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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.15  Ponta Grossa  2020  Epub 04-Jun-2020

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.15.14769.044 

Artigos

Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste: estudo curricular sobre a formação de professores por áreas de conhecimento

Teaching degrees in Field Education of the Northeast Region: curricular study on teacher training by areas of knowledge

Licenciaturas en la Educación del Campo de la Región Noreste: estudio curricular sobre la formación de profesores por áreas de conocimiento

Emerson Augusto de Medeiros* 
http://orcid.org/0000-0003-3988-3915

Jamira Lopes de Amorim** 
http://orcid.org/0000-0002-2741-919X

Sandra Maria Gadelha de Carvalho*** 
http://orcid.org/0000-0002-0759-2788

?Professor Adjunto da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA). Doutor em Educação pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). E-mail: <emerson.medeiros@ufersa.edu.br>.

**Professora Adjunta da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA). Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). E-mail: <jamira.lopes@ufersa.edu.br>.

***Professora Adjunta da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Docente Permanente do Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino da Universidade Estadual do Ceará (MAIE/UECE). E-mail: <sandra.gadelha@uece.br>.


Resumo:

Este texto tem como objetivo principal apresentar uma análise curricular acerca da formação de professores por áreas de conhecimento nos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo da Região Nordeste do Brasil. Trata-se de um estudo documental que se apoia na leitura e na análise de currículos e de matrizes curriculares de 11 cursos pertencentes a Universidades Federais e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Como resultado, salienta-se, entre outros aspectos, que é fundamental repensar a respeito da formação de professores por áreas de conhecimento. Apesar de haver questões importantes na organização curricular dos cursos, como, entre outras, a ênfase dada aos conhecimentos e aos conteúdos de cunho social, cultural, educacional, por exemplo, contribuindo para uma formação mais política do professor, entende-se que a formação por áreas de conhecimento, característica central para a formação docente nas Graduações, se apresenta nos currículos dos cursos em uma perspectiva disciplinar.

Palavras-chave: Licenciaturas em Educação do Campo; Formação de professores por áreas de conhecimento; Currículo

Abstract:

This text has as main objective to present a curricular analysis about teacher training by areas of knowledge in the Teaching degree courses in Field Education in the Northeast Region of Brazil. This is a documentary study based on the reading and analysis of curricula and curricular matrices of 11 courses belonging to Federal Universities and Federal Institutes of Education, Science and Technology. As a result, we emphasize, among other aspects, that it is essential to rethink about teacher training by areas of knowledge. Although there are important issues in the curricular organization of the courses, such as, among others, the emphasis given to knowledge and social, cultural, educational content, for example, contributing to a more political teacher education, we understand that the training by areas of knowledge, a central characteristic for teacher training in undergraduate courses, presents itself in the curricula of the courses in a disciplinary perspective.

Keywords: Teaching degrees in Field Education; Teacher training by areas of knowledge; Curriculum

Resumen:

Este texto tiene como objetivo principal presentar un análisis curricular sobre la formación de profesores por áreas de conocimiento en los Cursos de Licenciatura en Educación del Campo de la Región Noreste de Brasil. Se trata de un estudio documental que se basa en la lectura y en el análisis de currículos y de matrices curriculares de 11 cursos pertenecientes a Universidades Federales e Institutos Federales de Educación, Ciencia y Tecnología. Como resultado, se destaca, entre otros aspectos, que es fundamental repensar sobre la formación de profesores por áreas de conocimiento. A pesar de que hay cuestiones importantes en la organización curricular de los cursos, como, entre otras, el énfasis dado a los conocimientos y a los contenidos de cuño social, cultural, educativo, por ejemplo, contribuyendo a una formación más política del profesor, se entiende que la formación por áreas de conocimiento, característica central para la formación docente en las graduaciones, se presenta en los planes de estudios de los cursos en una perspectiva disciplinaria.

Palabras clave: Licenciaturas en Educación del Campo; Formación de profesores por áreas de conocimiento; Currículo

Introdução

No ano de 2019, os Cursos de Licenciatura em Educação do Campo completaram 12 anos de existência no âmbito da formação de professores no Brasil. Para alguns estudiosos da área educacional (MOLINA; HAGE, 2016; MOLINA, 2017; SILVA, 2017; MEDEIROS, 2019), tais Licenciaturas simbolizam uma grande conquista para os povos do campo por serem os primeiros cursos de formação docente regular nas Instituições de Educação Superior brasileiras com vista à Educação do Campo. Somando-se a esse aspecto, avivam a intenção central dessas Graduações que é formar docentes para os anos finais do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio por áreas de conhecimento, rompendo, em parte, com a perspectiva atual condizente à formação de professores para essas etapas da Educação Básica no âmbito disciplinar.

O texto em tela tem como objetivo central apresentar uma análise curricular sobre a formação de professores por áreas de conhecimento nos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo da Região Nordeste do Brasil1. Nesse sentido, estudaremos, em pormenores, os currículos e as matrizes curriculares das Graduações, com foco na organização dos componentes curriculares pertencentes aos núcleos formativos elucidados pelas propostas de formação docente; o total de horas considerado para a formação pedagógico-educacional; bem como a sistematização dos conhecimentos e dos conteúdos2 elencados nos ementários das disciplinas responsáveis, em cada um dos cursos, por esse aspecto, ou seja, pela formação pedagógico-educacional3. Para tanto, apoiamo-nos em uma pesquisa documental, ancorada na leitura e na análise de 11 projetos pedagógicos de cursos situados em Universidades Federais e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia pertencentes à Região Nordeste.

Por sermos pesquisadores e professores no contexto da Educação do Campo e por esses cursos não possuírem diretrizes curriculares específicas que os orientem, temos vivenciado, com frequência, alguns questionamentos sobre a proposta de formação docente pensada nacionalmente para essas Graduações. Questionamentos como: “As Licenciaturas em Educação do Campo formam quais professores?”, “O que é a formação docente por áreas de conhecimento?”, “Como se organizam os currículos desses cursos?”, “Quais fundamentos teórico-metodológicos sustentam as propostas de formação nas Graduações?”, povoam as instituições que ofertam os cursos e inquietam tantos os docentes formadores quanto os discentes e profissionais da Educação envolvidos na construção dessa nova modalidade de Graduação.

Dito isso, investigações que palmilhem na direção de adicionar reflexões acerca das questões que habitam a formação de professores nessas Licenciaturas são, para além de viáveis, necessárias e fundamentais. Nesses termos, intentamos contribuir com um estudo que ateste o que se propõe, em termos curriculares, sobre a formação docente para a Educação do Campo no contexto supracitado.

Traçada esta introdução, organizamos o restante do texto em quatro seções. O primeiro momento destacará, brevemente, notas sobre as Licenciaturas em Educação do Campo e a proposta curricular de formação docente pensada no país para as Graduações. O segundo momento discutirá os procedimentos metodológicos adotados na construção desta pesquisa. O terceiro instante reportar-se-á à análise desenvolvida, isto é, ao instituído curricularmente nos Projetos Pedagógicos dos Cursos investigados. Na última seção, com as considerações finais, apresentaremos reflexões acerca do que encontramos no estudo, realçando que a ampliação do debate a respeito das propostas curriculares dos cursos, tendo em vista que a discussão da formação de professores por áreas de conhecimento precisa ser melhor evidenciada no interior dos documentos curriculares é, ainda, necessária.

As Licenciaturas em Educação do Campo e a formação de professores por áreas de conhecimento

Segundo Molina (2015), a intenção de construir cursos superiores de formação de professores para atuação na Educação do Campo surgiu desde o início das ações que fundamentaram a constituição do movimento educacional concebido no Brasil como Movimento de Educação do Campo. Na I Conferência Nacional “Por uma Educação Básica do Campo”, ocorrida no período de 27 a 31 de julho do ano de 1998, na cidade de Luziânia (GO), evento que ampliou a força coletiva de criação desse movimento, já se debatia a necessidade urgente de uma formação docente, em nível superior, específica para atuação na Educação do Campo.

A partir de então, os movimentos sociais do campo, especialmente o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em parceria com educadores e educadoras que lecionam em espaços rurais e, algumas vezes, com os órgãos governamentais, têm buscado desenvolver ações que caminhem nessa direção. Fruto das lutas e do cenário descrito, podemos mencionar, em um primeiro momento, a oferta de Projetos de Formação Inicial Docente nominados de Pedagogia da Terra, desenvolvidos com o fito de formar docentes para atuação na Educação Infantil, nos anos iniciais do Ensino Fundamental e na Educação de Jovens e Adultos nos espaços rurais4 (MEDEIROS; FERREIRA; AGUIAR, 2018).

Apesar da conquista, os Cursos de Pedagogia da Terra não se tornaram regulares em muitas instituições, finalizando após a formação de duas ou três turmas. Com a continuidade das lutas e o avanço do fechamento das escolas no campo, bem como a pouca oferta dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio em espaços rurais, emergiu, na II Conferência Nacional “Por uma Educação do Campo”, realizada, por via dos povos do campo, também, em Luziânia (GO), no período de 2 a 6 de agosto de 2004, a ideia de criar-se uma Licenciatura regular para formar professores para atuação na Educação do Campo. De acordo com Caldart (2010), era consensual, entre os participantes do evento, que o curso de formação docente deveria atender à demanda de professores para as etapas educativas mencionadas neste parágrafo5.

Em 2007, posterior ao planejamento de atingir o objetivado no evento, deu-se início à primeira experiência de formação docente nas Licenciaturas em Educação do Campo (LEDOCs) no Brasil. A princípio, o curso desenvolveu-se por intermédio de um projeto-piloto, para o qual foram convidadas, pelo Ministério da Educação (MEC), quatro universidades, a saber: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Federal de Sergipe (UFS) e Universidade de Brasília (UnB) (MOLINA, 2015; MOLINA, 2017).

Na sequência, validando a experiência inicial com o projeto-piloto, o MEC criou um programa específico de apoio à formação superior em Licenciatura em Educação do Campo6, o PROCAMPO, lançando, de 2008 a 2012, três editais de convocação às Instituições de Educação Superior públicas para a oferta de novos cursos (SANTOS; SILVA, 2016).

Nos Editais de 2008 e 2009 (Editais nº 2, de 23 de abril de 2008; e nº 9, de 29 de abril de 2009, SESU/SETEC/SECADI/7MEC), a oferta de cursos deu-se para abertura de uma turma e participaram das propostas instituições de Educação Superior públicas pertencentes às esferas Municipal, Estadual e Federal. Já no Edital de 2012 (Edital SESU/SETEC/SECADI/MEC nº 2, de 31 de agosto de 2012), ao contrário dos anteriores, as instituições que submetessem propostas teriam de regularizar, obrigatoriamente, em suas matrizes de cursos de Graduação, as Licenciaturas aprovadas. Cabe dizer que, no mesmo edital, não se permitiu a participação de instituições municipais e estaduais.

Para participação no Edital em discussão, as instituições candidatas (Universidades Federais e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia) tiveram de contemplar, no envio das propostas, alguns critérios que, via de regra, foram produzidos a partir das orientações encaminhadas pela comissão que elaborou o documento. A rigor, orientou-se que os Projetos Pedagógicos dos Cursos8, principais documentos de avaliação das propostas, deveriam, quando construídos:

  1. considerar a realidade social e cultural específica das populações a serem beneficiadas, devendo ser elaborados com a participação dos Comitês/Fóruns Estaduais de Educação do Campo, onde houver, e dos sistemas estaduais e municipais de ensino;

  2. prever os critérios e instrumentos para seleção específica de ingressantes a fim de contribuir para o atendimento da demanda por formação superior dos professores das escolas do campo, com prioridade, para aqueles em efetivo exercício nos anos finais do ensino fundamental e ensino médio das redes de ensino;

  3. apresentar organização curricular por etapas equivalentes a semestres regulares cumpridas em Regime de Alternância entre Tempo-Escola e Tempo-Comunidade;

  4. apresentar diagnóstico da demanda no âmbito do ensino fundamental e do ensino médio nas comunidades a serem beneficiadas pelo projeto, bem como perfil e características sociais, culturais e econômicas de suas populações;

  5. apresentar currículo organizado por áreas de conhecimento - (i) Linguagens e Códigos; (ii) Ciências Humanas e Sociais; (iii) Ciências da Natureza, (iv) Matemática e (v) Ciências Agrárias. (BRASIL, 2012, p. 2).

Em um panorama geral, nas Instituições Federais de Educação Superior do Brasil, no ano de 2019, conforme Medeiros (2019), há 45 cursos regulares de Licenciatura em Educação do Campo. Como característica principal desses cursos, sobrelevamos a organização curricular das propostas de formação docente em áreas de conhecimento. Ao término da formação, os licenciados pelas Graduações serão intitulados em Educação do Campo com habilitação em uma das áreas que se propôs a formar - Ciências Humanas e Sociais, Linguagens e Códigos, Ciências da Natureza, Matemática ou Ciências Agrárias.

A perspectiva de organizar os currículos de formação docente por áreas de conhecimento efetuou-se, segundo Caldart (2010), por dois motivos: o primeiro, pauta-se na compreensão de que os currículos disciplinares, modelo histórico nas Licenciaturas, se contrapunham ao perfil de professores que se almejava formar nesses cursos. Projetou-se um perfil profissional para atuação docente por área de conhecimento e para a gestão de processos educativos escolares e comunitários no meio rural.

Como essas Licenciaturas estavam sendo planejadas para atender à formação de docentes para os anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio, sobrelevou-se o contexto em que esses docentes atuavam/poderiam atuar. Em muitas instituições educativas no campo, o número de alunos nas comunidades é insuficiente para a formação de um quantitativo de turmas nos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio que abarque a carga horária total do professor das disciplinas específicas. As escolas no campo, em sua maioria, ofertam apenas os anos iniciais do Ensino Fundamental e Educação Infantil. Ao formar docentes com um currículo organizado por áreas de conhecimento, a criação de novas instituições com oferta completa da Educação Básica se tornaria mais viável, visto que os profissionais, estando habilitados em áreas de conhecimento, poderiam lecionar em mais de uma disciplina em uma mesma instituição formativa (ANTUNES-ROCHA, 2009; CALDART, 2010; BARBOSA, 2012; MOLINA, 2015; MORAES; SOUZA, 2017).

O segundo motivo diz respeito ao aspecto de que seria muito difícil aprovar as subversões necessárias na lógica dos cursos nas instâncias cabíveis - MEC e universidades -, em vista dos objetivos9 formativos mais gerais que estavam em debate, o que poderia ter como implicação o não aceite da abordagem do campo ou a sua interpretação de forma equivocada (CALDART, 2010). O Movimento de Educação do Campo entende o campo como espaço vivo, multifacetado e plural. Uma Licenciatura disciplinar fragmentaria as condições de explorá-lo e de concebê-lo em sua diversidade.

No âmbito interno da organização dessas Graduações, isto é, na dimensão curricular oficial, perspectivou-se a sistematização das matrizes curriculares em três núcleos formativos, quais sejam: Núcleo de Formação Básica, Núcleo de Formação Integradora e Núcleo de Formação Específica. Assim, cada Licenciatura abrangeria as cinco áreas de conhecimento referendadas nos Editais de seleção para abertura de cursos - Ciências Humanas e Sociais, Linguagens e Códigos, Ciências da Natureza, Matemática e Ciências Agrárias - com ênfase, em um desses núcleos (Núcleo de Formação Específica), nas habilitações pretendidas.

Santos (2014), em sua análise sobre os núcleos formativos dos currículos das Licenciaturas em Educação do Campo, explica:

Na formação básica busca-se fazer os estudantes se apropriarem dos fundamentos sócio-históricos e político-filosóficos da educação, bem como da realidade do campo brasileiro. A formação integradora orienta-se pela questão: ‘qual a formação necessária para o educador do campo atuar no ensino médio e fundamental, em práticas educativas escolares e não-escolares, espaços formais e não-formais e de gestão de processos educativos’. [...] A formação específica tem por objetivo abordar o conjunto de componentes curriculares que dizem respeito à atuação profissional centralizando esse momento na formação por área do conhecimento por meio de uma preparação nas diferentes áreas, ‘a criação, avaliação e uso de textos, materiais didáticos, procedimentos e processos de aprendizagem que contemplem a diversidade social e cultural da sociedade brasileira’. (BRASIL, 2009apudSANTOS, 2014, p. 286, grifos do autor).

No Núcleo de Formação Básica, apresentam-se os conhecimentos e os conteúdos curriculares que sustentam a proposta formativa. As cinco áreas elencadas nos editais de seleção para abertura de cursos no Brasil são contempladas em seu interior. Além disso, estão os conhecimentos e os conteúdos da Educação ou de áreas que se articulam a ela e compõem outros domínios científicos - Psicologia Educacional, História da Educação, Filosofia da Educação, Sociologia Educacional, entre outras.

O Núcleo de Formação Integradora congrega os conhecimentos e os conteúdos curriculares referentes ao Estágio Supervisionado, à prática como componente curricular, à pesquisa, entre outros. Reforçamos que os conhecimentos e os conteúdos desse núcleo formativo colaboram, em realidade, para o desenvolvimento da Pedagogia da Alternância, dimensão metodológica orientada para as Licenciaturas (MEDEIROS, 2019).

No Núcleo de Formação Específica estão os conhecimentos e os conteúdos das áreas específicas da habilitação que se intenta para a formação docente. Cada curso pode ofertar o número de habilitações que desejar, a depender da proposta formativa inicial submetida para aprovação no MEC. Desse modo, em uma Licenciatura, pode existir a intenção de ofertar mais de uma habilitação, tendo, como ênfase, os conhecimentos e os conteúdos específicos da grande área que a forma no referido núcleo curricular. Na sequência (Figura 1), produzimos, a partir de nossos entendimentos, uma figura que sistematiza a organização curricular das Licenciaturas em Educação do Campo por núcleos de formação docente. Vejamos:

Fonte: Elaborada pelos autores, 2019.

Figura 1 Organização Curricular das Licenciaturas em Educação do Campo 

Após essas breves notas, seguiremos com a explanação de nossos passos para o desenvolvimento da investigação. No próximo tópico, registraremos os aspectos metodológicos na produção dos dados da pesquisa.

Procedimentos metodológicos

Por ser o objetivo central da pesquisa apresentar uma análise curricular sobre a formação de professores por áreas de conhecimento nos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo da Região Nordeste, com relevo para a organização curricular dos componentes curriculares nos núcleos formativos elucidados pelas propostas de formação docente, levando em conta, também, o total de horas considerado para a formação pedagógico-educacional, bem como a sistematização dos conhecimentos e dos conteúdos elencados nos ementários das disciplinas responsáveis nos cursos por esse aspecto, ou seja, pela formação pedagógico-educacional, realizamos os procedimentos listados na sequência.

No primeiro momento, fizemos o levantamento dos cursos, cadastrados na plataforma do e-MEC, que se apresentam em atividade na Região Nordeste. No referido espaço, há Licenciaturas catalogadas como projetos de formação docente (que não são cursos regulares nas instituições ofertantes - oriundas dos editais de 2008 e 2009) e como Graduações permanentes. Ao término desse procedimento, buscamos, nos sites das Instituições de Educação Superior, informações acerca das Licenciaturas que estão em funcionamento e se encontram registradas como Graduações permanentes nas matrizes de cursos ofertados à sociedade. Ao todo, identificamos 11 Licenciaturas em Educação do Campo com essas características em Universidades Federais e Institutos Federais Superiores de Educação, Ciência e Tecnologia da Região Nordeste10.

Em continuidade, nos dirigimos aos Projetos Pedagógicos dos Cursos disponíveis nos espaços institucionais. Das 11 Licenciaturas existentes, nove apresentaram os documentos curriculares nos sites das instituições, e duas11 nos disponibilizaram, após o contato, via e-mail, com as coordenações dos cursos, a documentação.

No terceiro instante, realizamos a leitura dos documentos curriculares oficiais, perspectivando concretizar o objetivo principal da pesquisa. Com esse encaminhamento, organizamos as informações dispostas nos Projetos Pedagógicos dos Cursos, em termos quantitativos, em quadros e gráficos, para interpretação e análise qualitativa.

Por último, no quarto momento, desenvolvemos a análise qualitativa, a partir das informações disponíveis nos quadros e nos gráficos, no intento de abstrair reflexões a respeito do propósito inicial do estudo. Mesmo tendo ciência de que os resultados da pesquisa representam, no âmbito curricular, sobre as Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil, uma pequena parcela da realidade, o que encontramos na Região Nordeste pode se materializar como parâmetro para outros contextos brasileiros e, dessa forma, complementar com conhecimentos a respeito da formação de professores por áreas de conhecimento almejada para essas Graduações.

Formação de professores por áreas de conhecimento nas Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste: análise curricular

Antes de adentrarmos na análise curricular, ou seja, no estudo dos currículos e das matrizes curriculares das LEDOCs da Região Nordeste, abordaremos algumas questões referentes às Graduações. Em primeiro lugar, destacamos que dos nove Estados que constituem a Região Nordeste, em cinco há Licenciaturas em Educação do Campo regulares e em funcionamento nas Universidades Federais e nos Institutos Federais Superiores de Educação, Ciência e Tecnologia. Nesse cenário, situam-se os Estados do Piauí, com quatro cursos, da Bahia, do Rio Grande do Norte e do Maranhão, com duas Graduações em cada, e da Paraíba, com uma Licenciatura.

Além desse aspecto, salientamos que, no âmbito da distribuição dessas Licenciaturas pelas Instituições de Educação Superior, dos 11 cursos regulares, nove estão alocados em Universidades e dois estão situados em Institutos Federais Superiores de Educação, Ciência e Tecnologia. Em relação à localização das Licenciaturas no plano interno das instituições ofertantes, três cursos encontram-se implementados nos campi sedes das Instituições e oito se localizam em campi externos às sedes. No Quadro 1, organizamos outras informações acerca das Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste.

Quadro 1 Panorama das Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste 

Instituição formadora Campus Habilitações ofertadas Ano de implementação do PPC Total de horas da formação docente
IFRN Canguaretama Ciências Humanas e Sociais e Matemática 2016 3.254 Ciências Humanas e Sociais
3.314 Matemática
IFMA São Luís - Maracanã Ciências Agrárias, Ciências da Natureza e Matemática 201012 4.470 Ciências Agrárias
4.665 Ciências da Natureza
4.695 Matemática
UFCG Sumé Linguagens e Códigos, Ciências Humanas e Sociais e Ciências Exatas e da Natureza 2011 3.555 (as três habilitações possuem o total igual de horas)
UFERSA Mossoró Ciências Humanas e Sociais e Ciências da Natureza 2013 3.210 (as duas habilitações possuem o total igual de horas)
UFMA Bacabal Ciências Agrárias e Ciências da Natureza e Matemática 2014 4.575 Ciências Agrárias
4.515 Ciências da Natureza e Matemática
UFPI Bom Jesus Ciências Humanas e Sociais 2013 3.200
UFPI Floriano Ciências da Natureza 2013 3.260
UFPI Picos Ciências da Natureza 2013 3.260
UFPI Teresina Ciências da Natureza 2013 3.260
UFRB Amargosa Ciências Agrárias 2013 3.073
UFRB Feira de Santana Ciências da Natureza e Matemática 2013 3.396 (as duas habilitações possuem o total igual de horas)

Fonte: Elaborado pelos autores, 2019.

Legenda: Projeto Pedagógico de Curso (PPC); Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN); Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA); Universidade Federal de Campina Grande (UFCG);Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA); Universidade Federal do Maranhão­ (UFMA); Universidade Federal do Piauí (UFPI); Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).

A partir das informações disponíveis no Quadro 1, apontamos, outra vez, algumas considerações, de cunho geral, sobre os cursos. Em relação ao número de horas destacadas para a formação docente, vemos que uma Licenciatura pode ter valores diferentes de horas projetadas em um único documento curricular. Isso ocorre porque, algumas vezes, em um único PPC (ou em uma única proposta curricular de formação de professores nas Graduações), há mais de uma habilitação. Encontramos Licenciaturas (do IFMA, do IFRN e da UFMA) que possuem o número de horas, os conteúdos e os conhecimentos curriculares iguais no Núcleo de Formação Básica e no Núcleo de Formação Integradora, diferindo no Núcleo de Formação Específica, por ele ser o núcleo formativo que agrega a(s) habilitação(ções) pretendida(s) à formação de professores da Educação do Campo.

Outra característica ilustrada confere ao fato de mais da metade das Licenciaturas (no total de seis) ofertarem duas ou mais habilitações no mesmo curso. Identificamos também que a habilitação em Ciências da Natureza é hegemônica no interior dos cursos (ela aparece em oito Graduações). Tal característica pode ser compreendida a partir da análise do Edital SESU/SETEC/SECADI/MEC nº 2, de 31 de agosto de 2012, documento que possibilitou a criação de nove dos 11 cursos existentes13, pois, em seu conteúdo, se inferiu que a área de formação em Ciências da Natureza deveria ser priorizada pelas instituições interessadas na oferta das Graduações, haja vista que a carência/demanda de professores nessa área de conhecimento se fez evidente historicamente nos espaços rurais (BRASIL, 2012).

Ainda a respeito das informações gerais sobre as LEDOCs, acrescentamos que somente a UFPI e a UFRB possuem mais de uma Graduação nas matrizes de cursos regulares ofertados sob sua dependência. Os cursos dessas duas instituições estão distribuídos em campi diferentes.

Adentrando a análise dos Projetos Pedagógicos dos Cursos, como primeira dimensão a validarmos, explanamos a organização dos núcleos formativos curriculares pensados para as Graduações e a distribuição de horas em seu interior. Sobre essa dimensão, detalhamos que, com os cursos da UFPI, Campus Bom Jesus, e da UFRB, Campus Amargosa, não foi possível apreender conclusões.

No PPC da primeira Licenciatura - LEDOC/UFPI, Campus Bom Jesus -, a organização da matriz curricular não segue a perspectiva de sistematização em núcleos formativos (UFPI, 2013a). Já em relação à segunda Graduação - LEDOC/UFRB, Campus Amargosa -, não encontramos o valor de horas específico para os núcleos formativos curriculares elencados em sua proposta. As disciplinas apresentam-se distribuídas em quatro eixos (que podem ser validados como núcleos formativos curriculares porque, na nossa visão, assumem a mesma função), os quais são denominados de “Formação Básica”, “Formação Sócio-política”, “Formação Específica - base integradora” e “Formação Específica de professores e gestores das Escolas do Campo” (UFRB, 2013a). Contudo, não se informa no documento o número de horas de cada um deles. Há o quantitativo de horas das disciplinas que compõem os núcleos (eixos) formativos, mas não o total de horas geral deles.

As informações coletadas nos demais projetos pedagógicos analisados (nove, no total), quanto à dimensão em discussão, estão postas no Gráfico 1. Comunicamos que, pelos documentos curriculares utilizarem de denominações diferentes sobre os núcleos formativos curriculares, a exemplo da utilização dos termos “eixos” e “ciclos”, preferimos abordá-los, no referido gráfico, com as nominações “Formação Básica”, “Formação Integradora” e “Formação Específica”, seguindo a proposta nacional de organização dos cursos (BRASIL, 2012). Contemplemos os achados:

Fonte: Elaborado pelos autores, 2019. Dados da pesquisa.

Gráfico 1 Organização dos núcleos formativos curriculares quanto ao número de horas nas matrizes curriculares das Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste 

O cenário desenhado no Gráfico 1 permite-nos o entendimento inicial de que apenas nos Cursos LEDOCs do IFMA e da UFMA, ambos localizados no Estado do Maranhão, a formação específica apresenta-se com maior foco nos documentos oficiais - o que condiz com o entendimento de que nesses cursos estão sobrelevados os conhecimentos e os conteúdos curriculares específicos das habilitações (e não os conhecimentos e os conteúdos de formação básica ou de formação integradora).

Em detalhe ao que se apresenta em cada curso, explanamos que nas LEDOCs da UFPI, nos campi Floriano, Picos e Teresina, as disciplinas são organizadas com os conhecimentos e os conteúdos do projeto formativo em três ciclos: o “Básico”, 2.055 horas; o “profissional”, 885 horas; e o de “formação complementar” (no último, incluímos também as atividades complementares), 320 horas; que, conjuntamente, totalizam 3.260 horas (UFPI, 2013b; UFPI, 2013c; UFPI, 2013d). Nos três cursos, aparece, com ênfase, a formação básica.

No Curso da UFCG, os componentes curriculares estão sistematizados em três dimensões: a “Formação Básica”, 1.530 horas; a “Formação Integradora”, 1.065 horas; e a “Formação Específica”, 960 horas. Na citada Licenciatura, a proposta de formação totaliza 3.555 horas (UFCG, 2011).

Na LEDOC do IFMA, as disciplinas ordenam-se em quatro núcleos: o “Núcleo Básico de Formação Geral”, 1.260 horas; o “Núcleo Básico de Formação Comum para a Docência”, 915 horas (pelo motivo dos dois núcleos destacarem componentes curriculares que dizem respeito à formação geral do professor com o estudo dos fundamentos políticos, históricos, sociológicos, filosóficos, da educação, entre outros, vemos que ambos constituem a Formação Básica na Graduação); o “Núcleo de Estudos Específicos da Habilitação em Matemática”, 2.340 horas14; e o “Núcleo de Atividades Diversificadas” (Formação Integradora), 180 horas, somando 4.695 horas.

Na Graduação da UFRB, Campus de Feira de Santana, as disciplinas estruturam-se em quatro núcleos de formação: a “Formação Geral”, 833 horas; a “Formação Sócio-Política”, 357 horas (os dois núcleos, para nós, representam a Formação Básica por aglutinarem componentes curriculares com conhecimentos e conteúdos relativos aos fundamentos teóricos da Educação, da Psicologia, da Sociologia, da Agroecologia, entre outros); a “Formação Pedagógica Integradora”, 1.156 horas; e a “Formação Específica”, 850 horas. Os valores dos núcleos e as 200 horas de atividades complementares quantificam 3.396 horas de formação (UFRB, 2013b).

No Curso da UFMA, habilitação em Ciências Agrárias, os componentes curriculares estão dispostos em três núcleos: o “Básico”, 2.040 horas; o “específico”, 2.335 horas; e o de “atividades complementares”, 180 horas. Um aspecto relevante é que, nessa Licenciatura, há dois projetos pedagógicos de curso. Tal como dispomos no Quadro 1, ela oferta duas habilitações - Ciências Agrárias e Ciências da Natureza e Matemática -, cada habilitação, porém, está situada em um PPC. Acreditamos que esse ponto é característico em virtude do cadastramento da Graduação no sistema do e-MEC. Nos dois projetos pedagógicos existentes, o núcleo básico e o núcleo de atividades integradoras têm um número igual de horas, o que difere é o núcleo específico, motivo pelo qual citamos, neste momento da análise, a habilitação em Ciências Agrárias (UFMA, 2014).

Na LEDOC do IFRN, as disciplinas anunciam-se em núcleos articuladores, em seminários curriculares e na prática profissional. Os núcleos articuladores, no nosso entendimento, trazem dimensões da Formação Básica, com os núcleos “fundamental”, 120 horas; “didático-pedagógico”, 330 horas; “epistemológico”, 180 horas; e “específico da educação do campo”, 435 horas; e da Formação Específica, com o “núcleo específico da habilitação em Matemática”, 975 horas. A Formação Integradora é situada nos “seminários integradores”, 154 horas; e na “prática profissional”, 1.000 horas. O conjunto desses componentes totalizam 3.314 horas de formação na Licenciatura (IFRN, 2016). Do mesmo jeito que nas LEDOCs do IFMA e da UFMA, a referida Graduação oferta mais de uma habilitação - Ciências Humanas e Sociais e Matemática -, e os núcleos específicos das habilitações possuem valores diferentes, o que nos fez considerar, durante a análise, o núcleo com o maior número de horas, no caso, o núcleo da habilitação em Matemática.

No contexto da LEDOC/UFERSA, a distribuição dos três núcleos formativos mostra a predominância de horas no Núcleo de Estudos Comuns, 1.605 horas; seguido do Núcleo de Atividades Integradoras, 975 horas; e do Núcleo de Estudos Específicos, 630 horas (UFERSA, 2013). O que mais nos intrigou nessa fase da análise foi o fato de que, se comparado aos outros oito cursos LEDOCs da Região Nordeste discutidos anteriormente, o Curso LEDOC/UFERSA é o que destina o menor tempo para a formação específica.

Após a explanação pormenorizada das realidades encontradas na análise da organização dos núcleos formativos curriculares nas matrizes curriculares das Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste, vemos a demanda de apontamentos reflexivos, em texto, oriundos do que abstraímos:

a) Dos nove documentos curriculares analisados quanto ao aspecto nuclear da pesquisa, em sete deles, predomina-se a ênfase na formação básica, o que significa que o estudo dos fundamentos teóricos da Educação, bem como de outras áreas que se associam a uma formação de cunho mais generalista, focada nos conhecimentos culturais, políticos, econômicos, entre outros, se atesta.

Dialogando com a nossa realidade profissional, na condição de docentes e, por quase dois anos, no âmbito da coordenação de uma Licenciatura em Educação do Campo, alertamos que uma das intenções principais da formação de professores do campo é a formação política dos sujeitos (CALDART, 2010; CALDART, 2012; MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014; MOLINA, 2017; MEDEIROS, 2019). Conhecer a realidade educacional no campo e buscar mecanismos para transformá-la exige dos docentes que atuam em espaços rurais uma formação que transcenda aos domínios dos conhecimentos específicos das matérias em que lecionam.

Esse fato, por vezes, é motivo de estranhamento, segundo Silva (2017), para muitos professores formadores (principalmente das áreas específicas) nos cursos LEDOCs, causando resistência quanto à perspectiva de formação docente nas Graduações por áreas de conhecimento. No entanto, para além dessa questão, é preciso entender que a Educação do Campo segue uma dimensão de formação de sujeito que não se alinha ao que, comumente, a Educação Brasileira desenvolveu. Dentre seus objetivos, apresenta-se a formação crítica dos diferentes povos do campo, que não se faz apartada da realidade local e dos problemas estruturais da sociedade (CALDART, 2012; ARROYO, 2015; HAGE et al., 2018).

Nesse sentido, na formação de professores para atuar na Educação do Campo, é fundamental romper com o modelo de formação dos cursos de Licenciatura das disciplinas específicas (referenciado tantas vezes nas pesquisas sobre formação docente no país, denominado pelo modelo 3+1 ou pelo modelo bacharelesco - GATTI et al., 2019) que, na história, priorizou os conteúdos específicos dos campos disciplinares e limitou os sujeitos em formação a desenvolverem um olhar mais crítico e consciente acerca da sociedade e, sobretudo, sobre a Educação.

b) Nos documentos analisados, parece não haver um entendimento a respeito do que seria a Formação Integradora nas LEDOCs.

É consensual, nos estudos de Medeiros (2019), Santos (2014) e Barbosa (2012), que os componentes curriculares da formação integradora apresentam importantes contribuições aos formandos das LEDOCs pelo contato que permitem com a realidade educacional. O núcleo curricular de formação integradora propõe conhecimentos e conteúdos curriculares do âmbito da pesquisa, da prática como componente curricular e dos estágios supervisionados (MEDEIROS, 2019). Em alguns cursos (a exemplo da UFMA, UFPI - campi Floriano, Picos e Teresina), verificamos que a Formação Integradora aparece interligada às atividades complementares ou foi articulada ao Núcleo de Formação Básica, com os conhecimentos e os conteúdos referentes à prática como componente curricular, aos Estágios Supervisionados e à pesquisa. Constatamos também que, nesses mesmos contextos, a Formação Integradora aparece ainda atrelada à Formação Específica.

Nessa linha de raciocínio, pensamos que esse procedimento pode somar para que os conteúdos e os conhecimentos específicos das áreas que compõem as habilitações consigam uma aproximação, em termos práticos, com a Educação Básica e a realidade social dos licenciandos. No entanto, vemos importante o repensar acerca desse aspecto na organização curricular dos cursos, haja vista que, na história, as disciplinas que vislumbraram o estudo dos conhecimentos e dos conteúdos específicos das matérias específicas do currículo escolar da Educação Básica se fizeram distantes da realidade educacional. Há estudos que denunciam que a dimensão da prática, como componente curricular vinculada a essas disciplinas, não passa de mero procedimento organizativo dos currículos de formação docente. A formação teórica (de cunho abstrato) sobressai-se, e o estudo da prática educacional não se efetua nas Licenciaturas (SANTOS, 2003; ARAÚJO, 2018; TOZETTO; MARTINEZ; KAILER, 2020).

c) O Núcleo de Formação Básica, hegemônico na organização curricular na maioria (em sete Licenciaturas) dos cursos analisados, apresenta uma variedade de áreas que o constituem.

Em referência a essa característica, supomos que, no planejamento dos currículos oficiais das LEDOCs, atentou-se às diferentes realidades que compõem cada contexto em que os cursos se inserem. Vemos que, no Núcleo de Formação Básica, a ênfase não está somente nas grandes áreas que permeiam as propostas formativas com os conhecimentos e os conteúdos do âmbito filosófico, sociológico, educacional, econômico, entre outros, mas se direciona para questões locais e culturais das populações do campo. Conhecimentos e conteúdos curriculares sobre a agroecologia, a agricultura familiar, os saberes da tradição das populações do campo, os movimentos sociais do campo, o direito agrário, a educação para a convivência com o semiárido, para citar alguns, se inserem em algumas das propostas de formação docente analisadas.

Essa realidade curricular oficial atende, em parte, aos ideais do Movimento de Educação do Campo no País, haja vista que, segundo Arroyo (2007), nos programas e nos cursos de formação de professores da Educação do Campo pensados em consonância com o Movimento de Educação do Campo, é preciso que sejam incluídos

[...] o conhecimento do campo, as questões relativas ao equacionamento da terra ao longo de nossa história, as tensões no campo entre o latifúndio, a monocultura, o agronegócio e a agricultura familiar; [...] os problemas da reforma agrária, a expulsão da terra, os movimentos de luta pela terra e pela agricultura camponesa, pelos territórios dos quilombos e dos povos indígenas. [...] a centralidade da terra e do território na produção da vida, da cultura, das identidades, da tradição, dos conhecimentos. [...] um projeto educativo, curricular, descolado desses processos de produção da vida, da cultura e do conhecimento estará fora do lugar. Daí a centralidade desses saberes para a formação específica de educadoras e educadores do campo. (ARROYO, 2007, p. 167).

Após essas afirmativas, declaramos que não entendemos que haja um modelo específico ou um currículo oficial ideal que sirva como receituário informando como devem ser os cursos de formação de professores da Educação do Campo. Defendemos, porém, como Arroyo (2007), que o campo na qualidade de território de múltiplos sujeitos, com diferentes culturas e modos de produção de vida, deve ser o ponto inicial da formação de seus professores (ARROYO, 2007; SAVI; ANTONIO, 2016).

Na continuidade da análise curricular das propostas formativas das Licenciaturas em Educação do Campo, como próxima dimensão a discutirmos, referenciamos o total de horas considerado para a formação pedagógico-educacional nos cursos, bem como a sistematização dos conhecimentos e dos conteúdos elencados nos ementários das disciplinas responsáveis nas Licenciaturas por esse aspecto, isto é, pela formação pedagógico-educacional. Novamente, organizamos as informações encontradas na Figura 2 a seguir15.

Fonte: Elaborada pelos autores, 2019. Dados da pesquisa.

Figura 2 Formação pedagógico-educacional nas Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste 

Em publicações que analisaram as dimensões curriculares oficiais de Licenciaturas no Brasil, que formam professores da Educação Básica para atuação em disciplinas específicas, a pouca atenção dada à formação de cunho pedagógico-educacional foi atestada (SANTOS, 2003; GATTI; BARRETTO, 2009; MEDEIROS, 2017; ARAÚJO, 2018; MEDEIROS; AGUIAR, 2018). Nas propostas curriculares analisadas das Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste, essa característica não se efetua. De modo geral, os conhecimentos e os conteúdos pedagógico-educacionais perpassam as Graduações.

Em termos quantitativos, a formação pedagógico-educacional aparece com atenção nos currículos oficiais da maioria das LEDOCs da Região Nordeste. Das 11 Graduações analisadas, nove apresentam, no mínimo, um quarto de sua carga horária total para o estudo dos conhecimentos e dos conteúdos referentes ao campo da Educação. Em realidade, como é o caso das LEDOCs da UFCG, da UFRB, Campus Feira de Santana, e da UFPI, nos Campi Picos, Floriano e Teresina, a ênfase na formação pedagógico-educacional equivale a mais de um terço das horas projetadas para a formação inicial docente. As exceções, neste aspecto da análise, são os Cursos LEDOCs da UFMA e do IFMA, que apresentam um pouco mais do quinto de horas, do valor total, designadas ao estudo dos conhecimentos e dos conteúdos pedagógico-educacionais16.

Na leitura dos ementários das disciplinas que atestam indicações para pensarmos a formação pedagógico-educacional, há uma variedade de conhecimentos e de conteúdos que dizem respeito à Educação. Tais conhecimentos e conteúdos se encaminham para os fundamentos teóricos da Educação (englobando as áreas de Psicologia da Educação, História da Educação, Sociologia da Educação, Antropologia da Educação, Filosofia da Educação, Linguagens e Educação, entre outras), para os sistemas de ensino (com apontamentos a respeito da política e da gestão educacional), para a organização e o trabalho pedagógico na escola e na sala de aula (com questões que discorrem sobre o currículo e a didática), para as metodologias/práticas de ensino em contextos escolares e não escolares (com indicações acerca do ensino de Geografia, do ensino de História, do ensino de Matemática, do ensino de Biologia, do ensino de Química, do ensino de Física, do ensino de Ciências Agrárias, do ensino de Língua Portuguesa, da Educação Comunitária, da Educação Social), entre outros.

Uma característica importante compreendida na análise consiste no fato de que, em algumas matrizes curriculares, mais precisamente nas ementas das disciplinas, os conhecimentos e os conteúdos pedagógico-educacionais situam a Educação de forma generalista sem estabelecer conexões com a Educação do Campo. Nos ementários das disciplinas “Organização e Gestão da Educação Brasileira” e “Filosofia da Educação”, dispostas nos Projetos Pedagógicos das Licenciaturas em Educação do Campo do IFRN e da UFPI, Campus Bom Jesus, verificamos esse aspecto. Observemos:

Disciplina - Organização e Gestão da Educação Brasileira - 60h:

A organização da educação básica brasileira no âmbito da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96). Sistema(s) de ensino: a visão teórica e o marco legal. Os embates entre gerencialismo e gestão democrática. A gestão democrática da educação e suas implicações para a democratização da educação básica. O planejamento educacional em âmbito federal, estadual e municipal. Financiamento da educação no contexto brasileiro. Avaliação institucional. Formação docente no âmbito das políticas de formação no Brasil (IFRN, 2016, p. 62, grifo do autor).

Disciplina - Filosofia da Educação - 60h:

Estudo da Filosofia e Filosofia da Educação, suas concepções e especificidades. Abordagem das concepções específicas ao âmbito educacional, bem como da compreensão do papel da educação e de sua relação entre pedagogia e ensino. Teorias e práticas educacionais, dimensões ético-políticas e estéticas, além da abordagem argumentativa da práxis educativa e da formação do professor (UFPI, 2013a, p. 42, grifo do autor).

Pelo que expõem as ementas das disciplinas, o campo e a educação do campo não se associam aos conhecimentos e aos conteúdos projetados no plano curricular, no âmbito da formação pedagógico-educacional. Não sabemos se, no currículo vivido em sala de aula, por professores formadores e licenciandos, tais dimensões serão atentadas e corporificadas. Na leitura dos Projetos Pedagógicos dos Cursos, essa característica emerge na maioria das ementas das disciplinas de cunho pedagógico-educacional, o que nos conduz para a compreensão de que temos a secundarização da Educação do Campo, em parte, na proposta curricular oficial das LEDOCs, quanto à questão em análise, a formação pedagógico-educacional.

Outra característica que merece atenção é o fato de que há poucos apontamentos a respeito da formação pedagógico-educacional com ênfase na formação docente por áreas de conhecimento. Em parâmetros explicativos, destacamos que os conhecimentos e os conteúdos de cunho pedagógico-educacional, ao se reportarem à formação docente, têm uma abordagem focada em uma perspectiva disciplinar e não em áreas de conhecimento. Os conhecimentos e os conteúdos das metodologias e as práticas de ensino situam o ensino de História, o ensino de Geografia, o ensino de Biologia, o ensino de Física, entre outros, mas sem se reportarem às grandes áreas que constituem as habilitações (Ciências Humanas e Sociais, Ciências da Natureza, entre outras). Citamos o exemplo das ementas das disciplinas “Metodologia do Ensino de Geografia” e “Metodologia do Ensino da Física” existentes nos Projetos Pedagógicos dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo da UFERSA e da UFPI, Campus Floriano:

Disciplina - Metodologia do Ensino de Geografia - 60h:

História da Geografia Escolar Brasileira. Planejamento escolar. Pesquisa e avaliação. Fundamentos metodológicos do ensino de Geografia na Educação Básica. Conceitos básicos do ensino de Geografia. Aprendizagem e didática em geografia (UFERSA, 2013, p. 62, grifo do autor).

Disciplina - Metodologia do Ensino da Física - 60h:

Laboratório e oficinas de planejamento da ação docente; construção de materiais didáticos; utilização das Novas Tecnologias em Educação (Internet/TV Escola). Estratégias do ensino de Física. Organização do trabalho pedagógico no ensino de Física. Diretrizes curriculares para o ensino de Física. Avaliação da aprendizagem em Física (UFPI, 2013b, p. 46, grifo do autor).

De maneira geral, apenas alguns cursos pensam em disciplinas de cunho pedagógico-educacional que se reportam à formação docente por áreas de conhecimento. Os conhecimentos e os conteúdos que visam uma formação destinada ao estudo da Educação parecem não se desmembrar do modelo disciplinar de formação de professores. Encontramos poucas Licenciaturas com a perspectiva de associar a formação pedagógico-educacional com a formação por áreas de conhecimento. Desta vez, recorreremos, como meio de contribuir com esse entendimento, às informações evidenciadas na disciplina “Metodologia do Ensino de Ciências Exatas e da Natureza no Ensino Fundamental” que compõe a matriz curricular da Licenciatura em Educação do Campo da UFCG:

Disciplina - Metodologia do Ensino de Ciências Exatas e da Natureza no Ensino Fundamental - 60h:

Os métodos usados pela ciência. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino de Ciências e Matemática. Interdisciplinaridade no ensino de ciências. Dificuldades no ensino de ciências. O professor de ciências. Usando o livro didático de forma crítica. Os Projetos de ciências. Avaliando o potencial da escola para o ensino de ciências. Estratégias didáticas. O papel da escola e a elaboração de programas de ciências (UFCG, 2011, p. 147, grifo do autor).

Com a análise registrada no texto, emergiram questões: Como ocorre, no currículo praticado dos cursos analisados, a discussão acerca da formação docente por áreas de conhecimento? Será que as Licenciaturas em Educação do Campo da Região Nordeste têm conseguido romper, na realidade curricular praticada, com o modelo disciplinar de formação docente? Nos demais currículos oficiais das Licenciaturas em Educação do Campo do Brasil, tal cenário se efetua? Acreditamos que outros estudos podem considerar essas questões e adentrar os contextos das LEDOCs do País para novas considerações. A análise anteriormente apresentada nos deixa a compreensão de que, tanto no plano do currículo oficial quanto no plano do currículo praticado/vivido pelas LEDOCs, há muitos aspectos que carecem de aprofundamentos. Esperamos que, a partir da leitura desenvolvida no presente texto, novos estudos se construam e somem, similarmente ao que buscamos, para o conhecimento a respeito da formação de professores por áreas de conhecimento nos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo - sejam no âmbito local, regional e/ou nacional.

Considerações finais

Neste texto, esforçamo-nos para registrar uma análise curricular a respeito da formação de professores por áreas de conhecimento nos 11 cursos de Licenciatura em Educação do Campo da Região Nordeste. Com respaldo em um estudo documental dos Projetos Pedagógicos dos Cursos, desenvolvemos a análise curricular a partir de duas dimensões: (1) organização curricular dos componentes curriculares nos núcleos formativos elucidados nas propostas de formação docente; e (2) formação pedagógico-educacional projetada no currículo oficial dos cursos (total de horas considerado para a formação pedagógico-educacional, bem como a sistematização dos conhecimentos e dos conteúdos elencados nos ementários das disciplinas responsáveis por esse aspecto nas Graduações).

Em primeira instância, constatamos que a organização curricular das propostas de formação docente evidencia que o núcleo de formação básica é hegemônico no currículo oficial das Graduações, o que pode ser considerado como algo positivo na análise, pois a formação docente, nesses cursos, desloca-se da perspectiva centrada nos conhecimentos e nos conteúdos específicos das disciplinas específicas do currículo escolar da Educação Básica, estendendo-se para uma formação docente de cunho generalista, focada, por sua vez, nos conhecimentos culturais, políticos, econômicos, da educação, entre outros.

No entanto, ainda a respeito da organização curricular dos componentes curriculares nos núcleos formativos elucidados nas propostas de formação docente, compreendemos que parece não haver um entendimento pleno do que seria a Formação Integradora nos currículos oficiais dos cursos. Em instantes, ela aparece interligada às atividades complementares e, em outros momentos, se associa aos núcleos de formação básica e de formação específica. Essa realidade implica, talvez, o afastamento da formação docente centrada na pesquisa (dimensão importante na formação do professor) e na Pedagogia da Alternância.

Lembramos que a Formação Integradora é responsável por articular, nos cursos LEDOCs, a dimensão prática da formação docente com a dimensão teórica. Ela comunga para acentuar, nos processos formativos, a unicidade entre teoria e prática, haja vista que, em realidade, é o núcleo de formação integradora que contribui para o desenvolvimento da Pedagogia da Alternância, dimensão metodológica das Graduações (MEDEIROS, 2019).

No que diz respeito à formação pedagógico-educacional, validamos três referências principais oriundas da análise, quais sejam: em primeiro lugar, constatamos que, diferentemente de análises curriculares publicadas na literatura educacional (SANTOS, 2003; GATTI; BARRETTO, 2009; MEDEIROS, 2017; ARAÚJO, 2018), que auferem a respeito dos cursos de Licenciatura que formam professores para as disciplinas específicas subvalorizarem a formação pedagógico-educacional do professor, priorizando os conhecimentos e os conteúdos das disciplinas específicas da área de formação, as LEDOCs da Região Nordeste creditam a formação pedagógico-educacional em seus currículos oficiais. Essa característica pode ser entendida como um grande avanço na formação docente destinada à atuação nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, no caso na Educação do Campo.

Em segundo lugar, avaliamos que, mesmo que haja um valor considerado de tempo para a formação pedagógico-educacional na maioria dos cursos (nove Graduações), é preciso rever a discussão sobre a Educação do Campo e o Campo nas matrizes curriculares. Nas disciplinas compreendidas como responsáveis pela formação pedagógico-educacional, tanto a Educação do Campo quanto o próprio Campo não são relevados. Projeta-se, na maior parte dos currículos oficiais, o trabalho acerca dos conhecimentos e dos conteúdos da área de Educação, mas sem associá-los, de forma direta, à Educação do Campo e ao Campo.

A terceira referência, quanto à formação pedagógico-educacional, concerne à formação por áreas de conhecimento. É quase inexistente, nos currículos oficiais analisados, disciplinas que estabeleçam nexos entre a formação pedagógico-educacional e a formação por áreas de conhecimento. Os conhecimentos e os conteúdos são abordados seguindo o modelo disciplinar, isto é, quando os currículos oficiais se reportam às metodologias e às práticas de ensino, fazem em uma perspectiva disciplinar e não por grandes áreas. Poucas Licenciaturas em Educação do Campo projetam componentes curriculares, de cunho pedagógico-educacional, para a formação por áreas de conhecimento. Nos cursos que ofertam as habilitações em Ciências Humanas e Sociais, por exemplo, as disciplinas que se destinam à metodologia e às práticas de ensino encaminham para a História, a Geografia e a Sociologia, não de forma conjunta (em grandes áreas). Esse aspecto é característico na maioria das Graduações.

Em linhas conclusivas, vemos que, nos currículos oficiais das LEDOCs da Região Nordeste, há questões que merecem ênfase pela contribuição que trazem à formação docente, de maneira geral (a priorização de uma formação docente com enfoque nos conhecimentos culturais, políticos, econômicos, da educação, entre outros). Do mesmo modo, há questões que carecem de atenção (a formação por áreas de conhecimento e a discussão acerca da Educação do Campo e do Campo nas disciplinas que vislumbram a formação pedagógico-educacional do professor), haja vista que, no nosso entendimento, não se alinham aos ideais do Movimento de Educação do Campo no Brasil. Todavia, não esqueçamos de que o currículo, seja ele oficial ou não, é um dispositivo que exprime relações de poder (SILVA, 2007), não é neutro e alheio aos interesses de quem o produziu.

1Este estudo iniciou como parte integrante da pesquisa doutoral de um dos autores do texto, intitulada Formação interdisciplinar de professores: estudo pedagógico-curricular sobre a Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (MEDEIROS, 2019), a qual foi realizada, no período de 2015 a 2019, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará (PPGE/UECE). Após a conclusão do estudo doutoral, desenvolveu-se novo estudo com ênfase nos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo da Região Nordeste, excetuando-se aqueles que estão cadastrados no Ministério da Educação como Programas de Formação Docente (Edital MEC/2008 e 2009), os quais aconteceram em duas Universidades Estaduais do Ceará (UECE e URCA) e em uma Instituição de Educação Superior Municipal de Pernambuco, totalizando três programas. A pesquisa conta com o apoio financeiro da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), via edital de fomento.

2Pontuamos que, ao longo do texto, nos referiremos aos termos “conhecimentos e conteúdos curriculares” das matrizes curriculares. Eles são concebidos, neste estudo, como as proposições curriculares oficiais destacadas nas ementas das disciplinas para serem vivenciadas com os formandos. Constituem parte do currículo oficial.

3A título conceitual, ressaltamos que a formação pedagógico-educacional será considerada, neste texto, como aquela que se faz/perspectiva com os diferentes conhecimentos e conteúdos da área de Educação, o que inclui os conhecimentos e os conteúdos do âmbito dos fundamentos teóricos da Educação, da Didática, do Currículo, das Práticas de Ensino, da Política e da Gestão Educacional, das diferentes modalidades de Educação, entre outros.

4Registramos que as experiências de formação de professores, em nível médio, desenvolvidas ao longo da história (podemos referenciar as experiências construídas a partir da criação do Setor de Educação do MST) pelos movimentos sociais do campo (em especial, destacamos o MST) contribuíram muito para o nascimento do Projeto de Formação Inicial Docente Pedagogia da Terra e das Licenciaturas em Educação do Campo.

5Compreendemos que, somando-se à luta de desenvolver cursos de formação de professores, em nível superior, está a busca por ampliação no que diz respeito à oferta da Educação do Campo para suas populações, abarcando, inclusive, a Educação Superior. A I Conferência Nacional de Educação do Campo, ocorrida no ano de 1998, tinha em seu título o termo “Educação Básica do Campo”, o que não ocorre com a segunda conferência, desenvolvida em 2004. No evento, debateu-se, entre outros tópicos, o entendimento de que a Educação do Campo não condiz com a oferta somente da Educação Básica, mas se estende ao Ensino Superior (MUNARIM, 2008).

6Explicamos que o PROCAMPO está situado nas ações desenvolvidas pelo Governo e pelos movimentos sociais do campo que visam estabelecer a Política Nacional de Educação do Campo. Ele é parte do Eixo II, de um total de quatro, que aborda a “Formação Inicial e Continuada de Professores” do Programa Nacional de Educação do Campo (PRONACAMPO). Orientamos a leitura de Molina (2015) e de Santos e Silva (2016) para entendimento das propostas do PRONACAMPO.

7Secretaria de Ensino Superior (SESU), Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC), Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI).

8No instante de submissão das propostas, as instituições candidatas teriam de enviar, junto à documentação, um formulário preenchido com o aval dos conselhos e/ou órgãos representativos das instituições e assinado pelos reitores. Junto ao formulário, deveria seguir o Projeto Pedagógico de Curso que atendesse às prescrições dos Editais (BRASIL, 2012).

9Os objetivos mais gerais condizem à construção de um curso vinculado ao projeto de educação defendido pelos movimentos sociais do campo, o qual nem sempre foi compatível com as propostas formativas das Licenciaturas existentes na área educacional (CALDART, 2010).

10Vale ainda ressaltar que os procedimentos metodológicos desenvolvidos na pesquisa tiveram início no ano de 2017 e concluíram suas atividades no ano de 2020.

11Das duas instituições que dispuseram o Projeto Pedagógico de Curso, via e-mail, uma nos encaminhou um texto com as informações relativas à Graduação. O arquivo não condiz ao documento curricular, porém trata-se de um resumo expandido com 33 laudas oriundo do texto oficial. Nele, há notas a respeito de toda a proposta do currículo oficial da Licenciatura, o qual contemplou as necessidades da investigação.

12Consideramos o ano de 2010 com respaldo no que consta na base de dados do e-MEC. No documento que recebemos da coordenação de curso (resumo expandido do PPC), não consta o ano de implementação.

13Com exceção dos Cursos LEDOC/UFCG e LEDOC/IFRN, todas as Licenciaturas investigadas foram criadas por via do Edital SESU/SETEC/SECADI/MEC nº 2, de 31 de agosto de 2012. Esclarecemos que os Cursos LEDOC/UFCG e LEDOC/IFRN, até onde sabemos, foram implementados por iniciativas das próprias instituições ofertantes, a partir de demandas educacionais locais.

14Citamos a habilitação em Matemática porque o Curso oferta três habilitações (Matemática, Ciências Agrárias e Ciências da Natureza), e os núcleos referentes a elas possuem horas diferentes no documento recebido da coordenação do Curso. O Núcleo de Estudos Específicos, da habilitação em Matemática, é o que registra o maior número de horas com relação às outras habilitações.

15Informamos que, tal como fizemos no momento que organizamos os núcleos formativos curriculares no Quadro 1, nos cursos com mais de uma habilitação e que possuem o valor diferente de horas no núcleo específico, contabilizamos, nas matrizes curriculares, os núcleos específicos com o valor maior de horas. Por essa razão, algumas Licenciaturas estão destacadas na Figura 2 com o título da habilitação, já que consideramos o valor maior atestado no núcleo específico da habilitação.

16Esclarecemos que, ao organizarmos o número de horas para a formação pedagógico-educacional, não consideramos as horas destinadas ao Estágio Supervisionado nos cursos.

Referências

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Recebido: 21 de Dezembro de 2019; Revisado: 09 de Abril de 2020; Aceito: 10 de Abril de 2020; Publicado: 19 de Abril de 2020

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