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Práxis Educativa

versión On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.14 no.2 Ponta Grossa mayo/ago 2019  Epub 14-Jun-2019

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.14n2.001 

Artigos

O currículo nas suas dimensões estrutural e interacional: perspetiva de Basil Bernstein*

The curriculum in its structural and interactional dimensions: Basil Bernstein’s perspective

El currículo en sus dimensiones estructural e interaccional: perspectiva de Basil Bernstein

Ana M. Morais** 

Isabel Pestana Neves*** 

Sílvia Ferreira**** 

**UIDEF (Unidade de Investigação, Desenvolvimento e Formação), Instituto de Educação, Universidade de Lisboa. E-mail: <ammorais@ie.ulisboa.pt>.

***UIDEF (Unidade de Investigação, Desenvolvimento e Formação), Instituto de Educação, Universidade de Lisboa. E-mail: <imneves@ie.ulisboa.pt>.

****UIDEF (Unidade de Investigação, Desenvolvimento e Formação), Instituto de Educação, Universidade de Lisboa; e Agrupamento de Escolas de São Gonçalo, Torres Vedras. E-mail: <silviacrferreira@gmail.com>.


Resumo:

O artigo, simultaneamente teórico e empírico, apresenta elementos de reflexão sociológica sobre a organização e desenvolvimento curriculares, quando se toma como principal referencial teórico o modelo do discurso pedagógico de Basil Bernstein (1990, 2000) e a sua teorização sobre formas e estruturas do conhecimento (1999). De um ponto de vista teórico, e com base no modelo do discurso pedagógico, descrevem-se as relações que se estabelecem entre o currículo e outros textos e contextos pedagógicos, referem-se processos de transformação (recontextualizações) que podem ocorrer quando o currículo é transposto para outros níveis do sistema educativo e apresentam-se algumas razões que podem estar na base dessas transformações. De acordo com a teorização sobre as estruturas de conhecimento, discute-se a relação entre a produção e a reprodução de conhecimento, para refletir sobre a relação que deve existir entre essas estruturas e as diferentes disciplinas do currículo. Incluem-se destaques sobre o currículo, em que se concretizam, através de explicitação e/ou exemplificação, os diferentes aspetos que sustentam a teorização apresentada. De um ponto de vista empírico, apresentam-se alguns dos procedimentos usados em análises do currículo, realizadas pelo Grupo ESSA (Estudos Sociológicos da Sala de Aula), a vários níveis de escolaridade e centradas na educação científica e indicam-se, a título de exemplo, alguns dos resultados obtidos. Finalmente fazem-se algumas considerações sobre o contributo da teoria de Bernstein para a análise curricular, com particular destaque para questões de política educacional, relacionadas com o significado sociológico da (des)centralização curricular e da flexibilidade curricular num currículo centralizado.

Palavras-chave: Desenvolvimento curricular; Educação científica; Modelo do discurso pedagógico; Estruturas de conhecimento

Abstract:

The article is both theoretical and empirical and makes a sociological reflection of the curriculum organization and development. Basil Bernstein’s model of pedagogic discourse (1990, 2000) and his theorization on forms and structures of knowledge (1999) constitute the central theoretical reference. From a theoretical perspective, and on the basis of the pedagogic discourse, the article describes the relationships between the curriculum and other pedagogic texts and contexts and refers the processes of transformation (recontextualizations) that may occur when the curriculum moves to other levels of the educational system, also pointing out reasons that may originate those transformations. On the basis of the theorization of knowledge structures, the relationship between production and reproduction of knowledge is discussed so that a reflection can be made on the relation that should exist between those structures and the several disciplines of the curriculum. Highlights of the curriculum are inserted in the article in order to concretize, through explicitness and/or exemplification, the various aspects that withstand the theorization. From an empirical point of view, the article provides some of the procedures that have been followed in curricula analyses made by the ESSA Group (Sociological Studies of the Classroom), at various schooling levels and focused on science education. Some examples of results obtained are given. Finally the article makes some reflections on the contribution of Bernstein’s theory for curriculum analysis, with a particular emphasis on questions of educational policy, related to the sociological meaning of curriculum (de)centralization and flexibility in the context of a centralized curriculum.

Keywords: Curriculum development; Science education; Model of pedagogic discourse; Knowledge structures

Resumen:

El artículo, es simultáneamente teórico y empírico, presenta elementos de reflexión sociológica sobre la organización y desarrollo curriculares, cuando se establece como principal referente teórico el modelo del discurso pedagógico de Basil Bernstein (1990, 2000), y su teorización sobre las formas y estructuras del conocimiento (1999). Desde el punto de vista teórico, y con base en el modelo del discurso pedagógico, se describen las relaciones que se establecen entre el currículo, otros textos y contextos pedagógicos, se refiere a procesos de transformación (recontextualizaciones) que pueden ocurrir cuando el currículo es transpuesto para otros niveles del sistema educativo y se presentan algunas razones que pueden ser la base de estas transformaciones. De acuerdo con la teorización de las estructuras de conocimiento, se discute la relación entre producción y reproducción de conocimiento, para reflexionar sobre la relación que debe existir entre esas estructuras y las diferentes disciplinas del currículo. Se incluyen destaques sobre el currículo, en que se concretiza, a través de la explicitación y/o ejemplificación, los diferentes aspectos que sustentan la teorización presentada. Desde un punto de vista empírico, se presentan algunos procedimientos usados en el análisis de los currículos, realizado por el Grupo ESSA (Estudios Sociológicos de la Sala de Aula), en varios niveles de escolaridad y centrado en la educación científica se indican, a modo de ejemplo, algunos de los resultados obtenidos. Finalmente se hacen algunas consideraciones sobre la contribución de la teoría de Bernstein para el análisis curricular, con particular destaque para cuestiones de política educacional, relacionadas con el significado sociológico de la (des) centralización curricular y la flexibilidad curricular en un currículo centralizado.

Palabras clave: Desarrollo curricular; Educación científica; Modelo del discurso pedagógico; Estructuras del conocimiento

Introdução

Em termos sociológicos, a teoria de Basil Bernstein (1990, 2000) pode constituir-se como um importante quadro teórico da investigação a realizar ao nível curricular e em outros textos e contextos educativos, como os manuais escolares e as práticas pedagógicas. Dado o rigor conceptual desta teoria é possível proceder a estudos aos vários níveis do sistema educativo, considerando não só as múltiplas relações entre esses níveis, mas também as relações que se estabelecem entre esse sistema e a sociedade.

Apresentam-se, neste artigo, elementos de reflexão sociológica sobre a organização e desenvolvimento curriculares, quando se toma como referencial teórico central o modelo do discurso pedagógico de Basil Bernstein (1990, 2000) e a sua teorização sobre formas e estruturas do conhecimento (1999). Neste sentido, dar-se-á particular ênfase aos modelos e conceitos, desenvolvidos por Bernstein, que têm uma ligação mais direta com o estudo do currículo.

Num primeiro ponto, começa-se por situar o currículo no modelo do discurso pedagógico, descrevendo as relações que se estabelecem entre o currículo e outros textos e contextos pedagógicos. Partindo dessas relações, referem-se os processos de transformação (recontextualizações) que podem ocorrer quando o currículo é transposto para outros níveis do sistema educativo e apresentam-se algumas razões que podem estar na base dessas transformações.

No ponto seguinte, e tendo como base a teorização sobre as estruturas de conhecimento, discute-se, em particular, a relação entre a produção e a reprodução de conhecimento. É, assim, possível proceder a uma reflexão sobre a relação que deve existir entre essas estruturas e as diferentes disciplinas do currículo.

Estes dois pontos, de cariz fundamentalmente teórico, incluem destaques sobre o currículo, em que se concretizam, através de explicitação e/ou exemplificação, os diferentes aspetos que sustentam a teorização apresentada.

No ponto que se segue, de cariz mais prático, apresentam-se alguns dos procedimentos usados em análises do currículo, realizadas pelo Grupo ESSA (Estudos Sociológicos da Sala de Aula)1, a vários níveis de escolaridade e centradas na educação científica. De forma a concretizar esses procedimentos, referem-se instrumentos utilizados nesses estudos e destacam-se, para alguns aspetos em análise, excertos retirados dos currículos estudados. Indicam-se também, a título de exemplo, alguns dos resultados obtidos.

O artigo termina com algumas considerações sobre o contributo da teoria de Bernstein para a análise curricular a vários níveis do sistema educativo, de forma a salientar as suas potencialidades no desenvolvimento de uma linguagem externa de descrição que permite a construção de instrumentos com grande poder analítico. Partindo desta teoria, levantam-se questões, de política educacional, relacionadas com o significado sociológico da (des)centralização curricular e da flexibilidade curricular num currículo centralizado.

O currículo no modelo do discurso pedagógico - Processos de recontextualização

Quando se posiciona o currículo no modelo do discurso pedagógico de Bernstein (1990, 2000), é possível analisar e discutir o significado sociológico da mensagem que ele contém e que resulta das múltiplas relações que se estabelecem aos vários níveis do aparelho pedagógico.

Bernstein (1990, 2000) pretende com este modelo (Figura 1) aplicável em sociedades contemporâneas desenvolvidas, evidenciar as múltiplas relações que se estabelecem entre a produção do conhecimento e a sua reprodução, referindo que o modelo assenta em dois pressupostos fundamentais. Um dos pressupostos é que o contexto educacional geral contemporâneo está relacionado com o campo da economia e com o campo do controlo simbólico. O outro pressuposto é o de que o contexto educacional tem como objetivo geral posicionar os sujeitos (professores e alunos) em referência a um conjunto de significados (discursos geralmente designados por conhecimento educacional transmitido pela escola) e de relações sociais (práticas específicas reguladoras da transmissão-aquisição dos significados legítimos e da constituição da ordem, relação e identidade).

Fonte: Bernstein (1990, adaptado por MORAIS; NEVES, 2007a).

Figura 1 Modelo do discurso pedagógico de Bernstein 

O modelo (Figura 1) engloba três níveis fundamentais de análise - geração, recontextualização e transmissão - e evidencia que o discurso pedagógico é determinado por um conjunto complexo de relações que pressupõem a intervenção de diferentes campos e contextos. Os dois primeiros níveis de análise estão associados à produção do discurso pedagógico e o terceiro nível à sua reprodução. Na parte superior do modelo estão representadas as relações entre o campo do controlo simbólico (onde se produz o conhecimento - ex., universidades e centros de investigação), o campo da economia (ligado à produção de recursos materiais - ex., empresas, indústria) e o campo do Estado (de onde emana o discurso regulador geral - DRG - que é constituído pelos princípios dominantes da sociedade e que está consignado na Constituição).

O currículo corresponde ao discurso pedagógico oficial (DPO) produzido no campo de recontextualização oficial que, no caso do sistema de ensino português, é fundamentalmente constituído pelo Ministério da Educação e respetivas direções-gerais. Enquanto discurso pedagógico oficial, o currículo contém uma mensagem que é o resultado das relações entre os campos do Estado, da economia e do controlo simbólico. Contudo, isto não significa que haja uma transposição direta dos discursos produzidos nesses campos, dado que ocorre uma transformação - recontextualização - em função da sua mudança para um novo contexto.

Na construção do currículo, o conhecimento académico produzido no campo de controlo simbólico é recontextualizado de forma a ser inserido num contexto educacional, segundo princípios que diferem dos que estiveram presentes na produção desse conhecimento. Conhecimentos do campo intelectual da educação (parte do campo de controlo simbólico) são também considerados na construção do conhecimento académico, sendo recontextualizados de acordo com os princípios pedagógicos e ideológicos dos seus autores. Por exemplo, a ciência que é veiculada nos currículos das disciplinas de ciências já foi transformada relativamente à ciência produzida pelos cientistas. Na construção do currículo, está ainda presente um determinado discurso regulador que resulta da recontextualização do DRG2. Como resultado destes processos de recontextualização, o conhecimento científico que é selecionado para ser inserido no currículo bem como a forma da sua aquisição não traduzem os conhecimentos e processos de investigação presentes nos campos em que tiveram origem. Como explica Bernstein (2000),

À medida que um discurso se move do seu local original para as suas novas posições como discurso pedagógico, ocorre uma transformação. A transformação ocorre porque de cada vez que um discurso se move de uma posição para outra, há um espaço onde a ideologia pode atuar. Nenhum discurso se move sem a ação da ideologia […]. Eu sugiro que à medida que o discurso se move, ele é transformado de um discurso atual, de um discurso não mediado para um discurso imaginário. (p. 32-33).

Tomemos o currículo de uma disciplina enquanto discurso pedagógico oficial

Por exemplo, a seleção dos conhecimentos da área da biologia para fazer parte de um currículo de ciências - ex., o conceito de fotossíntese - obedece a critérios relacionados com o nível de aprendizagem dos alunos e que têm subjacentes princípios associados ao posicionamento pedagógico e ideológico dos construtores do currículo. Também a seleção dos objetivos e estratégias de ensino/aprendizagem preconizados no currículo, baseada em ideias produzidas no campo intelectual da educação (das áreas da psicologia, epistemologia e sociologia), obedece aos mesmos critérios e depende do posicionamento dos autores. A referência a objetivos quase exclusivamente centrados na memorização e compreensão simples e referências ao construtivismo como modelo de ensino/aprendizagem são exemplos dessa seleção.

Ao ser posteriormente inserido no campo de recontextualização pedagógica (onde se incluem, por exemplo, departamentos de educação, escolas de formação de professores e instituições de produção de materiais pedagógicos), o discurso pedagógico oficial (currículo) é ainda objeto de um processo de recontextualização que irá traduzir o posicionamento pedagógico e ideológico dos agentes desse campo, recebendo também influência dos campos da economia e do controlo simbólico. É assim constituído o discurso pedagógico de reprodução que está presente, por exemplo, nos manuais escolares. Tal como as orientações curriculares refletem o posicionamento ideológico e pedagógico dos autores do currículo (ex., FERREIRA; MORAIS; NEVES, 2011), também as orientações contidas nos manuais refletem as interpretações que os autores fazem dos documentos curriculares, em função dos seus conhecimentos científicos e pedagógicos e das suas ideologias (ex., CALADO; NEVES, 2012). O discurso pedagógico de reprodução, ao ser posteriormente transposto para o nível de transmissão, sofre novo processo de recontextualização, constituindo-se como prática pedagógica. Esta prática irá depender do contexto específico de cada escola e da sua relação com os contextos da família e comunidade e refletir as decisões e interpretações que os professores fazem da mensagem dos manuais escolares e dos documentos curriculares, de acordo com as suas conceções pedagógicas/ideológicas e sob influências externas (económicas, ideológicas e académicas).

São os diferentes campos do aparelho pedagógico, influenciados pelos campos da economia e do controlo simbólico, que no seu conjunto definem o que do discurso pedagógico, relativo aos conhecimentos e capacidades que são objeto de ensino/aprendizagem, e o como desse discurso, relativo à forma como se processa o ensino/aprendizagem dos conhecimentos e capacidades.

Qual o significado da mensagem sociológica contida em manuais escolares e nas práticas pedagógicas dos professores, enquanto expressão de processos de recontextualização do currículo?

Embora os conhecimentos explorados no manual escolar e nas práticas dos professores contemplem os conhecimentos que estão expressos no currículo da respetiva disciplina, os modelos pedagógicos que irão orientar a transmissão-aquisição desses conhecimentos poderão não traduzir totalmente a mensagem contida no currículo, sendo o resultado da influência de teorias do campo intelectual da educação que os autores dos manuais e os professores perfilham.

Por exemplo, numa disciplina de ciências, as orientações expressas no currículo podem sugerir a realização de trabalho experimental, de trabalho cooperativo e/ou de resolução de problemas e, no entanto, nos manuais e/ou nas práticas essas componentes podem estar pouco ou nada representadas.

Daí a enorme importância que deve ser dada, na construção do currículo, à clara explicitação dos conhecimentos e das capacidades a serem desenvolvidos em cada nível de escolaridade, com referência à teorização e pressupostos que estão na base da seleção efetuada.

O modelo apresentado na Figura 1 evidencia, ao nível da transmissão do discurso, um conceito central à teoria de Bernstein - o conceito de código. O código é um princípio regulador, tacitamente adquirido, que seleciona e integra os significados relevantes, a forma da sua realização e os contextos evocadores. É, assim, um princípio regulador da relação entre contextos e gerador de princípios orientadores da produção dos textos adequados a cada contexto. A um nível operacional, o código é definido pela relação entre a orientação de codificação e a forma como essa orientação é realizada, segundo a fórmula OE/R/Cie ±Eie ±. Nesta fórmula, OE/R refere-se à orientação de codificação que pode ser restrita ou elaborada. Na orientação restrita, que caracteriza o discurso do dia a dia, os significados são particularistas, dependentes do contexto e têm uma relação direta com uma base material específica. Na orientação elaborada, que caracteriza o discurso pedagógico oficial, os significados são universalistas, relativamente independentes do contexto e têm uma relação indireta com uma base material específica. A forma como os significados são realizados está expressa, na fórmula, através dos conceitos de classificação (C) e de enquadramento (E) usados para analisar respetivamente as relações de poder e de controlo que caracterizam uma dada estrutura social; +/- é o valor forte ou fraco que a classificação e o enquadramento podem tomar; i refere-se a relações internas, ou seja, a relações dentro de um qualquer contexto de comunicação (família, escola, trabalho); e refere-se a relações externas, isto é, a relações entre diferentes contextos comunicativos (família e escola, comunidade e escola, escola e trabalho). Na sua dimensão pedagógica, o código surge, assim, como o princípio que regula a relação entre transmissores e adquiridores, que tem lugar, durante um certo período de tempo, em contextos/espaços especializados.

Uma vez que a comunicação educacional é regulada pelo código pedagógico, tal significa que o discurso pedagógico, presente nos vários níveis e em várias agências educacionais, encerra uma mensagem sociológica que é função da modalidade de código que regula a interação pedagógica (sendo, ao mesmo tempo, regulado por essa interação). Diferentes modalidades de código pedagógico contêm diferentes princípios de poder e/ou de controlo, sendo os conceitos de classificação e de enquadramento fundamentais para estabelecer a distinção crucial entre as componentes de poder e de controlo que têm expressão nos textos e contextos pedagógicos. A classificação, associada às relações de poder, diz respeito ao grau de isolamento entre categorias (sujeitos, discursos e espaços); é forte quando existe uma separação nítida entre categorias (por exemplo, entre professor e alunos) e fraca quando se esbate essa separação. O enquadramento, associado aos princípios de controlo, diz respeito à natureza da relação de comunicação entre categorias diferentemente posicionadas; é forte quando a categoria de maior estatuto assume o controlo na relação e fraco quando é dado controlo à categoria de menor estatuto.

Ao analisar o currículo, enquanto mensagem sociológica, Bernstein começa por distinguir entre dois tipos ideais de currículo (realidade visível) que têm subjacentes duas modalidades de código (realidade invisível) - o código de coleção e o código de integração. Num currículo baseado num código de coleção, a classificação é forte, o que significa que os conhecimentos estão isolados uns dos outros, separados por fronteiras nítidas; num currículo baseado num código de integraçã o, a classificação é fraca, isto é, o isolamento entre os conhecimentos é reduzido porque as fronteiras são esbatidas. Contudo, segundo Bernstein, esta forma de perspetivar o currículo, em função dos códigos pedagógicos, permite considerar não só o tipo de relação entre conhecimentos mas também a forma como os conhecimentos são transmitidos/adquiridos (pedagogia) e avaliados (avaliação). O conceito de enquadramento tem sido por isso usado para definir, conjuntamente com o conceito de classificação, os códigos subjacentes aos currículos. Tendo presente que os códigos de coleção e de integração correspondem a dois tipos ideais extremos (de classificação e enquadramento fortes ou fracos), é possível encontrar uma variedade de currículos caracterizados por valores intermédios de classificação e de enquadramento e/ou por combinações desses valores.

Tomando o currículo como objeto de estudo, o que significam diferenças no código pedagógico?

Um currículo de coleção é um currículo por disciplinas, em que estas são autónomas, assumindo algumas maior estatuto do que outras. Por exemplo, no currículo português do 2.º e 3.º ciclos, a Matemática tem maior estatuto do que a Educação Visual, sendo esse estatuto representado por exemplo pelo maior número de horas que lhe é atribuído ou pela existência de provas nacionais de avaliação. Um currículo de integração é um currículo não disciplinar, em que os conhecimentos são organizados em torno de um tema comum, sendo por exemplo a situação mais próxima do que se passa, em Portugal, num jardim-de-infância ou, eventualmente, no 1.º ciclo. Numa organização curricular intermédia podem existir múltiplas estruturas, como a de um currículo que, embora globalmente de coleção, inclua disciplinas que contêm conhecimentos de várias áreas do saber - é o caso da disciplina de Ciências Naturais no 5.º ano de escolaridade, com conhecimentos de biologia, geologia, química e física (dependendo a maior ou menor integração do grau de esbatimento das fronteiras entre esses conhecimentos no interior de uma mesma “disciplina”).

Uma mudança de códigos de coleção para códigos de integração poderá corresponder a uma mudança na forma de controlo sem, contudo, se alterarem as relações de poder. Se, por um lado, os códigos de integração podem ser vistos como expedientes tecnológicos para alterar os princípios de controlo, por outro lado, eles também podem corresponder a matrizes potenciais de mudança destinadas a efetuar uma alteração na distribuição do poder. Assim se explica que os códigos de integração possam ser igualmente apoiados por grupos de ideologias radicalmente diferentes (BERNSTEIN, 1975; DOMINGOS et al., 1986).

Na base do esquema da Figura 1, Bernstein apresenta as relações que definem o discurso pedagógico presente num contexto de transmissão. A dimensão estrutural do contexto é dada pelas relações de poder entre sujeitos, discursos e espaços/agências e a dimensão interacional pelas relações de controlo entre os sujeitos. Enquanto a classificação é usada para analisar a dimensão estrutural, o enquadramento é usado para analisar a dimensão interacional.

Ao nível da dimensão estrutural, as relações entre sujeitos referem-se, no contexto pedagógico da sala de aula, às relações entre o professor e os alunos e entre alunos socialmente diferenciados (género, classe social, etnia, aproveitamento escolar). Nesta relação, uma classificação fraca significa que se esbatem fronteiras entre sujeitos de diferentes estatutos sociais e uma classificação forte significa que essas fronteiras são muito nítidas. No caso da classificação entre transmissor e adquiridor, esta é sempre forte, dado o estatuto elevado que qualquer transmissor assume na relação pedagógica. Assim, as diferenças nesta relação correspondem a graus fortes de classificação de maior ou menor intensidade.

As relações entre discursos podem incluir relações entre o discurso académico (escolar) e o discurso não académico (do dia a dia), relações interdisciplinares e intradisciplinares. A classificação é fraca ao nível intradisciplinar quando se esbatem as fronteiras entre os vários assuntos de uma dada disciplina, o que se traduz numa articulação dos conhecimentos em conceitos sucessivamente mais abrangentes. Uma classificação forte corresponde, neste caso, a uma separação dos assuntos, o que se traduz, no seu extremo, num somatório de factos sem articulação explícita entre eles. Ao nível interdisciplinar, existe uma classificação forte quando não se estabelece qualquer articulação entre as diferentes disciplinas do currículo, ao passo que a classificação é fraca quando essa articulação estiver presente. As relações entre o conhecimento académico e o conhecimento não académico correspondem a diferentes graus de uma classificação sempre forte, dado que, no contexto escolar, é o conhecimento académico que assume maior estatuto.

As relações de poder entre os espaços referem-se, no contexto da sala de aula, às relações entre os espaços do professor e dos alunos e entre os espaços dos diferentes alunos. A classificação é forte quando as fronteiras entre espaços são nítidas - a existência de uma mesa do professor distinta e separada das mesas dos alunos é um exemplo desta classificação na relação “espaço do professor-espaço dos alunos”; a classificação é fraca quando se esbatem as fronteiras entre espaços - a existência de grupos de alunos socialmente diferenciados a partilhar a mesma mesa constitui um exemplo desta classificação na relação entre os espaços dos alunos.

Embora as relações apresentadas nesta parte do esquema se refiram às relações que têm lugar em contextos de reprodução, como é o caso do contexto da prática pedagógica na escola/sala de aula, elas podem também, em parte, ser apreciadas em estudos do currículo, tomado como discurso pedagógico oficial nas suas dimensões estrutural e interacional.

No contexto do currículo, em que se traduzem as relações de poder que definem a dimensão estrutural?

Numa análise curricular, a relação de poder entre sujeitos refere-se à relação que existe entre o Ministério da Educação (enquanto transmissor) e os professores/autores de manuais (enquanto adquiridores). Dada a diferente função que lhes é atribuída e o maior estatuto do Ministério da Educação, esta relação é caracterizada por uma classificação forte.

A relação de poder entre o discurso académico e o discurso não académico é, no contexto do currículo, caracterizada por uma classificação forte, assumindo o discurso académico o maior estatuto, dado que é este que constitui o objeto de estudo. A relação de poder entre disciplinas pode ser caracterizada por classificações mais ou menos fortes, consoante se trate de um currículo de coleção ou de um currículo de integração - num currículo de coleção, a classificação assumirá sempre um valor forte dado que, mesmo quando se estabelecem, ao nível de cada disciplina, relações com os conhecimentos de outras disciplinas, é o conhecimento da disciplina em causa que tem maior estatuto; num currículo de integração, em que a classificação é fraca, não existem disciplinas distintas, mas temas agregadores em torno dos quais se exploram conhecimentos de diferentes áreas do saber. A relação intradisciplinar pode ser, no contexto de cada uma das disciplinas do currículo, caracterizada por classificações fracas ou fortes consoante exista ou não uma articulação entre os assuntos da disciplina.

A relação de poder entre as duas agências - Ministério da Educação (agência de recontextualização oficial) e escola (agência de reprodução) - é caracterizada por uma classificação forte, dado que representam espaços distintos onde têm lugar atividades distintas.

Voltando à base do esquema da Figura 1 é de referir que, na sua dimensão interacional, o discurso pedagógico é definido pela relação DI/DR, em que DI corresponde ao discurso instrucional (conhecimentos e capacidades) e DR corresponde ao discurso regulador (princípios e normas de conduta social). No contexto da interação pedagógica, são particularmente importantes as relações entre transmissor e adquiridor, que se referem à seleção dos conhecimentos e capacidades, à sequência da aprendizagem, à ritmagem, ou seja à taxa esperada de aquisição, e aos critérios de avaliação, isto é, aos critérios que determinam a produção do texto legítimo. Os princípios subjacentes a estas relações designam-se, no seu conjunto, por regras discursivas, visto que se referem aos princípios que regulam a transmissão-aquisição do discurso instrucional específico (DIE - por exemplo, conhecimentos e capacidades cognitivas relacionados com Biologia, História, Educação Visual, entre outras) ou do discurso regulador específico (DRE - atitudes, valores, competências socioafetivas).

As regras discursivas dizem, assim, respeito ao controlo que os transmissores e adquiridores podem ter no processo de transmissão-aquisição e o conceito de enquadramento permite estabelecer, para cada uma das regras, a natureza do controlo. Por exemplo, no contexto da prática pedagógica, o enquadramento será forte, quanto às regras discursivas que regulam o DIE, se o professor (transmissor) tiver o controlo sobre os assuntos e atividades a explorar (seleção), a ordem segundo a qual se processa a aprendizagem (sequência) e o tempo destinado à aprendizagem e se deixar claro aos alunos (adquiridores) o texto a ser produzido como resultado da aprendizagem (critérios de avaliação); o enquadramento será mais fraco quando o adquiridor tiver também algum controlo nessas regras.

Para caracterizar o código pedagógico, ainda na dimensão interacional, são também cruciais as regras hierárquicas que regulam a forma de comunicação entre sujeitos com posições hierárquicas distintas (professor com maior estatuto do que alunos). No contexto da prática pedagógica um enquadramento fraco significa, por exemplo, que o professor explica aos alunos as razões porque se devem comportar de determinada maneira, apelando a uma relação interpessoal - controlo pessoal; um enquadramento forte e um enquadramento muito forte caracterizam respetivamente um controlo posicional e imperativo em que, no primeiro caso, o professor apela a regras e estatutos determinados e, no segundo caso, o professor recorre a ordens, admoestações, sem dar qualquer razão da sua atitude.

No contexto do currículo, em que se traduzem as relações que definem a dimensão interacional?

Sempre que se analisa o significado sociológico das mensagens contidas no currículo em termos da relação Ministério da Educação-escola/professor, poderemos estabelecer um paralelo com a relação professor-aluno, quando se admite que as diretrizes curriculares podem enfatizar o papel do professor como sujeito passivo da relação, que age como executor do currículo estabelecido pelo ministério, ou enfatizar o papel do professor como sujeito ativo, que intervém como construtor do currículo.

A relação entre o Ministério da Educação (ME) que propõe o currículo (transmissor) e os professores/autores de manuais escolares que implementam o currículo (adquiridores) será caracterizada, quanto às regras discursivas, por enquadramentos fortes quando o professor não tem qualquer possibilidade de alterar os conhecimentos e capacidades referidos no currículo (seleção), a ordem da sua exploração (sequência), o tempo de aprendizagem previsto (ritmagem) ou as normas relativas à avaliação dos conhecimentos e capacidades (critérios de avaliação). Esta situação, que está presente em sistemas educativos com currículo centralizado, significa que o professor não tem qualquer controlo sobre o processo educativo. Quando existe flexibilidade curricular, o enquadramento na relação ME-professor é enfraquecido, podendo os professores ter algum controlo sobre uma ou várias regras discursivas.

Quanto às regras hierárquicas, na relação ME-professor, elas serão caracterizadas por um enquadramento fraco se no currículo existirem esclarecimentos, por exemplo, sobre o significado de determinada opção curricular, sobre as razões de natureza teórica (epistemológica, psicológica, sociológica) que justificam a seleção feita quanto aos conhecimentos e capacidades e/ou quanto à modalidade de prática pedagógica a ser seguida pelos professores. Assim, embora o poder nesta relação hierárquica seja detido pelo ME (classificação forte), o controlo do ministério em relação ao professor é de natureza interpessoal. Tal como no contexto da prática pedagógica em sala de aula, esta forma de controlo constitui um expediente discursivo para assegurar, de forma mais eficiente, as relações de poder. O enquadramento será forte quando o controlo do ME sobre os professores for de natureza posicional, o que significa que não é fornecido no currículo qualquer tipo de razões sobre as orientações pretendidas.

Num estudo sobre currículo é também particularmente importante analisar a sua mensagem pedagógica, em termos das regras discursivas e hierárquicas que devem caracterizar a relação professor-aluno em contexto de sala de aula. Tal significa analisar, por exemplo, as sugestões metodológicas do currículo, no sentido de retirar o significado das interações subjacentes a essas sugestões. Se no currículo for indicada uma atividade investigativa, de pesquisa autónoma, tal pode ser visto como indiciando uma relação professor-aluno caracterizada por enquadramento fraco; neste caso, é dado algum controlo ao aluno sobre as regras discursivas. Também, ainda que de forma muito indireta, se pode retirar o significado da interação professor-aluno em termos de regras hierárquicas - estará subjacente a ideia de um controlo pessoal nessa interação se no currículo forem, por exemplo, referidas razões que o professor deve dar aos alunos sobre o trabalho a ser realizado.

Para além das dimensões estrutural e interacional do currículo que caracterizam o como do discurso pedagógico, constitui uma dimensão de grande importância o que do discurso pedagógico. Embora o que do discurso instrucional possa ser analisado em termos dos conhecimentos (e capacidades) que são selecionados para integrar o programa de uma determinada área disciplinar, ele também pode ser analisado em termos do nível de conceptualização do conhecimento e do nível de complexidade das capacidades que são selecionados como objeto de ensino/aprendizagem. Esta tem sido a opção tomada nos estudos de análise curricular realizados pelo Grupo ESSA (ex., CALADO; NEVES; MORAIS, 2013; FERREIRA; MORAIS, 2014). Tal não significa negligenciar a importância que deve ser dada à questão do estatuto que é atribuído às disciplinas de um determinado currículo (por exemplo, dentro de um currículo de ciências, a Biologia ter maior estatuto do que a Geologia) ou a assuntos específicos dentro de uma mesma disciplina. Significa que subjacente a essa opção está a defesa de que o nível de exigência conceptual em que qualquer conhecimento científico é explorado representa uma dimensão crucial do processo de ensino/aprendizagem. Defende-se também que na conceção de um currículo se deve valorizar a profundidade em detrimento da abrangência, tendo em conta a coerência curricular vertical e horizontal (BYBEE, 2003; GEAKE, 2009).

Elevar o nível de exigência conceptual na educação científica tem fundamentação de natureza epistemológica, tornando possível proporcionar a todos os alunos o acesso à estrutura hierárquica (ver ponto 2) que caracteriza o discurso vertical em contextos de ensino das ciências. Tem ainda fundamentação sociológica e psicológica. Dada a relevância que pode ser atribuída ao nível de exigência conceptual de um currículo, é possível analisar esta dimensão tendo em conta três parâmetros de análise, dois relacionados com o que do discurso pedagógico (complexidade dos conhecimentos e complexidade das capacidades cognitivas) e um relacionado com o como do discurso pedagógico (relação intradisciplinar entre discursos).

No contexto do currículo, em que se traduz o nível de exigência conceptual, tomado nos seus três parâmetros?

Num currículo de elevado nível de exigência conceptual são apresentados conhecimentos e capacidades de elevado grau de complexidade e estão presentes relações intradisciplinares caracterizadas por uma fraca classificação entre discursos, o que se traduz numa articulação clara entre diferentes assuntos da disciplina. A referência, no currículo, a esquemas conceptuais, a par de conceitos e de factos exemplifica esta situação. Pelo contrário, num currículo de baixo nível de exigência conceptual são apresentados conhecimentos e capacidades de reduzido grau de complexidade e estão presentes relações intradisciplinares caracterizadas por uma forte classificação entre discursos, o que se traduz num somatório de factos sem qualquer articulação entre eles. Entre estes dois extremos podem existir situações intermédias cujo nível dependerá da resultante combinação entre os três parâmetros.

Considerando todas as relações referidas, é possível ainda analisar a forma como os autores do currículo explicitam quer a mensagem pedagógica contida nesse documento, quer os princípios que fundamentam essa mensagem e, através desta análise, inferir o espaço de autonomia que é deixado aos autores de manuais e aos professores para reproduzir/recontextualizar a mensagem presente no currículo. Resultados de estudos sobre currículos, realizados no contexto da educação científica em vários níveis de escolaridade (ex., MORAIS; NEVES; FERREIRA, 2014), têm permitido uma discussão e reflexão fundamentadas sobre várias dimensões do ensino/aprendizagem como, por exemplo, a natureza dos conhecimentos e capacidades valorizados nos currículos (ex., NEVES; MORAIS, 2001a), os processos de ensino/aprendizagem que esses currículos preconizam (ex., MORAIS; NEVES; FONTINHAS, 1999; SILVA; MORAIS; NEVES, 2013a), a inclusão da natureza da ciência no ensino das ciências (ex., CASTRO, 2006, 2017; FERREIRA; MORAIS, 2013). Têm também permitido uma discussão e reflexão sobre a questão da flexibilidade curricular (ex., NEVES; MORAIS, 2001b, 2006).

Tomando ainda como referência o modelo do discurso pedagógico de Bernstein (Figura 1), é de salientar que as relações de classificação e de enquadramento analisadas em contextos escolares se aplicam do mesmo modo a contextos familiares desde que se considere mãe/pai em vez de professor, filho em vez de aluno e conhecimentos familiares em vez de disciplinas. Aplicam-se também a contextos de formação de professores, desde que se considere formador em vez de professor, professor em vez de aluno, agências de formação de professores/agências exteriores em vez de escola-família/comunidade e conhecimento prático dos professores em vez de conhecimento não académico. A aplicação do modelo a estes contextos pode ser observada em estudos, realizados pelo Grupo ESSA, centrados na família (ex., NEVES; MORAIS, 2005) e centrados na formação de professores (ex., AFONSO; MORAIS; NEVES, 2002). Estas possibilidades refletem o poder de explicação, descrição e transferência contido na teoria de Bernstein. Para além da aplicabilidade do seu modelo a vários textos e contextos pedagógicos, é extremamente importante a mensagem de mudança que pode encerrar através dos processos de recontextualização que têm lugar ao longo de todo o aparelho pedagógico.

Disciplinas do currículo e estruturas de conhecimento

A análise, discussão e reflexão sobre currículos implica considerar também, entre outros aspetos, a natureza das disciplinas que os compõem e a relação que é estabelecida entre o conhecimento escolar e o conhecimento do dia a dia. De acordo com a teorização de Bersntein (1999) sobre a natureza dos discursos e das estruturas de conhecimento que caracterizam as diferentes áreas do saber, um currículo corresponde a um discurso vertical que pode diferir em organização e conceptualização, consoante a estrutura da área disciplinar a que se refere.

Atendendo à sua natureza, Bernstein distingue duas formas de discurso - discurso vertical e discurso horizontal - e, dentro do discurso vertical, duas estruturas de conhecimento - estrutura hierárquica e estrutura horizontal. Distingue ainda, dentro das estruturas horizontais de conhecimento, as estruturas que têm uma gramática forte das estruturas que têm uma gramática fraca. A Figura 2 apresenta um esquema que ilustra a referida teorização.

Fonte: Adaptado de Bernstein (1999).

Figura 2 Discursos verticais e horizontais 

A distinção entre as duas formas de discurso - horizontal e vertical - baseia-se na diferença que existe entre o conhecimento do senso comum ou do dia a dia (discurso horizontal) e o conhecimento escolar (discurso vertical). No contexto da educação formal, a distinção entre estas duas formas de discurso pode relacionar-se com a distinção que usualmente se faz entre discurso não académico e discurso académico e entre conhecimento local e conhecimento oficial, respetivamente (MORAIS; NEVES, 2007a).

O discurso horizontal corresponde a uma forma de conhecimento organizado de modo segmentado e diferenciado e que tende a ser um discurso “oral, local, dependente e específico do contexto, tácito, multiestratificado e contraditório entre contextos” (BERNSTEIN, 1999, p. 159). O discurso vertical corresponde a uma forma de conhecimento que pode apresentar uma organização diferente consoante a natureza do saber - uma estrutura coerente, explícita, hierarquicamente organizada ou uma série de linguagens especializadas. A primeira integra proposições e teorias que operam a níveis cada vez mais abstratos, de modo a explicar a uniformidade subjacente a diversos fenómenos aparentemente diferentes. As ciências naturais, como a Física, a Química, a Biologia são exemplos de um discurso vertical com estrutura hierárquica. As estruturas horizontais de conhecimento são caracterizadas por uma série de linguagens especializadas com os seus modos próprios de questionamento e também com critérios específicos para a produção e circulação de textos. Por conseguinte, o desenvolvimento destas estruturas corresponde à introdução de uma nova linguagem, com um novo conjunto de questões, de relações e de defensores. As ciências sociais, como a Sociologia, a Economia e a História são exemplos de um discurso vertical com estrutura horizontal. Assim, enquanto nas estruturas hierárquicas de conhecimento existe uma integração da linguagem, nas estruturas horizontais de conhecimento existe uma acumulação de linguagens.

Bernstein (1999) estabelece ainda uma divisão das estruturas horizontais de conhecimento em duas formas de conhecimento: os conhecimentos que possuem uma linguagem interna de descrição com gramáticas fortes, como a Economia e áreas da Psicologia; e os conhecimentos que possuem uma linguagem interna de descrição com gramáticas fracas, como a Sociologia, a Antropologia e outras áreas da Psicologia. As primeiras são claras e explícitas em relação aos conceitos, às relações que se estabelecem entre eles e às descrições empíricas, enquanto nas segundas estes aspetos são pouco explícitos.

Ao considerar estas diferenças, Bernstein pretende pôr em evidência os princípios internos da produção de áreas distintas do conhecimento que são sujeitas à transformação pedagógica e chamar a atenção para os problemas de aquisição das diferentes formas de conhecimento. Centrando-se na distinção entre discursos horizontal e vertical, Bernstein tece algumas considerações sobre o uso de conhecimentos do discurso horizontal em educação. Segmentos do discurso horizontal, isto é conhecimentos do senso comum, têm sido inseridos no discurso vertical, ao nível dos conteúdos de diversas disciplinas, como parte do movimento para tornar os conhecimentos académicos mais acessíveis aos alunos. Contudo, se na conceção de um currículo, o discurso horizontal for encarado ao nível das disciplinas como um recurso primordial para combater o elitismo e o suposto autoritarismo do discurso vertical, pode-se correr o risco de o discurso horizontal vir a assumir um maior estatuto do que o discurso vertical. A ideia de que, no discurso oficial, conhecimentos do discurso académico e do discurso não académico devem ser igualmente legitimados, por estes últimos serem mais adequados aos interesses e motivações dos alunos, limita o acesso dos alunos mais desfavorecidos ao texto oficial legítimo, que assim continuarão desfavorecidos.

Contudo, estabelecer relações entre os dois discursos, assumindo o discurso vertical um maior estatuto, pode, e deve, constituir uma vertente importante do currículo de qualquer disciplina. Por exemplo, Morais e Neves (2009) consideram que “a aprendizagem dos alunos poderá ser melhorada quando se deixa entrar, na escola, os seus conhecimentos e experiências” (p. 20), deixando clara a forte classificação entre os dois discursos e a sua especificidade. Assim, sem comprometer o maior estatuto que deve ser atribuído ao discurso vertical, devem ser introduzidos nos currículos exemplos de situações do dia a dia que possam ser explicadas com base no conhecimento escolar.

Quando se pensa no currículo, enquanto discurso oficial, mas tendo em conta a estrutura - hierárquica ou horizontal - que caracteriza as diferentes áreas do saber, é importante discutir em que medida a organização e conceptualização do programa de uma determinada disciplina refletem a estrutura do conhecimento que se pretende transmitir.

Tomemos a Biologia como um exemplo de conhecimento de estrutura hierárquica

A teoria da evolução ou a teoria celular contêm princípios que integram e unificam ideias relacionadas com um conjunto de fenómenos biológicos e o desenvolvimento destas teorias resulta de uma conceptualização cada vez mais abrangente de teorias anteriores sobre os mesmos fenómenos. O desenvolvimento de uma linguagem conceptual em Biologia, como em qualquer conhecimento de estrutura hierárquica, pode implicar a refutação de posições anteriores ou a incorporação de posições anteriores em proposições mais gerais mas, em qualquer dos casos, corresponde a um desenvolvimento que se processa segundo uma estrutura hierarquizada.

A organização curricular de disciplinas relacionadas com áreas do saber de estrutura hierárquica (como a Biologia ou a Física) deverá, assim, refletir essa estrutura, o que significa que os conceitos a serem apreendidos devem surgir de forma interligada e segundo uma sequência hierarquizada. A ideia de currículo em espiral, segundo Bruner (1963), que teve principalmente na sua base conceitos da área da psicologia, pode ganhar uma nova dimensão, de cariz sociológico, de acordo com esta teorização de Bernstein.

A organização curricular de disciplinas relacionadas com áreas do saber de estrutura horizontal deverá ser diferente da que existe no caso de disciplinas relacionadas com áreas do saber de estrutura hierárquica. Enquanto neste último caso, não é indiferente a seleção e sequência dos conceitos que são incluídos no currículo da disciplina, no primeiro caso a seleção e sequência dos conceitos que são incluídos no currículo da disciplina vão depender fundamentalmente da posição/ideologia do seu autor. A Economia pode ser tomada como um exemplo interessante de uma disciplina com estrutura horizontal, dado que podem coexistir linguagens diferentes dentro desta área do conhecimento que não são transmutáveis porque partem de pressupostos distintos e muitas vezes opostos3. E uma vez que esta área do saber contém uma sintaxe conceptual explícita com a capacidade de gerar descrições empíricas relativamente precisas e/ou a formação de modelos formais de relações empíricas, a economia corresponde a uma estrutura horizontal de gramática forte.

Ao chamar a atenção para os problemas de aquisição das diferentes formas de conhecimento, Bernstein refere que, dentro das estruturas hierárquicas de conhecimento, não se coloca ao adquiridor o problema de saber, por exemplo, se está a falar de física ou a escrever sobre física mas apenas o problema do uso correto da física. Como esta forma de conhecimento é caracterizada por uma gramática forte, essa gramática torna visível o assunto de que trata e, para o adquiridor, a passagem de uma teoria para outra não indica uma quebra na linguagem mas simplesmente uma extensão dos poderes explicativo e descritivo dessa linguagem. No caso das estruturas horizontais de conhecimento, os problemas de aquisição surgem, em particular, quando a gramática é fraca.

Estudos realizados pelo Grupo ESSA têm considerado, no âmbito da aprendizagem científica, os problemas de aquisição do conhecimento científico enquanto discurso vertical com estrutura hierárquica (ex., MORAIS; NEVES, 2012), de aquisição do discurso vertical na sua relação com o discurso horizontal (ex., FERREIRA; MORAIS, 2017), e também de aquisição do conhecimento metacientífico, relativo à natureza da ciência, enquanto discurso vertical com estrutura horizontal (ex., CASTRO, 2017; FERREIRA; MORAIS, 2013).

Em síntese, a conceptualização de Bernstein sobre formas de discurso e estruturas de conhecimento pode constituir um importante referencial teórico a ter em conta na construção de currículos. Desta forma, será possível uma recontextualização do campo do controlo simbólico (onde se produz o conhecimento) para o campo de recontextualização oficial (onde se constrói o currículo) que considere, com as devidas diferenças contextuais, a articulação entre a produção e a reprodução do conhecimento.

Análise do discurso pedagógico oficial - Casos exemplares

Nesta secção apresentam-se sugestões, teoricamente fundamentadas, de como podem ser analisadas as dimensões do discurso pedagógico oficial (DPO) veiculado pelo currículo (Figura 3). Recorrendo a estudos empíricos realizados pelo Grupo ESSA, tendo por base o modelo do discurso pedagógico de Bernstein, apresentam-se também, a título de exemplo, resultados de análises sobre o currículo que ilustram os procedimentos utilizados. Nesses estudos, o currículo foi objeto de uma análise documental enquadrada numa abordagem metodológica com características de uma metodologia mista de investigação (ex., CRESWELL, 2003; MORAIS; NEVES, 2007b). Por um lado, a construção dos instrumentos que orientaram as diferentes análises baseou-se em quadros teóricos de referência, nomeadamente a teoria de Bernstein, os quais permitiram estabelecer os indicadores e as categorias de análise relacionados com as dimensões em estudo. Por outro lado, os descritores usados nos instrumentos foram definidos com base em dados empíricos relacionados com os textos em análise. A dialética entre o teórico e o empírico que orientou a construção dos instrumentos permitiu, assim, ter em conta não só a realidade em estudo mas também os quadros teóricos de suporte. A existência desta dialética foi possível dado o rigor conceptual da teoria de Bernstein que, ao possuir uma linguagem de descrição interna de gramáticas fortes, permite o desenvolvimento de linguagens de descrição externa que, por sua vez, possibilitam a orientação de análises empíricas mais sistematizadas. Tal como Morais e Neves (2007b) defendem, “rejeita-se quer a análise do empírico sem uma base teórica, quer a utilização de teoria que não permita a sua transformação com base no empírico” (p. 78).

Fonte: Adaptado de Silva, Morais e Neves (2013a). * ME- Ministério da Educação; C- classificação; E- enquadramento.

Figura 3 Dimensões de análise do discurso pedagógico oficial expresso no currículo 

O mesmo tipo de procedimentos metodológicos tem sido usado não só na análise de textos monológicos como é o caso do currículo (ex., CALADO; NEVES; MORAIS, 2013; FERREIRA; MORAIS, 2013; 2014; SILVA; MORAIS; NEVES, 2013a) e de outros textos pedagógicos como, por exemplo, os manuais escolares (ex., CALADO; NEVES, 2012), mas também na análise de textos dialógicos como é o caso da prática pedagógica em sala de aula (ex., ALVES; MORAIS, 2012; FERREIRA; MORAIS, 2017; SILVA; MORAIS; NEVES, 2013b) e de contextos de formação de professores (ex., AFONSO; MORAIS; NEVES, 2002). Enquanto em textos dialógicos, é possível proceder a uma análise direta de todas as dimensões do discurso pedagógico, em textos monológicos, como o currículo, a análise tem em alguns casos de ser baseada em inferências. É, por exemplo, o que se passa com a análise da relação entre sujeitos e entre espaços.

Na análise curricular podem ser tomadas como objetos de estudo as duas secções que usualmente surgem no currículo de qualquer disciplina - Orientações/Princípios Gerais e Orientações Específicas/Programáticas, de operacionalização dos princípios gerais. Esta separação analítica permite estudar processos de recontextualização que podem ocorrer no interior do currículo. O texto de cada uma destas secções pode ser dividido em unidades de análise4 que são classificadas de acordo com os instrumentos construídos para cada dimensão de análise do DPO. A tendência observada no conjunto das unidades de análise de cada uma das secções do currículo em estudo dará a mensagem sociológica contida no DPO que essa secção veicula e a sua comparação dará o sentido e grau de recontextualização que nele ocorre.

A mensagem sociológica transmitida pelo DPO, expresso no currículo, pode ser analisada em termos do discurso instrucional e do discurso regulador e em termos de o que deve ser transmitido/adquirido (conhecimentos e capacidades) e de o como deve ser transmitido/adquirido (Figura 3). Tal como refere Bernstein (1990), é necessário fazer a distinção entre o que é transportado, os conteúdos, e como esses conteúdos são transportados, ou seja, “entre o ‘que’ e o ‘como’ de qualquer transmissão” (p. 64).

A análise de o que de um currículo, ao nível do discurso instrucional, pode centrar-se, como se referiu no ponto 1, no grau de complexidade dos conhecimentos e das capacidades cognitivas que o Ministério da Educação recomenda que sejam desenvolvidos no processo de ensino e aprendizagem. É possível determinar o grau de complexidade dos conhecimentos com base na distinção entre factos, conceitos simples, conceitos complexos e temas unificadores/teorias, tendo em consideração as definições que diversos autores apresentam (ex., ANDERSON et al., 2001). No caso da complexidade das capacidades cognitivas, pode considerar-se a categorização que tem sido apresentada na forma de diferentes taxonomias, de que são exemplos a versão revista da Taxonomia de Bloom (ANDERSON et al., 2001) e a taxonomia criada por Marzano e Kendall (2007).

Nos estudos realizados pelo Grupo ESSA (ex., FERREIRA et al., 2015), a análise das dimensões relacionadas com o que do DPO tem sido baseada em instrumentos contendo uma escala cujos graus correspondem a níveis de complexidade crescente5, tendo a maioria dos instrumentos escalas de quatro graus de complexidade (ex., AFONSO et al., 2013; FERREIRA; MORAIS, 2014). Nestes instrumentos, e no caso da análise do nível de complexidade do conhecimento científico, o grau 1 corresponde a factos, o grau 2 a conceitos simples, o grau 3 a conceitos complexos e o grau 4 a temas unificadores e teorias. Para a análise do nível de complexidade das capacidades cognitivas, quando se usa a taxonomia revista de Bloom, o grau 1 corresponde a capacidades cognitivas pertencentes às categorias memorizar e compreender ao nível mais elementar, o grau 2 às categorias compreender a um nível mais complexo e aplicar ao nível da execução, o grau 3 às categorias aplicar ao nível da implementação e analisar e o grau 4 às categorias avaliar e criar; quando se usa a taxonomia de Marzano e Kendall, os graus correspondem aos quatro níveis desta taxonomia para o sistema cognitivo - recuperação, compreensão, análise e utilização do conhecimento.

Exemplificando a análise de o que num currículo

Considere-se, por exemplo, os seguintes excertos do atual Programa de Biologia e Geologia dos 10.º e 11.º anos de escolaridade (DES, 2001; 2003):

[1] “Interpretar dados experimentais de modo a compreender os processos de abertura e fecho dos estomas.” (Orientações específicas do Programa de Biologia do 10.º ano);

[2] “Formular e avaliar hipóteses relacionadas com a influência de fatores ambientais sobre o ciclo celular.” (Orientações específicas do Programa de Biologia do 11.º ano).

Tendo em conta a complexidade dos conhecimentos e das capacidades cognitivas, neste caso classificadas de acordo com a Taxonomia de Marzano e Kendall, o excerto [1] refere-se a uma situação em que se apela a conceitos simples, relacionados com a abertura e fecho dos estomas (grau 2), e a capacidades cognitivas associadas ao processo cognitivo de compreensão, uma vez que implica a interpretação de dados experimentais simples (grau 2). O excerto [2] refere-se a uma finalidade com um maior nível de conceptualização, focando conceitos complexos relativos ao ciclo celular (grau 3) e capacidades complexas associadas à utilização do conhecimento, dado que implica a formulação e avaliação de hipóteses (grau 4).

No estudo de Ferreira e Morais (2014), centrado no trabalho prático veiculado neste currículo, verificou-se a ausência de conhecimento científico associado ao trabalho prático nos princípios gerais do programa e a existência de um equilíbrio entre conceitos simples e conceitos complexos nas orientações específicas do programa. Quanto às capacidades, observou-se a prevalência de capacidades cognitivas associadas aos processos cognitivos de compreensão e análise nas orientações específicas e de capacidades mais complexas nos princípios gerais, ao nível da análise e utilização do conhecimento. Deste modo, os processos de recontextualização que ocorreram no interior do currículo, apenas passíveis de análise no caso das capacidades, corresponderam a uma diminuição do nível de complexidade na passagem dos seus princípios gerais para as suas orientações específicas.

A análise de o como de um currículo, no âmbito do discurso instrucional, pode centrar-se nas relações entre discursos, ao nível da dimensão estrutural, e nas relações de controlo entre sujeitos para as regras discursivas, ao nível da dimensão interacional (Figura 3).

Para a análise das relações entre discursos - relações intradisciplinares, interdisciplinares e entre conhecimento académico e não académico - a investigação desenvolvida pelo Grupo ESSA tem utilizado instrumentos que contêm uma escala de quatro graus de classificação (ex., AFONSO et al., 2013; CALADO; NEVES; MORAIS, 2013; SILVA; MORAIS; NEVES, 2013a). No ensino das ciências, o grau muito forte de classificação (C++) pode ser definido empiricamente pela ausência de relação entre os diferentes conhecimentos de ciências (na intradisciplinaridade), pela ausência de relação entre conhecimentos de ciências e de outras áreas disciplinares (na interdisciplinaridade) e pela ausência de relação entre conhecimento escolar e conhecimento do dia a dia (na relação entre conhecimento académico e não académico). Pelo contrário, o grau muito fraco de classificação (C- -) pode ser definido, na intradisciplinaridade, pela abrangência da relação entre temas de ciências, na interdisciplinaridade, por uma forte relação entre os conhecimentos de ciências e os de outras áreas disciplinares e, na relação entre conhecimento académico e não académico, por uma forte relação entre estes dois tipos de conhecimento. Os graus intermédios de classificação (C+ e C-), para cada um dos casos, podem ser definidos por uma relação intermédia entre os conhecimentos considerados.

Exemplificando a análise da relação entre discursos num currículo

Tome-se como exemplo o estudo realizado por Silva, Morais e Neves (2013a) centrado no ensino das ciências do currículo de Estudo do Meio para o 1.º ciclo do ensino básico. Nesse estudo analisou-se comparativamente a mensagem contida nos documentos oficiais Competências Essenciais - Estudo do Meio (DEB, 2001), revogado no ano letivo 2011/2012, e Programa de Estudo do Meio (DEB, 2004), implementado em 1990 e ainda em vigor.

Os seguintes excertos exemplificam a análise realizada, no âmbito desse estudo, quando se tem em consideração as relações intradisciplinares, interdisciplinares e entre o conhecimento académico e o não académico:

[1] “Conhecer alguns órgãos dos aparelhos correspondentes (boca, estômago, intestinos, coração, pulmões, rins, genitais): localizar esses órgãos em representações do corpo humano.” (Programa);

[2] “Conhecimento das modificações que se vão operando com o crescimento e envelhecimento, relacionando-as com os principais estádios do ciclo de vida humana.” (Competências Essenciais);

[3] “Reconhecimento da importância da evolução tecnológica e implicações da sua utilização na evolução da sociedade.” (Competências Essenciais);

[4] “Todas as crianças possuem um conjunto de experiências e saberes que foram acumulando ao longo da sua vida, no contacto com o meio que as rodeia. Cabe à escola valorizar, reforçar, ampliar e iniciar a sistematização dessas experiências e saberes, de modo a permitir, aos alunos, a realização de aprendizagens posteriores mais complexas.” (Programa).

No primeiro excerto, os conhecimentos científicos relativos aos órgãos de diferentes sistemas do corpo humano não se inter-relacionam, não contemplam a relação com conhecimentos de outras áreas disciplinares, nem apelam a conhecimentos do dia a dia, pelo que foi avaliado com um grau de classificação muito forte (C++) para as diferentes relações entre discursos, ou seja, existem fronteiras bem visíveis entre os diferentes tipos de conhecimento. Os restantes excertos contemplam uma dessas relações entre discursos com classificação fraca ou muito fraca: no segundo excerto ocorre a relação entre conhecimentos científicos, no âmbito do mesmo tema (C- quanto à relação intradisciplinar); no terceiro excerto verifica-se a relação com conhecimentos de outras áreas disciplinares, embora de forma genérica (C- quanto à relação interdisciplinar); e o último excerto evidencia uma forte integração com os conhecimentos do dia a dia dos alunos (C- - quanto à relação entre conhecimento académico e não académico).

A mensagem que emerge do referido estudo, quanto às relações entre discursos, aponta para uma reduzida relação entre conhecimentos científicos, para uma fraca relação entre conhecimentos de ciências e de outras áreas disciplinares e também para uma ocorrência limitada das relações entre conhecimento académico e não académico, em ambos os documentos curriculares analisados.

Os aspetos referidos, relacionados com o que e com o como do discurso instrucional, nomeadamente a complexidade dos conhecimentos e das capacidades cognitivas e a força da fronteira das relações intradisciplinares, podem ser utilizados, como se referiu no ponto 1, para inferir o nível de exigência conceptual de um currículo.

Exemplificando a análise do nível de exigência conceptual num currículo

No estudo de Calado, Neves e Morais (2013), por exemplo, investigou-se o nível de exigência conceptual expresso nos documentos oficiais do currículo das Ciências Naturais do 3.º ciclo do ensino básico - Competências Essenciais (DEB, 2001), revogado no ano letivo 2011/2012, e Orientações Curriculares (DEB, 2002). Esse nível de exigência conceptual foi determinado através do cálculo de um índice compósito, tendo em conta os resultados dos três parâmetros de análise - níveis de complexidade dos conhecimentos, das capacidades cognitivas e das relações intradisciplinares.

Os resultados do estudo evidenciam que o documento Competências Essenciais apresenta um nível de exigência conceptual considerável, superior ao do documento Orientações Curriculares. Os processos de recontextualização que tiveram lugar na passagem da mensagem do primeiro para o segundo documento conduziram a uma abordagem mais limitada da educação científica, sobretudo em termos da complexidade dos conhecimentos científicos e das relações intradisciplinares entre diferentes conhecimentos científicos. Na elaboração do documento Orientações Curriculares, no qual é esperada uma maior especificação do processo de ensino/aprendizagem, os seus autores parecem ter ignorado o enfoque em conceitos complexos e nas relações entre eles, preconizados no documento Competências Essenciais.

Outro estudo, centrado no trabalho prático em Biologia e Geologia do ensino secundário (FERREIRA; MORAIS, 2014), evidenciou que o currículo dessa disciplina, considerado no seu todo, apresenta um nível de exigência conceptual relativamente elevado quanto ao contexto de transmissão-aquisição do trabalho prático. Contudo, quando as componentes de Biologia e de Geologia foram analisadas de forma separada, a componente de Biologia apresentou um nível mais elevado de exigência conceptual do que a de Geologia.

Os processos de recontextualização, que se verificaram no interior desse currículo, ocorreram em diferentes direções de acordo com as dimensões analisadas, principalmente no caso das capacidades cognitivas e da relação entre discursos (analisada no âmbito da relação entre teoria e prática). Ao nível da complexidade das capacidades cognitivas do trabalho prático, esses processos de recontextualização corresponderam a uma diminuição do nível de exigência conceptual quando se passa das orientações gerais para as orientações específicas do currículo. Pelo contrário, em termos da relação entre teoria e prática, o nível de complexidade desta relação é maior nas orientações específicas de Biologia e de Geologia do que nas respetivas orientações gerais, elevando o nível de exigência conceptual. Apesar das orientações específicas serem, por natureza, mais detalhadas e contextualizadas que as orientações gerais, as duas equipas de autores (uma para a construção da componente de Biologia e outra para a construção da componente de Geologia) parecem não ter sido capazes de apresentar situações concretas de trabalho prático que possibilitassem o desenvolvimento das capacidades complexas que preconizaram nas orientações gerais do currículo.

Ao nível da dimensão interacional do currículo, as relações de controlo entre sujeitos, para as regras discursivas e para as regras hierárquicas, podem ser apreciadas sob diferentes perspetivas, por exemplo, na relação entre Ministério da Educação (ME)-professores/autores de manuais escolares ou na relação professor-alunos (Figura 3). A análise destas relações, e em particular da relação professor-aluno, apenas pode ser inferida, e com algumas limitações, a partir dos processos de ensino e aprendizagem valorizados no currículo dado que, tratando-se de um texto monológico, não é possível apreciar a intervenção direta dos sujeitos envolvidos na interação pedagógica.

No caso das regras discursivas, a análise do currículo pode incidir, por exemplo, na relação de controlo entre ME-professor quanto aos ‘critérios de avaliação’ (ex., CALADO; NEVES, 2012; FERREIRA; MORAIS, 2014) e na relação de controlo entre professor-alunos, considerando as regras discursivas - ‘seleção’, ‘sequência’, ‘ritmagem’ e ‘critérios de avaliação’ - no seu conjunto (ex., MORAIS; NEVES; FONTINHAS, 1999; SILVA; MORAIS; NEVES, 2013a). No caso dos estudos centrados na relação ME-professor, pretendeu-se apreciar em que medida o ME explicita aos professores determinadas características dos processos de ensino/aprendizagem. Nos estudos sobre a relação professor-aluno pretendeu-se apreciar a teoria de instrução valorizada no currículo, enquanto expressando o conjunto de todas as regras discursivas. Os instrumentos usados na análise destas relações contêm uma escala com quatro graus de enquadramento. O enquadramento é muito fraco (E- -) quando é dado mais controlo ao adquiridor (ao professor, na relação ME-professor e ao aluno, na relação professor-aluno) e o enquadramento é muito forte (E++) quando o transmissor (o ME ou o professor) tem o controlo da relação; os graus intermédios de enquadramento (E+ e E-) podem ser definidos por uma relação de controlo intermédia entre os sujeitos envolvidos.

Exemplificando a análise, num currículo, das relações entre sujeitos para as regras discursivas

Tome-se como exemplo o atual currículo de Biologia e Geologia do ensino secundário (DES, 2003). Os seguintes excertos ilustram a análise da mensagem contida nesse documento, no que se refere à explicitação do trabalho prático na relação ME-professor (critérios de avaliação):

[1] “O estudo da estrutura interna da matéria cristalina pode ser abordado através de pequenas experiências que permitam obter cristais em laboratório […]. Salientar que, embora alguns processos experimentais de formação de “cristais” sejam diferentes, em todos se observa a desagregação, nas suas partículas, das substâncias a cristalizar, as quais se reagrupam, posteriormente, constituindo os edifícios cristalinos. O professor deve chamar a atenção para as analogias entre as atividades sugeridas e o processo geológico, realçando, no entanto, as variáveis envolvidas e as diferentes escalas de tempo e de espaço em que ocorrem os fenómenos.” (Orientações Específicas do Programa de Geologia de 11.º ano);

[2] “Problematizar e formular hipóteses.” (Orientações Específicas do Programa de Geologia de 11.º ano).

No primeiro excerto, o ME torna muito explícito aos professores os critérios que devem orientar o trabalho prático a realizar com os alunos (E++). Pelo contrário, no segundo excerto, o ME deixa implícitos esses critérios (E- -).

Os dois excertos anteriores permitem também ilustrar a análise da mensagem contida nesse documento, no que se refere à relação professor-aluno quanto às regras discursivas. O excerto [1] contém uma mensagem que pode ser caracterizada por um enquadramento forte (E+) nesta relação, dado que indicia a existência de uma teoria de instrução didática centrada no transmissor, permitindo pouco controlo do aluno sobre o processo de aprendizagem. No excerto [2] a mensagem pode ser caracterizada por um enquadramento muito fraco (E- -) na relação professor-aluno, dado que indicia a existência de uma teoria de instrução autorreguladora, centrada no adquiridor, que permite ao aluno ter controlo sobre o processo de aprendizagem.

Um estudo centrado neste currículo (FERREIRA; MORAIS, 2014) evidenciou que, ao nível das orientações gerais, o ME deixa implícitos, não só, o tipo de trabalho prático, mas mais importante, os conhecimentos científicos e as capacidades cognitivas que são objeto de aprendizagem no trabalho prático. No caso das orientações específicas, verificou-se um maior controlo do ME (enquadramento forte e muito forte na relação ME-professor), sobretudo nos programas de Biologia de 10.º e 11.º anos. Deste modo, a recontextualização que ocorreu no interior do currículo correspondeu a uma maior explicitação do trabalho prático, quando se passa das orientações gerais para as orientações específicas.

Noutro estudo, centrado no currículo de Ciências Naturais da Reforma Educativa de 1991 (MORAIS; NEVES; FONTINHAS, 1999), a teoria de instrução, isto é o conjunto das regras discursivas na relação professor-aluno, foi analisada em função do tipo de frases contidas no texto curricular, recorrendo a uma escala de três graus de enquadramento. Por exemplo, se a frase contém afirmações que dão uma clara ênfase ao papel diretivo do professor no processo ensino/aprendizagem (ex., "diz", "informa", "explica") ou refere capacidades cognitivas que sugerem uma intervenção passiva do aluno, ela traduz a ideia de que o currículo valoriza uma teoria de instrução exclusivamente centrada no transmissor (E++). Se a frase contém afirmações que dão ênfase ao papel orientador do professor no processo ensino/aprendizagem (ex., "orienta", "acompanha", "apela à participação dos alunos") ou refere capacidades cognitivas que sugerem um certo grau de participação do aluno, ela traduz a ideia de que o currículo valoriza uma teoria de instrução que, embora centrada no transmissor, tem também em consideração a intervenção do aluno (E+). Se a frase contém afirmações que dão ênfase a um elevado grau de intervenção do aluno no processo ensino/aprendizagem (ex., "realiza atividades livres", "trabalhos independentes", "trabalhos de projeto") ou refere capacidades cognitivas que sugerem um elevado grau de autonomia do aluno, ela traduz a ideia de que o currículo valoriza uma teoria de instrução fundamentalmente centrada no adquiridor.

A análise de o como de um currículo, no âmbito do discurso regulador, pode centrar-se nas relações de controlo entre sujeitos para as regras hierárquicas, ao nível da dimensão interacional, e nas relações entre espaços, ao nível da dimensão estrutural (Figura 3).

Quanto às regras hierárquicas, a análise pode estar focada nas relações de comunicação entre professor-aluno e entre aluno-aluno (ex., SILVA; MORAIS; NEVES, 2013a) e também nas relações de comunicação entre ME-professor. No caso das relações de comunicação entre professor-aluno, a mensagem pode ser inferida a partir da teoria de instrução valorizada no currículo. Assim, parte-se do pressuposto de que um enquadramento muito forte (E++) quanto à teoria de instrução corresponderá a um enquadramento igualmente muito forte (E++) ao nível das regras hierárquicas, dado que nesta situação não se prevê o controlo do aluno nas relações de comunicação entre professor e alunos. Pelo contrário, quando a teoria de instrução é caracterizada por um enquadramento muito fraco (E- -), é previsível que o aluno tenha bastante controlo nas relações de comunicação e, por isso, as regras hierárquicas serão igualmente caracterizadas por um enquadramento muito fraco. Os graus intermédios de enquadramento correspondem a situações em que se prevê a participação mais ou menos limitada dos alunos no processo de ensino e aprendizagem e, por isso, um controlo limitado nas relações de comunicação. A partir da mensagem pedagógica que caracteriza a relação de comunicação professor-aluno é também possível inferir a mensagem veiculada no currículo quanto à relação de comunicação aluno-aluno. A valorização de um processo de ensino centrado no professor não privilegia a discussão entre os alunos e, deste modo, a possibilidade de interação entre eles será reduzida, sendo o grau de enquadramento considerado muito forte (E++). No outro extremo da escala, o grau de enquadramento será considerado muito fraco (E--) se for valorizado um processo de ensino e aprendizagem centrado nos alunos, onde é provável haver relação de comunicação entre eles. No caso das relações de comunicação ME-professor, as regras hierárquicas podem ser caracterizadas com base na presença ou ausência, no currículo, de fundamentos relacionados com a sua construção e implementação. Parte-se, assim, da ideia de que a apresentação de fundamentos que estão na base da elaboração do currículo e/ou que justificam determinadas opções quanto ao conteúdo do currículo traduz uma comunicação assente numa relação de natureza interpessoal, o que corresponde a uma relação de enquadramento fraco. Pelo contrário, a ausência desses fundamentos ou de justificações traduz uma comunicação assente numa relação de natureza posicional, o que corresponde a uma relação de enquadramento forte.

Exemplificando, num currículo, a análise das relações entre sujeitos quanto às regras hierárquicas

No que se refere às relações professor-aluno e aluno-aluno, tome-se como exemplo o currículo do ensino básico para o Estudo do Meio, em que se analisou o documento Competências Essenciais, com os princípios gerais do currículo (DEB, 2001), e o Programa, com as orientações específicas do currículo (DEB, 2004).

Os seguintes excertos ilustram a análise da mensagem contida neste currículo, no que se refere à relação professor-aluno:

[1] O carácter globalizador desta área não pode prescindir dos contributos específicos das várias ciências que a integram (História, Geografia e Ciências Físicas e Naturais, entre outras), tornando-se fulcral, por isso, a ação do professor na gestão do processo de ensino/aprendizagem, nomeadamente na organização dos conteúdos a abordar. (Competências Essenciais);

[2] A curiosidade infantil pelos fenómenos naturais deve ser estimulada e os alunos encorajados a levantar questões e a procurar respostas para eles através de experiências e pesquisas simples. (Programa).

No primeiro excerto é dada ênfase ao papel diretivo do professor no processo de ensino/aprendizagem, o que permite prever a ausência de uma relação de comunicação aberta entre o professor e os alunos (enquadramento muito forte - E++). No segundo excerto prevê-se que haja uma relação de comunicação aberta entre professor e alunos (enquadramento muito fraco - E- -).

Os excertos anteriores e o excerto seguinte permitem também ilustrar a análise da mensagem contida nesse currículo, no que se refere à relação aluno-aluno:

[3] A realização de um projeto implica uma planificação prévia que deverá resultar na elaboração de um plano orientador do trabalho de grupo e/ou individual. Desse plano deve constar: objetivos do trabalho; sequência das tarefas e sua distribuição pelos elementos do grupo; locais de trabalho; tempo previsto para a sua realização; produto previsto (álbum, exposição documental, apresentação oral, etc.); data da apresentação; critérios da avaliação e divulgação. (Competências Essenciais).

O excerto [1] permite inferir que a relação aluno-aluno também é caracterizada por um enquadramento muito forte (E++) dado que indicia processos de aprendizagem em que não é previsível haver relação de comunicação entre os alunos. O excerto [3] ilustra uma situação em que, pela natureza do trabalho evocado, se prevê uma comunicação aberta entre os diferentes alunos, correspondendo a um enquadramento muito fraco (E- -) na relação aluno-aluno.

No que se refere à relação ME-professor, tome-se como exemplo o currículo do 3.º ciclo do ensino básico para as Ciências Naturais do 7.º ano (DGEBS, 1991) que foi objeto de um estudo realizado por Morais e Neves (2001b). O excerto seguinte exemplifica um caso em que o ME apresenta uma justificação fundamentada sobre a forma de atuar do professor e que, por isso, pode ser classificada com enquadramento fraco:

[4] Abordar, com prudência, os assuntos relacionados com este tema [transmissão da vida] tendo em atenção aspetos éticos e afetivos pois a sexualidade é uma realidade global e multifacetada […] (Programa de Ciências Naturais do 7.º ano de escolaridade, 1991).

As relações de poder entre os espaços podem dizer respeito às relações entre os espaços do professor e dos alunos e entre os espaços dos diversos alunos (Figura 3). À semelhança das limitações indicadas para a análise das relações de controlo entre sujeitos num currículo (texto monológico) não é possível apreciar diretamente a fronteira entre os espaços, uma vez que não se tem acesso ao contexto no qual os sujeitos se movimentam. Numa investigação realizada pelo Grupo ESSA (SILVA; MORAIS; NEVES, 2013a), foram construídos instrumentos com uma escala de apenas dois graus de classificação, dada a dificuldade em discernir, num texto monológico, as situações correspondentes aos graus intermédios. A classificação foi considerada forte (C+) nas situações que valorizam processos de ensino e aprendizagem totalmente centrados no professor, sendo previsível a demarcação de espaços e a ausência de partilha de materiais entre o professor e os alunos e entre os diferentes alunos. A classificação foi considerada fraca (C-) nas situações que valorizam processos de ensino e aprendizagem totalmente centrados no aluno e onde se prevê a possibilidade de partilha de espaços e materiais.

Considerações finais

A teoria de Basil Bernstein aplicada em estudos de análise curricular tem permitido pôr em evidência não só as múltiplas relações que caracterizam a mensagem pedagógica contida num currículo mas também as relações que se estabelecem entre o currículo, enquanto discurso pedagógico oficial, e outros textos/contextos educacionais, enquanto discursos pedagógicos originados a partir do currículo (como é, por exemplo, o caso dos manuais escolares e das práticas pedagógicas dos professores). A forte estrutura conceptual da teoria de Bernstein e o poder descritivo, explicativo e de transferência da sua linguagem interna de descrição permitem desenvolver linguagens externas de descrição em que se utilizam os mesmos conceitos em textos (e contextos) produzidos a vários níveis do sistema educativo. É assim possível, não só ampliar as relações a estudar, como também alcançar uma conceptualização de nível elevado. Ao permitir estabelecer estas relações, a teoria torna possível a análise do aparelho pedagógico que caracteriza um dado sistema educativo. Com base nesta teoria é também possível compreender que um aparelho pedagógico que envolva um maior número de campos e contextos (característico de uma sociedade com um regime político pluralista) pode conduzir a processos de recontextualização de grau mais elevado contendo assim uma maior possibilidade de mudança.

A distinção, num currículo, entre o que se ensina e o como se ensina e a sua respetiva caracterização constituem uma marca de originalidade nas análises realizadas com base na teoria de Bernstein. No âmbito de o que se ensina, a importância dada ao nível de complexidade dos conhecimentos e das capacidades cognitivas tem não só fundamento de base epistemológica e psicológica mas também de base sociológica, com particular referência à teorização de Bernstein sobre as estruturas de conhecimento. No que se refere a o como se ensina, a especificação das diferentes relações sociológicas (entre sujeitos, discursos e espaços), que configuram a mensagem pedagógica do currículo, tem a sua base nos conceitos de classificação e de enquadramento considerados no modelo do discurso pedagógico de Bernstein.

Uma dimensão crucial na análise curricular - o nível de exigência conceptual - pode ser estabelecida tomando em conjunto o que se ensina e uma das relações de o como se ensina (relação entre discursos - relação intradisciplinar). A valorização dada a esta dimensão fundamenta-se na ideia de que todos os alunos devem ter acesso a um ensino de qualidade. Um currículo em que o nível de exigência conceptual é baixo limita os alunos a conhecimento nominal e factual e a processos cognitivos menos complexos, nomeadamente ao nível da memorização e, como tal, dá a esses alunos uma visão limitada do discurso vertical que caracteriza o discurso académico. Pelo contrário, um currículo em que se eleva o nível de exigência conceptual permite o acesso dos alunos a conhecimento conceptual e a processos cognitivos mais complexos, dando-lhes uma visão adequada do discurso vertical. No âmbito da investigação que tem sido desenvolvida pelo Grupo ESSA, entendeu-se que o ensino deve ser exigente e exigente para todos os alunos, de modo a que todos eles tenham acesso ao texto que, em determinado momento, é valorizado pela escola e pela sociedade.

Outra dimensão a destacar na análise de um currículo prende-se com a forma como os seus autores explicitam quer a mensagem pedagógica contida nesse documento, quer os princípios que fundamentam essa mensagem. Através deste tipo de análise, que traduz uma relação de controlo entre Ministério da Educação-professores, é possível inferir o espaço de autonomia que é deixado aos professores para reproduzir/recontextualizar a mensagem presente no texto curricular em estudo. Se é verdade que um currículo com uma mensagem vaga e pouco clara pode dar maior autonomia aos professores, também é verdade que essa mensagem pode ser prejudicial para professores com formação académica pouco sólida. Explicitar a mensagem pedagógica que é veiculada num currículo, com indicação dos fundamentos que lhe estão subjacentes, pode constituir um fator fundamental para o processo educativo dado que o conhecimento claro dessa mensagem permite (ou não) a sua recontextualização pelos professores.

As relações de poder e de controlo conceptualizadas por Bernstein permitem também distinguir modelos de gestão curricular. Neste caso o foco da análise são as relações que se estabelecem entre o Ministério da Educação e a escola. A Figura 4 esquematiza essas relações.

Fonte: Adaptado de Neves e Morais (2006).

Figura 4 Relações Ministério da Educação (ME) - escola em modelos curriculares distintos 

Num modelo centralizado de gestão curricular, as relações Ministério da Educação-escola tendem, no conjunto, a ser caracterizadas por classificações e enquadramentos fortes. Isto significa que é o Ministério da Educação que tem o poder e o controlo sobre o que e sobre o como do processo de ensino/aprendizagem, não sendo dado controlo nesse processo aos agentes escolares. Pelo contrário, num modelo descentralizado de gestão curricular (isto é, um modelo de gestão centrado na escola), essas relações tendem, no conjunto, a ser caracterizadas por classificações e enquadramentos fracos. Neste caso, é a escola e os seus agentes que definirão o processo de ensino/aprendizagem adequado ao respetivo contexto escolar e que, assim detêm o poder e o controlo sobre esse processo. Entre estes dois modelos extremos, é possível considerar situações em que o poder é detido pelo Ministério da Educação (classificação forte na sua relação com a escola) mas em que é dado algum controlo aos agentes escolares (enquadramento fraco na relação). Esta é a situação que caracteriza um modelo centralizado mas em que existe flexibilidade curricular.

O significado que pode ser atribuído às relações Ministério da Educação-escola/professores, em modelos curriculares distintos, constitui uma questão de extrema importância em estudos de currículo, dado que é fundamental saber se uma mudança de modelo curricular traduz apenas uma alteração nas relações de controlo ou traduz também uma alteração nas relações de poder entre Ministério da Educação-escola/professores. Este é um aspeto que assume especial relevância no contexto de um modelo de gestão flexível do currículo. A ausência de um sistema de avaliação externa das escolas, num modelo de gestão flexível do currículo, pode mesmo significar que a escola/professores venham a ter real poder na gestão curricular. Neste modelo a existência de um mecanismo regulador da implementação do currículo - como é, por exemplo, a existência de um sistema de avaliação externa das escolas - não significa dar poder à escola/professores mas significa antes que a escola/professores podem, dentro de certos limites, serem também “construtores” do currículo. Embora a existência de mecanismos reguladores da implementação do currículo possa ser vista como redutora da ação da escola e dos professores e como impeditiva da adequação do currículo às necessidades dos alunos de cada escola/região, é importante ter presente que, na ausência de uma sólida formação académica e pedagógica dos professores, tal situação pode ser mais prejudicial do que benéfica para os alunos, principalmente para os alunos socialmente desfavorecidos. É, contudo, evidente que os alunos, todos os alunos, só poderão beneficiar de um ensino de qualidade se o currículo veicular uma mensagem pedagógica de nível elevado.

Estudos realizados pelo Grupo ESSA, no contexto da educação científica, que exploram a relação entre a prática pedagógica e a aprendizagem dos alunos, a vários níveis de escolaridade (ex., ALVES; MORAIS, 2012; MORAIS; NEVES, 2009; PIRES; MORAIS; NEVES, 2004; SILVA; MORAIS; NEVES, 2013b), têm sugerido que um ensino de qualidade deve ser conceptualmente exigente quanto a o que do ensino/aprendizagem (conhecimentos e capacidades de diferentes níveis de complexidade) e que o como do ensino/aprendizagem deve traduzir uma modalidade de prática pedagógica mista, indo para além das dicotomias de pedagogias visíveis/pedagogias invisíveis e aprendizagem por descoberta/aprendizagem por receção. Considera-se que um currículo que tenha em conta estes resultados e que, simultaneamente, deixe explícitos aos professores os fundamentos em que se baseia pode ser uma via de sucesso, mesmo em modelos descentralizados ou em modelos centralizados de gestão flexível.

*Texto publicado no livro “Estudos de Currículo”, organizado por José Augusto Pacheco, Maria do Céu Roldão e Maria Teresa Estrela. Porto Editora, 2018, p. 9-38. Publicado com autorização da Editora.

1O Grupo ESSA é um grupo de investigação integrado na Unidade de Investigação, Desenvolvimento e Formação (UIDEF) do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa <http://essa.ie.ul.pt>.

2Por exemplo, no contexto das ciências, a relação entre o currículo e o DRG foi objeto de um estudo realizado em Portugal, em que se analisaram orientações programáticas correspondentes a dois períodos sociopolíticos (NEVES; MORAIS, 2000).

3Uma situação interessante, e que ilustra este caso, é a que ocorre no ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa (Portugal) - onde o Curso de Economia da Escola de Gestão (ISCTE Business School) e o Curso de Economia Política da Escola de Ciências Sociais e Humanas da mesma instituição, apresentam uma mesma disciplina académica - a Economia - com duas linguagens de descrição distintas.

4Uma unidade de análise corresponde a um excerto do texto, com um ou mais períodos, que no seu conjunto tenha um determinado significado semântico (GALL; GALL; BORG, 2007).

5O tamanho da escala dos instrumentos utilizados para a análise das dimensões relacionadas com o que do DPO dependeu do nível de complexidade, dos conhecimentos e das capacidades adequado ao nível de escolaridade. Por exemplo, no âmbito do 1.º ciclo do ensino básico, o estudo de Silva, Morais e Neves (2013a) recorreu a instrumentos de análise da complexidade dos conhecimentos científicos e das capacidades investigativas com escalas de apenas três graus. Optou-se por estas escalas por se considerar que os documentos analisados possuíam um número reduzido de conhecimentos de elevada abstração e de capacidades investigativas de grande complexidade, como seria expectável dado o nível de escolaridade a que se destinavam.

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Recebido: 20 de Dezembro de 2018; Revisado: 15 de Fevereiro de 2019; Aceito: 26 de Fevereiro de 2019

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