequência os resultados e problematizações evidenciados no decorrer da investigação, seguidos de algumas considerações.

2 CONTEXTO DA PESQUISA E DESDOBRAMENTOS METODOLÓGICOS

O propósito do nosso estudo são professores da área de Ciências da Natureza de uma escola pública da região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. A referida escola serviu de escola piloto no processo de inserção da BNCC e do Novo Ensino Médio, em sua região, sendo esse o motivo de sua escolha. A pesquisa teve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) para a coleta de dados, obtendo autorização para o uso de informações coletadas por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A solicitação foi atendida sob o parecer número 3.552.442.

A organização se deu por intermédio de entrevistas com os professores da área de Ciência da Natureza, num total de seis professores, as quais gravadas, posteriormente, degravadas e examinadas com o auxílio da análise de conteúdo de Bardin (2011). No decorrer do texto, os entrevistados estão designados como P1, P2, e, assim sucessivamente, para preservar a identidade dos participantes.

Nesse sentido, enfatizamos que a pesquisa é de natureza qualitativa, do tipo estudo de caso, em conformidade com a proposta de Lüdke e André (2013). O estudo de caso é caracterizado fundamentalmente, de acordo com as autoras, focalizando a interpretação do contexto, pois, “para uma apreensão mais completa do objeto, é preciso levar em conta o contexto em que ele se situa” (LÜDKE; ANDRÉ, 2013, p. 21). Além disso, o estudo de caso decorre a partir de três fases: “a primeira, aberta ou exploratória; a segunda, mais sistemática em termos de coleta de dados; e, a terceira, consistindo na análise e interpretação sistemática dos dados” (LÜDKE; ANDRÉ, 2013, p. 24).

O delineamento da pesquisa, ou seja, a etapa de coleta de dados, transcorreu como consequência de investigações em encontros realizados na escola, igualmente a partir de diálogos e discussões em momentos com professores da área. Conforme Lüdke e André (2013, p. 38), a entrevista é decorrente de intenso entrosamento entre entrevistado e entrevistador, pois, “a relação que se cria é de interação”, além disso, outra “grande vantagem da entrevista é que ela permite a captação imediata e corrente da informação desejada”.

Com base nessas informações, destacamos que as perguntas norteadoras da entrevista foram desenvolvidas com o propósito de reconhecer, mediante os retornos dos professores, as compreensões de currículo. Ancorada na análise de conteúdo de Bardin (2011), a produção dos resultados ocorreu fundamentada nas etapas de organização, codificação, categorização e inferências. Na organização, a análise de conteúdo se arranja basicamente em três estágios exclusivos, compostos por “pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação” (BARDIN, 2011, p. 124).

Em vista disso, a fase da pré-análise, caracterizada pela organização do material, envolveu a degravação das entrevistas executadas com os seis professores, de igual forma a organização dos feedbacks para posterior análise. Dando continuidade ao processamento dos dados, iniciou a fase de exploração do material, na qual procuramos extrair afinidades nas elocuções dos professores que expõem a compreensão curricular. A observação das respostas dos professores permitiu identificar, em determinados trechos, nuances das compreensões dos professores quanto ao currículo. Reforçamos a relevância desse processo segundo Bardin (2011, p. 133), conforme o autor, “tratar o material é codificá-lo. A codificação corresponde a uma transformação”, dessa forma, os professores entrevistados estão identificados por P1, P2, codificando-os.

Após a organização dos dados, desenvolvemos o processo de análise, em que resgatamos categorias que enfatizam compreensões de currículo, identificadas em estudos anteriores (KREUZ; LEITE, 2020a) e, que constituem o método de unir as compreensões dos professores evidenciadas em pesquisas acadêmicas examinadas anteriormente por meio de uma revisão bibliográfica, são: compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar, compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica e currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva. Desse modo, o quadro 01 apresenta a indicação dos discursos dos professores alocados nas categorias.

Quadro 1 Compreensões curriculares de professores 

Categorias Professores
Compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar P1, P2, P4, P5, P6
Compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica P1, P2, P3, P4, P5, P6
Currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva P2, P4, P5, P6

Fonte: As autoras.

As elocuções dos docentes, após serem analisadas, e, apresentando como suporte afinidades com as características de cada categoria, resultaram em unidades de aproximação nos excertos analisados. Dessa forma, fragmentos de discursos analisados que indiciam de alguma maneira uma compreensão ingênua de currículo, comparando-o com um guia de conteúdos, um objeto, produzido distante do espaço escolar, em que o docente negligencia a sua perturbação em fazer parte da produção desse currículo, foram identificadas como perspectivas da categoria compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar.

Igualmente, os discursos que se estreitavam com a categoria compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica, caracterizados por meio de traços de compatibilidade e da consciência dos docentes, na produção do currículo escolar, seja fazendo uso do livro didático, ou por algum outro ângulo de consonância, foram agrupados nessa categoria. Por conseguinte, na categoria currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva, foram designados os fragmentos que aproximavam uma compreensão mais definida de currículo, em que a maturidade do processo de construção curricular, a importância e a consciência do docente no processo ficassem evidentes, caracterizando uma construção curricular reflexiva.

Com base nessas discussões, apresentamos na sequência, alguns resultados obtidos a partir da análise e algumas reflexões.

3 COMPREENSÕES DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS ACERCA DE CURRÍCULO

Este segmento do texto é dedicado a exposição dos resultados e, de igual forma a sua discussão, analisando as compreensões de currículo de professores da área de Ciências da Natureza em exercício em escola pública no Brasil. Entendemos, de acordo com Lopes (2004), que o currículo é o foco central de qualquer reforma educacional, no entanto, conforme a autora, “as escolas são limitadas à sua capacidade, ou não, de implementar adequadamente as orientações curriculares oficiais” (LOPES, 2004, p. 110).

Com isso, críticas são realizadas de ambos os lados, ou seja, por parte do governo que questiona a não realização das políticas, pelos contextos de ensino, da forma como são propostas e, também, por parte dos professores, que afirmam sobre a construção de políticas distantes das realidades das escolas (LOPES, 2004). Essa realidade, ainda, presente no sistema educacional brasileiro nos leva a corroborar a recontextualização de discursos proposta por Lopes (2005).

Sustentamos o argumento de que explorar o processo de recontextualização de discursos, amparado em Lopes (2005), é profundamente necessário para a identificação do poder do professor na produção do currículo, uma vez que, em consonância com o que temos defendido em pesquisas já realizadas, “a implantação de novas políticas educacionais nas escolas, tais como a BNCC, não garante mudanças nos processos de ensino e aprendizagem, visto que, os textos produzidos como políticas são recontextualizados nos espaços escolares” (KREUZ; LEITE, 2020b, p. 11).

Ressaltamos que é importante permanecer atento ao processo de recontextualização, ao expressarmos que:

compreendemos que estudos acerca da recontextualização de discursos curriculares podem evidenciar fragilidades no processo de construção do currículo na escola, tendo em vista resistência aos processos de implantação e/ou falta de entendimentos teóricos acerca das competências e habilidades propostas nos próprios documentos curriculares (KREUZ; LEITE, 2020b, p. 11).

Partindo dessas colocações, compartilhamos nossa intensa inquietude com a recontextualização, e por sua vez, a sua repercussão nas compreensões curriculares dos professores em exercício na Educação Básica. Reconhecemos que a recontextualização e está amplamente associada com a interpretação das políticas e documentos curriculares, o que, por conseguinte, reflete na compreensão curricular e o seu desempenho na construção desse currículo. Dessa forma, trazemos, em seguida, as problematizações dos resultados apontados em nossa pesquisa empírica, dividida em subseções e organizada conforme as categorias identificadas.

3.1 Compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar

A categoria compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar está embasada em peculiaridades singulares. Essa afirmação é constatada a partir da identificação de compreensões curriculares que apontam vestígios de ingenuidade, em que o currículo é interpretado como um artefato, artigo que aprisiona o docente e toda a sua prática. Conforme já manifestado:

[...] os professores compreendem o currículo, e, igualmente a sua construção, como algo que ocorre distante deles, afastado da realidade da escola, o que remete a apontar para uma tendência quanto à ingenuidade por parte dos professores que, ao longo de sua prática pedagógica operam como se fossem robôs (KREUZ; LEITE, 2020a, p. 08).

Embasados nessas considerações, sinalizamos discursos de cinco professores, P1, P2, P4, P5 e P6. Dentre estes, merece destaque o discurso de P1, que revela uma compreensão conteudista acerca do currículo no ensino de Ciências, assinalando a angústia em cumprir com conteúdos pré-estabelecidos, dentro de determinado período. Esse posicionamento reitera os argumentos de Lopes (2004, p. 114), de que o currículo frequentemente é produzido a partir de “um modelo de regulação da especialização e de gerenciamento do processo educacional”. Acreditamos que esse entendimento prevaleça nos discursos dos professores, em razão de que, historicamente a educação brasileira tem sido refém de políticas de governo que sutilmente visam controlar a dinâmica escolar. Todavia, a expressão dos docentes em exercício, conhecedores do chão da escola, muito pouco foi valorizada quando se tratava do planejamento das políticas curriculares, naturalizando os traços de ingenuidade nos discursos e nas práticas.

Da mesma forma, identificamos indícios de ingenuidade em um posicionamento de currículo hierarquizado em que o docente revela passividade ao estar devotado a um currículo proposto por outras pessoas, sem a sua contribuição, sem moldar o currículo conforme o contexto. Ao passo que, em relação a escolha dos conteúdos, o professor menciona que:

Porque no início do ano daí eles te dão, os conteúdos, os conteúdos programáticos...A coordenação dá, é... os conteúdos programáticos... aí tu vai seguindo aquilo se tu vê que tu não vai conseguir trabalhar todo esse conteúdo até o final do ano, tu vai selecionando os mais importantes (P1).

Diante disso, corroboramos as ideias de Braga (2005, p. 27) ao evidenciar em suas pesquisas que “os professores sentem-se afastados da elaboração dos currículos e programas oficiais que norteiam a Educação Básica”. Identificamos um considerável número de discursos que se alinham a essa afirmação, e, que por isso estão colocados nessa categoria. Ademais, há semelhantes afirmações do autor que corroboram nessa direção, tal como, em momentos em que analisa o ponto de vista de uma professora, objeto de seus estudos, e expõe:

Fica claro em diferentes momentos que a função que Rita imagina para o ensino de ciências permeia a sua concepção do currículo ideal para a matéria. E a função desse ensino passa obrigatoriamente pela transmissão de um currículo pronto, pré-estabelecido, reduzindo o trabalho docente à adequação desse lote de informações ao tempo destinado às aulas de ciências. Em outro momento a extensão e abrangência do currículo é novamente destacada. A quantidade e a abrangência do conteúdo ministrado é a sua maior preocupação (BRAGA, 2005 p. 120).

De forma semelhante, o estudo de Melo (2016) nos apresenta indicações de afinidade com essa categoria, como, por exemplo, o fato de, segundo o autor, os professores conviverem

[...] com documentos oficiais que, embora com status prescritivo de aprendizagens desejadas, mas sem natureza de currículo, designam ou fazem referência a desempenhos (habilidades) cuja compreensão ou tradução para as atividades cotidianas de ensino e de avaliação impõem conhecimentos adicionais (MELO, 2016, p. 61).

Ainda, nos estudos de Melo (2016, p. 104), o autor relata que “há um abismo entre a prática docente e as avaliações em larga escala, pois as intenções não se conectam”. A essa afirmação agregamos a argumentação de Matos (2018, p. 105), ao expressar “a maneira como a educação está organizada é mecânica, ou seja, aquela educação que ocorre com a incorporação de um conhecimento novo de forma arbitrária”.

Relacionada aos argumentos, caracterizadores dessa categoria, até aqui apresentados, e, refletindo acerca da responsabilidade outorgada a quem seleciona os conteúdos escolares, parte importante do currículo, temos a fala de P1. Igualmente, confirmando a sua alocação na categoria conteudista-ingênuo, apresentamos o discurso de P4 ao comentar a sua prática,

Eu faço questionamentos antes de introduzir um novo conteúdo, questiono eles para ver o que que eles já sabem sobre isso, o que eles já têm de conhecimento, muitas vezes empírico, mas enfim já é alguma coisa que eles saibam, mesmo estando errado, ou equivocado, mas a gente sempre leva em consideração isso pra depois a partir dali vê o que precisa desenvolver com eles para que, às vezes, eles mudem sua opinião, se tem algum conceito aí equivocado(P4).

O conhecimento do professor em comparação ao conhecimento do aluno, que é problematizada na fala a seguir, é outro aspecto compatível com a ingenuidade do professor é realçado nessa fala, e que, em virtude disso, o aluno deva “mudar sua opinião”, esse posicionamento representa uma deturpação da função do professor como mediador, não cria possibilidades da construção do conhecimento em conjunto com o aluno, desmerecendo o saber, buscando legitimidade para o seu conhecimento, constrangendo o estudante. No entanto, o nosso entendimento é que o conhecimento deva ser construído de forma coparticipativa, resultando em processos significativos de aprendizagem e em um currículo qualificado. Nesse sentido, destacamos uma pesquisa realizada por Carminatti (2015, p. 48), indicando que alguns professores apenas reproduzem os conteúdos, “assim como se vê nos currículos tradicionais - que apenas transmitem conteúdos. A reprodução de saberes acontece principalmente com os saberes das disciplinas e os saberes curriculares, para os quais já há um sistema imposto, preestabelecido”.

A fala de P5, igualmente, é carregada de aspectos de compreensões ingênuas de currículo, ao afirmar, A gente faz uma sondagem, eu faço dessa forma, o que eles já sabem, eu faço as perguntas, pra ver o que eles já sabem, em cima disso, vai questionando e vendo então, a gente vai aprofundar e ver o que eles necessitam ainda., destaque para a frase “ver o que eles necessitam ainda”, reporta a uma possibilidade de interpretação de enxergar o aluno com um depósito de, como se, como se ainda precisasse de certa quantidade para estar completo.

Da mesma forma, Matos (2018) manifesta uma reflexão pertinente acerca de um currículo mais qualificado, segundo a autora:

Seria necessário conceber o currículo não como algo técnico, apolítico, a-histórico, neutro, que diz respeito apenas à sistematização de conhecimentos escolares, à organização de conteúdos, à formulação de objetivos, à escolha de metodologias e à forma de avaliação, mas como algo histórico, como um campo de batalha, e exatamente por ser histórico, ele está se formando, o processo é ininterrupto, e se ininterrupto, há sempre a esperança de um amanhã melhor, de se fazer algo diferente, há sempre o desejo que o inédito exequível aconteça (MATOS, 2018, p. 107).

Nessa direção, evidenciamos o discurso de P6, refletindo acerca dos traços de ingenuidade presentes na crença da ciência como verdade absoluta, à medida que o professor sente a necessidade de despertar nos alunos essa convicção, relatando, que se considera decepcionado quando não logra êxito nesse propósito, conforme declara:

Então existem muitas crenças a respeito das ciências, então isso eu já sei, então isso tá na minha cabeça, tá na cabeça de todo mundo. Então já tem esse conhecimento prévio, mas mesmo assim, nunca se consegue atingir uma meta de 100%, é interesse de cada um. Às vezes até, não é que me frustro, mas mesmo eu falando óh, a ciência determinou isto, isto e isto, os alunos não concordam. É só se fosse fazer uma prova normal, ou no papel daí eles botam, mas depois já volta ao normal. [...] Então nesse sentido, que eu quero justificar, no caso, a ciência sabe, já testou, já tem as evidências, já está comprovado, mas eu falar para as pessoas do senso comum, ou até mesmo, eu também, estou nessa área, mas a gente tem essas nossas crenças, hábitos e continua pecando. Isso vejo um motivo até às vezes, não vou dizer que tô frustrado, mas [...] então eu ensino, mas a escolha é do aluno, é da pessoa. É nossa escolha, fazer o que é certo e errado conforme a ciência (P6).

A posição de P6 é inquietante, na medida em que não há questionamentos, reflexões, sobre o conhecimento científico, afirmamos isso por conta de que entendemos que o conhecimento científico está sempre em aperfeiçoamento, fazendo com que uma definição que ora se mostra válida, em outro momento pode já não ser mais tão adequada. É importante compreendermos que essas evoluções são essenciais para o progresso da ciência e, consequentemente, do conhecimento escolar como um todo. Com base nesse entendimento, nos respaldamos em Lopes (2007, p. 203) vinculando a escola como encarregada de difundir o conhecimento científico, por outro lado, essa tomada de consciência precisa ocorrer não considerando o conhecimento como se “o mundo dependesse exclusiva e prioritariamente dele”, mas sim enxergá-lo como uma oportunidade para “compreender e (re) construir o mundo. Pensar no conhecimento científico na sua provisoriedade e contingência. Ou seja, pensá-lo em sua dimensão humana”.

Do mesmo modo, Carminatti (2015, p. 51) auxilia ao expor que o

conhecimento escolar é o resultado da interrelação entre os conhecimentos pessoais e populares com o conhecimento acadêmico, só que na maioria das vezes essa interrelação é apagada, negada, ao se passar o conhecimento escolar ao aluno, dando a impressão de que cada um destes âmbitos encontram-se separados e distantes, sem qualquer possibilidade de encontro e, muito provavelmente, é o currículo mal organizado que faz transpassar esta impressão, uma vez que, na vida “real” os saberes escolares e do senso comum interagem contínua e incessantemente.

A pesquisadora, ainda, retoma e fortalece a substancialidade do currículo na produção do conhecimento escolar bem como o seu papel na formação da personalidade humana ponderando:

é através do currículo que se concretizam as propostas e os discursos, pois ele orienta, propicia a construção do conhecimento no meio escolar, de saberes integrados com o conhecimento científico e o senso comum, para que se formem cidadãos autônomos, críticos e felizes (CARMINATTI, 2015, p. 62).

Na mesma direção, as falas de P4 e P6, respectivamente, contribuem para discussão da categoria ao trazerem à tona o tópico de aulas práticas, ao afirmarem:

Eu passo bastante, primeiro texto lá lógico, que a gente introduz, faz primeiro questionamento, depois dos conceitos, passa um pouco da teoria e depois quando possível eu gosto muito da prática. Porque é na prática quando eles mesmos podem manusear, manipular e ver as coisas como acontecem e aí que eles gravam realmente o que é que precisa ser gravado, o que precisam aprender (P4).

[...]atividades práticas, no caso, fenômenos físicos, que nem, esse ano já teve, vai ter de novo, se conseguir uma brecha no tempo (P6).

Os excertos de fala apresentados acima, abrem a possibilidade de interpretação na linha de que esses professores subordinam a realização ou não dessas aulas ao tempo disponível para tal, não considerando a magnitude real da aula prática quando se trata de determinados assuntos. Esse pensamento evidencia e retrata a realidade de muitos professores, que sofrem com sobrecarga de horas-aula, impedindo uma programação mais adequada e diversificada da aula. Por outro lado, há que se trazer outro questionamento, o de, se a prática em sala de aula tem tido a sua devida valorização? Por sua vez, o professor P4 remete ao potencial da aula prática encerrar sua resposta, reiterando que ela é relevante no processo de aprendizagem do aluno, facilitando o entendimento acerca de determinado conteúdo.

A ideia de Matos (2018) colabora nesse sentido, ao apresentar uma definição particular de currículo. Conforme o autor,

O currículo mais do que uma simples enumeração de conteúdos e diretrizes a serem trabalhados em sala de aula pelos docentes, é uma construção histórica e cultural que sofre transformações em seus propósitos e consequentemente em suas definições. Entendemos que os docentes precisam não somente conhecer o que está proposto nos currículos escolares, mas também ser partícipes da sua elaboração, somente assim atribuirão significados às orientações curriculares (MATOS, 2018, p. 18).

Portanto, salientamos a importância de permanecermos refletindo sobre a categoria compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar, reforçando a urgência em nos mantermos atentos para os indícios que qualificam as compreensões curriculares dos professores como ingênuas, especialmente no que diz respeito aos seus discursos, para que possamos, a partir disso, desenvolver currículos mais qualificados em que os professores assumam a sua posição de produtores do currículo e, de uma educação inovadora.

3.2 Compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica

A categoria compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica, destacada nessa pesquisa, apresenta aspectos como compreensões direcionada para uma perturbação com o conteúdo, no entanto, com traços de olhares Críticos, mesmo que isso se efetive de maneira intuitiva. Essa categoria pode ser definida a partir de uma

[...] compreensão de professores, em relação ao currículo, como uma grade curricular organizada fora da escola, porém com indícios de algum reconhecimento, por parte dos professores, e principalmente, da relevância da sua participação no processo. Os trabalhos apresentados nesta categoria, se aproximam ao demonstrarem algumas possibilidades do professor que se reconhece, ainda que apenas em determinados momentos, como um profissional que, sobretudo, possui uma responsabilidade social, ao ser professor e, que, por isso, demanda certa criticidade (KREUZ; LEITE, 2020a, p. 08).

Esta categoria é constituída a partir de excertos de todos os professores participantes da pesquisa, ou seja, cada um dos professores entrevistados teve alguma fala que os aproximam dessa compreensão, sendo ela composta por falas dos professores P1, P2, P3, P4, P5 e P6.

No entanto, antes de iniciarmos a discussão dessa categoria, é pertinente apresentar uma afirmação de Lopes (2019, p. 61), defendendo que o olhar do professor sobre os documentos curriculares, é determinante na sua compreensão, “tem seus limites contextuais, sendo sempre associada às dinâmicas contingentes”. Representando o seu entendimento acerca de currículo, que pode despontar sob diversos vieses. A partir disso, evidenciamos características apontam certa criticidade na fala do professor P3 que, ao fazer referência ao conteúdo programático, expressa dúvida e indicia, em determinados momentos, que essa forma de seleção talvez não seja tão adequada quanto deveria. Além disso, destaca o Enem como um parâmetro para a seleção do conteúdo, o que representa que a escolha não permanece apenas no rol de conteúdos estabelecidos, mas se utiliza de outras fontes para selecioná-los. De acordo com P3,

[...] a gente vai por aquele cronograma, o cronograma que é especificado, que a gente tem, felizmente ou infelizmente, de repente, a mais tempo. E ali, de um ano para o outro a gente também seleciona, as vezes, tão pedindo muito pouco no ENEM, não se dá tanto enfoque pra isso (P3).

Ainda, o discurso de P6, destaca mais um tema relevante a discussão dessa categoria, ao realizar uma tênue crítica direcionada à escolha dos conteúdos no cronograma utilizado pela escola. De acordo com P6,

Nas reuniões sempre, antigamente era por causa da Universidade de Santa Maria, aí tinha que ser adequado, por causa do vestibular, é sempre as universidades interferem um pouco, e no caso, não vou dizer que as universidades, mas, os pais dos alunos e os próprios professores que estão no comando, ou que estavam, então eles sempre tem metas, tem que ser de acordo com universidade que era o vestibular, hoje seria o ENEM, não é mais tanto assim, nem existe mais em Santa Maria, então o ENEM hoje em dia dominou. Mas eu sou um pouco contra essa questão, tu tem que preparar o aluno para enfrentar todas as adversidades, não só vestibular, que muitos não fazem e aí, mas aqui sempre foi prioridade o vestibular (P6).

O posicionamento do professor, ao se declarar contra tal argumento para a seleção do conteúdo, é um elemento que pode potencializar a transformação da compreensão curricular.

Encontramos na tese de Pereira (2011), algumas observações importantes, resultado de um estudo com professores em atuação, salienta que uma das professoras investigadas, sente-se contemplada pelos documentos curriculares da maneira como são prescritos e assume a sua responsabilidade em se aproximar por meio da própria prática. Ainda, destaca, como uma das características da professora, “o seu posicionamento crítico e o seu discernimento para desenvolver suas aulas a partir das propostas de que dispõe, mas tem como foco as demandas de seus alunos, suas características e potencialidades” (PEREIRA, 2011, p. 148).

Por outro lado, segundo a autora,

[...] embora valores, posturas e afetos se constituam como currículo enunciado nos contextos observados, as professoras têm dificuldade de romper com a concepção de currículo como artefato e que pressupõe a possibilidade de introdução do educando em uma cultura previamente estabelecida (PEREIRA, 2011, p. 171).

Outra característica da categoria II foi evidenciada na fala de P6 ao fazer referência ao livro didático. De acordo com o professor,

[...] seguindo a programação da escola eu procuro, porque agora tem que escolher os livros, a cada três anos, aí eu procuro ver os livros que estão de acordo com o local, que o aluno, que ele mais prefere, que ele gosta, já tem uma experiência, o que ele não quer, o que ele quer, o que eles têm facilidade. Daí eu faço a seleção.... Mas tá difícil, a última opção não me agradou muito, não tinha a opção para fechar com os conteúdos que o colégio, escolheu, mas não é o problema, tem que se adequar (P6).

A escolha do livro didático, quando ocorre sob análise, avaliação do professor, sinaliza para um aspecto dessa categoria, o professor lança seu olhar crítico sobre o livro, e sem perceber, faz também um julgamento de um currículo proposto. O discurso de P6 vai ao encontro dessa afirmação. Paralelamente, a sua perspectiva conteudista é retomada ao expressar sua inquietação em associar os conteúdos do livro com os conteúdos programáticos da escola, o que pode representar que o docente se sente subordinado a esses conteúdos.

Em alinhamento a esses aspectos, temos a pesquisa de Capeloto (2010, p. 08):

[...] os resultados revelam que os professores conhecem o PCN e acreditam que esse referencial influencia suas práticas de Ciências Naturais. Pelas análises, percebemos que essa influência se dá, muitas vezes, de forma indireta, pelo uso do livro didático, o material mais utilizado, pelos professores que fizeram parte do estudo, para a seleção e ordenação dos conteúdos e na escolha das atividades didáticas.

Nessa mesma direção a autora expõe, “mesmo que não percebam, ao utilizarem livros didáticos submetidos a uma avaliação que considera as diretrizes presentes nos PCN, os professores acabam incorporando, em suas práticas, concepções e ideias presentes nesse documento” (CAPELOTO, 2010, p. 97).

Outras evidencias de posicionamentos críticos de professores compõem a fala de P3, que, ao relatar como faz a sondagem inicial na introdução de um novo conteúdo, refere-se a esse processo como uma investigação, e, por meio dela, o professor percebe de onde pode partir o conteúdo. Isso representa uma compreensão crítica do professor ao perceber nos alunos o seu grau de dificuldade, fato que, para muitos professores, tem sido um entrave em sua prática pedagógica. De acordo com P3:

Eu acho que sempre a partir de uma conversa, eu gosto de investigar, a partir de um diálogo. Eu vou questionando eles, vou conversando [...] que depende, por ali que eu vou, investigando e dali que eu sigo então e na medida que eu vou trabalhando que eu vou vendo o grau de dificuldade, de entendimento, que daí eu vejo se, não eu posso avançar, posso seguir, não, ali eles têm bastante dificuldade, não adianta acelerar porque não vai dar certo (P3).

O discurso de P2expõe diversas metodologias usadas para ensinar ciências, dentre elas, o fomento à pesquisa. A introdução da pesquisa como uma metodologia na Educação Básica qualifica a formação do aluno que, posteriormente, ao se deparar com o Ensino Superior não sente a repentina mudança de metodologia entre a Educação Básica e o Ensino Superior, uma vez que a pesquisa é uma das principais atividades realizadas no Ensino Superior. Nesse sentido, P2 diz:

Que eu me lembre agora é, aula expositivas, jogos, aula de laboratório, é dou muita pesquisa para eles, se tem algum assunto pertinente, falei de alguma coisa, algum termo, de alguma substância química principalmente, então eu peço pesquisa para eles e depois socialização da pesquisa (P2).

Nessas circunstâncias, Silva (2013), relembra a relevância do papel do professor enquanto destaca a realidade da prática vai muito além de ensinar conceitos. Segundo o autor,

Cabe ao professor o importante papel de facilitador da aprendizagem, tendo ele a clareza de que ao invés de um Ensino de Ciências pautado em apresentações de definições científicas, deve-se adotar uma postura investigativa e argumentativa por meio da qual, além da construção dos conceitos, também sejam desenvolvidas habilidades e atitudes (SILVA, 2013, p. 69).

No contexto de analisar o que o estudante necessita para aprender ciências em suas aulas, P3 compartilha seu desassossego em estar, talvez “ultrapassada” na metodologia que utiliza e reflete:

O que ele precisa fazer? Eu gosto, pode ser que eu tô ultrapassada, mas eu não abro mão de um, de um resumo, explicar em slides, ou que seja no quadro deles copiar, eu não abro mão disso. Um questionário avaliativo, ou questões, alguma coisa de pesquisa, trabalhos, às vezes de pesquisa, essas aulas práticas participar das aulas práticas. De eles contribuírem com o que eles sabem, que daí no final, eu não avalio só em questão a avaliação individual, mas o fato deles fazer o tema, pode ser que de repente, não seria o ideal, mas eu acho que é uma coisa legal, que às vezes, eu dou coisas extras[...] (P3).

Nessa mesma linha, P4 demonstra compreender que a curiosidade está relacionada à vontade do aluno de aprender, e que, dessa forma, o aluno se interessa pelo que está sendo trabalhado em sala de aula. Ainda, P4 defende a avaliação como um processo e que, por meio dele, os alunos constroem o seu conhecimento. Dessa forma, P4 argumenta:

Ele precisa prestar atenção, interagir, participar da aula, atender quando ele é solicitado, quando ele é chamado, Ah, questionar principalmente porque sempre penso que digamos assim, a curiosidade é a chave da Inteligência, porque se eles são curiosos se eles se interessam, se eles querem saber é porque eles vão aprender, agora, se eles são desinteressados e não querem nada com nada daí, é difícil.... eu não costumo fazer provas com eles, é mais trabalhinhos e relatórios de atividades práticas, então prova, prova, prova de decorar conteúdo eles não têm, então eles a partir de uma prática de alguma coisa que eles aprenderam ou até de pesquisar coisas que eles vão construir seu conhecimento (P4).

Nesse sentido, Capeloto (2010, p. 65) contribui ao afirmar que:

Não se pode esquecer que o professor não realiza sua ação no vazio, mas considera o contexto e a realidade do ambiente em que trabalha. Ele também sofre influências da política curricular e de outros aspectos como as normas de funcionamento da escola e as condições de seus alunos.

Ainda, em se tratando de avaliação, P1 relata a diversidade de metodologias avaliativas que utiliza em sua prática pedagógica. Cabe destacar a sua preocupação em utilizar o que chama de modelos didáticos mais atuais, ou seja, há uma preocupação de P1 em pluralizar as possibilidades avaliativas e torná-las mais atrativas aos seus alunos, conforme podemos observar:

Eu fazia escrita, então, individual escrita e também, das aulas práticas eu pedia relatórios, então sempre (ênfase no sempre) depois que a gente tinha uma aula prática eles faziam um relatório, inicialmente nos primeiros anos eu passava o modelo do relatório o que deve ter, com introdução, conclusão e eu avaliava dessa forma, também com maquetes e outros modelos didáticos mais... mais ...atuais(P1).

A avaliação também é evidenciada na fala de P2, ao expressar o seu posicionamento em relação aos saberes dos alunos, P2 revela entender que a avaliação deva ocorrer de forma diversificada, pois cada aluno aprende de determinada forma e aponta algumas causas para uma possível não - aprendizagem de seus alunos. P2 diz:

A avaliação, eu faço, divido a pontuação do trimestre em várias avaliações, por prova mesmo, daí essa avaliação eu faço muitas vezes com, eles podem usar um rascunho, eles podem preparar um resumo para ser utilizado, às vezes não, depende o conteúdo não, ou então eles podem, fazer em dupla e, outras formas diversificadas de avaliação, relatório, também participação em aula, também a confecção de algum material, por exemplo[...]eu vejo que assim, eu avalio bem, bem avaliado, vamos dizer assim, às vezes dentro de uma prova eu preciso procurar o que dá para considerar. Mas eu entendo que, tem alunos que não têm a facilidade, que aquilo não é interessante para eles, então, se tiraram a média para mim tá bom! Entendeu? Então eles, se eles já não foram... eu dou todas as condições, faço revisão e se ainda assim o aluno não captou, eu tiro o que ele tem de bom, faço recuperação e se ainda assim ele não corresponder aos 60%, ele vai tem que ser analisado daí se ele tem condições de passar de ano ou não! [...] Mas assim, muitos não aprendem não. Por vários motivos, falta de interesse, por falta de estudo e por dificuldade mesmo na área de ciências da natureza (P2).

Nessa perspectiva, Capeloto retoma a relevância da autonomia do professor ao produzir o currículo escolar a partir de suas escolhas. Segundo a autora,

É importante compreendermos que o professor é um profissional ativo na transferência do currículo, e ele atua na definição dos conteúdos para diferentes alunos, na seleção dos meios mais adequados para eles, bem como, na escolha dos pontos mais relevantes a serem avaliados em seus educandos (CAPELOTO, 2010, p. 65).

O reconhecimento de que variadas identidades e, portanto, diferentes compreensões compõem a sala de aula é também um destaque da fala de P3, demonstrando a sua preocupação em valorizar os saberes dos alunos e possibilitar a aprendizagem a todos. P3 diz:

Depende, é, na verdade é uma questão difícil de responder, porque se a gente for observar numa sala de aula, são “n” pensamentos diferentes. São “n”, habilidades diferentes, porque o que eu vejo, de que alguns gostam de Biologia, se identificam, enquanto alguns, eles não conseguem compreender coisinhas básicas, tem aquela aversão (P3).

Seguindo com a apresentação de falas que nos remetem à opinião crítica dos professores engajados na categoria, temos ainda a contribuição de P6 novamente, ao se referir ao Novo Ensino Médio. De acordo com o professor, essa nova orientação curricular apresentada não se mostra viável para a solução de todas as demandas engendradas no ambiente escolar:

mesmo eles sabendo, fazendo tudo que é cálculo difícil e não sei o que, como é a meta, depois que ele fez a avaliação, se formou no Ensino Médio ele não vai usar, porque ele foi contra, e ele acha que isso é só para a aula, só pra fazer avaliação, eles não conseguem entender que isso é para a vida, que dá para usar no dia a dia,[...] então isso eu vejo como um problema também e o Novo Ensino Médio, infelizmente não vai solucionar esse problema! (P6).

É conferido, assim, a essa categoria uma dimensão intermediária, porém extremamente relevante para o processo de compreensão curricular dos professores em atuação na Educação Básica. Permitir a esses professores se expressarem, ouvirem e analisarem seus discursos recontextualizados na prática escolar e, com isso, refletirem acerca de suas ações e da sua participação ativa na produção curricular da escola, traz entre seus pontos positivos, dar a voz a quem frequentemente não é ouvido. Além disso, nessa categoria, pôde-se evidenciar de maneira profícua o significado de um posicionamento crítico na produção curricular.

3.3 Currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva

Englobando compreensões de currículo mais qualificadas, temos a categoria currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva, que se caracteriza por:

[...] compreensões mais qualificadas do currículo, em que os professores se reconhecem no processo de construção curricular. Nessa compreensão curricular um dos elementos centrais é a reflexão, ao refletir sobre a sua prática, acerca do currículo que está compondo a sua atividade, o currículo vai sendo construído pelo próprio professor, ao se dar conta do que precisa melhorar, do que pode fazer diferente, do que deve adaptar à sua realidade e a de seus alunos (KREUZ; LEITE, 2020a, p. 08).

As compreensões curriculares são importantes também, na medida em que permitem novas reflexões acerca do papel do professor na produção de políticas curriculares, assimilando, que cabe ao professor assumir a identidade de quem “conhece todos os lados da moeda”, e, portanto, possui competências significativas para contribuir com propostas e sugestões que podem juntamente com outras, se transformar em políticas, assumindo um “sentimento de pertencimento” (LOPES; MACEDO, 2011, p.161).

A reflexão acerca da compreensão curricular pode debilitar a “fragilização da participação dos professores no contexto de produção de textos” (LOPES, 2011, p. 162). Há que se recordar, porém, que o

texto curricular é apenas um dos elementos da política e não dá conta de responder pela totalidade do processo. Além disso, quando chega ao contexto da prática, não está fechado, pronto. Na arena da prática escolar, outros debates também acontecem, caracterizando a política como um processo em constante vir-a-ser (LOPES; MACEDO, 2011, p. 163).

Aproximados com essa categoria, houve excertos de apenas quatro professores, representando a categoria com menor difusão entre os professores entrevistados, sendo eles: P2, P4, P5 e P6. Realçamos características relacionadas à categoria crítico-reflexiva nas falas de P2 e P5 ao expressarem que diversos fatores definem os conteúdos a serem trabalhados em sala de aula. Porém um se destacou entre todos, ao sinalizar a inquietação do professor em relacionar o conteúdo com o cotidiano do aluno.

É, principais três critérios. Um pela...que a gente já vem trabalhando conteúdos, há mais tempo, também pela relevância de cair no ENEM e também pela importância de que eles podem usar no dia a dia deles (P3).

Então eu sempre dou uma ênfase maior naquilo que eu acho que é o mais significativo pro aluno (P5).

Nesse sentido, a pesquisa de Fenner (2014, p. 7) contribui ao apontar que “os professores procuram trabalhar os conteúdos de acordo com cada realidade escolar”. Além disso, os professores sujeitos da pesquisa do autor “apontam que currículo é um contexto globalizado. É um instrumento de compreensão do mundo e para a transformação social. Tudo que se faz na escola, sistematizado ou não, é currículo” (FENNER, 2014, p. 39).

O autor ainda reforça a sua reflexão ao afirmar:

Um dos desafios da educação é manter o equilíbrio entre as diferentes culturas, para que o educando tenha uma visão do todo e saiba, principalmente, construir sua própria história. A educação centrada na realidade necessita ser inclusiva, focar-se no crescimento social, pessoal e cultural e não se centrar apenas no conhecimento científico. É necessário considerar o indivíduo em seu contexto sócio-histórico-cultural para oportunizar que o estudante faça diferentes leituras de mundo, diferentes interpretações de realidades e fatos, que realmente desenvolvam-se no ser humano os direitos e deveres da cidadania (FENNER, 2014, p. 51).

Da mesma forma, o professor P6 expõe uma breve explicação acerca de como transcorrem as suas aulas, destacando um notável potencial reflexivo crítico neste professor, visto que a sua aula representa um currículo em movimento, que vai sendo construído pelo com base nos interesses dos alunos, segundo P6, “daí às vezes toda a aula vira só de perguntas e eu explico e dou as respostas conforme, o meu conhecimento”.

A partir disso, recorremos novamente a pesquisa de Fenner (2014, p. 41), que nos ampara ao expressar que decorre “daí a necessidade da construção de uma escola que priorize um processo de aprendizagem no qual as crianças e os jovens possam aprender com prazer e através de práticas desafiadoras em seus modos de produção, contextualização e interpretação”.

Ainda problematizando a fala do professor P6, este refere-se à avaliação e à forma como a vê e a realiza. Para P6,

[...] a avaliação que eu menos faço é aquela tradicional, pega uma folha coloca o nome, o número, e daí entregar dez, vinte questões, é o que eu menos faço ultimamente, mas até eu chegar nesse ponto eu já observei e treinei bastante, [...], então pensei, para quê encher eles de avaliações que eles não gostam, que as vezes tem medo, já dá um branco, tem tudo que é aluno, com os problemas emocionais, então eu pensei não, isso é estressante, os meus colegas fazem bastante, então eles já vão praticar essa parte eu vou praticar então outras avaliações para testar o conhecimento, pra ver como eles estão (P6).

Nessa mesma linha, P5 expressa a forma como realiza a sua avaliação, em que se percebe o desenvolvimento do protagonismo dos alunos, eles escolhem o que lhes interessa, eles fazem e aprendem fazendo. De acordo com P5:

Eu dou umas questões de tema, eu dou atividades em aula pra eles fazerem, eu faço prova, eu faço trabalhos, de diversas formas, hoje em dia não é só por provas... então nesse trimestre eu fiz, de alguma prática que esteja relacionado ás aulas de ciências, o que a gente já aprendeu desde o início do ano até ali, e eles gostam muito e eu vejo que é uma boa forma deles memorizar o conteúdo, [...] eles ficam bem encantados, tem coisas bem legais que eles procuram, que eles trazem para a sala de aula, e fazem para os colegas da turma e muitas vezes a gente chama outras turmas pra vir assistir, eu acho muito válido, e é uma forma avaliativa, é uma forma deles procurar naquilo que eles tem interesse, procurar e pesquisar, eles tem realizar a prática e ver qual é a explicação que tem para tal atividade. É bem legal, eu gosto de fazer no último trimestre, porque daí eles analisam já por conceitos que a gente estudou lá em fevereiro, no primeiro trimestre, no segundo trimestre, então eles fazem, foi muito produtivo (P5).

Acerca da avaliação, Fenner (2014, p. 38) destaca que “Pensar uma avaliação mediadora emancipatória significa rechaçar a crença no sistema tradicional de avaliação. É negar a visão saudosista da escola exigente, disciplinadora, detentora do saber e do poder.” E segue, eximindo os professores como únicos responsáveis por resultados insatisfatórios:

Os professores não são unicamente os principais responsáveis pelos resultados negativos nas avaliações de seus estudantes, mas devem comprometer-se no sentido de buscar aprimoramento pessoal e poder trabalhar com mais segurança em sala de aula, um espaço muito complexo (FENNER, 2014, p. 39).

Da mesma forma, enfatizando o processo reflexivo como um qualificador das compreensões curriculares, Fenner (2014, p. 67) aponta que o professor reflexivo “busca significar e construir pessoas e histórias com base nas experiências vividas. Ele oferece estrutura para o seu crescimento e o de seus alunos”.

Além disso, o autor fortalece a categoria III, ao afirmar que:

[...] a reflexão implica sempre uma análise crítica do trabalho que realizamos. Fazendo uma reflexão sobre nosso trabalho, estamos questionando sua validade, o significado que ele tem para nós e para os sujeitos com quem trabalhamos, bem como para a comunidade da qual fazemos parte e que estamos construindo através de nossas práticas diárias. Toda e qualquer resposta às questões que nos propomos só pode ser encontrada em dois espaços: no da nossa prática, da experiência cotidiana da tarefa que procuramos realizar, e no da reflexão crítica sobre os problemas que essa prática faz surgir como desafios para o professor (FENNER, 2014, p. 69).

Ainda, de acordo com o autor, o currículo é muito mais que um programa ou uma relação de conteúdos, sua função é mais ampla e dinâmica, ao representar precisamente a identidade escolar. O currículo é resultado dos projetos da escola, de seu posicionamento e de suas concepções “de homem, sociedade, educação, de como são selecionados conteúdos e o porquê das relações interpessoais, da metodologia, da visão de mundo, das práticas” (FENNER, 2014, p. 50).

Dessa forma, Lopes e Macedo (2021, p. 06) afirmam,

nos faculta concluir ser mais efetivo tentar mudar a escola pela ação disruptiva da pesquisa e da intervenção docente. É muito mais produtivo intervir nas políticas curriculares por meio da constituição de uma rede intersubjetiva da qual participem professores em serviço, pesquisadores da Universidade também formadores de professores, professores em formação inicial que, no espaço situado da escola, vão se produzir como sujeitos. Nessa rede, estarão sendo produzidos currículos - da escola, com desdobramentos no currículo da universidade -, demonstrando ser possível falar em políticas públicas de currículo situadas nas escolas.

Portanto, as investigações acerca das compreensões curriculares têm nos evidenciado que as categorias que identificamos em nossos estudos anteriores são potencializadas a partir deste estudo empírico, uma vez que, os discursos dos professores se aproximam das categorias apresentadas e contribuem para o seu entendimento. Nesse sentido, ressaltamos a importância de estudos que problematizam o currículo nos espaços escolares.

4 CONCLUSÃO

Com o intuito de responder à questão central desse estudo, nos questionamos, porque investigar as compreensões de professores? Destacamos a relevância do estudo por podermos, a partir dele, construirmos entendimentos de como os professores compreendem o currículo. Embora essa resposta possa parecer óbvia, ela se encontra repleta de possibilidades. O estudo permite produzir um parâmetro para entendermos qual a compreensão mais fragilizada e qual a compreensão mais evoluída de currículo.

O parâmetro acima mencionado, constituído a partir do estudo apresentado, demonstra que ainda há muito a se investir em formação de professores com foco no currículo escolar, buscando contribuir com novas compreensões e, com isso, qualificar a Educação Básica como um todo, formando professores que deixem de ser meros implementadores de políticas curriculares e passem a se reconhecerem como curriculistas, construtores do currículo.

Com as discussões apresentadas, reafirmamos a importância do presente estudo, em que investigamos as compreensões curriculares de professores em exercício. Destacamos que, por meio deste estudo, foi possível indiciar que as compreensões curriculares dos professores investigados estão em permanente movimento, ao passo que: em alguns aspectos, aproximam-se da compreensão conteudista-ingênuo sobre currículo escolar; em outros, da categoria compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica; e ainda, em outros, da categoria currículo escolar sob uma compreensão crítico-reflexiva, o que caracteriza um processo de constante transformação, que, no contexto atual, é imprescindível por conta das novas propostas curriculares que vêm sendo apresentadas às escolas públicas do Brasil.

É importante destacar, ainda, que, por meio dessa investigação, evidenciamos que a categoria compreensão curricular sob a perspectiva conteudista-crítica tem sido a mais recorrente entre as falas dos professores analisados, representando um aspecto positivo de que a maioria dos professores, sujeitos da nossa pesquisa, estão atuando, produzindo currículos sob uma compreensão mais crítica e menos ingênua e fechada.

Destarte, consideramos que as falas dos professores investigados fornecem elementos que evidenciam o processo de recontextualização de discursos curriculares, ao sinalizarem aspectos presentes nos documentos oficiais e indicarem aproximações com as práticas escolares. Com isso, defendemos a necessidade de mantermos permanentemente discussões, que versam acerca de aspectos que tratam do currículo escolar em processos de formação de professores da área de Ciências da Natureza, tanto inicial como continuada.

Dessa forma, retomamos nosso questionamento inicial, pensando acerca das compreensões curriculares dos professores de Ciências, e defendemos que, por meio do processo de recontextualização dos discursos, dessa releitura a que são submetidos documentos e propostas curriculares, o pensamento curricular dos professores de Ciências em atuação na Educação Básica caracteriza uma compreensão crítica, em que surgem indícios de seu reconhecimento como autores/produtores de currículos escolares.

Para finalizar, destacamos a importância de ouvir atentamente os discursos pedagógicos produzidos nos espaços escolares, dar voz a quem faz o currículo acontecer nos parece uma possibilidade inicial e indispensável para o processo de maturidade das compreensões curriculares dos professores em atuação na Educação Básica brasileira.

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Recebido: 02 de Maio de 2021; Aceito: 14 de Fevereiro de 2022

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