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Práxis Educativa

versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.14 no.2 Ponta Grossa maio/ago 2019  Epub 14-Jun-2019

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.14n2.018 

Resenha

FERNÁNDEZ FASTUCA, Lorena. Pedagogía de la formación doctoral. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Editorial Teseo; Universidad Abierta Interamericana, 2018. 238 p.

Andréa de Paula Pires* 

*Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Integrante do grupo de Pesquisa: Políticas Educacionais e Práticas Educativas - GPPEPE - UEPG. E-mail: <andreappires@hotmail.com>.

FERNÁNDEZ FASTUCA, Lorena. Pedagogía de la formación doctoral. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Editorial Teseo; Universidad Abierta Interamericana, 2018. 238p.


“A aprendizagem neste nível envolve práticas de formação diferentes das de outros níveis do sistema e das instâncias educacionais. No entanto, há muito pouco que se sabe sobre ele e sobre as anotações pedagógico-didáticas do nível de pós-graduação na Argentina”. (FERNÁNDEZ FASTUCA, 2018, p. 24, tradução nossa).

A citação acima expressa que o processo de ensino e aprendizagem a nível de Doutorado tem características que o diferem de outras modalidades de ensino. Embora este nível seja considerado o último do sistema educacional formal e o início da carreira acadêmica de um pesquisador, pouco se sabe sobre o processo de formação voltado à pesquisa, o que significa que o tema vem sendo pouco discutido e pesquisado no contexto educacional.

Sabe-se que a universidade se constitui um importante espaço de investigação científica e de produção de conhecimentos, que podem ser aplicados à resolução de problemas nos diferentes setores de atuação da humanidade. Desse modo, ao incentivar o desenvolvimento de pesquisas, a universidade efetiva aspectos importantes de sua função social.

Entretanto, tais pesquisas impactam de modo positivo no que diz respeito à consolidação da base científica nacional e ao desenvolvimento da sociedade, quando demanda de um processo de formação de pesquisadores que busca a construção da autonomia intelectual e da postura crítica do sujeito. Por esse ângulo, faz-se pertinente explorar o contexto em que ocorre o processo de formação para a pesquisa, principalmente na atual conjuntura, em que a produtividade e a mercantilização da pós-graduação está em constante crescimento (FERREIRA; PACHECO, 2009), sendo necessária, assim, a garantia da qualidade do processo formativo.

É nesse sentido que a autora argentina Lorena Fernández Fastuca vem dedicando seus estudos acerca da formação de pesquisadores. O livro resenhado surge da necessidade e importância em entender as diferentes perspectivas de formação existentes na comunidade acadêmica argentina. Por este viés, a autora destina seus esforços em compreender a lógica da formação pedagógica nos programas de Doutorado em Ciências Biológicas e Ciências Sociais, o que permite identificar grandes diferenças entre os ambientes de aprendizagem, uma vez que os grupos disciplinares possuem formas diferenciadas na construção do conhecimento.

No livro, a autora apresenta os resultados de uma investigação centrada na análise das práticas de ensino e aprendizagem colocadas em jogo a nível de Doutorado e propõe uma reflexão sobre todo o processo formativo, tendo como principais tópicos abordados: a orientação de teses como prática formativa; a prática da gestão da tese; as oficinas de tese; o trabalho na equipe de pesquisa e o processo de publicação dos artigos.

Quando a autora pontua sua intenção em analisar as práticas de ensino e aprendizagem que estão em jogo no nível de Doutorado, entendemos que, de acordo com Bourdieu (2004), o trabalho científico não é empreendido por agentes epistêmicos ideais, mas é voltado ao entendimento das relações de forças que se estabelecem enquanto comunidade científica, o que não representa um conjunto harmonioso, mas um campo carregado de conflitos, considerando que o conhecimento científico está suscetível aos modos de organização e valoração dos grupos científicos.

Assim sendo, o estudo trata de uma importante contribuição para entender a dinâmica da formação de doutores. Ao mesmo tempo, permite a compreensão de produtos acadêmicos, tanto institucionais como pessoais, que devem ser avaliados e ajustados conforme os variados moldes das culturas disciplinares.

A obra resenhada foi organizada em cinco capítulos e tem como objetivo analisar as práticas de ensino e aprendizagem empreendidas a nível de Doutorado, propondo uma visão de todo o processo, articulado a aspectos imprescindíveis no contexto de formação doutoral. Sobre tais aspectos, o texto leva o leitor a (re)pensar os objetivos do Doutorado, como em quais espaços formativos este nível se realiza, quem são os atores que intervêm nesse processo, quais são as práticas de ensino e os estilos de orientação de tese e os desafios que são enfrentados pelos estudantes no decorrer da formação.

A pesquisa teve como foco de estudo doutorandos e orientadores de teses dos programas de Doutorado em Ciências Biológicas e Ciências Sociais de uma mesma universidade, de maneira que as discussões foram centralizadas nos sujeitos, e as relações estabelecidas entre si.

Para alcançar o objetivo, a autora realizou uma pesquisa descritiva por meio de uma abordagem qualitativa, com base em dados gerados por entrevistas realizadas com 20 pares de orientador de tese e aluno de cada área pesquisada (Ciências Biológicas e Ciências Sociais), em observações realizadas nos grupos de pesquisa (ambas as áreas), em oficinas de tese (Ciências Sociais) e no curso de design experimental (Ciências Biológicas).

Frente aos conceitos apresentados pela autora, a concepção do Doutorado na Argentina, também adotada na pesquisa, se dá enquanto uma instância de formação em pesquisa e para a academia, ocorrendo em dois momentos: participação nas disciplinas e desenvolvimento da pesquisa. A formação para a pesquisa é considerada um processo educacional com características particulares e engloba diferentes práticas, envolvendo a aprendizagem de um ofício e a inserção em um grupo social específico.

Quanto à aprendizagem do oficio de pesquisador, a autora busca respaldo em Pierre Bourdieu, quando este afirma que se tornar um cientista não consiste apenas em conhecer normas e métodos experimentais, mas sim tratar como um verdadeiro “ofício”, o qual exige um conhecimento prático, um “saber-fazer” que só pode ser conseguido por meio do habitus científico (BOURDIEU, 2003). O próprio Bourdieu (1989, p. 21-22) explicitou o que teria de ser ensinado sobre seu ofício, para ele, “essencialmente, um modus operandi, um modo de produção científico que supõe um modo de percepção, [...], a única maneira de o adquirir é o de ver operar praticamente ou observar o modo como este habitus científico - é bem este o seu nome -, ‘reage’ perante opções práticas”. Portanto, aprender a ser pesquisador é aprender um ofício (FERNÁNDEZ FASTUCA, 2018).

No primeiro capítulo, “O doutorado, ambiente de aprendizagem”, a autora explica, de maneira breve, como se constituem os doutorados na Argentina e as diferentes características da formação conforme a área disciplinar, com o intuito em oferecer uma ampla visão do caminho da formação dos doutorandos de cada área. Neste capítulo, é oferecida uma primeira descrição geral acerca dos programas analisados e, nos capítulos subsequentes, a autora faz uma análise profunda dos espaços de formação identificados como relevantes.

Nesse contexto, para a compreensão do processo de formação do pesquisador, a autora analisa a organização, os espaços, as pessoas e a trajetória de formação de cada um dos programas, e afirma que eles apresentam características particulares no ensino do ofício de pesquisador. Desse modo, para o entendimento do processo formativo, julgamos necessário elencar algumas especificidades.

Nas Ciências Biológicas, o trabalho é realizado por equipes compostas de alunos iniciantes, alunos mais avançados do Doutorado e alunos do Pós-Doutorado, os quais se encontram diariamente no local de trabalho. A temática da pesquisa é definida pelo orientador de tese. A pesquisa é sempre realizada em equipes, de modo que o pesquisador solitário não existe nesta área. Talvez seja por essa razão que existe maior chance de aprovação de financiamento das atividades científicas desenvolvidas em torno de determinadas linhas de pesquisa. Prevalecem a dependência mútua entre os estudantes e o fortalecimento das relações entre si. As práticas de formação ocorrem em torno do conceito de pesquisa enquanto tarefa grupal inserida em um laboratório, espaço este em que o doutorando aprende o ofício de pesquisador. Nesta disciplina, a função que prevalece do orientador de tese é a do apoio prático, pois cabe a ele definir as condições do ambiente de aprendizagem e possibilitar as trocas e interações. O orientador de tese é o responsável pela formação dos estudantes na realização da tese, utilizando-se de duas principais práticas de ensino: a correção do progresso e a modelagem.

Nas Ciências Sociais, o ofício de pesquisador é apreendido de modo individual, prevalecendo a relação entre o orientador de tese e o doutorando. Há mais liberdade na escolha da temática da investigação, a qual é acompanhada pela ausência de um local fixo de trabalho e horários fixos. Há, ainda, maior liberdade com a organização das tarefas diárias, sem a exigência do trabalho em equipe. As práticas de ensino e aprendizagem ocorrem em diferentes espaços percorridos pelo estudante e entre as pessoas com os quais ele interage. Existe escassez de financiamento para projetos de pesquisa e para atividades da academia. Por ser uma atividade investigativa majoritariamente individual, a trajetória do doutorando é caracterizada pela solidão, abandonando a adolescência acadêmica e vendo-se forçado a tomar decisões em seu processo de formação. Portanto, a autonomia (suposta) da formação do investigador nesta área tem como consequência a solidão, esta que, por sua vez, vem acompanhada da insegurança e da incerteza, sentidas pelos doutorandos no decorrer do processo formativo. Por outro lado, essa autonomia tem seus efeitos positivos na aprendizagem, possibilitando, por exemplo, que o trabalho de pesquisa seja realizado com grande significância para o aluno, pois ele é o principal responsável pelos resultados a serem obtidos.

No contraste dos dois programas, ficou evidente, nas Ciências Biológicas, que o status de estudante permanece durante todo o processo de formação, a chamada “adolescência acadêmica”. Nas Ciências Sociais, ocorre o contrário: exige-se do estudante a autonomia da tese durante todo o processo formativo, no qual o doutorando é forçado a entrar na chamada “idade adulta acadêmica”. Desde o início, o estudante assume o protagonismo do processo de formação.

No segundo capítulo, “Qual é a direção da tese?”, a autora conceitua a atividade de tese enquanto um espaço de ensino e aprendizagem, partindo do entendimento de que o processo de construção do conhecimento não é uma atividade isolada, o que requer a interação entre os atores envolvidos, ou seja, entre orientador de tese e aluno (orientando). Nas ideias de Bourdieu (1989), a prática da pesquisa não é uma habilidade natural do pesquisador, mas é a consequência de um trabalho que pode ser aprendido e também ensinado. Nesse sentido, Fernández Fastuca (2018) toma o ser pesquisador como uma profissão, adquirida e aprendida na medida em que é praticada em uma estreita relação com o outro de maior expertise, isto é, a relação do doutorando com professores e orientadores de tese.

Esta constatação levou a autora a concluir que a figura do orientador de tese é considerada essencial no processo de formação. Ainda que, de modo formal, ele tenha a atribuição de acompanhar a qualidade da pesquisa da tese, despertando sentimentos de confiança, lealdade, respeito, medo e ódio, nesta relação, é muito difícil que exista o sentimento da indiferença.

O gerenciamento de tese é uma atividade formativa que envolve o orientador de tese (diretor, tutor, supervisor) e assume caráter didático-pedagógico. De acordo com a autora, há quatro funções principais do orientador de tese: aconselhamento acadêmico, socialização, apoio psicossocial e apoio prático. Ainda nesse capítulo, são abordados dois princípios adotados pelos orientadores de tese na orientação do trabalho: a) a busca de equilíbrio frente às tensões da orientação; e b) encaminhar o trabalho de tese.

Seguindo no terceiro capítulo, intitulado “A prática da gestão de tese”, a autora discorre sobre a organização do relacionamento gerencial em ambos os programas de Doutorado e propõe três estilos de gerenciamento de tese. No primeiro estilo, denominado Diretivo, no qual o orientador de tese assume o papel mais relevante, a autora entende que as práticas de ensino estão próximas da instrução. Os estudantes são considerados dependentes do orientador de tese para seguirem instruções precisas. Os orientadores desse estilo são exclusivos das Ciências Biológicas. O segundo estilo, Orientador, como o próprio nome revela, ocorre quando o orientador da tese apenas orienta o aluno, reconhecendo o importante papel do discente no desenvolvimento da tese e em seu processo de aprendizagem. Este estilo foi encontrado em ambos os programas. O último estilo proposto pela autora é o Acompanhante, em que o orientador de tese está menos envolvido no processo de trabalho da tese, considera-se leitor especial da tese e oferece ao aluno instrumentos para a condução do trabalho somente quando requisitado. Há a convicção por parte dos orientadores de tese de que a total responsabilidade cabe ao pesquisador em formação. Segundo a autora, este estilo é encontrado com mais frequência nas Ciências Sociais do que nas Ciências Biológicas.

Em paralelo à gestão de teses, os programas de Doutorado abrangem seminários e cursos que auxiliam o desenvolvimento das pesquisas. Este é o foco do quarto capítulo “As oficinas de teses”, no qual a autora aponta os espaços curriculares propostos pelos programas analisados, as oficinas de teses (Ciências Sociais) e o curso de Design Experimental (Ciências Biológicas), enfocando objetivos, conteúdos e técnicas didáticas desenvolvidas pelos docentes.

Sabe-se que esta ação educativa busca oferecer aos alunos uma bagagem teórica e prática que sirva de alicerce para a realização da pesquisa. O desenvolvimento das oficinas de tese e dos cursos voltados para a práxis pedagógica nos cursos de pós-graduação apresenta diferentes contribuições para a formação do pesquisador. A autora aponta que tais espaços de formação buscam orientar os doutorandos na construção da tese, no desenvolvimento do pensamento crítico, na promoção de orientações e de conteúdos teórico-metodológicos. A autora, ainda, conceitua as oficinas de tese como ambientes críticos de aprendizagem que potencializam a construção do conhecimento, tornando-se espaços de intercâmbio entre pesquisadores especialistas e doutorandos empenhados na tarefa de realizar pesquisas autênticas e que promovam o pensamento crítico.

Sabe-se que os espaços de formação formalmente contemplados nos programas de Doutorado são diversos, cumpridos em espaços físicos e teóricos nos quais, ao longo do curso, os alunos se inserem. No entanto, o processo de formação de pesquisadores ainda abarca espaços que, mesmo não estando contemplados de modo formal nos programas, são partes integrantes do processo de formação de doutores e carregam grande fonte de aprendizado e oportunidades. Esta questão é tratada no último capítulo, “Espaços de formação não contemplados pelos doutorados”, do livro resenhado.

Neste capítulo, a autora trata da participação do aluno na academia como fonte de aprendizado, isto é, a participação em grupos de pesquisas, congressos e o processo de publicação de artigos. Para a autora, o processo de aprendizagem como participação consiste na enculturação em uma prática social específica: a academia. Tal participação objetiva envolver o aluno em diferentes atividades significativas, com o intuito de que o aprender aconteça em contextos reais.

O grupo de pesquisa é um espaço importante na formação do pesquisador na medida em que oferece ao aluno o aprendizado da tarefa específica de pesquisa, a realização de atividades como gestão de projetos, participação em atividades de extensão e direção de uma equipe de pesquisa. A participação do doutorando em equipes de pesquisa tem o potencial de levar o aluno ao avanço na sua aprendizagem na medida em que os futuros doutores progridem de tarefas mais simples às mais significativas para a equipe. A autora deixa claro que esta passagem acontece em ambas às disciplinas e que, nesse processo, os trabalhos e as discussões da equipe de pesquisa se constituem importante fonte de aprendizado, mas alerta que, muitas vezes, a falta de afinidades e de cooperação entre os membros do grupo podem gerar relações conflituosas e momentos de tensão.

Destarte, a autora aponta que a interação com os pares é primordial no processo de formação de pesquisadores. O convívio dos pares ao longo da formação, em ambos os programas analisados, propiciou momentos de orientações e aconselhamentos para a efetivação de tarefas que os doutorandos estavam enfrentando. O fato de que, nas Ciências Sociais, o trabalho é mais individualizado, o grupo de pesquisa marca a relevância dessa interação no processo de formação.

Sabe-se que, no decorrer do processo de formação como doutor, a tese está sempre em processo de aperfeiçoamento da escrita, o que inclui o conhecimento de como apresentar as informações de acordo com o campo pesquisado. Os congressos nesse contexto se tornam espaços importantes de aprendizagem, pois a apresentação do trabalho, os comentários tecidos nesse âmbito, bem como a publicação dos resultados são ocasiões de confirmações ou reformulações do trabalho.

Quanto ao processo de publicação de artigos, a autora destaca que, no contexto da academia, tal processo não é novo, mas, nos últimos anos, tem havido grande pressão para publicação de trabalhos, no qual o Índice de Citações e o Índice de Fator de Impacto caminham de mãos dadas. A autora afirma que tal pressão não é exercida apenas para pesquisadores em carreira, mas, sobretudo, àqueles que estão em processo de formação doutoral. Mesmo assim, a autora aponta que a participação do aluno na academia por meio do trabalho de publicação de artigos perfaz uma oportunidade de aprendizado, visto que expõe o aluno a desafiar os limites e as fronteiras de seu conhecimento.

Nesse contexto, assim como o orientador de tese e os colegas de equipe que elaboram comentários que auxiliam no melhoramento e aprofundamento das ideias, outros atores, por exemplo, os árbitros de periódicos acadêmicos, cumprem função semelhante. O sistema de arbitragem cega desses periódicos pode estimular o aprofundamento ou a reformulação das ideias, sugerindo caminhos que permitam melhor análise dos dados, contribuindo significativamente para o melhoramento da pesquisa.

Em suma, no livro, a autora identifica três principais espaços de formação de pesquisadores: a gestão da tese, as oficinas de tese e a participação na academia. Em cada um desses espaços, os agentes formativos mudam: orientadores de tese, professores de pós-graduação, árbitros de revistas científicas e pares de Doutorado. Nesse contexto, a trajetória do doutorando é permeada por uma rede de relações marcadas por diferentes profissionais do programa de Doutorado e da academia, contando que esta variedade de profissionais envolvidos no processo formativo não diminui a importância do orientador de tese. No entanto, seu papel no processo de ensino é compartilhado com outros que podem influenciar de maneira igual ou maior o caminho formativo do doutorando em diferentes particularidades da formação.

Por fim, a intenção da autora é oferecer instrumentos para a análise, a compreensão e a intensificação das discussões sobre o processo de formação de pesquisadores no contexto argentino da pós-graduação, visto que as práticas de formação postas em jogo no decorrer do processo formativo doutoral precisam ser investigadas, a fim de analisá-las com mais profundidade, pois o avanço do conhecimento sobre a temática oferecerá fundamentos para o fortalecimento de práticas já exitosas e para a elaboração de novas práticas de formação.

Diante disso, o livro resenhado apresenta importantes contribuições para (re)pensar a formação de pesquisadores no contexto brasileiro. Entre tais contribuições, podemos destacar: o objetivo do Doutorado; as condições de formação que vêm sendo asseguradas pelos programas nas diversas regiões do país; quais são os avanços e os retrocessos das políticas de formação que o país vem enfrentando e, ainda, (re)pensar o papel social da formação do pesquisador educacional, visto que o esforço em abordar um assunto pouco explorado nos estudos brasileiros é sempre bem-vindo.

O livro permite indagar diferentes questões de extrema importância e necessidade à sua inserção no debate do cotidiano dos programas de pós-graduação stricto sensu. De acordo com Abreu e Lima Júnior (2016), o acontecer real do processo de formação do pesquisador em Educação em alguns programas no Brasil ainda está atado a paradigmas e, muitas vezes, os discentes passam por um processo formativo que visa exclusivamente à escrita da dissertação ou da tese, reproduzindo, desse modo, uma visão linear de formação. Tal processo envolve a formação humana que carrega em si elementos subjetivos, políticos, ontológicos e epistemológicos.

Por fim, tendo em vista que, no Brasil, a pesquisa sobre a formação de pesquisadores na pós-graduação, principalmente no Doutorado, é ainda escassa (HOSTINS, 2006, 2013; SAVIANI, 2007; FERREIRA; PACHECO, 2009; SEVERINO, 2009; PINTO; MARTINS, 2009; ABREU; LIMA JUNIOR, 2016; FREITAS; SOUZA, 2018; NASCIMENTO, 2018; MAINARDES; STREMEL, 2019), sugestiona-se que a obra resenhada possa fazer parte do acervo de discussões junto aos alunos nos programas de pós-graduação stricto sensu no contexto brasileiro. Tal sugestão tem o intuito de abrir novos horizontes em relação aos objetivos da formação, dos espaços formativos, das práticas de ensino e aprendizagem, principalmente no incentivo às pesquisas acerca da temática nas diferentes linhas de pesquisa. Além das questões tratadas pela autora, existem pontos importantes a serem pesquisados, que consideram currículo, avaliação, habilidades a serem desenvolvidas no decorrer da formação, equilíbrio entre a formação generalista e a formação específica, por exemplo, a formação para o campo da Política Educacional.

Referências

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Recebido: 20 de Dezembro de 2018; Revisado: 10 de Março de 2019; Aceito: 18 de Março de 2019

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