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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.21  São Paulo  2023  Epub 30-Jun-2023

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2023v21e54873 

Artigos

Indícios da Identidade Pessoal-Profissional de Licenciandos/as em Ciências Biológicas1

Evidence of the Personal-Professional Identity of Undergraduates in Biological Sciences

Evidencia de la Identidad Personal-Profesional de los Licenciados en Ciencias Biológicas

Felipe TSUZUKIi 
http://orcid.org/0000-0003-0361-5601

Marinez Meneghello PASSOSii 
http://orcid.org/0000-0001-8856-5521

Virgínia Iara de Andrade MAISTROiii 
http://orcid.org/0000-0002-5172-6173

1i Doutorando em Ensino de Ciências e Educação Matemática pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Formador de professores na Clickideia Tecnologia Educacional. E-mail: felipe.tsuzuki@outlook.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-0361-5601

ii Doutora em Educação para a Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) - Bauru, SP, Brasil. Docente Sênior da Universidade Estadual de Londrina (UEL) - Londrina, PR, Brasil - e docente Sênior colaboradora da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP) - Câmpus Cornélio Procópio, PR, Brasil. Com o apoio do CNPq. E-mails: marinezpassos@uel.br e marinez@uenp.edu.br - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0001-8856-5521

iii Doutora em Ensino de Ciências e Educação Matemática pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Docente Associado do Departamento de Biologia Geral da Universidade Estadual de Londrina (UEL). E-mail: virginiamaistro@uel.br - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-5172-6173


Resumo

Com a alteração curricular no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma universidade pública, a disciplina Práticas Pedagógicas: Sexualidade e Saúde foi adicionada, tornando-se o primeiro contato dos/as estudantes com os conteúdos pertinentes à docência, somados à temática da sexualidade, que pela primeira vez institucionalizava-se no currículo. Assim, questionou-se: que indícios da identidade pessoal-profissional de licenciandos/as em Ciências Biológicas, uma disciplina de educação para a sexualidade mobiliza? Para responder a tal questão, produziu-se uma avaliação da disciplina que foi respondida por 28 licenciandos/as que a cursaram no ano de 2015. Tal avaliação objetivava o registro dos indícios da identidade pessoal-profissional deste professor em formação para posterior análise. As respostas foram submetidas à Análise Textual Discursiva, que possibilitou a identificação de três categorias emergentes: Formações de si; Percepções de educação para a sexualidade; Instrumentalizações para a educação sexual.

Palavras-chave: práticas pedagógicas; sexualidade e saúde; formação inicial em ciências biológicas; identidade pessoal-profissional

Abstract

With the curricular change in the Licentiate Degree in Biological Sciences course at a public university, the Pedagogical Practices: Sexuality and Health discipline was added, becoming the first contact of students with the contents relevant to teaching, in addition to the theme of sexuality, which for first time it was institutionalized in the curriculum. Thus, the question was: what signs of the personal-professional identity of undergraduate students in Biological Sciences does a discipline of education for sexuality mobilize? To answer this question, an evaluation of the discipline was produced, which was answered by 28 undergraduates who took it in 2015, this evaluation aimed at recording the evidence of the personal-professional identity of this teacher in training for further analysis. The answers were submitted to Discursive Textual Analysis that enabled the identification of three emerging categories: Formations of self; Perceptions of sexuality education; Instruments for sexual education.

Keywords: pedagogical practices; sexuality and health; initial teacher training in biological sciences; personal-professional identity

Resumen

Con el cambio curricular en la carrera de Licenciatura en Ciencias Biológicas de una universidad pública, se agregó la disciplina Prácticas Pedagógicas: Sexualidad y Salud, convirtiéndose en el primer contacto de los estudiantes con los contenidos relevantes para la docencia además de la temática de la sexualidad, que primera vez que se institucionalizó en el plan de estudios. Así, la pregunta era: ¿qué signos de la identidad personal-profesional de los estudiantes de grado en Ciencias Biológicas moviliza una disciplina de educación para la sexualidad? Para responder a esta pregunta se elaboró una evaluación de la disciplina, la cual fue respondida por 28 estudiantes de pregrado que la cursaron en el año 2015, esta evaluación tuvo como objetivo registrar las evidencias de la identidad personal-profesional de este docente en formación para su posterior análisis. Las respuestas fueron sometidas a Análisis Textual Discursivo que permitió identificar tres categorías emergentes: Formaciones del yo; Percepciones de la educación sexual; Instrumentos de educación sexual.

Palabras clave: prácticas pedagógicas; sexualidad y salud; formación inicial en ciencias biológicas; identidad personal-profesional

1 INTRODUÇÃO

O ensejo para o desenvolvimento da pesquisa, cujos resultados trazemos neste artigo, está diretamente vinculado à mudança curricular do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma universidade pública do estado do Paraná, que entrou em vigor no ano de 2015. Tal alteração no currículo, além de outras mudanças, inseriu a disciplina nominada Práticas pedagógicas: Sexualidade e Saúde no primeiro semestre do curso, trazendo em seu bojo uma modificação estrutural, que ao mesmo tempo inseria os licenciandos na docência (por meio do seu viés - prático-pedagógico) e abordava os conteúdos relativos à sexualidade, os quais não compunham o currículo anterior.

Em função desta alteração, nossa atenção e acuidade para as manifestações dos discentes redobraram. E, preliminarmente, pudemos ouvir depoimentos como: “esta disciplina está sendo um marco para a minha vida pessoal-profissional”; “estou sendo (neste contexto1) mobilizado a refletir sobre as contribuições dela (disciplina) para a minha formação pessoal e profissional”; “ela (a disciplina) faz surgir um valor afetivo, pois ao estudar teoricamente as sexualidades, eu pude me compreender, vivenciar a minha sexualidade, refletir acerca da minha saúde de modo integrado”.

Diante desses relatos que inserimos nesta introdução e de tantos outros que poderíamos listar, fomos levados a desenvolver a investigação que aqui descrevemos e que foi orientada pela seguinte questão: Que indícios da identidade pessoal-profissional de licenciandos/as em Ciências Biológicas, uma disciplina de educação para a sexualidade mobiliza?

Na sequência apresentamos esclarecimentos a respeito das perspectivas teóricas e metodológicas assumidas para o desenvolvimento da investigação, alguns detalhes a respeito da coleta de dados e da situação de pesquisa, os dados, nossas interpretações e diversas evidências conclusivas.

2 PERSPECTIVAS TEÓRICAS

As propostas educacionais que são utilizadas na atualidade, não necessariamente contemporâneas, propõem um ensino como meio, como intermediário, uma preparação para a vida e o exercício da cidadania e, portanto, desconsideram o presente (aquilo que se está vivendo) dos sujeitos no contexto escolar, colocando-os em um constante adiamento de suas existências (MOSÉ, 2013).

Pautando-nos nessas afirmações, observamos que elas estão relacionadas a uma não democratização dos espaços formativos, pois a escola passa a não caracterizar e a não considerar as diferentes vozes que emergem nas vivências escolares cotidianas.

Na ausência desse diálogo somado à abordagem autoritária, tomada por alguns/mas docentes, as escolas tornar-se-iam o oposto de um espaço seguro, caracterizando-se por relações de poder que se evidenciariam nas relações professor/a-aluno/a. Assim, a escola restringir-se-ia à reprodução de conceitos, interditando a criação e a expressão dos/as estudantes.

Ao discutir as relações da escolaridade com a vida, Mosé (2013) assume que esse distanciamento da escola com a sociedade atua como uma barreira para as relações humanas, pois:

Essa falta de conexão da escola, tanto com a sociedade quanto consigo mesma, não é apenas prejudicial para o desenvolvimento cognitivo dos alunos, que se dá pela capacidade de fazer relações cada vez mais amplas e complexas, mas prejudica também as relações humanas, a prática da justiça social, o exercício da cidadania, implica diretamente o aumento do grau de angústia e solidão, e impulsiona cada vez mais ao consumo de produtos, de pessoas, de drogas lícitas e ilícitas. Participar da sociedade, interferir em suas instâncias, construí-la, nos dá uma sensação de pertencimento que nos fortalece e fortalece os acordos. Mas a escola foi se afastando dessa continuidade e se baseando em um conhecimento dividido e abstrato (MOSÉ, 2013, p. 51).

Entretanto, esse “distanciamento da escola”2 já havia sido discutido por Freire (2014), o qual se referiria à fragmentação e à descontextualização que a escola vinha promovendo. E, a partir dessa discussão, Freire propõe uma educação baseada nas “leituras de mundo”, que os/as estudantes já possuem. Assim, com conhecimentos que já se têm, o/a sujeito/a (estudante) aprenderia, considerando o que o/a mesmo/a já sabia e, portanto, não mais reproduziria conceitos vazios, que em seus contextos não possuíam significado, sentido ou relevância.

Louro (2000) aponta que uma tradição dualista, a qual se constitui em uma constante dicotomia, busca separar o mundo em uma dualidade antagônica, sendo imaterial/material, sol/lua, calor/frio, masculino/feminino, natural/cultural. Quando essa tradição se expressa no âmbito escolar, a autora sugere que há uma tentativa artificial de segregar, também, os corpos dos alunos, pensando seus corpos biológico-cognitivos, mas não compreendendo os aspectos culturais.

Assim, o dualismo e sua persistência em segregar instâncias pode ter se expressado de modo extremo no âmbito escolar e promovido as fragmentações e os distanciamentos identificados por Freire (2014), Mosé (2013) e tantos/as outros/as autores/as que já se debruçaram sobre este fenômeno. Desta forma, para pensar no trabalho com um tema transversal como a sexualidade (BRASIL, 1999), faz-se necessário criar estratégias para transgredir essas fronteiras, sejam elas de uma distância ou de um fragmento.

Pensar em sexualidade, por vezes, pode levar muitos ao engano de relacionar a temática somente ao sexo ou aos órgãos urogenitais. Contudo, estudos atuais, a exemplo do de Freitas e Dias (2010), consideram que as sexualidades3 se referem à identidade sexual do indivíduo, pois a sexualidade é o desejo de contato, o carinho, o amor, o prazer, sua construção e a interiorização de sentimentos. Desta forma, a sexualidade não deveria ser restrita apenas aos sistemas urogenitais, pois:

A sexualidade é uma das dimensões do ser humano que envolve gênero, identidade sexual, orientação sexual, erotismo, envolvimento emocional, amor e reprodução. É experimentada ou expressa em pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, atividades, práticas, papéis e relacionamentos... Sexualidade se refere não somente às capacidades reprodutivas do ser humano, como também ao prazer. Assim, é a própria vida (CASTRO; ABRAMOVAY; SILVA, 2004, p. 29).

Embora se entenda, teoricamente, que a sexualidade se relaciona com as questões anteriormente destacadas nos livros didáticos, um dos principais recursos utilizados para o ensino, a sexualidade está relacionada apenas às estruturas biológicas externas, como: os sistemas urogenitais, as mamas, os pelos pubianos, entre outros (TRINDADE; FERREIRA, 2008). Considerando esse contexto reducionista do conceito sexualidade, a expressão no âmbito escolar da educação sexual, por vezes, restringe-se à anatomia e à fisiologia do sistema urogenital.

Tendo em vista esses exemplos de educação sexual, Figueiró (2014) afirma que a sexualidade é também construída por fatores culturais e, portanto, o que se trabalha sobre ela na escola precisa envolver reflexões, tanto individuais quanto coletivas, pois, desta forma, o/a estudante poderá reconhecer-se enquanto sujeito de sua sexualidade. Logo, a educação sexual poderia ser trabalhada por meio de diferentes modalidades didáticas, possibilitando aos/às professores/as abordagens que envolvessem dinâmicas transversais e não apenas concentradas em determinado conteúdo.

Acerca da responsabilidade de trabalhar a sexualidade na escola, Madureira (2007) afirma que esta recai sobre os/as professores/as de Ciências e Biologia. Contudo, em outra pesquisa (TURKE et al., 2015), os/as docentes que participaram, inclusive os/as que lecionavam Ciências e Biologia, relataram que não se sentiam preparados/as ou confortáveis ao abordar a sexualidade.

Desta forma, somos levados a refletir acerca da emergência deste tema no contexto da sala de aula, uma vez que, se os/as professores/as se sentirem despreparados/as ou desconfortáveis, os/as mesmos/as poderiam tentar se eximir do trabalho com esta temática. Porém, Louro (1997) afirma que a presença da sexualidade na escola não depende exclusivamente da vontade ou do trabalho realizado pelo/a professor/a, uma vez que:

Essa presença da sexualidade independe da intenção manifesta ou dos discursos explícitos, da existência ou não de uma disciplina de “educação sexual”, da inclusão ou não desses assuntos nos regimentos escolares. A sexualidade está na escola porque ela faz parte dos sujeitos, ela não é algo que possa ser desligado ou algo do qual alguém possa se “despir” (LOURO, 1997, p. 81, assinalamentos da autora).

Em sua obra, Figueiró (2009, p. 141) evidencia a falta de formação dos/as professores/as com o tema da sexualidade ao dizer que: “Todo o processo formativo dos professores/as, tanto no magistério quanto nas licenciaturas, não os tem preparado para abordar a questão da sexualidade no espaço da escola”. Assim, seriam justificadas as sensações de desconforto e de despreparo dos docentes em trabalhar as temáticas relacionadas à sexualidade.

Todavia, o trabalho com a educação para a sexualidade no ambiente escolar se configura como ação fundamental para a redução dos preconceitos propagados e replicados cotidianamente (BELLO; LUZZI, 2009). Sendo assim, faz-se necessário investir em formação, tanto inicial como continuada, desses/as professores/as para a educação sexual.

Não é recente a preocupação com a constituição da identidade docente. Pimenta (1996) já pesquisava a construção dessa identidade no processo de formação de licenciandos. Segundo a mesma autora, a identidade docente e o contexto em que ela se forma irão guiar a ação e a prática de lecionar. Assim, entendemos a identidade docente enquanto uma necessidade que se configura com o contexto e se constrói a partir da significação social da profissão (PIMENTA, 1996).

Embora não exista um padrão na composição de um currículo de um curso de licenciatura, o estudo de Terrazzan et al. (2008) indicou que um dos fatores que influenciam na formação da identidade docente de licenciandos em Ciências Biológicas, é a quantidade de disciplinas que visam a formação pedagógica. Desta forma, a construção da identidade docente está associada aos componentes curriculares, o que respalda a importância de uma disciplina como a que nos propusemos a analisar.

Entretanto, Shulman (1986) explicita que a atuação profissional do educador envolve uma base de conhecimentos para o ensino. Sendo esta base composta pelos conhecimentos: do conteúdo; do currículo; pedagógico geral; pedagógico do conteúdo; dos/as alunos/as e suas características; do contexto educacional; dos fins, propósitos e valores educacionais, e seus fundamentos filosóficos e históricos. Ou seja, para Shulman (1987), apenas saber o conteúdo a ser lecionado não seria suficiente para se ensinar tal conteúdo, nem mesmo saber ensinar de forma geral poderia formar um/a professor/a que saiba ensinar qualquer conteúdo.

Portanto, damos ênfase ao conhecimento pedagógico do conteúdo (CPC) para pensar a formação docente no que toca à educação sexual. Pois, a partir desta base de conhecimentos para o ensino (SHULMAN, 1986) é que o/a professor/a irá adaptar e reorganizar os seus conhecimentos teóricos para a transposição na sala de aula (ARAMAN, 2011), utilizando-se das metodologias, abordagens e recursos didáticos que julgar necessários.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Esta investigação foi realizada tomando como corpus de pesquisa as respostas dos/as discentes a uma avaliação da disciplina de Práticas Pedagógicas: Sexualidade e Saúde. A avaliação se deu na primeira turma de Licenciatura em Ciências Biológicas a cursar a disciplina e, portanto, sua produção foi no ano de 2015, feita pela professora que a lecionava. A avaliação era composta por uma pergunta e uma solicitação (apresentadas a seguir), cujas manifestações foram expressas de forma dissertativa. Em que esta disciplina contribuiu para sua formação? Elabore sugestões que podem ser implementadas no desenvolvimento desta disciplina. Os/as discentes poderiam expressar-se da maneira que quisessem em uma folha de papel sulfite de tamanho A4.

Foram obtidas respostas de 28 licenciandos/as, que submetemos aos procedimentos da Análise Textual Discursiva (ATD) proposta por Moraes e Galiazzi (2007). Tal vertente analítica é considerada, tanto como uma metodologia de comunicação dos resultados como de aprendizado, uma vez que o pesquisador imerge nos dados e com eles aprende (e só então os comunica).

Para a análise, foi realizada a desconstrução dos textos registrados pelos/as estudantes, que consiste em um processo de fragmentação, em que as respostas foram divididas em trechos que buscavam manter seus sentidos semânticos. Tendo em mãos esses trechos, chamados de unidades de análise, passamos a um segundo processo interpretativo.

Primeiramente, codificamos cada uma dessas unidades, a fim de identificar a qual se referia e determinar a origem daquela unidade. Para isso elaboramos o seguinte código: D1501L1, que indica, respectivamente, depoente (D), resposta coletada no ano de 2015 (15), número da ordem de coleta (01), linha da resposta em que se encontra essa unidade (L1).

Em seguida, as unidades de análise foram submetidas ao estabelecimento de relações entre elas e dessas relações emergiram as categorias (três), as quais representavam as unidades de análise nelas contidas: Formações de si; Percepções de educação para a sexualidade; Instrumentalizações para a educação sexual.

Posteriormente, as categorias emergentes passaram a ser interpretadas a fim de buscar as novas compreensões acerca das respostas dos discentes, considerando não somente as respostas de cada sujeito, mas, também, estabelecendo relações entre o universo de respostas obtidas daquela turma. Desse movimento foi possível elaborar subcategorias para cada uma das categorias. Formações de si foi organizada em duas subcategorias; Percepções de educação para a sexualidade, também, em duas subcategorias; Instrumentalizações para a educação sexual em cinco subcategorias.

Cabe informar que não foi adotada a propriedade da exclusão mútua das categorias, procedimento que se refere à possibilidade de alocação de uma unidade de análise em uma única categoria. Pois, por se tratar de uma busca por indícios de identidade baseada nas percepções e situações vivenciadas durante o desenvolvimento de uma disciplina, consideramos algumas vezes acomodações duplas em função de contradições argumentativas apresentadas em uma mesma resposta pelos/as depoentes.

Diversos dos detalhes apresentados nesta seção, serão elucidados na próxima, pois durante a sistematização das categorias inserimos alguns exemplos dos componentes que as representam. Trazemos somente um ou outro fragmento, pois a completude dos dados inviabilizaria sua apresentação em um artigo (considerando a delimitação de páginas e caracteres desta forma de divulgação).

4 RESULTADOS EMERGENTES

Nesta seção organizamos os dados interpretados em um único quadro. Tal registro é o resultado de inúmeros outros procedimentos analíticos, que foram pouco a pouco sendo delineados, segundo as indicações de Moraes e Galiazzi (2007).

Na primeira coluna podem-se observar as três categorias emergentes, na segunda as subcategorias referentes a cada uma delas, e na terceira coluna exemplos de depoimentos que elucidam nossas nominações e alocações. Cabe verificar nesta coluna que negritamos algumas expressões, as quais nos orientaram durante o processo analítico.

Na continuidade ao quadro, esclarecemos e definimos os elementos das colunas 1 e 2 e fazemos diversos comentários interpretativos, os quais nos auxiliaram a elaborar as conclusões finais desta pesquisa.

Quadro 1 Categorias, subcategorias e relatos 

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS RELATOS (EXEMPLOS)
Formações de si Formação pessoal D1502L1 - Como ser humano essa disciplina me mostrou novos conceitos de diversidade de gênero e sexualidade [...].
D1503L1 - A disciplina tirou algumas dúvidas que eu ainda tinha mesmo tendo tido informações e conversas [...].
D1510L3 - É importante ter essas aulas tanto para o próprio conhecimento como também para ser usado para aplicação em sala de aula.
D1513L1 - Melhorou meu modo de vista ao meu companheiro, com tipos de pessoas e gosto diferente [...].
D1528L3 - [...] conhecimento pessoal e social (entender diferentes realidades) [...].
Formação profissional D1501L2 - [...] são muito esclarecedoras e ajudam a tirar dúvidas que futuramente podem surgir na minha profissão e vida acadêmica.
D1502L3 - Como possível futuro professor eu aprendi a como ajudar os alunos e colegas de trabalho em inúmeras situações desconfortáveis e perigosas.
D1505L1 - A disciplina é fundamental para nosso conhecimento e formação como professores e biólogos.
Percepções de educação para a sexualidade Orientação Sexual D1506L2 - Quebrando tabus e esclarecendo assuntos importantes para a saúde.
D1512L2 - [...] dúvidas acerca do ato sexual [...].
D1514L3 - [...] assim como instruir melhor sobre doenças [...].
D1516L2 - Ensinar sobre saúde e higiene como algo necessário, saber os procedimentos a serem feitos quando um aluno trata um tema mais sério (abuso, por exemplo).
Educação Sexual D1508L2 - [...] a entender melhor o amplo conceito da sexualidade.
D1509L1 - Essa disciplina contribuiu para o meu conhecimento sobre sexualidade e várias questões que a englobam.
D1511L3 - [...] sem preconceitos com o intuito de tornar a sociedade mais respeitosa e harmoniosa.
D1518L1 - Ela teve como objetivo desmistificar preconceitos e auxiliar na formação de um bom educador.
Instrumentalizações para a educação sexual Métodos de ensino D1501L3 - Achei interessantes os debates levantados em sala e os exercícios sobre filmes que tratam de um assunto normal, que é retratado como tabu na sociedade.
D1510L4 - Além da parte teórica, trazer mais dinâmicas para serem aplicadas, jogos, discussões, mais sugestões de filmes, séries e outros.
D1512L6 - Realizar mais atividades práticas sobre o perigo das DST’s [...].
Interesse por temáticas específicas D1509L3 - Sugestões: trabalhar pronomes e linguagem ao se referir a pessoas fora do binário de gênero (exemplo: agênero ou genderfluid, bigênero etc.).
D1510L2 - [...] para determinados assuntos envolvendo higiene pessoal, sexualidade, doenças, entre outras.
D1524L1 - A disciplina foi interessante, me ajudou a conhecer melhor a diversidade sexual, conhecer os gêneros, os métodos anticoncepcionais [...].
D1528L6 - [...] mais enfoque na relação homoafetiva feminina.
Potencial formativo para o/a outro/a D1517L2 - [...] saber a história da sexualidade, saber lidar com a questão da sexualidade como algo natural e passar isso para outras pessoas.
D1520L2 - Mostra a importância que é abordar esse assunto, já que há uma certa dificuldade em mostrar isso para as pessoas.
D1526L1 - É de extrema importância a disciplina de sexualidade, visto que há muitas informações desconhecidas por grande parte da população,
Dificuldades no processo formativo D1506L5 - Maior carga horária para poder ter mais dinâmicas e/ou divisão da sala para maior interação.
D1520L4 - Controlar mais a turma no momento de discussões, pois houve alguns exageros e falta de respeito entres alunos.
D1526L6 - [...] visto que algumas pessoas querem impor seus pensamentos a outros, sem ouvir a opinião alheia, levando o que era para ser uma discussão saudável, a uma discussão de ideologias e desnecessárias.
Considerações acerca da docente e da disciplina D1503L6 - Obrigada professora por ser atenciosa e meiga, pelo aprendizado.
D1504L4 - [...] com todo seu discernimento e competência.
D1504L5 - Sugestões: continue assim, sempre nos trazendo coisas novas.
D1512L8 - Obrigada por fazer do ensino algo tão especial!
D1524L5 - No geral, a disciplina está ótima.

Fonte: Os autores.

4.1 Formações de si

Nesta categoria foram alocadas as unidades de análise que faziam menção a uma contribuição da disciplina para algum processo formativo, seja ele de âmbito pessoal ou de âmbito profissional.

Nós a instituímos como sendo decorrente das aprendizagens e descobertas relatadas pelos/as licenciandos/as. Por vezes, os/as estudantes citaram que depois de cursarem a disciplina viam o mundo de uma forma diferente e que se relacionavam de outro modo a partir do que aprenderam. Contudo, quando estas percepções não mencionavam objetivamente a formação docente, consideramos que os/as discentes relatavam aprendizagens que contribuíram com sua formação pessoal. No entanto, estamos cientes de que esta formação pessoal interfere diretamente na formação profissional, mas ambas foram segregadas, a fim de uma sistematização que visou a didatização da comunicação destes resultados.

Cremos que os fragmentos alocados junto às categorias/subcategorias no Quadro 1 esclarecem e justificam nossas opções.

Destacamos, ainda, que para elaborarmos essas subcategorias pautamo-nos no que indicam: Alheit e Dausien (2006), quando afirmam que a aprendizagem é um processo individual, enquanto formação refere-se a um processo coletivo; Arruda, Araújo e Passos (2018), ao destacarem que a construção da identidade docente ocorre no âmbito social; Campos (1989), quando indica que a formação pessoal desenvolve-se a partir de processos psicológicos que permitem ao sujeito adquirir as habilidades que forem necessárias para a resolução de situações adversas do cotidiano; Gatti (2010), que entende a formação profissional como um conjunto de competências técnicas e operacionais associadas ao trabalho no ensino.

Desta forma, as percepções dos/as discentes evidenciam a contribuição formativa da disciplina, conforme foi requerido na avaliação da disciplina, as quais interferiram não apenas na formação profissional - um processo inerente à disciplina - mas participaram da formação pessoal desses/as discentes de forma complementar. Em contraponto, a pesquisa realizada por Rocha e França (2013), no Rio de Janeiro, enfatizou a necessidade de uma Formação Inicial em Ciências Biológicas que oportunize debates acerca de temáticas relacionadas a sexualidade, uma vez que os licenciandos que participaram dessa pesquisa - e não tiveram acesso a disciplinas como a que analisamos neste trabalho - quando solicitados para representarem a sexualidade, em geral, reproduziram conceitos hegemônicos e reforçadores de estereótipos que divergem da literatura e do conhecimento científico produzido acerca desta temática (ROCHA; FRANÇA, 2013).

Outro estudo, com semelhante objetivo, analisou as ementas das disciplinas e entrevistou os estudantes de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma universidade do estado de São Paulo, na qual foi-se questionado acerca do caráter formativo do curso para sexualidade (CORBAGI; BONZANINI, 2021). As respostas dos estudantes, somadas à análise das ementas, evidenciaram pouca contribuição do currículo do curso para a promoção dessa formação, contudo alguns entrevistados destacaram que se utilizaram de atividades extracurriculares para obterem essa forma, dentre as quais foi destacado o movimento estudantil (CORBAGI; BONZANINI, 2021). Considerando essas outras experiências e as evidências de contribuição para a formação pessoal-profissional da disciplina de sexualidade e saúde analisada, defendemos a instituição de disciplinas contendo as abordagens com sexualidade no currículo formal, visando cumprir com as diretrizes curriculares nacionais e prover esta formação a todos/as os/as estudantes e não somente aqueles/as que conseguem acessar essas atividades extracurriculares.

4.2 Percepções de educação para a sexualidade

Nesta categoria agrupamos as unidades que expressavam as concepções de educação para a sexualidade assumidas pelos/as discentes, considerando que essas se evidenciaram como uma orientação sexual (BRASIL, 1999), que se propõe a discutir a saúde e a sexualidade em uma perspectiva mais biológica e voltada para questões de higiene, ou de uma educação sexual, que enfoca as noções de identidade, cultura, política e diversidade.

Nela alocamos as unidades de análise que faziam menção aos modos de operar da educação sexual, considerando sua utilidade no contexto escolar. Logo, as percepções que denotavam o modo de pensar a educação para sexualidade estão reunidas aqui. Posteriormente, subdividimos essa categoria em duas perspectivas de trabalho com a educação para a sexualidade, sendo que uma perspectiva se refere a um ensino enfocado apenas nas questões biológicas (Orientação sexual) e o âmbito de higiene, enquanto a outra pensa o ensino como meio de se trabalhar as identidades, as diferenças e a diversidade (Educação sexual). Novamente, assumimos uma divisão, que pode não ser compartilhada por todos os que leem essas manifestações. Nossa intenção foi sistematizar os registros dos/as licenciandos/as.

Essas determinações organizacionais consideraram o que nos apresentam alguns autores, entre eles: Furlani (2009), que explora a contraposição dos termos educação sexual com orientação sexual, trazendo, historicamente, suas origens; Britzman (1999), ao defender que o uso da nomenclatura “orientação sexual” seja oriundo dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), os quais preveem uma perspectiva de formação para a cidadania, mas ainda se encontra atrelada às questões anatômicas, fisiológicas e reprodutivas; Louro (1997, 2008, 2011), quando afirma que a sexualidade não é algo exterior ao sujeito, sendo assim, a temática não poderia ser excluída do contexto educacional, defendendo que as sexualidades e os gêneros perpassam os discursos no contexto escolar, nas aulas que os conteúdos são as sexualidades ou não, ou seja, as sexualidades e os gêneros estão presentes nos discursos de Ciências, de Biologia, de Química e outras disciplinas, pois compreendem a diversidade, as identidades, as questões sociais e políticas.

No caso, a maioria das unidades de análise foi alocada na segunda subcategoria, o que pode evidenciar uma tendência na abordagem da disciplina em adotar uma perspectiva da educação sexual, voltada para a diversidade, a multiplicidade e a complexidade que envolve o próprio conceito de sexualidade. Contudo, os/as estudantes manifestaram as duas concepções de educação para sexualidade, o que nos levou a inferir que estes/as perceberam a educação para sexualidade como uma integração dessas duas perspectivas.

No Paraná foram mapeados indícios de educação para a sexualidade nos currículos das Licenciaturas em Ciências Biológicas de todas as Instituições de Ensino Superior (IES) da rede pública do estado (VITOR; MAISTRO; ZÔMPERO, 2020). E, a partir desta pesquisa, verificou-se que nessas IES são trabalhadas as temáticas correlatas à sexualidade, mas de forma desigual e com abordagens distintas (VITOR; MAISTRO; ZÔMPERO, 2020). Os autores destacam que as IES privilegiam abordagens estritamente biológicas e que nos currículos enfatiza-se as discussões que tangem a anatomia e a fisiologia do aparelho urogenital, em detrimento de questões envolvendo as questões sociais e afetivo-emocionais (VITOR; MAISTRO; ZÔMPERO, 2020). Desta forma, a abordagem de educação para a sexualidade adotada pelas IES pode estar relacionada com a forma e a postura com que esses professores em formação poderão adotar em sua prática docente.

4.3 Instrumentalizações para a educação sexual

Nesta última categoria agrupamos as unidades que continham percepções dos/as discentes acerca de sua formação inicial voltada para as questões da sexualidade, como defende Rufino et al. (2013), objetivando a construção de uma base de conhecimentos para o ensino (SHULMAN, 1986). São elas: metodologias utilizadas pela docente da disciplina para ensinar (Métodos de ensino), curiosidade ou vontade de saber mais sobre determinado assunto (Interesse por temáticas específicas), possíveis contribuições da disciplina para outras pessoas (Potencial formativo para outros), problemas identificados em sua própria formação durante a disciplina (Dificuldades no processo formativo) e percepções sobre o desenvolvimento da disciplina e o desempenho da docente (Considerações acerca da docente e da disciplina).

Na subcategoria Métodos de ensino, observamos a frequente menção das produções midiáticas trazidas para o contexto escolar como recurso didático, das atividades dinâmicas, práticas e nos momentos de debate. Além de mencionarem a importância desses métodos para seu próprio aprendizado, muitos/as enfatizaram a possibilidade de utilizá-los no futuro, os quais eram acompanhados de elogios ou adjetivos que denotavam satisfação (como: D1507L3 - [...] além de promover discussões saudáveis [...]). Com relação ao Interesse por temáticas específicas, notamos que foram recorrentes as solicitações de aulas que explorassem a diversidade sexual, os gêneros e suas nomenclaturas, as orientações sexuais, a higiene e as infecções sexualmente transmissíveis. No que tange à subcategoria de Potencial formativo para o/a outro/a, foram reunidas as percepções que indicavam a possibilidade da disciplina de educar outras pessoas, sendo possível que este conhecimento veiculado ajudasse na resolução de problemas sociais, que expressassem a sensibilidade dos/as discentes com a docência e que indicavam a produção de uma identidade docente, na qual não apenas pensavam sobre sua formação, mas em estratégias de transposição desses conhecimentos. Quanto às Dificuldades no processo formativo, foram pontuados pelos/as estudantes a pouca carga horária da disciplina e o mau comportamento de seus/suas colegas de turma. Por fim, as Considerações acerca da docente e da disciplina concentraram percepções que elogiavam a professora, suas habilidades enquanto docente e que enfatizavam a necessidade da disciplina.

Salientamos que essas cinco últimas subcategorias tiveram como base: a definição de Rangel (2014) de métodos de ensino, que os assume enquanto modos e técnicas com o objetivo de ensinar, mas que estes podem ser dinamizados e diversificados; os Focos de Aprendizagem Docente (FAD), de Arruda, Passos e Fregolente (2012), os quais seriam compostos por: interesse, conhecimento prático, reflexão, comunidade e identidade docente; e o conceito de dificuldades de aprendizagem definido pela Associação Psiquiátrica Americana (2002), a qual compreende como dificuldades ou perturbações da aprendizagem situações ou barreiras que promovam o baixo rendimento nas avaliações.

Considerando as subcategorias emergentes, as interpretamos como indícios da formação de uma identidade docente por parte dos/as discentes, uma vez que estes/as atentavam-se aos métodos de ensino, percebiam o potencial de educar outros/as, identificavam dificuldades que essa educação enfrentava, interessavam-se pelo conteúdo, admiravam a educadora e os modos de educar adotados por ela.

As questões descritas nesta categoria vão ao encontro do relato de Fernandes, Assis e Acrani (2022), que vivenciaram a inserção curricular de uma disciplina que se detinha à formação docente e à sexualidade em uma Universidade Federal no estado de Minas Gerais. As autoras relatam dificuldades semelhantes às descritas pelos estudantes nesta categoria, como: a carga horária e a inserção de discussões que não se restrinjam apenas às questões anatômicas e fisiológicas (FERNANDES; ASSIS; ACRANI, 2022). Contudo, assim como neste artigo, as autoras avaliam que essa disciplina contribuiu para a formação inicial desses professores, não apenas no que concerne aos conteúdos nela trabalhados, mas por proporcionar diferentes metodologias e abordagens para instrumentalizar os professores em formação que cursavam a disciplina (FERNANDES; ASSIS; ACRANI, 2022).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir desta investigação, identificamos evidências de que uma disciplina de Práticas Pedagógicas: Sexualidade e Saúde mobilizou as identidades de licenciandos/as do curso de Ciências Biológicas, sendo elas identidades profissionais e pessoais. Segundo os relatos dos/as estudantes, observamos que a identidade profissional foi influenciada pela construção contínua da identidade pessoal. Desta forma, mudanças na perspectiva pessoal também interferiram na forma que os/as licenciandos/as refletiam sobre a prática da docência.

Quanto à perspectiva de educação para a sexualidade, observamos a emergência de dois modos de se pensar educação sexual pelos/as licenciandos/as. Desses modos de pensar emergiram, tanto uma modalidade que tende para as ciências da saúde, as conceituações e identificações de doença, corpo biológico, sintomas e saúde no aspecto social, quanto uma maneira de olhar a educação sexual enquanto diversidade, a qual aponta para as diferenças, as identidades e as possibilidades de ser. Ambas as perspectivas foram citadas e destacadas como importantes pelos/as estudantes e podem ser consideradas complementares pelos/as mesmos/as.

A disciplina também operou como uma instrumentalização dos/as docentes em formação inicial. Os/as licenciandos/as destacaram as metodologias de ensino que foram utilizadas pela docente da disciplina como um processo de aprendizagem e como possibilidades de transposição para quando forem lecionar. Nas percepções foram evidenciados o interesse por temáticas específicas da disciplina e o potencial que esses conteúdos possuem para agenciar a formação de outros/as. Contudo, os/as estudantes descreveram algumas dificuldades enfrentadas durante a disciplina, as quais, em sua maioria, mostraram-se como incômodos em relação à carga horária da disciplina, a falta de respeito e o comportamento de seus/suas colegas licenciandos/as durante as aulas. E, mesmo sem terem sido solicitados, os/as discentes escreveram elogios à docente e aos seus modos de educar, o que indicou certa admiração pela professora e sua atuação, operando como inspiração para a formação de suas identidades docentes.

Dentre as demonstrações de interesse pelo conteúdo, as relações com a saúde e com a própria higiene foram frequentemente citadas pelos/as licenciandos/as, bem como os tópicos referentes à diversidade sexual. Contudo, ainda outras temáticas poderiam ter sido trabalhadas, mas que por destaques levantados por eles/as mesmos/as, como o tempo e a quantidade de estudantes em sala, não puderam ser desenvolvidos com abrangência. Por fim, os/as estudantes apontaram para a necessidade de aumento da carga horária para a disciplina e enfatizaram a relevância para a sua formação, tanto pessoal quanto profissional.

A partir de reflexões sobre os depoimentos dos/as graduandos/as, para os anos posteriores, além da parte teórica, levou-nos a inserir mais dinâmicas, jogos, filmes, oficinas, com o intuito de possibilitar mais espaços/tempos para dialogar e problematizar questões emergentes durante as aulas e aquelas tidas por polêmicas. Outra questão que percebemos nos depoimentos que inferiram indisciplina e a falta de respeito por ideias de outros/as sobre determinados assuntos, tais como aborto, feminismo e questões de gênero, é que por ter sido uma área do conhecimento pioneira na universidade, despertou muito interesse e curiosidade por parte não só dos/as estudantes regularmente nela matriculados/as, mas de outros cursos (Filosofia, Ciências Sociais) que assistiam às aulas, com permissão da docente responsável. E, com excesso de pessoas, de diferentes pensamentos e vivências, gerou algum desconforto por determinados posicionamentos extremistas a respeito daqueles assuntos tidos polêmicos, fato que levou a docente a restringir a participação destes nos anos seguintes, ficando apenas os/as regularmente matriculados/as.

Durante os anos subsequentes (que totaliza um quinquênio neste ano de 2020), percebemos que essa prática pedagógica possibilitou enfrentar desafios, romper barreiras e instigar os/as jovens a abrirem espaço para expor suas vivências, suas dificuldades, seus preconceitos e tabus, de modo a dialogar, a estabelecer e propagar novas propostas para serem aplicadas no contexto escolar ao vivenciarem a docência durante os projetos de ensino e extensão.

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NOTAS:

1 Durante a escrita do texto e construção do Quadro 1, utilizamos complementos textuais para elucidar e contextualizar os depoimentos que foram fragmentados no processo analítico. Esses complementos foram adicionados entre parênteses para que seja possível diferenciar o que foi acrescentado pelos autores e o que foi, de fato, dito pelos depoentes.

2 Esta expressão está sendo utilizada para ilustrar a fragmentação, o distanciamento dos conteúdos escolares citados por Freire (2014) e Mosé (2013), respectivamente. A condição de distância não está se referindo a uma medida física ou geográfica do espaço.

3 Sexualidades no plural constituiu uma forma de expressar a pluralidade das possibilidades de vivenciar a sexualidade, sem que se consolide ou normatize apenas uma ou algumas formas de vivenciá-la. O uso desta terminologia foi inspirado no artigo de Furlani (2007). Quando o termo sexualidade for mantido no singular é porque a este foi empregado o sentido de temática ou de conteúdo a ser estudado.

Recebido: 30 de Junho de 2021; Aceito: 01 de Setembro de 2022; Publicado: 15 de Maio de 2023

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