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Práxis Educativa

versión impresa ISSN 1809-4031versión On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.16  Ponta Grossa  2021  Epub 20-Oct-2021

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.16.16601.002 

Dossiê: Paulo Freire (1921-2021): 100 anos de história e esperança

Formação permanente freireana na Educação de Jovens e Adultos: reinventando políticas e práticas no município de São Paulo*

Freirean permanent education in Youth and Adult Education: reinventing policies and practices in the city of São Paulo

Formación permanente freireana en la Educación de Jóvenes y Adultos: reinventando políticas y prácticas en el municipio de São Paulo

**Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Pesquisadora na USP. Integra o grupo de pesquisa “O pensamento de Paulo Freire na educação brasileira”, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). E-mail: <fernanda14voltas@hotmail.com>

***Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professora titular da PUC-SP nos Programas de Pós-Graduação em Educação: Currículo e Educação e no Mestrado Profissional: Formação de Formadores. Coordena a Cátedra Paulo Freire dessa instituição. E-mail: <anasaul@uol.com.br>

****Doutor em Educação: Currículo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). É docente pesquisador da Universidade Católica de Santos e coordena a Cátedra Paulo Freire dessa mesma instituição. E-mail: <asaul@hotmail.com>


Resumo:

Este estudo analisou a presença e a reinvenção do pensamento de Paulo Freire nas políticas e nas práticas de formação de professores da Educação de Jovens e Adultos desenvolvidas no âmbito da Diretoria Regional de Educação Pirituba-Jaraguá, São Paulo, entre 2013-2016. Partiu-se do pressuposto de que elementos da proposta de formação docente, posta em prática na Gestão Paulo Freire (1989-1992), vêm sendo mantidos e recriados na Rede Municipal de Ensino de São Paulo, submetidos, porém, a condicionantes que ganham ou perdem força em função do compromisso político assumido pela administração pública. A pesquisa qualitativa adotou os seguintes procedimentos metodológicos: análise de documentos, entrevistas e observação participante. O referencial teórico contou, principalmente, com aportes de Paulo Freire, Vitor Paro e Rubens de Camargo. Os achados confirmaram a hipótese inicial, apontaram condicionantes envolvidos no ressurgimento de pressupostos freireanos na formação docente e demonstraram a viabilidade da reinvenção do legado de Freire em políticas e redes públicas de ensino.

Palavras-chave: Paulo Freire; Política educacional; Formação de professores

Abstract:

This study analyzed the presence and reinvention of Paulo Freire’s thinking on the policies and practices of teacher education in Youth and Adult Education developed within the scope of the Regional Education Directorate Pirituba-Jaraguá, São Paulo, between 2013-2016. It was assumed that elements of the teacher education proposal put into practice during Paulo Freire’s Administration (1989-1992) have been continued and recreated in the Municipal Education Network of São Paulo, subjected, however, to conditions that gain or lose strength according to the political commitment assumed by the public administration. The qualitative research adopted the following methodological procedures: document analysis, interviews and participant observation. The theoretical framework relied mainly on contributions from Paulo Freire, Vitor Paro and Rubens de Camargo. The findings confirmed the initial hypothesis, pointed out conditions involved in the resurgence of Freirean assumptions in teacher education and demonstrated the feasibility of reinventing Freire’s legacy in policies and public networks of education.

Keywords: Paulo Freire; Education policy; Teacher education

Resumen:

Este estudio analizó la presencia y la reinvención del pensamiento de Paulo Freire en las políticas y en las prácticas de formación docente para la Educación de Jóvenes y Adultos, desarrolladas en el ámbito de la Dirección Regional de Educación Pirituba-Jaraguá, São Paulo, Brasil, entre 2013-2016. Se partió del supuesto que elementos de la propuesta de formación docente puesta en práctica en la Gestión Paulo Freire (1989-1992) han sido mantenidos y recreados en la Red Municipal de Educación de São Paulo, sometidos, sin embargo, a condicionantes que ganan o pierden fuerza debido al compromiso político asumido por la administración pública. La investigación cualitativa adoptó los siguientes procedimientos metodológicos: análisis de documentos, entrevistas y observación participante. El referente teórico contó, principalmente, con las contribuciones de Paulo Freire, Vitor Paro y Rubens de Camargo. Los resultados confirmaron la hipótesis inicial, señalaron condicionantes involucrados en el resurgimiento de los supuestos freireanos en la formación docente y demostraron la viabilidad de la reinvención del legado de Freire en políticas y redes públicas de enseñanza.

Palabras clave: Paulo Freire; Políticas de educación; Formación docente

Introdução

Paulo Freire tem, em sua biografia, uma face importante, nem sempre mencionada ou analisada, pelos estudiosos do autor. Trata-se de sua atuação como gestor público quando assumiu a pasta da Educação da cidade de São Paulo, a convite da Prefeita Luiza Erundina de Sousa, do Partido dos Trabalhadores. Esteve à frente da Secretaria no período de 1989 a 1991, tendo deixado a equipe que com ele trabalhava com a responsabilidade de prosseguir na implementação de sua proposta de política pública para a Educação da cidade. O seu trabalho foi valioso e marcante tanto que, ainda durante e após a sua gestão, muitos municípios brasileiros, inspirados em seu trabalho, passaram a assumir políticas e práticas semelhantes àquelas que estavam sendo ou foram desenvolvidas na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SME/SP). Pesquisadores de diferentes Universidades propuseram-se a investigar como as propostas de Paulo Freire vinham sendo materializadas e reinventadas em diferentes espaços escolares e não escolares. O projeto “O pensamento de Paulo Freire na atualidade: análise de políticas e práticas”, realizado em âmbito nacional, coordenado pela Profa. Dra. Ana Maria Saul, da Cátedra Paulo Freire da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), já em sua 4ª edição, visa a analisar a presença e a reinvenção do pensamento de Paulo Freire em sistemas públicos de Educação do Brasil, a partir da década de 1990.

Transcorridas três décadas da gestão Paulo Freire, considerando a atualidade e o vigor do pensamento desse autor e diante da polêmica que se instalou nos últimos anos no Brasil, em torno do seu nome, a curiosidade epistemológica se acentuou e provocou a inquietação de investigar a presença e a reinvenção do pensamento de Freire em espaços da educação brasileira, de modo a identificar os seus condicionantes. Assim sendo, o estudo aqui relatado integrou a pesquisa coordenada pela PUC-SP e propôs-se a investigar a formação de professores da Educação de Jovens e Adultos (EJA) no município de São Paulo, no período 2013-2016.1

Devido ao fato de que os autores deste artigo tiveram aproximações com a Diretoria Regional de Educação (DRE) Pirituba-Jaraguá, quer porque foram solicitados para participar de formações de professores, quer porque realizaram observações ou apreciaram relatos sobre o trabalho dessa DRE, as evidências coletadas, aliadas à leitura de documentos produzidos sobre a EJA da SME, configuraram-se em indícios de adesão ao pensamento de Paulo Freire. Esses indícios e a existência de um processo formativo de professores de EJA, em aparente sintonia aos princípios políticos e pedagógicos propugnados pela Divisão de Educação de Jovens e Adultos (DIEJA)2, no que se refere ao referencial de Paulo Freire, permitiram levantar a hipótese de que há um legado freireano reinventado na Rede Municipal de Ensino (RME) de São Paulo, sede da experiência pioneira de uma administração pública que assumiu a perspectiva crítico-emancipatória como orientadora de sua política educativa.

A aproximação com a DRE e a análise exploratória de documentos produzidos pela SME/SP, que explicitavam a política educacional da gestão 2013-2016, permitiram identificar que, no referido período, embora a SME/SP não tenha adotado o referencial freireano como norteador de sua política mais ampla, houve a intenção, por parte da DIEJA, de que esse referencial subsidiasse os trabalhos da EJA3.

Ante à explícita intenção da DIEJA de trabalhar na perspectiva crítico-emancipatória e entendendo que a mudança que se deseja construir na EJA não pode ser concretizada sem que a perspectiva propalada seja colocada em ação na formação de professores, optou-se por tomar as políticas e as práticas de formação docente de professores de EJA como objeto de estudo da pesquisa, por compreender que a sua análise forneceria, de forma especial, dados importantes que permitiriam dizer a respeito do legado freireano na RME de São Paulo. Assumiu-se, portanto, que a formação docente seria um caminho fundamental para a comprovação, ou não, da hipótese afirmada na pesquisa.

A referida investigação partiu do pressuposto de que elementos da proposta de formação de professores, posta em prática na Gestão Paulo Freire4, vêm sendo mantidos e recriados na RME de São Paulo. O que se buscou demonstrar é que essa proposta não se extinguiu na rede, ao contrário, tem ressurgido, em função de condicionantes que ganham ou perdem força, em virtude de projetos de gestão pública comprometidos com a transformação social ou com a manutenção das desigualdades, em diferentes contextos e tempos históricos. Pretendeu, portanto, responder às seguintes questões:

  • Como o pensamento de Paulo Freire se concretizou e se recriou nas políticas e nas práticas formativas de professores de EJA, na Diretoria Regional de Educação Pirituba-Jaraguá (DRE-PJ), no período 2013-2016?

  • Que condicionantes permitiram ou dificultaram o ressurgimento do pensamento de Paulo Freire nas orientações da DIEJA e no trabalho de formação de professores de EJA da DRE-PJ, na referida gestão?

A abordagem qualitativa revelou-se apropriada à pesquisa que se propôs a construir conhecimento, a partir da compreensão e da prática dos sujeitos envolvidos nos processos de formação de professores de EJA, na RME de São Paulo. No bojo dessa abordagem, o estudo de caso (YIN, 2001) mostrou-se como estratégia de pesquisa adequada para o trabalho que teve o objetivo de construir conhecimento aprofundado, a partir da dinâmica natural do objeto em seu contexto concreto, de modo a compreender as condições específicas nas quais ele acontece. Assumiu-se, portanto, que o estudo de um caso em particular tem importância em si mesmo porque permite a ampliação do conhecimento existente sobre o fenômeno estudado; assim, ajuda a elucidá-lo. Há de destacar-se que, nessa perspectiva, a produção do novo conhecimento em pesquisa não tem, necessariamente, o caráter de ineditismo. O conhecimento produzido é novo pela especificidade das circunstâncias e das características de sua produção.

A trajetória seguida para chegar à definição do local da pesquisa – a DRE-PJ – deu-se por sucessivas aproximações e procedimentos próprios para delimitação de um caso a ser tomado como referência do estudo. A decisão de analisar as ações de formação continuada de professores de EJA, realizadas nos âmbitos da DIEJA, da DRE-PJ e de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) da referida Diretoria relacionou-se ao fato de a pesquisa orientar-se pela epistemologia dialética, que compreende a realidade como processo histórico, contraditório e complexo, que vai exigir do pesquisador um exercício constante de análise relacional entre as partes e o todo. Compreendeu-se, portanto, que as ações de formação de professores de EJA que aconteceram no contexto da DRE-PJ, campo do estudo, não poderiam ser compreendidas ou explicadas de maneira isolada daquelas que foram propostas nos âmbitos da SME/DIEJA e da EMEF selecionada para o estudo, posto que tais ações estavam imbricadas e se influenciavam mutuamente.

Na pesquisa em questão, foram adotados os seguintes procedimentos de coleta de dados e informações: análise de documentos, realização de entrevistas semiestruturadas e observação participante. Em relação aos indispensáveis cuidados éticos para o desenvolvimento da pesquisa, no contexto das três instâncias educativas investigadas (DIEJA, DRE-PJ e EMEF), em um primeiro momento, foi realizada a apresentação da pesquisa, com destaque para os objetivos da investigação e os procedimentos de coleta de dados, aos potenciais participantes e gestores responsáveis. Uma vez acolhida e formalmente autorizada a proposta, foram agendadas as datas em que seriam realizadas as observações participantes e entrevistas.

Faz-se oportuno salientar que todas as entrevistas foram realizadas nos horários, nos dias e nos locais mais convenientes para os entrevistados. No encontro com cada sujeito, com o intento de fortalecer a transparência do processo e criar um ambiente favorável para a construção da necessária confiança, todos os sujeitos receberam com antecedência, via e-mail e/ou WhatsApp, um roteiro com as questões da entrevista. Na ocasião das entrevistas, os participantes foram informados que seus depoimentos seriam utilizados exclusivamente para os fins da pesquisa, que seu anonimato seria garantido e que poderiam desistir da participação na investigação, a qualquer momento, sem nenhum prejuízo para eles. Em seguida, os entrevistados foram consultados quanto às suas possíveis dúvidas e, também, quanto à autorização para a gravação, em áudio, de suas falas. Após esses procedimentos, todos os participantes concordaram em assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Referencial teórico

Dentre os subsídios teóricos que apoiaram o desenvolvimento da pesquisa, destacaram-se as contribuições de Paulo Freire, Rubens de Camargo e Vitor Paro. Em Freire (1987, 1996, 2001, 2007), buscou-se aprofundar a compreensão do conceito de formação permanente, bem como de categorias a ele articuladas, tais como “leitura da realidade”, “diálogo”, “avaliação” e “participação”. As produções de Camargo (1997) e Paro (2000) forneceram importantes elementos para identificar e analisar os condicionantes que facilitaram ou dificultaram a manutenção e ou recriação da política e da prática de formação freireana no contexto investigado.

A formação permanente freireana5 e os demais conceitos a ela relacionados serão explicitados a seguir, de modo que se compreenda como orientaram a produção e a análise dos dados.

Formação permanente freireana

Para Paulo Freire (1987), a educação é um ato político pois toda prática educativa traz em si valores implícitos que estão relacionados a um certo projeto, desejo ou sonho de sociedade que se quer construir. Na concepção do autor, o ser humano não nasce pronto. Ele vai forjando sua humanidade nas relações que estabelece com os seus semelhantes e com o mundo. É na prática social que mulheres e homens se humanizam, podendo cumprir sua vocação ontológica de ser mais6, ou se desumanizam. Nesse sentido, nem toda educação é humanizadora. Não sendo neutra, a educação pode estar a serviço tanto da reprodução das ideologias dominantes, interessadas na manutenção das variadas formas de desigualdade econômicas e sociais, quanto da construção de uma visão crítica, capaz de sensibilizar os sujeitos quanto à percepção das contradições da realidade, de seus condicionamentos históricos e das possibilidades de transformação dos contextos de opressão.

A Pedagogia Freireana insere-se em uma matriz de pensamento crítico-emancipatória. Assume que uma das tarefas da educação e, portanto, da formação docente, é desvelar criticamente o inacabamento do ser humano e do mundo, pois ambos não estão fadados a um futuro inexorável, mas se fazem historicamente, a partir das condições concretas da existência. O conceito de formação permanente, subjacente a essa concepção, funda-se no reconhecimento de mulheres e de homens como seres histórico-sociais, inconclusos que, cientes do seu inacabamento, lançam-se em uma busca curiosa e incessante de aprender/ensinar. Nas palavras de Freire (2007):

A educação é permanente não porque certa linha ideológica ou certa posição política ou certo interesse econômico o exijam. A educação é permanente na razão, de um lado, da finitude do ser humano, de outro, da consciência que ele tem de sua finitude. Mais ainda, pelo fato de, ao longo da história, ter incorporado à sua natureza não apenas saber que vivia, mas saber que sabia e, assim, saber que podia saber mais. A educação e a formação permanente se fundam aí. (FREIRE, 2007, p. 22-23).

Nesse entendimento, os sujeitos estão em permanente formação nos diferentes espaços da existência em que, mediatizados pelo mundo, colocam-se a construir conhecimento na relação com os outros. É justamente esse o fundamento que diferencia a concepção de formação permanente freireana da noção de formação continuada ou formação em serviço. Essas modalidades de formação não são, em si, sinônimos de formação permanente, embora possam ser assim caracterizadas nas situações em que os princípios da proposta freireana sejam assumidos e orientem, de fato, as ações formativas.

Faz-se oportuno esclarecer que a expressão “formação permanente” adjetivada do termo “freireana” foi utilizada neste texto na mesma acepção de Alexandre Saul (2015), cuja intenção ao fazê-lo foi

[...] dar ênfase aos princípios que Paulo Freire propôs em sua teoria e prática e distinguí-la de outros usos que tomam essa expressão como mero sinônimo de ações cronológicas de formação e/ou de propostas que priorizam, de forma explícita ou implícita, o produtivismo e a rentabilidade que pode ser gerada pelos trabalhadores, e cujo objetivo é torná-los melhor adaptados às exigências das mudanças tecnológicas e do desenvolvimento econômico. São exemplos desse tipo de proposta: os projetos desenvolvidos pela Organização da Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo Conselho da Europa, nos anos 1970, que tinham por base o conceito de “educação permanente” (GADOTTI, 1981), e os documentos da atual política governamental de países da União Europeia, que trabalham com a concepção de “aprendizagem ao longo da vida. (SAUL, A., 2015, p. 16).

Com o objetivo de melhor compreender a concepção freireana de formação permanente, será aqui apresentada uma trama conceitual freireana em que essa categoria ocupa o lugar central (Figura 1). As tramas conceituais freireanas vêm sendo utilizadas no âmbito da Cátedra Paulo Freire da PUC-SP, desde o ano de 2001, com uma dupla finalidade: a) didática, ao permitir que os sujeitos envolvidos nas situações de ensino-aprendizagem possam aprofundar seu entendimento acerca dos conceitos da obra do referido autor; b) auxiliar que os pesquisadores interessados percebam como os conceitos freireanos podem ser articulados de modo a compor a matriz de análise da sua investigação ou orientar ações/intervenções educativas (SAUL; SAUL, 2013, 2017, 2018). Sobre a sua organização, Saul e Saul (2013) elucidam que:

Figura 1 Trama conceitual FreireanaFonte: Os autores, 2020. 

A trama pode integrar diferentes conceitos abarcados pela obra [freireana], tendo em vista explicitar a leitura que o autor dessa construção faz da relação entre os conceitos. […]. Entende-se, pois, que toda a trama é motivada por um objeto de estudo do seu autor. Por isso, as relações da trama podem variar, mesmo quando se propõem à compreensão/explicitação de um mesmo conceito central. As conexões entre os conceitos são representadas por setas e palavras que buscam dizer da relação que existe entre os mesmos, na perspectiva do pesquisador e/ou docente, autor da trama. As setas podem ter uma direção única ou dupla. Quando há uma única direção quer dizer que foi identificada uma articulação que se dirige de um para outro conceito, significando causalidade, dependência, associação, etc. Quando a seta apresenta duas direções significa que a articulação encontrada pode ter sua origem em ambos os conceitos relacionados, demonstrando o caráter de reversibilidade na relação encontrada. (SAUL; SAUL, 2013, p. 108).

Os demais conceitos que compõem a trama foram selecionados por serem considerados fundamentais ao permitir entrever a essência, as eventuais condições de viabilização e limites e intencionalidades da formação permanente. Em conformidade com a observação de Saul e Saul (2013), as relações evidenciadas entre os conceitos, na trama a seguir, buscaram respeitar as proposições originais de Freire sobre o tema da formação em sua obra.

Ressalte-se que essa trama conceitual se constituiu em um instrumento metodológico crucial. Isso porque os conceitos selecionados da obra de Freire para compor o constructo teórico gerador de reflexões sobre a formação permanente freireana foram a base para elaborar os roteiros das entrevistas semiestruturadas, orientar a observação de práticas no campo de pesquisa e analisar, ao lado de outras categorias empíricas, os dados produzidos na investigação.

A leitura da realidade é condição para a formação permanente

Freire (1987) compreende a realidade como uma totalidade constituída por partes em permanente e dinâmica interação. Nas ocasiões em que uma compreensão crítica dessa totalidade se faz ausente, os sujeitos tendem a captar o real em pedaços, a partir de uma visão focalista que não permite reconhecer a interação entre as partes constituintes, tampouco conhecer a realidade em sua complexidade. Daí que, frequentemente, as tentativas de transformar um determinado contexto não gerem resultados satisfatórios, pois as ações que visam a mudar as partes isoladas não são capazes de promover a transformação do todo.

Para o autor, a realidade concreta dá-se na dialética entre a subjetividade e a objetividade. Fazem parte dela, por conseguinte, tanto os fatos e os dados materiais constatáveis, quanto a percepção que dela estejam tendo os sujeitos envolvidos no contexto a ser estudado. Com base nesse entendimento, pode-se afirmar que as concepções dos educadores a respeito dos diferentes objetos, ações e práticas do cotidiano da escola são dimensões da realidade que devem ser consideradas em qualquer processo formativo que pretenda investigar e intervir no ambiente escolar.

Freire (1996) sublinha que as ações de transformação da prática educacional devem partir da realidade concreta. É lendo e conhecendo melhor a realidade, seus condicionantes, obstáculos e contradições, que os sujeitos podem estabelecer coletivamente planos de ação que, na perspectiva da humanização, permitam superar eventuais práticas antidemocráticas, autoritárias e pouco críticas, instaladas no dia a dia. A leitura da realidade é o primeiro passo da formação permanente, e um dos mais fundamentais, pois é condição para a construção de uma programação educativa significativa, contextualizada e crítica.

É uma postura e uma prática que considera os desejos, as necessidades, as dúvidas, as expectativas e os sonhos dos educadores em relação à formação continuada, mas não se esgota em uma consulta retórica a respeito do que esses gostariam de estudar no espaço-tempo de sua formação. A problematização das práticas faz parte desse processo e permite identificar os limites explicativos, as dúvidas, as crenças, os medos, os preconceitos, as visões de mundo, os sentidos e os significados expressos nas falas dos professores, que correspondem aos conflitos socioculturais, às situações-limites vivenciadas pelo grupo. Estas são entendidas por Paulo Freire como situações concretas que se apresentam como obstáculos para os processos de humanização e libertação dos seres humanos, estabelecendo os limites até onde se pode chegar. Na perspectiva crítico-emancipatória, porém, tais impedimentos não devem ser assumidos como barreiras intransponíveis, mas como desafios a ser enfrentados, coletivamente, pelos sujeitos engajados na ressignificação e na transformação de seus contextos e de suas práticas.

É a partir das situações-limites, identificadas por meio do exercício de leitura coletiva da realidade, que emergem as temáticas significativas que darão origem à programação educativa da formação, em um processo denominado por Freire de “redução temática” (FREIRE, 1987). A leitura da realidade gera, portanto, as condições para que os conteúdos que comporão a programação educativa da formação permanente não sejam selecionados a priori, mas respondam às necessidades, às demandas e aos desafios da prática social que se quer transformar. Desse modo, os conceitos não são estudados de forma abstrata, mas vão sendo selecionados à medida que ajudam a desvelar a realidade. Adicionalmente, a leitura da realidade permite detectar práticas contra-hegemônicas a serem reforçadas no contexto da formação de educadores.

Pode-se dizer que a leitura da realidade como condição para a formação permanente de educadores fundamenta-se, também, na dimensão humanizadora implícita à proposta freireana, que considera os sujeitos em sua integralidade. Dessa maneira, fazer a leitura da realidade implica estar atento ao dito e, também, àquilo que eventualmente foi silenciado pelo grupo de professores, e que só poderá ser depreendido por meio de uma leitura sensível dos gestos, dos movimentos, da inquietação dos corpos, do olhar surpreso, da reação mais introvertida ou agressiva dos participantes em relação à proposta formativa (FREIRE, 2007). Esse exercício poderá fornecer pistas importantes ao formador e auxiliá-lo nas decisões a respeito dos planos e das estratégias da formação.

A formação permanente exige diálogo

Freire entende que o diálogo faz parte da natureza humana constituída social e historicamente. É uma espécie de postura necessária, na medida em que os seres humanos foram se tornando mais criticamente comunicativos, diante de sua ação no mundo. O diálogo não é, portanto, uma conversa qualquer, mera troca de informações, uma tática para manipular ou entreter os sujeitos. Tem compromisso com a transformação da realidade. Daí que, para o autor, existir humanamente signifique pronunciar o mundo e, assim, modificá-lo (FREIRE, 1987).

No âmbito dessa abordagem, o diálogo é um princípio ético, político e epistemológico que deve orientar as relações de ensino-aprendizagem. Ético pois reconhece os educandos - e, também, os professores em formação – como sujeitos do conhecimento, que possuem saberes mais ou menos críticos que precisam ser respeitados e problematizados na prática pedagógica; político porque tem como horizonte a transformação dos contextos desumanizantes; epistemológico posto que é um caminho factível para construir conhecimento; daí que não se possa falar em diálogo sem conteúdo. Sobre esse ponto, Saul e Saul (2013) esclarecem que:

O diálogo freireano implica uma partilha de saberes. É condição para a construção de conhecimento, porque, na situação dialógica, a comunicação entre os sujeitos, que estão dialogando, problematiza o objeto de conhecimento, questionando, criticando, avaliando, trazendo novos aportes de informação, enfim, ampliando as dimensões do que é possível saber sobre o objeto a ser conhecido/reconhecido. [...]. O diálogo [no processo de ensino -aprendizagem] requer que se estabeleça uma relação horizontal entre os sujeitos, porque pressupõe que todos sabem alguma coisa, saberes críticos ou não. É justamente essa condição que permite a produção de novos conhecimentos em diálogo, contextualizados pelo momento histórico e com intencionalidade política. (SAUL; SAUL, 2013, p. 112).

Pode-se dizer que o diálogo é um dos aspectos fundamentais que devem permear os processos da formação permanente freireana. Diálogo que se estabelece desde os primeiros momentos da formação, nos quais os educadores são convidados a compartilhar coletivamente as visões que trazem a respeito de suas próprias práticas. Para Marcelo García (2013), um quefazer desse tipo, que implica análise e reflexão na e sobre a própria ação, possibilita que a prática docente vá se constituindo em epistemologia, em fonte de conhecimento para os professores.

A formação permanente, concebida por Paulo Freire, demanda o exercício da “escuta atenta” por parte de todos os sujeitos envolvidos no processo formativo. Escuta que extrapola o simples ouvir pois pressupõe acolhimento e abertura ao outro. É uma atitude a ser construída entre o grupo de professores, um conteúdo e uma prática essenciais à essa proposta. Menezes e Santiago (2014, p. 52) esclarecem, entretanto, que essa qualidade de escuta não deve ser compreendida como aceitação incondicional ao que o outro pensa ou diz, mas como uma prática livre de preconceitos, capaz de possibilitar a reflexão crítica e o posicionamento consciente dos sujeitos em formação.

No espaço da formação permanente, o diálogo concretiza-se, também, quando o formador, responsável pela coordenação do trabalho, assume a tarefa de problematização das experiências relatadas pelos professores. Para Freire, problematizar é mais do que levantar questões, é promover o distanciamento crítico que permite ver além das aparências, romper a anestesia do cotidiano e construir um novo olhar sobre o objeto de conhecimento. Ao admirar partes da realidade que já conhecem, os educadores têm a oportunidade de refletir e aprender novos aspectos de suas próprias experiências. Em uma concepção dialética de construção de conhecimento, após esse momento de admiração de uma face do objeto, é fundamental o movimento de retorno para o todo, que implica problematizar a parte admirada e suas conexões com a realidade totalizante, permitindo que o educador avance em uma compreensão mais crítica do contexto em que vive.

A avaliação e a formação permanente implicam-se mutuamente

O legado freireano fornece subsídios para pensar sobre quais seriam as características desejáveis de uma avaliação comprometida com a proposta de educação crítico-emancipatória. Todas as escolhas e ações humanas são inspiradas por crenças, valores e intencionalidades, daí que existam diferentes compreensões de educação e, portanto, de avaliação. Avaliar implica decidir a respeito de práticas, métodos e procedimentos que melhor atendam às finalidades e ao horizonte político da proposta de educação que se defende. Nesse sentido, cabe sempre perguntar qual é a avaliação que interessa e que se deseja? Para que avaliar?

Em uma perspectiva emancipatória, a finalidade da avaliação é a libertação dos sujeitos e não a sua domesticação (FREIRE, 1996). O que se pretende, ao avaliar, é realizar uma análise crítica que possa subsidiar decisões e orientar possíveis mudanças de práticas. Para Freire, a avaliação não pode estar a serviço, em qualquer hipótese, da punição, inspeção ou classificação de educadores ou educandos. No entendimento do autor,

[…] a avaliação não é o ato pelo qual A avalia B. É o ato por meio do qual A e B avaliam juntos uma prática, seu desenvolvimento, os obstáculos encontrados ou os erros e equívocos porventura cometidos. Daí o seu caráter dialógico. “Tomando distância” da ação realizada ou realizando-se, os avaliadores a examinam. Desta forma, muita coisa que antes (durante o tempo da ação) não era percebida, agora aparece de forma destacada diante dos avaliadores. Neste sentido, em lugar de ser um instrumento de fiscalização, a avaliação é a problematização da própria ação. (FREIRE, 1981, p. 26).

Enquanto práxis, a avaliação das ações cotidianas, subsidiada por esse referencial político-pedagógico, visa a gerar sucessivas transformações no contexto concreto e ampliar os níveis de conscientização dos sujeitos engajados no estudo da realidade.

No âmbito da proposta de formação permanente freireana, a avaliação deve estar à serviço da humanização, crivo ético-crítico que imprime direção às decisões e às ações coletivas em torno do processo formativo. Avaliar a formação docente a partir desse crivo reforça o compromisso de que as ações de mudança ocorram no sentido de fortalecer as relações democráticas na escola e, também, nos demais espaços sociais.

O movimento de ação-reflexão-ação, inerente à essa proposta de avaliação, cria condição para a conscientização dos educadores participantes, permitindo que estes, ao refletirem criticamente sobre a prática formativa, passem a compreendê-la, como prática social, situada historicamente e condicionada por múltiplos determinantes. Dessa maneira, a práxis avaliativa deverá possibilitar que o coletivo de professores compreenda as razões de ser das contradições que se expressam no ambiente formativo.

Nessa perspectiva, o quefazer avaliativo incluirá a análise de aspectos, de variada ordem, que tensionam a ação formativa, tais como: a seleção da programação educativa, os critérios utilizados para essa seleção, os métodos de trabalho, as relações de poder dentro da escola e do sistema de ensino, as condições para o trabalho docente, a variedade de posicionamentos frente aos diferentes sujeitos do contexto educativo e aos sistemas sociocultural, político e econômico (SAUL, A., 2015). Esse esforço coletivo e permanente de desvelar e compreender criticamente o contexto concreto possibilita que os educadores comecem, gradativamente, a vislumbrar caminhos possíveis para a intervenção e a mudança da prática formativa e, também, da sociedade.

Vale destacar, ainda, o papel fundamental que a avaliação pode ter no que se refere ao planejamento da programação educativa significativa da formação permanente, uma vez que permite que essa seja constantemente confrontada com as demandas da realidade do grupo de educadores, em formação. Questões como as que se seguem podem auxiliar nessa tarefa: Os conhecimentos estudados, até o momento, ajudam a pensar em planos de ação para a transformação da realidade? Há algo que ainda precise ser aprofundado? O que parecia prioridade no planejamento do programa educativo, mas deixou de ser, por causa dos novos desafios que se colocam no caminho? O que o grupo considera prioridade no atual contexto?.

Pode-se dizer que formação permanente freireana e a avaliação implicam-se mutuamente porque: a) a avaliação é imprescindível para mudar a prática da formação, de modo de que ela se torne cada vez mais significativa para os professores que dela participam e concretize princípios democráticos; b) enquanto avaliam o processo formativo, do qual são sujeitos críticos, os educadores analisam, debatem visões, buscam entender as razões de ser dos fatos, optam, decidem, elaboram planos de ação, ou seja, têm a oportunidade de aprender caminhos e referências para avaliar a sua própria prática. Daí que a tarefa avaliadora, nessa perspectiva, implique formação.

A formação permanente requer participação

Ao defender um projeto democrático de sociedade e a politicidade da educação, Paulo Freire aponta para o relevante papel que a escola pode desempenhar na formação crítica dos sujeitos para o exercício da participação cidadã. Nesse sentido, o processo de aprendizado participativo, instituído nos diferentes espaços da escola, pode contribuir para a criação e a revitalização da esfera pública democrática (LIMA, 2009).

Participar, para Freire (2001), é uma ação comprometida, crítica e criadora, que implica partilha de poder e assunção mútua de responsabilidades. Além disso, é uma exigência e uma tarefa que se coloca à prática educativa que se assume progressista. Portanto, ao inserir-se nesse recorte político-ideológico, a proposta de formação permanente freireana vai demandar, necessariamente, a crescente participação dos docentes nas deliberações acerca do processo formativo. Espera-se, portanto, que envolvidos em quefazeres desse tipo, os educadores possam ir conquistando autonomia partilhada diante da ação formativa.

A participação não é algo que se estabelece espontaneamente entre o grupo de professores participantes de programas de formação continuada. No bojo da proposta de formação permanente freireana, o caráter pedagógico do processo participativo ganha destaque. Nesse sentido, mais do que discursar sobre a importância da participação, é preciso experimentar com eles esse processo, enquanto exercício que implica optar, debater, argumentar e decidir coletivamente, compreendendo as consequências envolvidas nessa ação.

Para que isso, de fato, se concretize, os formadores precisarão estar atentos a fim de possibilitar a expressão das diferentes vozes do grupo, seja por meio da fala, da escrita ou pelo uso de diferentes linguagens que contemplem as necessidades e as possibilidades dos sujeitos de “dizer a sua palavra”. Além disso, faz-se necessário respeitar os distintos tempos de reflexão dos professores, pois nem todos se sentirão aptos a opinar ou decidir no momento imediato que um assunto é colocado ao grupo.

Ao buscar aprofundar a participação dos educadores na formação, é preciso cuidar para que todos os envolvidos nos processos decisórios tenham acesso às informações necessárias, que subsidiarão as escolhas que serão feitas. Para Camargo (1997), a partilha de informações é um requisito fundamental para a consolidação de processos democráticos. Nesse sentido, o autor esclarece que “[...] o domínio de informações estabelece relações de poder, portanto ao democratizar a informação, começa-se a socializar parcelas de poder” (CAMARGO, 1997, p. 261).

Por fim, para que os docentes se apropriem, de fato, do seu direito de participar e do dever de não se omitir no espaço da formação, é preciso que sintam que sua voz gera repercussões na realidade vivida. Desse modo, a formação permanente freireana intenciona criar condições para que os docentes se apropriem do espaço formativo, ampliando a sua participação nos processos que envolvem a identificação de temas significativos referidos à realidade concreta, a busca coletiva por soluções, o encaminhamento de planos de ação que ajudem a superar os obstáculos constatados, a escolha e a indicação de subsídios teóricos para o estudo coletivo e, mesmo, a eventual condução de debates.

Pode-se afirmar que a assunção dos docentes como corresponsáveis pela formação encontra-se no horizonte político-pedagógico dessa proposta formativa, na qual a consolidação do espaço democrático estará sempre condicionada ao enfrentamento das tensões que se estabelecem entre a autoridade do formador e a liberdade dos participantes (FREIRE, 2013; SAUL, A. M., 2005). A participação democrática exige uma constante reflexão sobre as ações empreendidas, daí que seja uma tarefa comprometida e consciente, compartilhada pelos sujeitos.

Alexandre Saul (2015) salienta que o trabalho de formação na perspectiva crítico-emancipatória pode vir a enfrentar alguns desafios no que se referem à efetiva participação do grupo de educadores. Isso porque, mesmo diante da possibilidade de atuarem como sujeitos ativos da práxis formativa, os sujeitos podem adotar uma postura passiva e silenciosa. As possíveis explicações para essa ambiguidade passam pelo reconhecimento de que, em seus cotidianos, os docentes têm convivido com a força da cultura autoritária presente na sociedade brasileira e na escola, a falta de experiência/oportunidades concretas de participação e com o controle das instituições e das políticas por grupos conservadores hegemônicos.

A conquista da participação nos espaços formativos que se pretendem democráticos demandará, portanto, sempre tempo, esforço crítico e coletivo para refletir e superar os fatores envolvidos na não participação, a luta por estruturas democratizantes nas políticas públicas e nas instituições, condições materiais que permitam o desenvolvimento do trabalho e a crença de que a transformação é difícil, mas possível.

Condicionantes da presença e da reinvenção do pensamento de Paulo Freire

Na busca de um quadro de referência para compreender e analisar os condicionantes que pudessem explicar a vigência do pensamento freireano no trabalho de formação de professores de EJA, tomou-se os trabalhos de Paro (2000) e Camargo (1997) que apresentam categorias para analisar limites e possibilidades de um dado fenômeno educativo.

Em sua pesquisa sobre a participação da comunidade na gestão da escola pública, Paro (2000) identificou alguns condicionantes que, no interior da unidade escolar, acabaram por impedir ou facilitar essa participação. Estes foram denominados pelo autor da seguinte maneira: condicionantes materiais, institucionais, ideológicos e político-sociais. Paro (2000) compreende os condicionantes materiais como aqueles relacionados às condições objetivas em que se desenvolvem as práticas e as diferentes relações no interior da escola. Englobam, portanto, as condições de trabalho dos profissionais da educação e as variadas circunstâncias da realidade concreta que impactam diretamente as possibilidades de desenvolvimento das atividades político-pedagógicas no espaço escolar (grande número de aluno por classe, escassos recursos didáticos, falta de manutenção dos equipamentos e espaços, poucos recursos financeiros, dentre outros).

Os condicionantes institucionais referem-se ao modo como são estruturadas as relações de poder e autoridade no interior da escola, bem como aos mecanismos institucionais formais que viabilizam e incentivam a participação democrática nesse contexto. Ainda que, no âmbito da escola pública, professores, pais e comunidade em geral possam ser potencialmente compreendidos como pertencentes à classe dos trabalhadores, sendo, presumivelmente, portadores de interesses comuns, no interior da unidade escolar, as relações interpessoais entre esses distintos atores são conflituosas e atravessadas por diferentes interesses pessoais imediatos. Na concepção de Paro (2000), os condicionantes político-sociais podem ser compreendidos como manifestação e expressão de interesses e conflitos desses diferentes grupos que compartilham o espaço escolar.

Finalmente, os condicionantes ideológicos dizem respeito às concepções e às crenças dos sujeitos que influenciam e orientam suas práticas e relações, no ambiente escolar, facilitando, obstaculizando ou impedindo a participação da comunidade nas decisões acerca da gestão desse equipamento público.

Ao constatar a amplitude de tais condicionantes, Camargo (1997) propõe a sua utilização como instrumentos de análise não apenas da realidade escolar, mas também de políticas públicas:

Ao nosso ver, tais condicionantes se configuram, pela abrangência com que foram definidos, como instrumentos de análise tanto no âmbito da unidade escolar quanto no âmbito das políticas públicas educacionais implementadas em sistemas e redes públicas de ensino. [...]. Diferentemente de Paro que desenvolve os conceitos de condicionantes materiais, ideológicos, institucionais e político-sociais para explicar a dimensão política no interior da escola, os condicionantes [na proposta do autor] são entendidos tanto como elementos de classificação e síntese da implementação concreta de políticas educacionais no âmbito de sistemas e redes escolares, como para implementação de ações concretas (que podem ser uma expressão da tradução local dessas políticas) no âmbito da escola. (CAMARGO, 1997, p. 168-169, grifo do autor).

Acresce-se, também, no estudo de Camargo (1997), a gestão democrática e a qualidade de ensino, a necessidade de identificar elementos em cada uma dessas categorias.

No presente estudo, as categorias desenvolvidas por Paro (2000) foram assumidas como instrumentos de análise do objeto investigado. Dessa forma, os excertos extraídos das entrevistas semiestruturadas, documentos e anotações do caderno de campo foram organizados de acordo com os condicionantes apresentados por esse autor: materiais, institucionais, político-sociais e ideológicos.

Os extratos de textos analisados foram selecionados por expressarem ações, intenções e percepções que concretizavam de maneira mais acentuada as características de cada um desses condicionantes e traziam evidências que ajudavam a compreender a conjuntura que possibilitou, ou dificultou, que o pensamento de Paulo Freire ressurgisse nas políticas e nas práticas de formação de professores de EJA, no contexto pesquisado.

Inspirado na proposta de Camargo (1997), o Quadro 1, a seguir, evidencia os elementos presentes em cada um dos condicionantes. Tais elementos emergiram do conjunto dos dados empíricos coletados no campo de pesquisa. Foram identificados por meio de um processo indutivo no qual se utilizou de conhecimentos tácitos7 e do arcabouço teórico-metodológico acerca dos condicionantes utilizados na investigação.

Quadro 1 Condicionantes da presença e reinvenção do pensamento de Paulo Freire 

Condicionantes materiais

- Acesso a subsídios teórico-metodológicos adequados ao trabalho de formação, na perspectiva freireana.

- As condições de trabalho do professor.

- Recursos humanos necessários para o fortalecimento da proposta de formação.

Condicionantes político-sociais

- Contradições em torno da participação dos professores de EJA da região nas reuniões de formação organizadas pela DIPED (frente EJA)8, na DRE-PJ.

- Continuidade da política de formação docente diante da alternância da administração pública.

Condicionantes ideológicos

- A crença de que a Pedagogia Freireana pode contribuir com o projeto político progressista de educação.

- O papel das lideranças político-pedagógicas progressistas diante da continuidade do legado freireano, na Rede Municipal de Educação de São Paulo.

- A valorização da formação como espaço-tempo singular para discutir a realidade, construir conhecimento coletivo e trocar experiências.

Condicionantes institucionais

- A possibilidade de diálogo com interlocutores da universidade para discutir a EJA, a partir da proposta de Paulo Freire.

- A rotatividade do corpo administrativo e docente na Rede Municipal de Educação.

Fonte: Os autores, 2020.

Resultados e discussão

Os dados produzidos na pesquisa podem ser sintetizados em relação a cada uma das categorias voltadas à formação permanente, presentes na trama conceitual freireana que foi construída neste trabalho. As evidências coletadas permitiram detectar processos de leitura da realidade nas ações de formação continuada empreendidas nos contextos pesquisados. Essa categoria expressou-se, sobretudo, no bojo de dinâmicas que visaram provocar a explicitação da visão de mundo dos sujeitos a respeito dos principais desafios que enfrentavam em seu trabalho com a EJA. Ainda que não tenha sido possível constatar indícios de um possível aprofundamento dessa prática, no sentido da posterior exploração das eventuais contradições e identificação de limites explicativos, foi possível perceber que o movimento de leitura da realidade fomentou, por vezes, o delineamento de programas formativos, a seleção de subsídios teóricos, bem como orientou mudanças em planos de formação, em função das demandas da realidade, aproximando-se, portanto, da proposta freireana.

Especialmente no âmbito das ações formativas organizadas pela DIEJA e pela DIPED (frente EJA) da DRE-PJ, pôde-se perceber a busca intencional e explícita pela concretização da categoria diálogo, a partir do referencial freireano. A utilização da teoria da ação dialógica, o trabalho a partir de círculos de cultura, o compromisso com a construção de uma prática formativa problematizadora, a discussão sobre as práticas concretas dos educadores e o exercício do desvelamento das teorias embutidas nas práticas são algumas das evidências que corroboram esse entendimento. Em relação à formação continuada posta em prática na EMEF investigada, a ênfase do diálogo recaiu sobre as práticas cotidianas dos professores e a elaboração coletiva de planos de ação para a resolução de problemas identificados.

Ainda que tenha sido possível verificar a presença de práticas avaliativas nos contextos formativos pesquisados, a consolidação da avaliação enquanto práxis que possibilita a reflexão crítica dos sujeitos sobre as experiências vivenciadas apresentou-se como um desafio a ser superado. De modo geral, os dados coletados no campo de pesquisa revelaram a presença de uma prática avaliativa coletiva, porém pouco sistematizada. As formações organizadas pela DIEJA aparecem como exceção a essa constatação, uma vez que os indícios sugeriram a continuidade dos processos avaliativos, que possibilitaram replanejar a programação educativa e identificar conhecimentos construídos pelo grupo de educadores em formação. Todavia, as entrevistas e as observações participantes, realizadas em 2016, possibilitaram depreender que, apesar dos responsáveis pelos processos formativos atribuírem valor à avaliação, reservando, por vezes, momentos para a realização dessa prática, o tempo parece ter se configurado como um fator limitador do aprofundamento do intento avaliativo, no âmbito das ações de formação que aconteceram na DRE-PJ e, também, na escola investigada.

Apesar dos limites evidenciados nas práticas analisadas, pode-se dizer que o caráter coletivo das avaliações realizadas nos espaços investigados, a preocupação de tomar a formação como objeto de reflexão, a tentativa de criar espaços para que os educadores expressem suas percepções sobre a experiência formativa vivenciada e o replanejamento das ações, representam pontos de aproximação com a proposta de formação permanente freireana que poderiam ser fortalecidos, de modo a se buscar maior coerência com as proposições de Paulo Freire, propugnadas pela política de EJA da administração, no período 2013-2016.

A investigação possibilitou depreender a flexibilidade das propostas de formação docente que, nos contextos analisados, foram apresentadas aos educadores de maneira democrática, possibilitando que eles pudessem participar com sugestões de eventuais alterações aos programas inicialmente propostos. Nas circunstâncias da pesquisa, a categoria participação foi evidenciada sob diferentes aspectos, dentre os quais se destacam: a possibilidade de sugerir temas, propostas formativas e subsídios teóricos para a formação; a possibilidade de decidir sobre o tema gerador orientador da formação e sobre as necessidades de aprofundamento teórico; a atuação dos educadores como coformadores, coordenando debates teóricos ou apresentando relatos de práticas da EJA, nas formações. Pode-se dizer que tais práticas se encontram em consonância com a proposta de formação permanente freireana que considera os professores como sujeitos e compromete-se a desenvolver ações que desafiem posturas passivas e sejam capazes de potencializar a construção da autonomia docente.

Os achados da pesquisa possibilitaram confirmar a hipótese de que há um legado freireano, reinventado, na RME de São Paulo, sede da experiência pioneira na qual uma administração pública assumiu a perspectiva crítico-emancipatória como orientadora de sua política educativa. De maneira específica, a análise dos dados coletados permitiu concluir que as categorias leitura da realidade, diálogo, avaliação e participação se manifestaram, com variada ênfase, nas políticas e nas práticas de formação de educadores de EJA, no período 2013-2016, confirmando que elementos da proposta de formação permanente, posta em prática na Gestão Paulo Freire, vêm sendo mantidos e recriados na RME de São Paulo.

Pode-se afirmar que, a despeito de limites e de contradições identificados na documentação e/ou na prática das categorias evidenciadas, a materialização do pensamento de Paulo Freire pode ser depreendida, sobretudo pela presença de orientações, de proposições e de ações formativas que visavam fomentar a reflexão crítica e coletiva dos educadores de EJA a respeito de sua ação pedagógica, tendo como horizonte a construção de uma educação emancipatória.

A reinvenção da aludida concepção foi evidenciada visto que as experiências formativas investigadas mantiveram aproximações e coerência com a perspectiva de formação permanente freireana, ainda que tenham ocorrido em um contexto histórico-social diferente daquele em que os pressupostos teórico-metodológicos do autor foram incorporados, pela primeira vez, a um programa de formação docente da RME, no período da Gestão Paulo Freire.

Ao tomar como referência as proposições de Paro (2000) e Camargo (1997), a investigação possibilitou evidenciar ainda condicionantes materiais, ideológicos, político-sociais e institucionais que permitiram ou dificultaram o ressurgimento da proposta de formação docente, inspirada em pressupostos freireanos, no âmbito das orientações da política de EJA e nas ações de formação desenvolvidas na DRE-PJ, durante a gestão 2013-2016.

Do que foi observado e evidenciado na investigação, os condicionantes materiais foram importantes para possibilitar o ressurgimento do pensamento de Paulo Freire nas políticas e nas práticas de formação de professores de EJA investigadas. De maneira geral, o acesso aos subsídios teórico-metodológicos adequados e as condições de trabalho oferecidas aos docentes, em especial a jornada de trabalho, a pontuação relativa à evolução funcional e a instituição de horários de formação em serviço remunerada foram elementos que atuaram nessa direção. Em relação aos recursos humanos necessários para o fortalecimento da proposta de formação crítico-emancipatória, verificou-se que, embora a equipe da Divisão Pedagógica de EJA (DIPED-EJA), responsável pela coordenação das ações de formação de EJA na DRE-PJ, tenha sido ampliada no final da gestão 2013-2016, os dados evidenciaram que, nesse particular, essa ampliação foi insuficiente para garantir a organização e o desenvolvimento de um trabalho de formação docente mais amplo e sistemático dessa divisão junto aos professores das escolas da região, de modo a potencializar/aprofundar os debates em torno dos desafios do cotidiano da EJA, à luz dos pressupostos freireanos.

No tocante aos condicionantes ideológicos, a crença de que a Pedagogia Freireana poderia contribuir com o projeto político progressista de educação, da administração petista, no período 2013-2016, a presença de lideranças político-pedagógicas – que, ao ocuparem cargos de chefia na RME, aproveitaram-se das condições políticas e ideológicas favoráveis para propor e implementar políticas inspiradas no ideário freireano – e a valorização de ações formativas comprometidas com a análise crítica e colaborativa das práticas docentes, por parte de professores e gestores da EJA da DRE-PJ, configuraram-se como elementos que contribuíram, de maneira expressiva, com a retomada e revitalização do legado de Paulo Freire, nos contextos investigados.

Os condicionantes político-sociais identificados nesta pesquisa revelaram elementos que, embora não tenham impedido que o trabalho de formação de professores de EJA fosse desenvolvido na perspectiva freireana, constituíram-se em desafios a ser superados para a concretização desse intento, na gestão 2013-2016. As contradições em torno da participação dos professores de EJA da região nas reuniões de formação organizadas pela DIPED-EJA, na DRE-PJ, expressaram-se no fato de que, embora a referida divisão objetivasse sensibilizar os docentes quanto à necessidade de reorganizar o currículo da EJA, a partir da matriz crítico-emancipatória, ela não foi capaz de viabilizar a participação de todos os professores da região nos encontros de formação que organizou. Dessa forma, a decisão sobre a participação dos educadores, para além da cota oficialmente estipulada, ficou a cargo dos diretores das unidades escolares.

Ademais, diante do resultado das eleições municipais de 2016, em que o candidato João Doria (PSDB) foi eleito, a continuidade da política de formação de professores de EJA que a DIEJA buscou implementar, inspirada no referencial freireano, colocou-se como um problema a ser enfrentado pelos educadores da RME que faziam adesão a esse pensamento, frente a eminente alternância da administração pública. Nesse sentido, os resultados da pesquisa apontaram para a necessidade de instituírem-se mecanismos legais que garantam, democraticamente, a continuidade de propostas de formação de professores que atendam aos interesses dos professores e contribuam com a melhoria da qualidade social da educação.

Em relação aos condicionantes institucionais, a análise dos dados empíricos permitiu verificar que a possibilidade de interlocução com formadores externos, da universidade, que assumem o referencial freireano, representou um elemento significativo que contribuiu para o aprofundamento das discussões coletivas acerca dos pressupostos teórico-metodológicos do pensamento de Paulo Freire e para sua incorporação nas políticas e nas práticas de formação de professores de EJA investigadas, no período 2013-2016. Em contrapartida, a alta rotatividade do corpo administrativo e docente, resultante do processo de remoção dos profissionais da RME, previsto na legislação municipal, configurou-se como um fator dificultador, mas não impeditivo, da presença e da reinvenção do pensamento de Paulo Freire nas ações de formação investigadas, uma vez que esse mecanismo institucional pode interferir na qualidade, na continuidade das discussões e na constituição dos grupos de educadores em formação.

No contexto da pesquisa, os condicionantes ideológicos destacaram-se por terem exercido uma influência significativa, no sentido de possibilitar a materialização e recriação do pensamento freireano. Parece acertado dizer que tais condicionantes apresentaram mais força do que os demais, uma vez que todos os elementos identificados se colocaram a favor da possibilidade de ressurgimento da proposta de formação permanente discutida na pesquisa.

É possível que o manifesto vigor de tais condicionantes, no bojo da investigação, tenha se dado em função da opção progressista, comprometida com a transformação social, assumida pela administração 2013-2016. Acredita-se que, no caso estudado, a orientação da política pública favoreceu a expressão desses condicionantes, no âmbito das políticas e práticas de formação de professores investigadas, criando espaços para a atuação das lideranças político-pedagógicas progressistas e para que a DIEJA pudesse propor uma política de EJA alicerçada em pressupostos freireanos.

Considerações finais

O conjunto dos achados desta pesquisa permite afirmar que, no contexto investigado, ainda que tenham sido identificados condicionantes político-sociais, materiais e institucionais que estabeleceram limites ao desenvolvimento de processos formativos radicalmente alinhados à perspectiva freireana, eles não foram capazes de impedir que o pensamento de Paulo Freire ressurgisse nas orientações da DIEJA e no trabalho de formação de educadores de EJA, da DRE-PJ. Pode-se dizer que, na gestão 2013-2016, a força dos indicadores que contribuíram positivamente para a concretização e a recriação do pensamento de Paulo Freire, no quadro geral dos condicionantes de análise, se sobrepôs aos indicadores limitantes. Daí que tenha sido possível constatar a presença de categorias que definem a formação permanente freireana, nas políticas e nas práticas formativas de educadores de EJA.

Diante disso, parece acertado dizer que a orientação progressista assumida pela administração petista, no período estudado, contribuiu para que tais condicionantes ganhassem força, mesmo diante de contradições evidenciadas na análise de dimensões mais gerais da política educativa da RME. Desse modo, a política educativa mais ampla da RME, embora ambígua, até mesmo mostrando pontos de aproximações com propostas neoliberais, pautou-se, de maneira geral, em princípios democráticos e de qualidade social da educação, que não se contrapuseram às intenções político-pedagógicas da DIEJA, tampouco daquelas assumidas pela DRE-PJ, de desenvolver os trabalhos de formação de professores de EJA, tendo como referência principal os pressupostos teóricos-metodológicos de Paulo Freire.

Observe-se porém que, em contexto de gestões comprometidas com os interesses neoliberais e com a manutenção das desigualdades, esses mesmos condicionantes podem perder força e aqueles que obstaculizam o ressurgimento do pensamento freireano em redes públicas de ensino podem vir a se fortalecer, fazendo com que as possibilidades de concretização da proposta de formação permanente freireana sejam minimizadas, no âmbito das políticas e das práticas formativas, até que haja uma nova conjuntura política que regule o jogo de forças e a expressão dos condicionantes identificados nesta pesquisa.

Este estudo contribuiu para acrescer evidências que demonstram como o legado de Freire tem sido recriado em redes públicas de ensino. Tem a potencialidade de inspirar, portanto, políticas públicas e processos formativos de educadores que tenham como horizonte a educação problematizadora e humanizadora defendida por Paulo Freire.

Notes

1Gestão mais recente do Partido dos Trabalhadores (PT), na capital paulista, sob administração do prefeito Fernando Haddad.

2Setor da SME/SP responsável pela proposição e pela implementação da política de EJA no município.

3Esse intento foi evidenciado especialmente nos documentos: Educação de Jovens e Adultos: princípios e práticas pedagógicas (SÃO PAULO, 2015, 2016) - volumes 1 e 2.

4O período 1989-1992, no qual Paulo Freire assumiu o cargo de Secretário da Educação na SME/SP, a convite da prefeita Luiza Erundina de Sousa (PT), ficou conhecido como Gestão Paulo Freire. Na ocasião, embora Freire tenha exercido o cargo de Secretário da Educação somente nos dois anos iniciais do mandato, as propostas da política educacional, definidas no início da sua gestão, tiveram continuidade nos anos subsequentes, sob a direção do Secretário Mario Sérgio Cortella.

5O uso deliberado do adjetivo freireano e flexões, assumido neste texto, é uma questão de preferência, pela compreensão de que a manutenção da grafia integral do sobrenome do autor destaca com mais vigor a procedência das produções: a matriz de pensamento de Paulo Freire. Em alguns redutos acadêmicos significativos, seguiu-se, pois, o seguinte critério: à ortografia original do antropônimo, foi acrescentado o sufixo ano, resultando no adjetivo freireano.

6Ser mais, no sentido do desenvolvimento e da potencialização das diferentes dimensões do ser humano (moral, intelectual, afetiva, material, social, etc.) e da garantia das condições de vida digna para todos e todas.

7Compreendidos aqui como as teorias implícitas presentes na prática dos pesquisadores, incluindo crenças, anseios, valores e saberes construídos em seu percurso de formação (MORAES, 2003).

8A Divisão Pedagógica (DIPED) da DRE-PJ, no período 2013-2016, era responsável pela coordenação geral das ações de formação continuada de professores e gestores de todos os níveis e modalidades de ensino. O trabalho da DIPED era organizado em 29 frentes. A frente EJA coordenava diretamente as ações de formação de educadores de EJA observadas na DRE-PJ, no período da pesquisa.

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Recebido: 10 de Agosto de 2020; Revisado: 19 de Setembro de 2020; Aceito: 20 de Setembro de 2020; Publicado: 25 de Setembro de 2020

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