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Práxis Educativa

versión impresa ISSN 1809-4031versión On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.15  Ponta Grossa  2020  Epub 02-Sep-2020

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.15.15481.077 

Artigos

Parar pandêmico: educação e vida

Pandemic break: education and life

Parar pandémico: educación y vida

Paola Zordan* 
http://orcid.org/0000-0002-8937-7706

Verônica Domingues Almeida** 
http://orcid.org/0000-0001-5232-3838

*Professora Associada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Doutora em Educação. E-mail: <paola.zordan@gmail.com>.

**Professora Adjunta da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Doutora em Educação. E-mail: <veedomingues@gmail.com>.


Resumo

Este ensaio debate a educação nos tempos da Covid-19 a partir da problematização do papel do Estado, do paradigma linguístico nos currículos e do conteudismo, diante da paragem e da suspensão de atividades presenciais. Discutem-se duas frentes a serem combatidas: a escolarização vinculada ao futuro e a produtividade conteudista que relega à formação. Multirreferencial, dialoga com Boaventura Souza Santos, Byung-Chul Han, Gilles Deleuze, Michel Foucault e outros para questionar os itinerários educativos nesse contexto. Com Friedrich Nietzsche, pensa-se uma educação vinculada ao presente e à vida. Formulam-se indagações sobre o governo dos corpos, o papel das instituições educacionais, as relações de poder nas políticas públicas e as reconfigurações educativas frente ao isolamento social. Em defesa da potencialização de processos formativos pautados em uma ética amorosa com o mundo, reivindica-se que as instituições educacionais se permitam pausas ativas na reinvenção dos percursos pedagógicos.

Palavras-chave: Conteudismo; Covid-19; Formação

Abstract

This essay debates education in Covid-19 times from the problematization of the role of the State, the linguistic paradigm in curricula and content due to the break and suspension of face-to-face activities. Two fronts to be fought are discussed: schooling linked to the future and content productivity that relegates education. Being multi-referencial, we have a dialog with Boaventura Souza Santos, Byung-Chul Han, Gilles Deleuze, Michel Foucault and others to question the educational itineraries in this context. With Friedrich Nietzsche, we think of an education linked to the present and to life. Questions are asked about the government of bodies, the role of educational institutions, power relations in public policies and educational reconfigurations in the face of social isolation. In defense of the potentialization of training processes based on a loving ethic with the world, it is demanded that educational institutions allow themselves active pauses in the reinvention of pedagogical paths.

Keywords: Contentism; Covid-19; Education

Resumen

Este ensayo debate la educación en los tiempos de Covid-19 a partir de la problematización del papel del Estado, del paradigma lingüístico en los currículos y del contenidismo, delante del cese y la suspensión de las actividades presenciales. Se discuten dos frentes a ser combatidos: la escolarización vinculada al futuro y la productividad contenidista que relega a la formación. Multirreferencial, dialoga con Boaventura Souza Santos, Byung-Chul Han, Gilles Deleuze, Michel Foucault y otros para cuestionar los itinerarios educativos en este contexto. Con Friedrich Nietzsche, se piensa en una educación vinculada al presente y a la vida. Se formulan indagaciones sobre el gobierno de los cuerpos, el papel de las instituciones educativas, las relaciones de poder en las políticas públicas y las reconfiguraciones educativas frente al aislamiento social. En defensa de la potencialización de procesos formativos pautados en una ética amorosa con el mundo, se reivindica que las instituciones educativas se permitan pausas activas en la reinvención de los recorridos pedagógicos.

Palabras clave: Contenidismo; Covid-19; Formación

Introdução

Eu sou adicionado a 1 grupo de “enfrentamento coronavírus” diferente por dia. O nível de estresse é ABSURDO!

Ontem deu um boom! Muitas baixas. A UTI está quase cheia e estamos começando a preparar para receber estes doentes ou com suspeita de... Comecei a trabalhar quinta de manhã e sexta, 14h, quando estava me arrumando para ir embora, a enfermeira bateu na porta do quarto “não estão conseguindo intubar um paciente”. Saí correndo quase com as calças caindo...O cara deveria ter <50 anos. Cheguei em casa num nível de exaustão físico e mental que comecei a chorar! [ícone de homem com mão no rosto]

Aí, naquele horário ali, já me preparando para dormir, fui abrir meus e-mails e tinha um e-mail do colégio dizendo que [nome da criança] não estava entregando as atividades há >de 1 semana, que eles estavam muito preocupados, e me dei conta que esqueci [menção aos filhos]...

me senti péssimo[ícone emoticon de tristeza]

O contexto imposto pela Covid-19 associada ao novo coronavírus (SARS-CoV2), cuja prevenção demanda o isolamento social e consequente supressão das atividades escolares e educativas regularmente presenciais, até o final do ano de 2020 , provoca questões urgentes em torno da finalidade da educação na contemporaneidade. Como professoras, pesquisadoras e mães, trazemos aqui alguns dilemas e situações vividas, as quais envolvem tanto os poderes aos quais estamos submissas quanto às escolhas que temos feito. Com Nietzsche, o presente ensaio torna-se amorfati no enfrentamento das dificuldades e das aprendizagens que a pandemia e suas decorrentes paradas nos apresentam.

Diferentemente de outras produções, o texto observa eventos acadêmicos e reuniões a distância, fóruns institucionais, grupos de amigos e família em aplicativos de mensagens, pedidos de socorro, in box, de outras mães, conversas com vizinhas isoladas, leituras, sites e outros veículos de manifestação individual e coletiva, descrevendo uma metodologia imprecisa de coleta de dados. A discussão aqui travada deu-se em nossas próprias casas, localizadas em regiões bem distintas do Brasil, e os fatores pensados dão-se via profusos diálogos ocorridos desde 16 de março de 2020, quando o isolamento social preventivo, por ordem de governos, suspendeu as aulas presenciais.

No esforço conjunto de pensar a educação brasileira em um horizonte comum entre universidades públicas do Nordeste e do Sul, trazemos nossas leituras e questões na tentativa de aproximarmos nossos desconfortos, conceitos e perspectivas, em um debate que venha contribuir ao ineditismo deste presente. Assim, a partir de uma postura multirreferencial (ARDOINO, 1998) foi realizada uma imensurável bricolagem (KINCHELOE; BERRY, 2007) de referências, notícias, observações empíricas, entrevistas, depoimentos de pais e de professores em redes sociais, abaixo-assinados e milhares de mensagens, entre as quais destacamos a de um pai médico, como epígrafe, a fim de compreender os efeitos da ainda prevalência de uma educação calcada nos conteúdos, advinda do paradigma linguístico com base teórica estruturalista.

São inúmeras as inquietações quanto aos percursos que a atividade educativa tem trilhado nesse momento: o papel das instituições educacionais, as políticas públicas, os relacionamentos domésticos e as articulações entre instituições, governos e profissionais. No seio de tais inquietações, levantamos alguns questionamentos, sendo o principal aquele que pensa de que modo concebemos a atividade educacional em seu vínculo com a vida. Diante desse problema, perguntamos: Como o processo de escolarização, em sua supressão dos corpos vivos e pulsantes, tem pensado a formação humana? O que é fundamental para essa formação quando a vida, no coletivo, está em risco? Que princípios nos regem, quando mantemos padrões pedagógicos hegemônicos em uma situação completamente distinta da comum? Por que nos parece aceitável que a educação seja pensada para o futuro? Formulamos amplas perguntas, cujo caráter não se esgota no presente ensaio, a fim de pensarmos o que a pandemia está formando e delinearmos itinerários da atividade educacional neste momento. Nesse contexto, podemos acompanhar três grandes temas para debate: as limitações e as acessibilidades do ensino a distância e suas implicações na compulsoriedade do homeschooling , a intensificação da aprendizagem informal, advinda da indústria do entretenimento e mídias eletrônicas , e, por fim, discussões em torno das bases epistemológicas da educação-ensino-aprendizagem, perante as quais, a partir de uma perspectiva biopolítica, desenvolvemos nossas considerações.

Com Boaventura de Souza Santos (2020, p. 10), compreendemos que os efeitos do novo coronavírus, em especial “o modo como for interpretado”, determinará “o futuro da civilização em que vivemos”. O vírus ameaça não apenas a economia mundial, mas especialmente o antropoceno, ou seja, a centralidade do humano no planeta. A natureza mostra ser a vida humana totalmente dispensável para sua plena existência e para a existência planetária. A propagação e a letalidade da Covid-19 obriga a humanidade a lidar de novas maneiras com a morte, mudar hábitos para evitar os perigos de contágio e, destarte os imperativos de consumo e o permanente assédio digital para que se permaneça comprando, há uma revisão de valores, ainda que ideais de progresso e desenvolvimento precisem, o tempo todo, ser enfatizados. Em face a essa catástrofe pandêmica, a educação, que deveria ser esteio para o controle dos contágios, para ampliação de atos solidários e para disseminação de princípios éticos em prol da vida, tem se evidenciado, ainda mais, como uma agente de alargamento do fosso de nossas relações com o mundo, incluindo aí a ampliação das desigualdades sociais.

Há um apelo, de várias frentes, para que não “paremos”, e esse chamado, que possui objetivos diversos, encontra maior intensidade no sentido que se refere à manutenção do ritmo de produção que nos subjetiva a ser peças de uma máquina, usando um termo arendtiano, como homo faber (ARENDT, 2010). Em um contexto mais atual e mais “velocizado” (SILVA, 2017), trata-se do “sujeito do desempenho” descrito por Byung-Chul Han a partir dos estudos de Michel Foucault diante da “aceleração do processo de produção capitalista” (HAN, 2017, p. 96). O que Marcio Tascheto, em sua tese, trata como o “velocizado” decorre das crises subjetivas da contemporaneidade, figuradas na crise da representação, nos abalos midiáticos, nos processos de endividamento e securitização (ZORDAN; SILVA, 2018), os quais, em conformidade com a situação pandêmica, especialmente no que tange à segurança, configuram sintomas que se intensificam.

Em relação à atividade educacional, a produção do “sujeito que concorre consigo mesmo” (HAN, 2017, p. 99) implica a continuidade dos padrões quantitativos, de proposições unilaterais e conteudistas de ensino e de aprendizagem. Para atender ao apelo de manter a máquina funcionando, andando e rendendo, houve um movimento frenético de diversas instituições educativas, em especial às de cunho privado, para migrar ações educacionais presenciais - acontecidas nas instituições - para atividades a distância - realizadas exclusivamente nos lares. Essa corrida por aulas on-line e atividades remotas gerou inúmeros impasses, não apenas quanto ao despreparo das famílias e dos estudantes ao homeschooling, mas, especialmente, quanto à relevância e à importância dadas aos conteúdos a serem aprendidos durante a pandemia.

Um estudo sobre a educação domiciliar, que enfatiza o papel sociabilizador das instituições educativas, tendo em vista que estas cumprem um importante papel de mediar as relações familiares com as complexidades das relações sociais, compreende que as resistências e críticas à escola estão implicadas na historicidade política da educação. “A lógica da escolarização é percebida como excludente, bem como o autoritarismo intrínseco às relações de poder que se inscrevem na escolarização” (VASCONCELOS; BOTO, 2020, p. 6). Anterior a imposição contingencial do homeschooling, esta ocorrida, principalmente, às famílias que têm filhos em instituições privadas, as pesquisas observam que “não é tranquila” a opção dos familiares fazerem o papel de educadores. Além disso, assumindo, também,

[...] que a educação tem um papel importante no processo de diminuição das desigualdades e desvantagens entre os estudantes, cabe ressaltar que, se por um lado as instituições repetidamente falham nesse intento, por outro, o homeschooling não somente é incapaz de resolvê-lo, mas destina-se a frustrá-lo. (BARBOSA, 2016, p. 160).

Em relação à educação pública brasileira, como uma parte considerável dos alunos não possui condições materiais de acompanhamento de aulas on-line, a maioria das redes de educação não se dedicou a pensar em estratégias de formação humana durante a pandemia e muitos desses estudantes foram colocados à margem de proposições pedagógicas nesse período. Esse cenário de exclusão social, via tecnologias digitais, denunciado desde as últimas décadas do século XX por inúmeros pesquisadores, como Guedes (1998), Teixeira e Brandão (2003), Almeida et al. (2005), Bonilla e Pretto (2011), expõe o abismo que a educação pública nacional se encontra diante do apelo à continuidade do processo educativo formal em uma situação de isolamento social. Assim, o modelo fabril discutido no século anterior por Arendt e seu caráter excludente no que diz respeito à educação contribui para que os estudantes sofram diversos tipos de violência. O exemplo mais notório é a manutenção do calendário do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM 2020, acompanhado do convite para que se reinventem; afinal, como apregoa o slogan do Ministério da Educação, “a vida não pode parar” . A vida, enquanto força inumana não para mesmo, porém a humanidade, para se precaver de possíveis dizimações provocadas por um vírus, precisar parar, diminuir seu ritmo, repensar o que forma a aceleração progressiva a que vem se submetendo.

No que tange ao Ensino Superior, vale destacar que “[...] as universidades públicas foram sujeitas à lógica do capitalismo universitário, com os rankings internacionais, a proletarização produtivista dos professores e a conversão dos estudantes em consumidores de serviços universitários” (SANTOS, 2020, p. 28). Sobre essa questão, Foucault, quando questionado sobre a vida acadêmica, no início dos anos 1980, fala da exclusão dos estudantes universitários da vida real (FOUCAULT, 2010).

O problema do sistema de isolamento, mencionado em outro contexto por Foucault, é que ele tira as forças do estudo e as dá para uma vida universitária de ritos iniciáticos (avaliações, bancas examinadoras) e teatralizações (colações de grau e outras pompas). Os estudantes, mesmo o proletariado que ele observava chegar à Universidade, são reabsorvidos socialmente no mercado de trabalho aptos a reproduzirem o modelo burguês de pequenas e inócuas conquistas, cuja vida universitária os faz, apesar de alguns momentos contestatórios, assimilar. Na medida em que garantem sujeitos aptos a manterem a sociedade, em todos seus aspectos, funcionando, as instituições educativas, até as últimas décadas do século XX, eram instituídas para propagar os aparelhos de Estado, o qual, por sua vez, passa a ser gerido pelo mercado global. Este se ocupa com formações de “funções públicas” endógenas e exógenas ao próprio aparelho estatal e seu “sistema de servidão maquínica” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.116). A questão de Foucault foi formulada perante à centralidade da formação (e da importância da formatura) a fim de se pensar, desde aquele contexto, a inoperância e/ou a inexistência da intensificação das relações sociais nos estudos, afetando todos os níveis de educação.

Em um panorama de hipercapital, no qual a educação é confrontada com uma “grande massa de informações” (HAN, 2018a, p. 95), uma formação para uma convivência social harmônica e para a preservação da natureza e saúde do planeta (ZORDAN, 2019) permanece ignorada. Especialmente nas redes privadas de ensino, um grande número de instituições tem cambaleado diante das adaptações aligeiradas do ensino presencial para atividades remotas, violentando, na urgência de que as atividades geradoras de rendas sejam mantidas, os alunos, suas famílias, assim como os professores. O imperativo de rendimento e a necessidade de manutenção do funcionamento econômico devem-se ao que Boaventura de Souza Santos observa ser a versão mais nociva e antissocial do capitalismo financeiro de alcance global, a que sujeita a sociedade “[...] sobretudo saúde, educação e segurança social - ao modelo de negócio do capital, ou seja, a áreas de investimento privado que devem ser geridas de modo a gerar o máximo lucro para os investidores” (SOUZA SANTOS, 2020, p. 24).

Assim, o que vemos e as informações que recebemos, enquanto pesquisadoras em isolamento, é que, na maior parte das escolas e universidades, são aulas desenvolvidas por vídeo conferência ou gravadas, encaminhamento de atividades do material didático do estudante, algumas outras atividades, que seguem os mesmos modelos pedagógicos, apesar de estarem dispostas em plataformas digitais, e, ainda, a realização de chats e fóruns para dúvidas. O estabelecimento de algum tipo de diálogo com os alunos e suas famílias não ocorre em todos os casos, tampouco as universidades que mantêm aulas a distância possuem espaços suficientes para debate e fóruns que não estejam restritos às disciplinas ministradas. Há casos em que os próprios estudantes se organizam em grupos fechados, os quais, pelo que podemos observar nas situações em nossas casas, servem para que esses jovens façam suas críticas, entre si, sobre os métodos e os conteúdos a que estão sujeitos. Algumas instituições apelam, ainda, para o uso da ideia de fortalecimento da autonomia e do protagonismo do estudante. Todavia, parecem não se questionar sobre o que propõem, já que todo esse aparato tecnológico é utilizado mantendo os princípios do padrão hegemônico da educação transmissora de conteúdos . Esse conteudismo é fortalecido, ainda, pela tentativa de homogeneização dos processos de aprendizagem e pela unilateralidade das proposições, já que ficam notáveis a lógica da transmissão do conhecimento, a supressão dos aspectos pedagógicos relacionais, incluindo questões psicoemocionais, e a evidência da aquisição do conteúdo acumulativo e informativo, em detrimento da construção de saberes e da ampliação das relações que fazemos com esses conteúdos, o que tornaria possível, também, ampliar atos solidários, disseminar princípios éticos e refletir sobre a humanidade.

Parece haver um acordo velado que contraria Edgar Morin, referindo-se a Montaigne, na sua obra A cabeça bem-feita:

[...] o significado de ‘uma cabeça bem cheia’ é óbvio: é uma cabeça onde o saber é acumulado, empilhado, e não dispõe de um princípio de seleção e organização que lhe dê sentido. ‘Uma cabeça bem-feita’ significa que, em vez de acumular o saber, é mais importante dispor ao mesmo tempo de: - uma aptidão geral para colocar e tratar os problemas; - princípios organizadores que permitam ligar os saberes e lhes dar sentido. (MORIN, 2003, p. 21).

Assim, mesmo com a vida ameaçada, não há pudores na confirmação de que vale mais uma cabeça bem cheia do que uma cabeça bem-feita. É válido apontar, ainda, que, nesse acordo, uma questão parece não estar sendo considerada, a que se refere às atividades remotas, da forma como estão sendo propostas, não ofertarem nenhum tipo de garantia de que os conteúdos transmitidos estão “enchendo” as cabeças. Diante a esse quadro,

[...] teremos de imaginar soluções democráticas assentes na democracia participativa ao nível dos bairros e das comunidades e na educação cívica orientada para a solidariedade e cooperação, e não para o empreendedorismo e competitividade a todo o custo. (SANTOS, 2020, p. 6-7).

Isso nos leva a fazer outras indagações, na qualidade de sociedade, sobre quais aprendizagens subjetivas, entrelaçadas ao consumo de material internético não institucionalizado, os estudantes estão fazendo diante desse contexto. Interessa saber como todos, famílias, professores, estudantes, estão se sentindo? Estamos operando nas vias da formatação, “informação”, deformação ou da formação humana, em sua complexidade? A que a escola, parada sem parar, está servindo? Por que, de um modo geral, consideramos que pausas na produtividade impactariam negativamente no futuro? Quando é o futuro? É agora? E agora? Agora? Agora...? Agora já é o futuro? Em outras palavras, que recados estamos dando como humanidade?

Frente ao que Giorgio Agambem (2020) começou por definir como “estado de exceção” gerado pela Covid-19, em menos de um mês de sua propagação mundial, pensadores contemporâneos como Slavoj Zizek, Jean Luc Nancy, Judith Butler, Alain Badiou, David Harvey, Raúl Zibechi, María Galindo e Paul B. Preciado , entre outros, dos quais destacamos o coreano radicado na Alemanha, Byung-Chul Han, discutem a economia, a política, o assujeitamento dos corpos e a espetacularização da doença, escrevendo o quanto não há mais distinção entre as infecções reais, as físicas e as eletrônicas. No livro No enxame: perspectivas do digital, Han (2018b) alerta quanto aos ruídos, não sem consequências econômicas, presentes no caráter desrespeitoso e difamatório das relações e notícias internéticas. Contudo, mesmo sendo a educação, perante o imperativo de isolamento social, confinada a meios eletrônicos, seus problemas pouco são debatidos. Há uma concordância tácita, entre cientistas e intelectuais, de que somente pela educação é possível que uma nova ética se estabeleça e potencialize a reconstrução do respeito ao planeta, a fim de que novos modos de relação entre os seres humanos entre si e com a natureza passem a predominar.

No entanto, o embate biopolítico é exaurido na própria subjetividade daquele que preconiza valores outros que não os do lucro e do consumo exacerbado. Observa-se que é global a não aceitação da ciência como um saber aberto, como campo de observações, que, antes de qualquer afirmação, se pergunta, abrindo questões que nem sempre encontram respostas. A experimentação científica se dá via buscas incertas, sem verdades imediatas, contrária à ânsia por segurança, que se calca em opiniões e notícias cujos fundamentos muitas vezes são falsos. Assim, toda essa lastimável situação que a espécie humana está submetida diante de um vírus, o qual Byung-Chul Han (2020, p. 97) observa estar “pondo a prova nosso sistema”, deveria servir para buscarmos alternativas de virar chaves paradigmáticas e promover rupturas com modelos de educação enrijecidos, homogeneizantes, monocromáticos, monotemáticos e monológicos. A pesquisa e a produção intelectual, com bases científicas e filosóficas, vêm problematizar o senso comum, a opinião sem fundamentação, o excesso de informações, possibilita precipitações educativas maleáveis. Trata-se de um saber epistêmico, que desconstrói verdades pré-concebidas afirmando a heterogeneidade, a pluralidade, a dialogicidade, a policromia e a polilogia de processos formativos.

Potencializar percursos formativos abertos contraria as concepções de formação baseadas no pressuposto metafísico de um sujeito que deve ser educado em vista de uma finalidade, por exemplo, cidadão, ser humano crítico e ativo, trabalhador inserido no mercado de trabalho e tantos outros papéis. Geralmente, tais concepções são filiadas a processos que modelam e capacitam sujeitos de acordo com padrões exógenos, fundados em tentativas de homogeneização das singularidades, a partir da disciplina dos corpos e dos conhecimentos, para que atinjam uma dada meta, ou seja, agem como uma espécie de “informação”, pois são ligados às ideias de modelo, uniformidade e futuro. Nesse paradigma, a formação tendo como pressuposto básico

[...] um determinado conceito de pessoa ou ser humano traz consigo a tentativa de se justificar permanentemente um ‘fundamento’ a partir do qual se deriva (e para o qual se volta) a ação educativa calcada em ‘metas’ e ‘fins’ educacionais. Atingir, pois, o ideal humano de pessoa seria ‘cumprir’ os desafios propostos em relação aos fins da educação. (CALLONI, 2000, p. 1-2).

A partir de Nietzsche e da frase inspirada em Píndaro, “como alguém se torna o que é”, que dá o subtítulo da obra Ecce Homo (NIETZSCHE, 1985), compreendemos formação a partir da noção, anti-metafísica, de imanência, de devir. O devir não está ligado a um imperativo que sugere uma meta a ser alcançada ou um estágio final a ser atingido, mas implica precipitação, imprevisibilidade e acontecimento, em continuum de vida. “O chegar a ser o que se é pressupõe não suspeitar nem de longe o que se é. A partir desse ponto de vista, tem seu sentido e valor próprios, inclusive, os desacertos da vida, os caminhos momentâneos secundários [...]” (NIETZSCHE, 1985, p. 27). Amar aquilo que somos obrigados a viver, independentemente do que escolhemos viver, sem trair o que nos tornamos e o que nos forma a cada experiência enquanto forças a devir: amorfati. Desse modo, o imponderável dos acontecimentos, as contingências como a pandemia, não interrompem a formação; do contrário, são a própria formação. Nessa linha, Jorge Larossa (2005, p. 49) reescreve a célebre frase como “um emblema da ideia de formação”, nos convidando a fazer o enfrentamento de algo mais amplo, a bildung. Esse termo alemão, que possui múltiplos significados, quando traduzido como formação, exprime, na leitura de Larossa, “[...] a ideia que subjaz ao relato do processo temporal pelo qual um indivíduo singular alcança sua própria forma, constitui sua própria identidade, configura sua particular humanidade ou definitivamente, converte-se no que é” (LARROSA, 2005, p. 52).

Assim, formar-se, tornar-se o que se é, empreende construir-se no fluxo da vida, pois

[...] ninguém pode construir no teu lugar a ponte que te seria preciso tu mesmo transpor no fluxo da vida - ninguém, exceto tu. Certamente, existem as veredas e as pontes e os semideuses inumeráveis que se oferecerão para te levar para o outro lado do rio, mas somente na medida em que te vendesses inteiramente: tu te colocarias como penhor e te perderias. Há no mundo um único caminho sobre o qual ninguém, exceto tu, poderia trilhar. Para onde leva ele? Não perguntes nada, deves seguir este caminho. (NIETZCHE, 2003, p. 140-141).

Nesse percurso, o inventivo faz-se potente já que “[...] isso que somos e que temos de chegar a ser está claramente do lado a invenção. O homem é um animal de invenção, e as diferentes formas de consciência não são senão produtos dessa função inventiva, dessa capacidade de invenção” (LAROSSA, 2005, p. 45). O tornar-se, como formação, não se restringe, portanto, aos elementos exógenos que impregnam os discursos pedagógicos e que, focados no que formar para o futuro, perdem de vista a dimensão singular de como nos formamos no eterno presente. Essa concepção incorpora uma forma discursiva outra, de abertura aos corpos, como singularidade criativa de si, como possibilidade contínua de se reinterpretar, se reinventar e de diferir de si mesmo, pela forma como compreendemos as experiências, como engendramos a diferença e nos alteramos perante as contingências. Assim, a formação, bildung, é contínua e incessante, não definindo um ponto de chegada, mas tendo como horizonte o percurso em si mesmo. Dessa maneira, os questionamentos aqui feitos (e ainda outros que podem ser desdobrados destes) são necessários para vincular a educação à vida, mas não uma vida na qual os seres humanos se aproximam pelo controle biopolítico daquilo que desempenham e pelas finalidades sociais exógenas, mas, sim, uma vida aberta à invenção, que os tornam mais próximos pelo que significam no coletivo, uns para os outros, no mundo; afinal, a vida, em seu sentido radical, em seu “fluxo desejante” (DELEUZE; GUATTARI, 2004), não pode parar.

Com grandes efeitos nos pensadores de Sopa de Wuhan, o trabalho conjunto de Deleuze e Guattari, juntamente às investigações de Michel Foucault, partem do legado de Nietzsche em defesa de uma vida não morta, uma vida que, mesmo na doença, não se subsuma aos valores caquéticos de uma civilização que somente deseja aquilo que os fluxos de capital impõem. Trata-se de pensar a vida e como, pela educação, esta vem a ser governada, especialmente perante a operância, ainda que tardia, do paradigma linguístico nos currículos e a decorrência disso no conteudismo dos processos de ensino e de aprendizagem. Isso em um contexto no qual opera um outro tipo de biopoder (FOUCAULT, 1997), não mais subjugado ao Estado, mas, sim, perdido na desintegração homogênea do enxame veloz e proliferante, no qual se projeta um humano rentável e tecnológico. Tal projeto de ser humano, calcado na pressa produtivista, é colocado em xeque pelo vírus. Ameaça intrínseca aos corpos e ao próprio sistema produtivo, a Covid-19 exige uma parada estratégica para que o atendimento das suas complicações seja logisticamente administrado. Se as palavras de ordem são “parar”, estacando ao máximo a mobilidade urbana e “ficar em casa”, a fim de se evitar a contaminação e a propagação do vírus, precisamos ter em conta o papel do Estado e seus comandos sobre os corpos.

Face à imposição dos corpos ao isolamento social e as atividades remotas de algumas instituições de ensino, dentro de um Estado destroçado pelo capital financeiro, precisamos considerar que, historicamente, a aparelhagem estatal distribui cargos, poderes e rendimentos. Seja uma organização coesa e fortificada, como outrora foi, seja uma estrutura mais difusa, compartimentada por órgãos distintos e poderes específicos, o poder circulante em um Estado sempre é exercido por pessoas. Vidas, as quais se fazem valer de leis, de regras e de princípios, os quais o Estado, independentemente de seu regime, garante o funcionamento, mesmo que esse modo de existência faça das pessoas peças de um complexo maquinário produtivo. Os estudos foucaultianos demonstram tal paradoxo, ao mostrar como o poder, que circula em qualquer tipo de governo, se exerce justo naqueles que se constituem no próprio poder a que estão sujeitos. Em tempos antigos, o poder tinha a possibilidade de ser situado em um governante, protegido por sua fortificação e seu templo, os quais figuram o imperar sobre o maior número de forças. Esse poder também foi visto no professor de antanho, soberano em uma sala de aula. Hoje, mesmo sem uma personificação, imparcializado e atenuado em um aparelho jurídico, o poder personificado, que em tempos antigos estruturava os liames sociais, o rei jurista, capaz de inventar “um direito” e ainda impor “uma disciplina, subordinada a fins políticos” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 112), se perde na arbitrariedade da própria lei. Há muito, este antigo exercício de poder foi sendo diluído, gradativamente, em forças midiáticas não localizadas, cuja jurisprudência, a qual condena e absolve sem tribunais, subjuga vidas e corpos a imperativos inegociáveis.

Na situação da pandemia, entretanto, os governos, de modo global, destarte raras contradições tais como as confusões discursivas atualmente presenciadas no Brasil, reassumem a necessidade de emissão de comandos a fim de salvar vidas. Perante a precarização dos serviços públicos e a demonização do poder identificado ao Estado, cujos agentes são tomados como ineficientes, idiotas ou corruptos predadores, assistimos a uma ruptura do ritmo mercadológico habitual. Intervenções governamentais, providências emergenciais de víveres e infraestrutura de combate à doença, passam a ser mundialmente exigidas. Entretanto, a degradação das políticas sociais advinda do neoliberalismo sobrepujante, que provocou a privatização ou a falta de verba que leva ao subfinanciamento dos serviços públicos, especialmente no Brasil, permite poucas ações estatais. Deflagrada, agora, uma imensa demanda do âmbito da Saúde, observa-se o quão pouco grandes corporações empresarias, a iniciativa privada e os detendores do Mercado financeiro agem em prol da população. A importância do poder público faz-se latente.

Ao pensarmos a Educação, esse contexto leva-nos a mais uma indagação: Qual o papel do governo dos corpos no combate à conteudização apartada da vida e do presente? O projeto educacional moderno foi constituído em torno dos projetos de governo das Nações Estado republicanas, como atesta a produção dos estudos foucaultianos no campo da Educação (AQUINO, 2013). Tais estudos demonstram que pouca ou nenhuma ênfase é dada aos saberes ligados ao corpo, esse informe assujeitado, vigiado e punido, que define os devires da população. Assim, como pensar, dentro desta parada, estratégica e problemática, um deslocamento, vital e necessário, da centralidade dos códigos e linguagens sobre os quais se pautam as bases educacionais? Como rever as abolições do corpo, historicamente amalgamadas nas práticas educacionais, no quadro de conteudização remota observado durante a pandemia?

As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (BRASIL, 2013) estão centradas em questões de cunho social, transdisciplinar e interdisciplinar, sem definir áreas e subáreas de conhecimento, mas, sim, campos, como a educação no campo, indígena, quilombola, educação de jovens e adultos, e instâncias para a ação educativa. Essa ligação, indissolúvel destarte a mudança de governos, parece forte em função das escolhas e da pouca delimitação dos referenciais curriculares, ainda que, com a publicação da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), de cunho aplicacionista, seja definida sobre habilidades e competências cujos conteúdos privilegiam a aquisição de códigos e linguagens. Na prática e nas diretrizes regionais, há uma insistência discursiva, que tende a se estratificar em uma ou outra redação de política pública; contudo, ainda temos estratificações históricas que determinam escolhas e divisões curriculares, especialmente nos grandes exames, como o ENEM.

A compreensão, raramente fundamentada teoricamente, das áreas de conhecimento como “linguagem”, deixam o corpo e suas afecções, como algo menor, quando não sequer algo existente, dentro dos currículos e dos conteúdos programáticos. O corpo, em sua imanência, ao ser tratado como “linguagem”, independentemente da teoria adotada para se contextualizar, o que pode ser a linguagem, não é mero conteúdo. E o que vem a ser uma linguagem, afinal? Podemos presumir, simplificadamente, que toda e qualquer linguagem demanda codificações, ou seja, não há linguagem fora da ação de codificar e decodificar. Não vamos listar aqui todos os tipos de códigos que as linguagens pressupõem, mas, sim, a partir dessa síntese, perguntar: O corpo, seus gestos, seus movimentos, suas emoções, pode ser codificado? Certamente, o corpo sofre codificações, sobre o corpo muitos códigos são inscritos, transcritos, escritos, mas há um código específico que possa dar conta de tudo o que perpassa, expressa e forma um corpo, suas doenças, suas emoções? Isso tudo permeia como formamos nossas percepções, jamais descoladas dos corpos. Seja em termos táteis e hápticos (a percepção do tato frente ao espaço), visuais, sonoros, gustativos, olfativos, a percepção material constitui vital estímulo ao pensamento, porém nem sempre podemos dizer que o que se pensa configura algo codificável, ou seja, algo instituído dentro de uma convenção a ser apreendida e posteriormente reconhecida. Mesmo assim, há quem diga que não há percepção que não seja codificada, porém tal acepção implica uma perspectiva estruturalista e linguística em relação ao pensamento, conceituando seu plano noológico, quer dizer, o modo como o pensamento se forma, em termos de linguagem. Isto foi uma tendência muito forte no século passado: compreender o mundo e até a própria psique em termos de linguagem, criando no senso comum a crença de que tudo na existência se forma via “leitura”, isto é, de decodificação.

Entretanto, um estudo mais profundo de Lacan (1998), cujas aulas permitiram a acepção de um inconsciente como “linguagem” ou mesmo na semiologia de Roland Barthes (1964), um dos autores linguageiros mais lido pelo mundo, coloca-nos em um limite em relação ao que pode uma linguagem. Nesse limiar, a teoria estruturada chega em elementos que nem sempre se estruturam. Trata-se de forças inauditas, impossíveis de serem codificadas e, consequentemente, comunicadas. Para linguistas como Hjelmslev (2003), nem todas as formas de expressão apresentam conteúdos que podem ser circunscritos em códigos. Há uma diferença substancial entre percepções codificáveis e percepções para as quais não encontramos uma forma de expressão instituída ou preescrita dentro de alguma estrutura que detenha significações e designações convencionais. Muitas das sensações não conseguem ser traduzidas por palavras ou mesmo por convenções não verbais. Somente na Paidéia, conforme os estudos de Werner Jaeger (2001), podemos encontrar uma só educação em que códigos, percepções e corpo em movimento estão interligados, tendo em vista que Gramática, Música e Ginástica eram espaços disciplinares distintos integrados na formação do cidadão grego.

Entretanto, a concepção de “linguagem”, típica de abstrações do mundo industrializado que começa a se informatizar, em nada converge às práticas educacionais dos antigos. Também é importante observar que, no império de Alexandre, essa formação já se modifica, expandindo-se a outros saberes, porém o uso dos números e das formas aprendido com as culturas orientais expande a educação helenística para códigos que vão para além dos das notações musicais e os da Gramática. E, hoje, assim como para a cultura romana, que veio logo após a cultura Alexandrina, criticada por Nietzsche em razão de privilegiar conhecimentos metafísicos e abandonar o corpo, a educação abrange muitos outros conhecimentos, os quais, via classificações enciclopedistas e taxonomias científicas, definem áreas de conhecimento com subdivisões próprias. Interpretar e decodificar aquilo que, por ser inaudito, dificilmente fechado, sem posição fixa, é traduzir o que, por não caber em códigos prescritos, poderia se tornar revolucionário. O corpo faz revoluções micropolíticas muito mais efetivas, em termos subjetivos, do que as guerrilhas militantes, as oposições bélicas e outras manifestações majoritárias que recorrem aos grandes dualismos. Em tempos pandêmicos, o frenesi pela continuidade de padrões produtivos subjetiva corpos em isolamento e subjuga o saber desses corpos em contéudos codificados. Isso provoca uma espécie de despontencialização política de suas forças mais transgressoras, visto que pode trazer aquilo que não pode ser convencionalizado e instituído. Nada é mais revolucionário que o corpo, ignorar suas forças é garantir o controle biopolítico da população. O capitalismo exige agentes produtivos e massa de consumidores, não corpos singulares movidos por uma ética relacional formada entre forças naturais e respeito humano.

A educação ética-estética preconizada, sem delongas e análises, pelos pensadores contemporâneos (seja os que encontramos na Sopa de Wuhan e outros intelectuais que são lidos em grandes veículos de comunicação durante a pandemia), não discutem o suficientemente as questões educacionais, especialmente às ligadas aos problemas da formação, implicadas nos problemas biopolíticos que o presente contexto traz. O panorama geofilosófico, pelo qual tais autores transitam, omitem a “pedagogia do conceito” de Deleuze e Guattari (1992), a qual pressupõe que os conceitos, como criações nunca fechadas de planos de pensamento em devir, podem ser ensinados, sendo os conceitos não termos dogmáticos e indecifráveis, mas criações do pensamento que permitem o enfrentamento do caos, da violência e da crueldade. Essa pedagogia não é reflexiva, tampouco contemplativa, não se projeta para o futuro, mas, sim, pensa pragmaticamente, em ação, o que acontece a cada instante vivido.

Concebendo a aprendizagem como decifração nunca desligada do corpo, ainda que permeada por mistérios, Deleuze demonstra que não há, destarte todas as teorias cognitivas, saber plenamente como e por que alguém aprende, mas, sim, como figuras, tipos ou personagens dos quais qualquer um pode se acercar. Misturando conceitos de diferentes àreas de conhecimento, como rizoma (biologia), estrato (geologia), ponto cinza (artes visuais) aponta, afirmando a transversalidade dos saberes, para o que pode ser pensado, como elemento do “fora”, como algo novo. Para tanto, é preciso combater a opinião, doxa, que, em vez de instigar o pensamento a todas as perspectivas possíveis acerca de um problema, é um dito apegado a um só ponto de vista e a uma forma única de se pensar, muitas vezes formando preconceitos. Combatido pela epistemologia, o discurso opiniático insiste nos dogmas que julgam o que é uma boa produção, sem analisar as formas de dominação a que se submetem os juízos. Por isso, não podemos ignorar que há uma imensa colonização linguajeira nos conteúdos, junto aos quais taxações de bom, certo, direito, são impostas sem que a maior parte das pessoas perceba.

Discutir o imperativo que enquadra o conhecimento em ortodoxias classificativas é combater o afunilamento dos espaços institucionais digitalizados que a pandemia delega aos processos formativos. Se, pelo menos em crença, os conteúdos estão sendo transmitidos via plataforma digitais ou teleaulas, obrigamo-nos a clamar pelos que ficam à margem dos aparatos cibernéticos. Por que os que têm acesso a tais dispositivos tecnológicos serão recompensados e receberão mais recursos? Como criar espaços de efetiva aprendizagem, espaços outros que não estejam insistindo na transmissão, aquisição e reprodução de conteúdos? O que acontece nos corpos que sentem, sofrem isolados em suas casas, nas bordas invisíveis das aulas eletrônicas que insistem no cômputo de horas?

“A digitalização elimina a realidade” (HAN, 2020, p. 108-109), observa o pensador que, embora entenda que o medo seja um sintoma da fragilidade dos mercados financeiros, insiste que as desigualdades esquizofrênicas do capitalismo não serão extintas pelas crises deflagradas pelo novo coronavírus. Patrícia Manrique (2020) observa que as questões biopolíticas se tornaram completamente visíveis perante às questões levantadas pela pandemia; as desigualdades, os rechaços, quem é o outro, quem é o estranho, implicam constantes decisões acerca de quem somos, das nossas identidades “[...] e quem formamos como parte deste nós, que agora temos que defender do vírus” (MANRIQUE, 2020, p. 159). Ainda não inventaram uma opinião (aliás, opinião não se inventa, apenas se propaga) que aplaque as durezas da vida, que acabe com o tédio, atenue o estresse do constante assujeitamento burocrático, dissipe a tristeza, diminua a insuficiência das porcarias ingeridas e termine com a vergonha pelo extermínio justificado.

Herdeira das ilusões metafísicas, a comunicação mercadológica descarta a matéria com muita facilidade, de modo que cria muitos e muitos despojos, poluição visual e atulhamento de informações. Estimula a produção de artefatos que, nem bem são usados, já viraram restos para alimentar o lixão. Todavia, uma pedagogia dos conceitos, mesmo que exerça a crítica das opiniões e a resistência aos focos descentrados do poder, não se ocupa com o que urge nas malhas da sociedade de controle e da onipresença massiva dos aparelhos telemóveis e computadores. Problematizar as “submissões” constantes a que estamos sujeitos, enquanto educadores e educandos, não significa deixar de se submeter; afinal, o poder funciona como uma linha sinuosa, cujas forças biopolíticas, ainda que funcionando dentro de uma estranha lógica de submissão constante, constituem a única possibilidade de resistência.

Assim, em tempos de pandemia, esta ética, concebida na educação como vida, obriga-nos, também, a encarar acontecimentos que, em outros momentos, não caberiam no contexto das pesquisas em educação, tampouco poderiam ser mencionados em um só ensaio. As constantes falhas nas conexões eletrônicas e a falta de equipamentos adequados para as tarefas remotas, fato observado mesmo em lares de classe média, é um dos pontos que chama atenção. A replicação infinita das, quase sempre, mesmas mensagens, das notícias em torno dos escândalos do Executivo e da situação política do Brasil, frente a qual só cabe ao cidadão, trancafiado em casa protestar, mais uma vez, das varandas e das janelas. Contingências que implica seguirmos, enquanto pesquisadoras mulheres, discutindo o trabalho doméstico, encarando a multiplicação da louça suja na pia da cozinha, tendo de criar estratégias de colaboração com filhos e de atenção e cuidados específicos com os idosos.

Estar em casa faz com que haja menos roupa a ser lavada, mas o exercício de paciência cotidiana faz com que a educação tenha de ocupar-se de outras mínimas questões. Nos meses de pandemia, há de abrir-se espaço para escutas: das dificuldades que as famílias vêm tendo ao ter de lidar com crianças e adolescentes que, confinados, muitas vezes se comportam de modo hostil; das mulheres que enfrentam o aumento da violência dos homens sobre elas, fornecendo dados para pesquisas de gênero; dos idosos que, cada vez mais privados de sua autonomia, sucubem diante do desprezo de uma sociedade que não os reconhece em sua cidadania. Tópicos que outrora não pertenciam ao rol de temas evidenciados nas pautas educacionais, tais como a harmonia ambiental das casas, o intensivo valor do espaço, as alegrias de se estar com plantas e animais por maior tempo, o valor inestimável de uma sacada ou de um quintal, “gritam para serem escutados” e figurarem debates nesse campo.

Dando um outro sentido ao apelo de que não “paremos”, seguimos na direção contrária à pedagogia do isolamento, que subjetiva corpos a partir de uma geografia que os coisifica como meros receptores de conteúdos disparados digitalmente, a fim de que não parem de produzir alicerces para o futuro. Pensamos em uma educação no presente e para o presente e no convívio educacional, mesmo em isolamento, como formação; não uma educação para uma vida futura, mas na própria vida-vivente. É nesse sentido que reivindicamos paragens em devir, que nos permitam o repouso necessário para navegar na criação. Desse modo, tais pausas não significam que as instituições educacionais devam se manter isoladas e apáticas durante a pandemia, mas que devam buscar nas experiências cotidianas miúdas, nas fissuras e nas brechas da convivência, em que a louça, os panos e as tarefas estão contidas, processos formativos.

Nas micro-ousadias da invenção, em tempos de isolamento, podemos encontrar meios de pausarmos a negação, a exclusão e a “informação” representadas pelo fetiche do padrão conteudista, homogeneizador e reprodutivista da produtividade. Reclamamos paragens para nos revisitarmos e nos questionarmos sobre os itinerários que a atividade educacional está seguindo, especialmente, nesse momento. Paragens para inventar novas vivências pedagógicas. Paragens para vermos as cores vivas de conceitos que o famigerado fluxo do conteudismo faz esmaecer. Paragens para dar evidência a uma educação esteada nos múltiplos saberes das relações com o mundo, com o outro e consigo mesmo. Que trabalhe com a problematização, estabeleça a dúvida e desejos não colonizados, que crie arte, que nos permita filosofar e que construa portfólios solidários, como testemunhos das viradas dessa passagem.

Paragens para potencializar uma educação que favoreça o nosso sentirpensar em torno de questões contemporâneas fundamentais para uma formação humana que viva uma ética amorosa com o mundo. Essa ética não está fundada em dogmas religiosos que pregam o amor como caminho para salvação após a morte. Tampouco, amparada na lógica do Positivismo, que impõe um domínio racional sobre o amor, o colocando em um patamar estático, já que visa a deixar para posteridade o crivo da verdade científica moderna, criando uma doutrina de salvação no plano terrestre. Também, não se apresenta como a moral e seus desdobramentos, o direito e a polidez (COMTE-SPOMVILLE, 2011).

Tais ideários tendem a colocar o amor “[...] sob a égide da servidão e da restrição dos impulsos, seja em prol da eternidade ou do progresso” (ALMEIDA, 2017, p. 243) e podem, portanto, servir como meios de controle dos corpos por se manifestar como obediência às ordens divinas ou aos padrões morais e aos interesses impostos, socialmente. A ética que nos referimos é imanada na mundanidade do amor (ARENDTH, 1998) que, como sentimento primaz do humano (MATURANA, 1998), diante das tentativas de “insignificação” da vida, se pauta na intensificação das forças vitais, emitindo uma preocupação quanto às causas coletivas de um convívio solidário contínuo entre as pessoas e entre estas e o planeta. Uma ética amorosa que desloca os sentidos da vida, para os sentidos na vida, já que:

Tal sentimento, é condição preponderante na compreensão dos seres humanos como subjetivados e criadores de histórias, o que denota a possibilidade de constante criação e recriação de sentidos ao mundo. É neste prisma, que o ato amoroso se constitui, favorecendo que o ser humano se associe aos outros, através de suas atividades, distanciando-se de se assemelhar, estritamente, pelo que consome e concebendo-se como plural. Neste mote, não se prioriza a individualidade em detrimento da coletividade, ao contrário, é neste espaço da ação amorosa, que a criação surge na esfera coletiva, propiciando ações políticas e instituindo, portanto, o íntimo e o privado como âmbito do público. (ALMEIDA, 2017, p. 244).

A efetiva relatividade do tempo, que surgia como pauta filosófica, algumas vezes aplicada ao planejamento educacional e à didática, agora ganha outras dimensões. Pesquisas da área de Educação e Saúde devem estar buscando dados para atestar a imensa necessidade de profissionais implicados com a vida. Pesquisas no campo das Artes devem estar se encaminhando para mostrar o quanto a arte salva os piores momentos de tédio, ainda que, em nosso país, haja risco real de artistas morrerem de fome, sendo o número de perdas de artistas uma notícia triste a cada dia. Seguimos com a esperança de que a essencialidade do poder público tenha, em termos mundiais, sido sentida. Embora Byung-Chul Han (2020) questione esse fato, podemos observar a falência de um modelo ecônomico, produtor de subjetividades consumistas . O antropeceno está falindo. Não importando o quanto a humanidade se ache importante, sente-se que ser consumido pela natureza é o destino da vida individual. Amorfati.

O vírus, com sua imensa carga de indecifração, evidencia todos esses acontecimentos e paradoxos. Ninguém sabe ao certo como se contamina, qual a sua evolução em cada corpo, o tempo de cura ou os fatores que levam os corpos, mesmo sem comorbidades, ao óbito. Não há regras, ainda que quase não sejam computadas mortes, ao menos no Brasil, nos hospitais cuja prática médica ocorra em padrões de excelência técnica e científica. Ninguém encontrará, com precisão, as razões de uma doença. A doença de um Estado controlador de corpos, que tenta nos subjetivar em fôrmas de obediência. A doença educacional do paradigma linguístico nos currículos, que fragmenta os itinerários formativos. A doença do produtivismo que, por não permitir paragens, impõe um modelo de educação violentador, o qual tenta homogeneizar os processos formativos, sem modificar bases epistemológicas, por via digital. A doença do conteudismo que, desconsiderando o devir da formação, contraria a vida ativa (ARENDT, 2010) e impõe uma vida contemplativa. A doença de não amarmos nosso destino. A doença da esperança desesperada. Em todos os âmbitos, observamos uma subjetividade doentia na falta de lógica da gravidade da doença, bem como na sanha do continuísmo producente. Somente intubadas, febris, poderemos parar? Esperamos que não. Por isso, ainda esperançamos que, com a rebeldia de paragens formativas amorosas com o mundo, após a pandemia, tenhamos menos slogans “a vida não pode parar” e mais pedagogias da vida, que, em sua força pulsante, não contabilizada, não pode parar.

1 Essas palavras, sintomáticas aos pontos debatidos no presente ensaio, foram enviadas em grupo de aplicativo de mensagens, em 18 de maio de 2020, sendo a exaustão profissional e o problema do excesso de trabalho escolar um ponto corrente entre diversos integrantes. O presente texto, que pensa questões emergenciais, desenvolve-se independente de nossos projetos de pesquisa em andamento, portanto não objetiva analisar a mensagem, tampouco a realidade do emissor. Enviada via relações pessoais de uma das pesquisadoras, a mensagem reproduz-se com assentimento e total omissão de identidade, tanto do indivíduo como do grupo em que foi emitida.

2 A Portaria No 544, de 16 de junho de 2020, autoriza até 31 de dezembro do corrente ano, a suspensão de atividades presenciais para o Ensino Superior, em caráter excepcional, afirmando o que hoje se configura como Ensino Remoto Emergencial ou Ensino Emergencial Remoto (BRASIL, 2020). Quanto à Educação Básica, apesar de diversas redes de Educação, juntamente aos Conselhos Municipais e Estaduais, iniciarem um movimento de articulação para discutir o retorno das atividades educativas presenciais, ainda não há uma previsão para a volta dessas atividades.

3 Quanto a esse debate, o qual não nos adentraremos profundamente no presente texto, ainda que seja necessário referendá-lo, sugere-se conferir a breve discussão feita pelos pesquisadores Crediné Menezes, Daniel Lopes, Mariangela Ziede e Rosane Aragón (2020) - Sobre a docência e o ensino universitário a distância em tempos de pandemia, disponível em: https://www.ufrgs.br/faced/wp-content/uploads/2020/04/EAD.pdf. Acesso em: 20 maio 2020.

4 No campo da Educação, nos últimos 25 anos, especialmente no âmbito dos Estudos Culturais, abundam pesquisas que tratam dos efeitos da indústria do entretenimento na formação de subjetividades. Seguindo autores como Joe Kincheloe, Peter McLaren, entre outros, foram consideradas “pedagogias culturais”, expressão de Shirley Steinberg, a qual traduz esse rol de análises em torno do que a cultura, especialmente via ícones e narrativas amplamente consumidas em filmes e produtos infantis, educa, constituindo o que pode ser chamado de “ensino informal”. Embora não se ignore os efeitos dessa formação, no presente texto, não nos deteremos a analisar os efeitos desse consumo. Contudo, cabe aqui apontar, para futuros estudos, a ampla exposição midiática, seja na televisão aberta, seja via opções de streaming (aos que podem pagar), a que estão sujeitos jovens, crianças, adultos e idosos no contexto do isolamento pandêmico.

5 É possível acessar a campanha do ENEM 2020 no perfil do Ministério da Educação nas redes sociais. Facebook: https://web.facebook.com/ministeriodaeducacao/videos/1847762045366391/ e Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=IQMSrxLzLLk . Frente a essa evidente exclusão social, entidades científicas brasileiras uniram-se para solicitar, coletivamente, a suspensão do calendário. (ANPED, 2020; VARGAS, 2020; G1 2020). Nesse contexto, a declaração do então ministro de que esse exame “[..] não é feito para atender injustiças sociais e, sim, para selecionar os melhores candidatos” (MENDONÇA, 2020, n.p.; GOMES, 2020, n.p.), atesta o quanto o conteudismo se sobrepõe aos valores éticos nos processos formativos da Educação brasileira.

6 Em relação a esse e outros problemas, citamos a entrevista do colega Nelson Pretto, que afirma o quanto é preciso “[...] pensar, antes de tudo, sobre a própria concepção de educação e de currículo. O(a) professor(a), de uma maneira geral, usa com certa tranquilidade as redes digitais, mas não dá conta de trazer isso para o cotidiano dos processos formativos, pois o que ele sabe fazer é engessado pelo currículo fechado, a tal grade curricular, agora intensificado pela BNCC” (AZEVEDO, 2020, n.p.).

7 Esses/as autores/as contribuem com a obra Sopa de Wuhan, organizada por Pablo Amadeo (2020). Em relação a essa referência, é importante fazermos duas considerações: a primeira refere-se a críticas que vem recebendo quanto ao caráter eurocêntrico e orientalizante, especialmente posto em seu título e capa, como é possível acessar em https://diplomatique.org.br/a-china-muito-alem-da-sopa-de-wuhan/ e https://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/racismo-redes-sociais-e-covid-19-um-virus-amarelo/; a segunda observação, crítica interna nossa, tem relação ao fato de que, cada vez mais, os intelectuais do Brasil são ignorados dentro das atuais discussões globais. No contexto da pandemia mundial, estamos sendo apresentados como o país com maior problemas e perigos em relação à doença, isso devido ao desrespeito frente informações científicas e orientações técnicas dos profissionais da área da Saúde.

8 O referido documento se encontra no atual site do Ministério da Educação e pode ser acessado por meio do link: http://portal.mec.gov.br/docman/julho-2013-pdf/13677-diretrizes-educacao-basica-2013-pdf/file. Outros pareceres e diretrizes, as quais não substituem o documento substancial de 2013, podem ser encontrados em: http://portal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal/323-secretarias-112877938/orgaos-vinculados-82187207/12992-diretrizes-para-a-educacao-basica. Entretanto, o que se institui como Base Nacional Comum Curricular (BNCC) norteia, por etapas, a aplicabilidade de conteúdos definidos a partir das áreas de conhecimento descritas pela LDB No 9.394/1996. Os documentos da BNCC estão disponíveis em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acessos em: 20 maio 2020.

9 No dia 18 de abril de 2020, o então ministro da Educação Abraham Weintraub, em uma postagem na rede social Twitter, sobre a realização do ENEM em 2020, respondeu a um internauta que o questionou sobre a suspensão de aulas nas universidades: “Autonomia universitária... Porém, as que estão dando aulas receberão mais recursos e serão premiadas. Há joio e há trigo...”. Esse post foi amplamente divulgado por vários sites de notícias (TURTELLI, 2020a; 2020b; AGÊNCIA ESTADO, 2020).

10 Tal fato pode ser demonstrado no manifesto traduzido como Contra uma volta à normalidade, assinado por artistas e intelectuais, incluindo grandes nomes da cultura pop, o qual atenta para as catástrofes ecológicas, a negação da vida, que o consumismo implica, e, a partir da crise da Covid-19, reclama o compromisso mundial que tenhamos uma profunda reforma de objetivos e valores, mudando, obviamente, a lógica econômica predadora a que estamos submetidos (COLLECTIF, 2020).

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Recebido: 20 de Maio de 2020; Revisado: 25 de Junho de 2020; Aceito: 26 de Junho de 2020; Publicado: 02 de Julho de 2020

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