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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.17  Ponta Grossa  2022  Epub 24-Maio-2022

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.17.20234.056 

Artigos

Pierre Bourdieu e a questão dos intelectuais

Pierre Bourdieu and the issue of the intellectuals

Pierre Bourdieu y la cuestión de los intelectuales

*Professor no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Paraná, Brasil. E-mail: <ndoutorado@yahoo.com.br>.


Resumo:

Bourdieu e a questão dos intelectuais são o objeto deste artigo, cuja preocupação é produzir uma interlocução entre a história intelectual e a teoria dos campos. Apoia-se em Meditações pascalianas e A ontologia política de Martin Heidegger, sem deixar de mencionar suas outras produções e as discussões da historiografia no que diz respeito ao problema dos intelectuais. Faz-se uma incursão nessas duas obras para evidenciar a crítica à tradição escolástica, especialmente à história da filosofia e à história das ideias, bem como sublinhar a fecundidade de sua sociologia dos intelectuais aos escritos da história intelectual. O movimento analítico bourdieusiano permite identificar, no pensamento heideggeriano, as homologias indiretas (eufemizadas) entre problemas filosóficos e questões políticas, assim como as homologias diretas entre interesses políticos e elementos do campo de produção cultural nos escritos de intelectuais de estratos intermediários (mediadores e despertadores), como testemunham aqueles que difundiam o “humor völkisch”.

Palavras-chave: Bourdieu e teoria dos campos; Sociologia dos intelectuais; História intelectual

Abstract:

Bourdieu and the issue of the intellectuals are the focus of this paper, whose concern is to produce a dialogue between the intellectual history and the field theory. It is supported by Pascalian Meditations and The Political Ontology of Martin Heidegger, along with his other productions and the discussions about historiography related to the problem of the intellectuals. It was surveyed these two works to evidence his critique to the scholastic tradition, mainly to the history of philosophy and the history of ideas, and also to highlight the fruitfulness of his sociology of intellectuals and the intellectual history writings. Bourdieu’s analytical movement allows the identification, in Heidegger’s thoughts, of indirect homologies (euphemized) between philosophical problems and political issues, as well as the direct homologies between political interests and elements of the cultural production in writings by intellectuals of intermediate level (mediators and creators), as confirmed by the writings of those disseminating the “völkisch humor”.

Keywords: Bourdieu and the field theory; Sociology of intellectuals; Intellectual history

Resumen:

Bourdieu y la cuestión de los intelectuales son el objeto de este artículo, cuya preocupación es producir una interlocución entre la historia intelectual y la teoría de los campos. Se basa en las Meditaciones pascalianas y La ontología política de Martin Heidegger, sin dejar de mencionar otras producciones y las discusiones de la historiografía en lo que respecta al problema de los intelectuales. Se hace una incursión en esas dos obras para evidenciar la crítica a la tradición escolástica, especialmente a la historia de la filosofía y a la historia de las ideas, como también destacar la fecundidad de su sociología de los intelectuales a los escritos de la historia intelectual. El movimiento analítico bourdieusiano permite identificar, en el pensamiento heideggeriano, las homologías indirectas (eufemizadas) entre problemas filosóficos y cuestiones políticas, así como las homologías directas entre intereses políticos y elementos del campo de producción cultural en los escritos de intelectuales de extractos intermedios (mediadores y despertadores), como lo testifican aquellos que difundían el “humor völkisch”.

Palabras clave: Bourdieu y teoría de los campos; Sociología de los intelectuales; Historia intelectual

Introdução

Bourdieu e a questão dos intelectuais1 são centrais neste texto, cuja preocupação é estabelecer uma interlocução entre a história intelectual e a teoria dos campos.2 A história intelectual e a história dos intelectuais já têm uma certa trajetória, pois desde os anos 1980 ganham mais espaço na historiografia. No caso francês, La marche des idées, de François Dosse (2003), apresenta uma síntese de sua reinserção acadêmica. O autor assinala que a reviravolta francesa está atrelada à criação do Groupe de recherche sur l’histoire des intellectuels (GRHI), dirigido por Jean-François Sirinelli, em 1985, à obra Les intellectuels en France: de l’Affaire Dreyfus à nos jours de Pascal Ory e Jean-François Sirinelli, lançada na França em 1986 (ver ORY, SIRINELLI, 2002), bem como ao Dictionnaire des intellectuels français, sob a direção de Jacques Julliard e Michel Winock, lançado em 1996 (ver JULLIARD; WINOCK, 2002), e ao livro O século dos intelectuais, de Michel Winock, lançado na França em 1997 (ver WINOCK, 2000).

A partir dos anos 2000, é possível acompanharmos uma parte desse movimento por meio dos próprios escritos de François Dosse. De um lado, ele apresenta uma síntese dos estudos dos intelectuais, notadamente na já citada La marche des idées3 e em Le pari biographique: écrire une vie, lançada, na França, em 2005 e, no Brasil, em 2009, com o título O desafio biográfico: escrever uma vida (DOSSE, 2009). De outro, ele produz suas próprias análises, como mostram seus livros específicos de certas personagens, como, por exemplo, Michel de Certeau: le marcheur blessé (DOSSE, 2007b), Pierre Nora: homo historicus (DOSSE, 2011), bem como os mais recentes que produzem uma prosopografia dos intelectuais franceses: La saga des intellectuels français: à l’épreuve de l’histoire (1944-1968) e La saga des intellectuels français: l’avenir en miettes (1968-1989), publicados em 2018 (DOSSE, 2018a, 2018b).

É importante assinalarmos que, em Le pari biographique (Um desafio biográfico), Dosse (2009) traz muitas pesquisas que são incluídas no que denomina de estudos biográficos. Nela, os estudos de Bourdieu integram suas discussões de modo lateralizado, a fim de exemplificar um modelo a ser evitado. Na própria França, merecem destaque as produções do historiador Christophe Charle, em particular Naissance des “intellectuels” (1880-1900), de 1990, La république des universitaires (1870-1940), de 1994, e Les intellectuels en Europe au XIXe siècle: essai d’histoire comparée (1996), que dialogam com a sociologia bourdieusiana.4 Aqui, ele analisa estudantes, professores universitários, escritores e suas inserções nas disputas intelectuais, enfatizando uma história social dos intelectuais menos interessada “[...] em clarificar as ideias do que situar o autor no campo dos debates sobre os intelectuais” (CHARLE, 1996, p. 18, tradução nossa). Charle é representativo de uma história intelectual interessada em romper com a tradicional história das ideias (análise internalista) e com a história determinista (história externalista).

Sem deixarmos de dialogar com as análises da historiadora Helenice Rodrigues da Silva (2002, 2003), assumimos uma fronteira menos rigorosa entre história intelectual e história dos intelectuais, assim como entre esses dois domínios e a sociologia dos intelectuais. No texto “História intelectual em questão”, Silva (2003) procura diferenciar os dois domínios historiográficos, inclusive com o subtítulo “História intelectual versus história dos intelectuais”, tomando os estudos de Sirinelli para explicitar as singularidades de cada uma dessas formas de escrita historiográfica. Nesse horizonte interpretativo de Silva (2003), inscreve-se a intervenção de François Dosse, cujas discussões indicam uma certa prevalência da história intelectual, como mostraremos no primeiro item deste artigo. De todo modo, o objetivo desta análise é cotejar algum diálogo entre estudos que se instituem tanto na história intelectual quanto na história dos intelectuais com as produções de Pierre Bourdieu. Nesse enfoque, parece-nos importante relativizar a diferenciação assinalada por Silva (2003) entre história dos intelectuais e sociologia dos intelectuais, notadamente ao sublinhar que a primeira tenderia “a privilegiar a conjuntura” e a segunda, “[...] praticada pelos sociólogos, interessa-se, essencialmente, pelo nível das estruturas” (SILVA, 2003, p. 19). Essa observação não implica negar as fronteiras disciplinares, pois são elementos importantes em todos os domínios. Entretanto, a preocupação é explorar tanto as fronteiras das coisas como as coisas de fronteiras, pois, se a história intelectual é “[...] um domínio plurisdisciplinar por excelência” (SILVA, 2003, p. 16), resta-nos, ao promover esse conjunto de interlocução, o interesse de estabelecermos algumas possibilidades de escrita que tratem do problema dos intelectuais.

É nesse horizonte que inscrevemos este artigo, cujo escopo é construir-se a partir do diálogo com Bourdieu. Assim sendo, L’Ontologie politique de Martin Heidegger (BOURDIEU, 1989)5 e Méditations pascaliennes (BOURDIEU, 2001)6 são escritos fecundos para refletir a relação entre história intelectual e sociologia dos intelectuais, sem deixar de fazer referência aos livros Les règles de l’art: genèse et structure du champ littéraire (BOURDIEU, 1992/1996) e Manet: une révolution symbolique (BOURDIEU, 2013).

Limites e poderes do pensamento

A tradicional história das ideias ou mesmo a história da filosofia são objetos de discussão de uma diversidade de autores/as das Ciências Sociais e da História.7 Nesse movimento, inscrevem-se os estudos de Pierre Bourdieu, seja ao desenvolver uma análise geral da filosofia (Meditações pascalianas), seja ao detalhar o pensamento heideggeriano no campo de produção ideológica e no cânone filosófico (A ontologia política de Martin Heidegger).

Na introdução de Meditações pascalianas (BOURDIEU, 2001), o autor informa que decidiu problematizar questões específicas que foram deixadas até aquele momento a cargo dos próprios filósofos. Na sequência, proclama sua primeira premissa:

Creio que, antes de tudo, convém refletir tanto acerca dos limites do pensamento e dos poderes do pensamento, como a respeito das condições de seu exercício, que levam tantos pensadores a ultrapassar os limites de uma experiência social forçosamente parcial e local, geográfica e socialmente, circunscrita a um pequeno cantão, sempre o mesmo, do universo social, e até intelectual, tal como demonstra a estreiteza das referências invocadas, muitas vezes reduzidas a uma disciplina e a uma tradição nacional. (BOURDIEU, 2001, p. 11).

O intento de Bourdieu é problematizar a forma como a própria filosofia se constitui, isto é, o método que ela aplica a si mesma para definir sua própria imagem, ou melhor, promover uma análise sócio-histórica da filosofia. Nesse sentido, é bastante pertinente ao diálogo entre história intelectual e sociologia dos intelectuais. Não há um cancelamento do estudo do pensamento, elemento fundamental à história intelectual, como exploraremos no próximo item, ao abordar a forma de análise de Martin Heidegger. É necessário problematizarmos os limites e os poderes do pensamento, das obras, das ideias. Tais elementos estão relacionados às condições sociais, isto é, aos diferentes fatores que condicionam a produção do pensamento, pois é bastante comum as ideias circularem sem seus contextos de produção, como Bourdieu (2002) sublinha no seu artigo Les conditions sociales de la circulation internationale des idées.8

A citação anterior explicita uma abordagem das ideias que procura superar a oposição entre análise interna e análise externa. No nosso entendimento, essa é uma premissa compartilhada pelos integrantes da história intelectual francesa. No entanto, no exercício analítico da composição dos elementos internos e externos, aparecem divergências, pois o principal desafio consiste em estabelecer a relação entre tais aspectos constitutivos da atividade intelectual. Nesse sentido, parece existir maior dificuldade de aproximação. As críticas de Dosse (2018b) a Bourdieu indicam tal divergência, pois ele reclama que o sociólogo aprisiona os indivíduos nas estruturas dos campos. O historiador, por sua vez, desejaria uma escrita intelectual mais dinâmica, mais próxima do que o próprio biografado imagina fazer, embora ele próprio considere as duas facetas de grande importância.

De um lado, Dosse (2018b, p. 16, tradução nossa) diz que “[...] o estudo dos modos de engajamento político dos intelectuais é indispensável, mas ele trata da menor parte da atividade intelectual”. Essa nota evidencia uma certa prevalência de uma história do pensamento. Aqui está a profunda relação entre história intelectual e filosofia, pois as obras produzidas pelos indivíduos ocupam um lugar fundamental. De todo modo, Dosse procura superar a velha história das ideias, instaurando uma complexa articulação entre os fatores internos e externos. No entanto, sua posição explicita uma certa divergência em relação à sociologia dos intelectuais de Bourdieu. No nosso entendimento, refere-se à forma de tratamento das mediações entre autor/a e obra. Para Bourdieu, não necessariamente o engajamento político dos intelectuais se refere à menor parte da história intelectual, mas se referiria a outra dimensão constitutiva das ideias. Acima de tudo, é a definição do objeto que precisará se a história dos intelectuais constitui a maior ou menor parte, pois, em caso de estudos de grandes personagens, as obras podem ganhar visibilidade. No entanto, em situação de personalidades intermediárias (mediadores e despertadores), a atividade política poderá ter maior pertinência. Portanto, do ponto de vista historiográfico, cabe ao/à pesquisador/a compreender essa complexidade ao manejar a relação entre teoria e empiria a partir de cada objeto. Se, de uma parte, Dosse (2018b) sustenta que o engajamento político representa a menor parte da história intelectual; de outro lado, afirma que essa atividade é “[...] alimentada de visões de mundo, de representações, práticas empregadas por escolas de pensamento, de paradigmas no sentido amplo que inspiram orientações convergentes associadas a momentos singulares” (DOSSE, 2018b, p. 16, tradução nossa). Aqui residiria a maior parte da história intelectual, pois deveria restituir as obras dos intelectuais no bojo desse amplo clima da atividade do pensamento. Essas duas dimensões constituem os elementos internos e externos de uma análise. O desafio é articulá-las, pois “[...] permite mostrar a complexidade das situações e se afastar das relações causais estreitas, como aquelas que presidem a lógica que reduz uma personagem a sua posição social, espacial ou à sua personalidade psicológica” (DOSSE, 2018b, p. 16, tradução nossa).

Notemos que essa passagem indica uma classificação reducionista do tipo de análise bourdieusiana, como também podemos observar em Dosse (2009). É importante assinalarmos que a teoria dos campos, embora procure mostrar a organização de um determinado espaço social, indicando os agentes, suas posições e tomadas de posição, jamais sustenta a absoluta ligação entre posição e tomadas de posição, conforme a passagem seguinte:

[...] a relação que vai das tomadas de posição às posições não é mecânica. A uma posição objetiva no espaço social objetivo não corresponde mecanicamente uma tomada de posição política, religiosa, estética etc. Existe uma autonomia do espaço social que poderíamos qualificar de política em relação às classificações objetivas. (BOURDIEU, 2020, p. 93).

Essa ideia é reiterada por Gisèle Sapiro (2020a) no artigo Repensar o conceito de autonomia para uma sociologia dos bens simbólicos:

Assim, contrariamente ao que frequentemente se diz nos comentários sobre a teoria do campo, a relação entre habitus e campo não tem nada de mecânico: as disposições orientam as escolhas que os produtores culturais fazem num “espaço dos possíveis” estruturado, referindo-se à sua própria história, que constitui o campo. Essas escolhas e a socialização no campo conduzem a uma “transubstanciação” das disposições ético-políticas que as tornam, às vezes, irreconhecíveis, notadamente nas obras literárias, artísticas ou teóricas, como mostra Bourdieu (1988) no caso de Heidegger. (SAPIRO, 2020a, p. 10).

A teoria dos campos estabelece-se como uma alternativa às análises dos bens simbólicos. Bourdieu critica os estudos de caráter puramente lógico, tão comum na filosofia e na clássica história das ideias. Igualmente, ele tinha muitas reservas à história social do pensamento fortemente marcada pelos estudos deterministas.9 Não se trata de divergência de premissa, mas de formas de mediação empregadas por Bourdieu e Dosse. No caso de Bourdieu, o conceito de campo exerce uma função fundamental, pois os indivíduos estariam imersos no espaço social, que é recortado pelos mais variados microcosmos, o que requer de cada pesquisador/a o cuidado e a atenção para restitui-los em cada contexto geográfico e histórico, tal como compreender as posições e as tomadas de posição dos agentes. A teoria dos campos nasce de um esforço metodológico de Bourdieu para explicar os problemas de estudos, como testemunham Les règles de l’art: genèse et structure du champ littéraire (BOURDIEU, 1996) e Manet: une révolution symbolique (BOURDIEU, 2013). Sobre esse ponto, sublinhamos uma passagem de Gisèle Sapiro:

Em Bourdieu, a reflexão sobre a autonomia nasceu de uma questão metodológica: podemos autonomizar os domínios culturais como objetos de estudo? Ou uma tal operação somente é possível se estudar-se o processo histórico de autonomização desses espaços de atividades (quer trate-se do campo literário, do campo artístico, do campo científico etc.)? (SAPIRO, 2020a, p. 9).

Como se observa, ao/à pesquisador/a incumbe-se a complexa tarefa de pôr em funcionamento esse aparato metodológico e conceitual, inexistindo qualquer concessão à generalização ou à aplicação mecânica. Essa observação é reiterada nos comentários de Roger Chartier, ao ser indagado a respeito da fecundidade dos conceitos de campo, prática e habitus:

Tais categorias podem ser utilizadas em todas as sociedades da história. O grande risco seria aplicá-las mecanicamente. A sociologia de Bourdieu é um modo de compreensão do mundo social que não se define em função de uma cronologia e não está ligada apenas à compreensão do mundo contemporâneo. O conceito é sempre operatório, mesmo se as realidades históricas que ele descreve sejam móveis. Os historiadores que trabalham sobre a literatura do século XVII produziram um debate para saber se a Academia Francesa, quando foi criada, ou as diferentes formas do que chamamos de “República das Letras” representavam uma primeira configuração de um campo que se distanciava do poder, ou se essa produção literária estava inscrita no interior da Monarquia absolutista e do poder aristocrático. (CHARTIER, 2008, p. 90, tradução nossa).

Dosse (2018b, p. 16-17, tradução nossa), por sua vez, menciona que seu modelo de história intelectual “[...] supõe uma entrada nos próprios discursos, uma imersão nas obras [...]”. Nessa passagem, é possível notar uma certa ênfase às ideias, embora ele reitere em vários momentos a importância de superar os conflitos entre os enfoques internalistas e externalistas. À título de ilustração, A história do estruturalismo de Dosse10, conforme salienta Helenice Rodrigues da Silva (2002, p. 24), “[...] foi recebida pela crítica especializada como sendo mais uma história das ideias do que uma história intelectual”. Essa nota de Silva (2002) nos ajuda a compreender alguns ângulos dessa divergência entre Dosse e Bourdieu. Como veremos no item seguinte, Bourdieu pretende operar um tipo de análise que problematize a filosofia heideggeriana, sem reduzir seu pensamento aos interesses ideológicos do campo político, mas sem deixar de mostrar alguma relação entre a obra filosófica e as cosmovisões que tinham forte reverberação nas relações do mundo social. Em outros termos, nesse empreendimento, já podemos observar uma preocupação em indicar como Heidegger se insere no cânone filosófico, ao mostrar sua relação com o léxico e com as questões pertinentes ao domínio específico, além de sublinhar como seus escritos teóricos objetivaram os problemas do mundo político em uma linguagem metafísica. Desse modo, na leitura de Bourdieu, não é possível dissociar uma obra da trajetória do/a autor/a.11 No entanto, uma ideia não poderá ser compreendida apenas pelos elementos externos. Ao estudo dos pensamentos, caberá o desafio de estabelecer essas complexas relações entre as condições internas e externas.

Em Meditações pascalianas, o empreendimento de Bourdieu (2001) é contra a tradição filosófica. Ele reitera a preocupação de sua sociologia dos intelectuais, notadamente ao afirmar que o próprio desejo ou afeição ao pensamento puro tem uma gênese social e histórica: “Os que gostam de acreditar no milagre do pensamento “puro” devem resignar-se a admitir que o amor à verdade ou à virtude, como qualquer outra espécie de disposição, deve necessariamente algo às condições em meio às quais se formou, ou seja, a uma posição e a uma trajetória sociais” (BOURDIEU, 2001, p. 12).

Essa disposição ao pensamento puro caracteriza o que ele chama de razão escolástica, uma espécie de “[...] recalque, tão poderoso no mundo puro e perfeito do pensamento, de tudo o que se refere a realidade social” (BOURDIEU, 2001, p. 15). Esse esquecimento das condições sociais (recalque) está na própria constituição da razão escolástica, capitaneada pela história da filosofia que é praticada pelos próprios filósofos. É fundamental restituirmos esse processo de sublimação das condições sociais e de predomínio do pensamento puro. De modo preciso, é necessário entendermos, na própria historicidade, como se desenvolveu a percepção de que há algo que diz respeito apenas ao pensamento, à reflexividade.

É pelo fato de estarmos enredados no mundo que parece haver algo de implícito no que pensamos e dizemos a seu respeito. No intuito de liberar o pensamento, não é possível contentar-se com esse retorno sobre si do pensamento pensante que em geral se associa a ideia de reflexividade; e apenas a ilusão da onipotência do pensamento pode fazer crer que a dúvida mais radical seja capaz de colocar em suspenso os pressupostos, ligados as nossas diferentes filiações, dependências e implicações, que mobilizamos em nossos pensamentos. (BOURDIEU, 2001, p. 19).

O autor problematiza a crença na onipotência do pensamento ou mesmo na capacidade de reflexão do sujeito como propala a história da filosofia, especialmente as filosofias do sujeito do século XX. Trata-se de uma crítica contundente à história da filosofia e à história das ideias. Como já dissemos, essa crítica ao pensamento desencarnado pode ser localizada em diferentes movimentos das Ciências Humanas. Contudo, a contribuição de Bourdieu é apresentar uma gênese dessa tradição escolástica que constitui e é constituída de maneira exemplar pela história da filosofia. Ele avança, nesse sentido, ao cotejar implicitamente o conceito de habitus, isto é, ao mostrar como as disposições incorporadas nos processos cognitivos, denominados de sistemas simbólicos (instrumentos de conhecimento e de comunicação), só podem ser compreendidas na história:

O inconsciente é a história – a história coletiva que produziu nossas categorias de pensamento, e a história individual por meio da qual elas nos foram inculcadas: por exemplo, é a história social das instituições de ensino (a mais banal de todas e ausente da história das ideias, tanto das filosóficas como das demais) e a história (esquecida ou recalcada) de nossa relação singular com essas instituições que podem nos oferecer algumas verdadeiras revelações sobre as estruturas objetivas e subjetivas (classificações, hierarquias, problemáticas, etc.) que, a despeito de nossa vontade, sempre orientam nosso pensamento. (BOURDIEU, 2001, p. 19).

Não existe pensamento puro, sem suporte social e histórico, muito embora parece haver. Bourdieu indica o caminho para uma história menos reducionista, isto é, aquela que considere os aspectos mais amplos, como do campo de produção ideológica, ou dos campos específicos, os elementos intermediários (história das instituições), os fatores mais particulares (restituição das posições e tomadas de posição dos agentes no seio das instituições e campos). Como veremos no próximo item, em A ontologia política de Martin Heidegger, Bourdieu (1989) procura realizar essa proposta de análise ao inscrever o referido filósofo nos dois espaços: no campo de produção ideológica e no campo filosófico.

Se não existe pensamento puro, embora pareça, quer dizer que há uma história recalcada em que se origina aquilo que Bourdieu (2001) chama de disposição escolástica, isto é, uma disposição “[...] que tende a colocar em suspenso as exigências da situação, as constrições da necessidade econômica e social, e as urgências ou as finalidades daí derivadas” (BOURDIEU, 2001, p. 22-23). Essa condição ganha contornos mais precisos com o processo de constituição de certos espaços sociais com algum tipo de autonomia, que estão relacionados à divisão social do trabalho (Durkheim) e diferenciação das atividades sociais (Weber). Esse mecanismo é interpretado por Bourdieu (2001, p. 26) como uma espécie de ambiguidade da disposição escolástica, ou seja, “[...] aquisições universais tornadas acessíveis devido a um privilégio exclusivo – deriva do fato de que a ruptura escolástica com o mundo da produção e ao mesmo tempo ruptura liberadora e separação, desconexão, possuindo a virtualidade de uma mutilação”. Tal ambiguidade se apresenta porque:

O cancelamento da necessidade econômica e social autoriza a emergência de campos autônomos, espécies de “ordens” (no sentido pascaliano), conhecendo e reconhecendo apenas a lei que lhe é própria e, por outro lado, salvo uma vigilância especial, ameaça condenar o pensamento escolástico aos limites dos pressupostos ignorados ou recalcados tal como determina essa retirada do mundo (BOURDIEU, 2001, p. 26).

Conforme Bourdieu (2001, p. 28-29), “[...] a disposição escolástica deve seus traços mais significativos ao processo de diferenciação pelo qual os diversos campos de produção simbólica tornaram-se autônomos e constituíram-se como tais, distinguindo-se, dessa forma, do universo econômico, o qual também estava em constituição”.

Não é o caso de explorar o conjunto dos estudos em que Bourdieu mostra a emergência de certos espaços com algum tipo de autonomia, isto é, com funcionamento regido por algum interesse particular, dissociando-se de valores exteriores. A ideia central deste primeiro item foi posicionar Pierre Bourdieu no debate dos estudos que versam sobre o problema da constituição das ideias, das obras, ou mesmo, dos/as autores/as e intelectuais.

Estudos de intelectuais ao modo bourdieusiano

No primeiro capítulo do livro A ontologia política de Martin Heidegger12, Bourdieu (1989) explicita sua posição perante duas formas interpretativas: “A análise adequada se baseia numa dupla rejeição: ela recusa tanto a pretensão do texto filosófico à autonomia absoluta, e a recusa correlata a toda referência externa, como a redução direta do texto às condições mais gerais de sua produção” (BOURDIEU, 1989, p. 12). Aqui se mostra a recusa à escrita da história da filosofia ou mesmo da tradicional história das ideias, assim como à escrita de uma história determinista do pensamento. Trata-se de operacionalização da hipótese metodológica da teoria dos campos, como sublinha Gisèle Sapiro (2020a). Nesse movimento, de um lado, conforme Bourdieu (1989, p. 12), “[...] pode-se reconhecer a independência, mas com a condição de ver claramente que ela é apenas um outro nome da dependência com respeito às leis específicas do funcionamento interno do campo filosófico”. De outro, “[...] pode-se reconhecer a dependência, com a condição de se levar em conta as transformações sistemáticas cujos efeitos suportam o fato de que ela só se exerce por intermédio dos mecanismos do campo filosófico” (BOURDIEU, 1989, p. 12)13.

Essa exposição indica a hipótese metodológica da teoria dos campos, cujo principal desafio de cada investigador/a é testar a fecundidade dessa proposição. No caso de estudos historiográficos, notadamente daqueles que retratam intelectuais, é fundamental que façamos reflexões para contextualizar o uso de Pierre Bourdieu. Não se trata de transportar a ideia de campo e buscar em diferentes lugares e tempo a existência desses espaços sociais. Ao contrário, essa teoria estimula estudos que retratam a ausência de espaços específicos, isto é, de campos sociais demarcados por fronteiras tênues, como indica Ana Paula Hey (2008a, 2008b) ao tratar de campo acadêmico e campo político no Brasil.

Em estudos desenvolvidos por nós (CAMPOS, 2007, 2008a, 2008b, 2009, 2010, 2013; CAMPOS; SOUZA, 2018; SOUZA; CAMPOS, 2017, 2021), que retratam o período entre o final do século XIX e a primeira metade do século seguinte, podemos observar a grande dificuldade de existência de instituições que simbolizassem alguma autonomia dos campos. Por exemplo, na história do Ensino Superior paranaense, da primeira metade do século XX, a articulação entre agentes do mundo universitário e do universo político é quase direta, por vezes sendo tais espaços compostos pelas mesmas pessoas ou com vinculação muito estreita. Essa percepção se faz presente na constituição da própria Universidade de São Paulo, pois, muito embora um projeto universitário que se pretendia modelar no Brasil, não deixava de estar atravessado pelos interesses acadêmicos e pelas pretensões políticas dos grupos dominantes e dirigentes paulistas (MICELI, 2001; CARDOSO, 1982). Na história da imprensa, é notável a forte relação entre jornalismo, interesses da esfera política e da seara econômica (CAPELATO, 1980, 1989). Desse modo, nessas situações, opera-se muito mais pela ausência da autonomia, isto é, pela presença da heteronomia para nos referirmos aos estudos de Gisèle Sapiro, especialmente La guerre des écrivains (SAPIRO, 1999). Essa complexa relação entre autonomia e heteronomia dos campos é posta em discussão pelos estudos de Bourdieu. Nessa direção, isso parece ser importante de considerarmos nas análises da história intelectual que dialogam com esse sociólogo. Sobre essa dimensão, uma passagem da entrevista de Sapiro (2013) se mostra muito elucidativa:

No coração está a problemática teórica da autonomia; o que quer dizer e através de que meios ela se traduz. Como pensá-la e como pensar também a heteronomia, porque ela me interessava talvez mais do que a autonomia. Isso estava no centro de minha postura. E continua, eu nunca parei de trabalhar sobre a questão da autonomia, não sei por que, mas é o que me atrai. (SAPIRO, 2013, p. 24-25).

Nesse movimento, inscreve-se a potencialidade de Bourdieu aos estudos dos intelectuais. Esse posicionamento indica a centralidade da teoria dos campos de Bourdieu. Para ele, “[...] é preciso, pois, abandonar a oposição entre a leitura política e a leitura filosófica, e submeter a uma leitura dupla, inseparavelmente política e filosófica” (BOURDIEU, 1989, p. 12, grifo do autor). É uma proposição levada a cabo ao longo desse escrito sobre Heidegger, contrapondo-se aos detratores desse filósofo que postulavam a recusa de seu pensamento devido as suas ligações com o Nacional-Socialismo, tal como aos defensores da separação total entre obra e autor (“filosofia pura”). Esse assinalamento de leitura dupla assume o sentido “[...] pela referência a dois espaços sociais aos quais correspondem dois espaços mentais” (BOURDIEU, 1989, p. 12-13). O problema presente nas leituras apartadas é exposto nos seguintes termos:

Detratores que não admitem a filosofia em nome da afiliação ao nazismo ou bajuladores que separam a filosofia da dependência ao nazismo, todos entram em acordo, por ignorar que a filosofia de Heidegger poderia ser somente a sublimação filosófica imposta pela censura específica do campo de produção filosófica, dos princípios políticos ou éticos que determinaram a adesão do filósofo ao nazismo. Pela sua obstinação ao se interrogarem sobre os fatos biográficos sem colocá-los em relação à lógica interna da obra, os adversários de Heidegger reconhecem aos seus defensores a distinção que estes reivindicam explicitamente entre o “estabelecimento crítico dos fatos” e a “hermenêutica dos textos”. (BOURDIEU, 1989, p. 13, grifo do autor).

Devemos atentar que esse escrito do sociólogo trata de um renomado filósofo alemão, considerado um dos maiores do século XX. Isso implica duas considerações: de um lado, trata-se de um estudo de uma grande personagem, uma entidade quase hagiográfica, cuja tendência é refratar todo tipo de relação com as forças externas. De outro, embora essa propensão, uma grande personalidade não é imune às condições sociais de produção de uma obra. Há uma certa ambiguidade na trajetória de um intelectual, ou se quisermos, uma dualidade ou multiplicidade de condicionantes. Bourdieu mostra como o forte capital simbólico acumulado por Heidegger, no campo filosófico, é constitutivo de sua intensa penetração nesse “mundo à parte” e resulta em um certo eufemismo da linguagem própria do mundo político. “A fronteira é aquela que separa o profano e o profissional, que sabe o que quer dizer falar, porque conhece, ao menos de modo prático, o espaço no qual seu discurso encontrar-se-á desperdiçado” (BOURDIEU, 1989, p. 52).

Essa observação remete-nos às diferenciações entre as posições e as tomadas de posição dos intelectuais, pois quanto maior reconhecimento de uma personagem em um espaço específico, maior a probabilidade de resistência às restrições externas. Por consequência, quanto mais distante ou fora de um espaço específico, menor será o poder de refração às constrições de outros espaços sociais. Esses dois movimentos poderiam aproximar-se dos estudos que tratam de grandes personagens, isto é, de personalidades consagradas, como seria o caso de Heidegger, bem como os que recortam em indivíduos intermediários, em outras palavras, intelectuais que detêm pouco ou nenhum reconhecimento nos espaços específicos, mas têm intensa reverberação no mundo social. O próprio livro que trata de Heidegger permite essa segunda possibilidade de estudo dos intelectuais, prisma também presente na reflexão de Jean-François Sirinelli (2003), ao sublinhar a importância de

[...] não nos limitarmos às trajetórias apenas dos “grandes” intelectuais e de descermos até o estrato intermediário dos intelectuais de menor notoriedade, mas que tiveram importância enquanto viveram, e até a camada, ainda mais escondida, dos “despertadores” que, sem serem obrigatoriamente conhecidos ou sem terem sempre adquirido uma reputação relacionada com seu papel real, representaram um fermento para as gerações intelectuais seguintes, exercendo uma influência cultural e mesmo às vezes política. (SIRINELLI, 2003, p. 246).

Os estudos de Bourdieu possibilitam essa dupla condição nas investigações de história intelectual, pois podemos nos enveredar aos personagens com alto reconhecimento no campo acadêmico brasileiro ou naqueles que têm menor ou nenhum, mas com forte inserção em outros espaços, como nos movimentos sociais, universos político, religioso, etc.14 O capítulo “A filosofia pura e o zeitgeint” do livro de Bourdieu (1989) traz uma síntese da relação entre o pensamento puro e o espírito da época a fim de indicar um determinado clima do processo formativo de Heidegger. Ou se preferirmos, apresenta um conjunto de escritores alemães que integrava o estrato intermediário – intelectuais de menor notoriedade –, uma espécie de “despertadores”. Esse ambiente é descrito como discurso völkisch15, uma

[...] “mensagem literatiça destinada aos literatos”, nasce e renasce sem cessar, à margem da Universidade, nos círculos mundanos ou nos grupos artístico-intelectuais e floresce nas universidades. Isto, primeiro entre os estudantes e os professores subalternos, depois, no termo de uma dialética complexa, da qual a obra de Heidegger é um momento, entre os próprios mestres. (BOURDIEU, 1989, p. 24).

Ao longo dessa parte do livro, Bourdieu mostra como essa atmosfera constituía as origens sociais e culturais de Heidegger. Trata-se do primeiro nível da análise, o ater-se à posição desse filósofo no campo social (BOURDIEU, 2004a, 2004b). Bourdieu (2004b, p. 128) descreve que, “[...] em primeiro lugar, é necessário objectivar a posição no espaço social global do sujeito, a sua posição de origem e a sua trajectória, a sua pertença e as suas adesões sociais e religiosas”. Na parte final do capítulo, Bourdieu aproxima o pensamento de Heidegger da ambientação intelectual da Alemanha. De um lado, “[...] o nacionalismo, a exaltação da raça alemã e de suas ambições imperialistas, se expressam na linguagem política ou semipolítica da resolução e do domínio, do comando e da obediência, da vontade, do sangue, da morte e da aniquilação como modalidade da mobilização” (BOURDIEU, 1989, p. 51). De outro:

Eles podem também falar, como Heidegger, a linguagem metafísica ou quase metafísica de uma vontade de poder como vontade de querer, como afirmação de uma vontade posta a serviço não de fins mas da superação de si mesmo ou, ainda, a linguagem do afrontamento resolvido com a morte como experiência autêntica da liberdade. (BOURDIEU, 1989, p. 51).

Nesse momento, Bourdieu começa a análise do que denomina de segundo nível, a saber: o fixar-se à posição de Heidegger no campo dos especialistas (dos filósofos). Esse movimento representa o processo de sublimação filosófica, isto é, a substituição de um discurso que circulava em diferentes espaços sociais (uma certa vulgarização) pelo escrito propriamente filosófico. Nessa ótica, “[...] o niilismo político e a própria tradição nietzschiana, sem falar da vulgata ‘revolucionária’ conservadora de Jünger ou Spengler, devem dobrar-se às exigências da meditação ontológica do leitor dos pré-socráticos, de Aristóteles e dos teólogos cristãos” (BOURDIEU, 1989, p. 51-52). Isso está associado ao que Bourdieu entende como sentido de jogo, conhecimento das regras específicas de um espaço social. Para Bourdieu (1989, p. 52), “[...] é o conhecimento deste espaço dos possíveis que permite ‘prever as objeções’, isto é, antecipar a significação e o valor que, considerando as taxinomias em vigor, serão associados a uma tomada de posição determinada e desmentir de antemão as leituras recusadas”. Na mesma página, ele é assertivo ao dizer que “[...] um pensamento socialmente reconhecido como filosófico é um pensamento que implica na referência ao campo de tomadas de posição filosóficas e o domínio, mais ou menos consciente, da verdade da posição que ele ocupa nesse espaço” (BOURDIEU, 1989, p. 52). Nesse sentido, arremata Bourdieu (1989):

Pode-se supor que um filósofo tão seguro de sua profissão como Heidegger sabe o que faz quando escolhe Jünger como objeto de reflexão (sobretudo coletiva e pública): Jünger coloca as únicas questões (políticas) que Heidegger aceitou responder, as únicas questões (políticas) que fez como suas, ao preço de um trabalho de retradução, que permite ver na obra o modo de pensar filosófico. A transferência que ele opera de um espaço mental (e social) a um outro supõe uma ruptura radical, comparável àquilo que, com relação a um outro campo, chama-se “ruptura” ou “ruptura epistemológica”. A fronteira entre a política e a filosofia é um verdadeiro limiar ontológico: as noções dependentes da experiência prática e cotidiana e as palavras que as designam, frequentemente as mesmas, sofrem uma transformação radical que as torna irreconhecíveis aos olhos dos que aceitaram dar um salto mágico para outro universo. (BOURDIEU, 1989, p. 53, grifo do autor).

O salto de Heidegger é converter os problemas políticos em questões filosóficas. É esse movimento que se vê em O Ser e o tempo. É a retradução de um problema histórico em uma questão ontológica. Desse modo, para Heidegger, é o Ser que deve ser pensado, o único que se apresenta em plenitude para ser pensado. E essa atividade passa a ser um dever do filósofo, de buscar as determinações essenciais do ser nos entes ou pensar o Ser de modo próprio e autêntico. Esse léxico é específico do universo filosófico. “Ele só pode responder às questões filosóficas, isto é, às questões que lhe foram perguntadas ou que ele se pergunta, na única linguagem pertinente, a linguagem filosófica, às quais ele só pode (de fato e de direito) responder após tê-las reformulado em seu dialeto filosófico” (BOURDIEU, 1989, p. 54). Isso é uma condição para integrar o espaço filosófico, constituindo-se em uma crença tácita nas suas regras. Desse modo, assinala Bourdieu (1989, p. 54), “[...] não se deve esperar do filósofo que ele fale abertamente a linguagem crua da política”. A explicitação da posição de Heidegger no campo filosófico e a da sua tomada de posição é feita nos capítulos seguintes do livro de Bourdieu. No capítulo “O campo filosófico e o espaço dos possíveis”, mostra-se como o filósofo alemão se inseriu nesse universo específico, em particular ao trilhar o percurso do mundo universitário. Aqui opera-se uma certa biografia intelectual, pois Bourdieu sublinha as funções ocupadas pelo pensador alemão, assim como sua tomada de posição em relação aos problemas filosóficos, notadamente a despeito da tentativa de redução da Filosofia à Epistemologia. Nesse sentido, como afirma Bourdieu (1989):

Pertencer ao campo filosófico em um tal lugar e em tal momento, era se afrontar com o problema ou com o programa que se achava inscrito nas oposições constitutivas de sua estrutura: como ultrapassar a filosofia da consciência transcendental sem cair no realismo ou no psicologismo do sujeito empírico ou, pior, numa forma qualquer de redução “historicista”? A singularidade da operação filosófica de Heidegger reside no fato de que ela tende a criar no seio do campo filosófico, por um violento golpe filosoficamente revolucionário, uma nova posição, com respeito à qual todas as outras teriam de se redefinir. (BOURDIEU, 1989, p. 64).

Bourdieu (2004b) reitera a necessidade de compreender-se uma personagem no interior desse espaço social e seu lugar no espaço escolástico. De modo específico, o sociólogo indica que “[...] seria então perfeitamente inútil tentar compreender um pensamento filosófico tão evidentemente professoral como o de Heidegger fora de suas relações com o campo filosófico no qual ele se enraíza” (BOURDIEU, 1989, p. 60). Nesse movimento, Bourdieu operacionaliza o terceiro nível de sua análise, ao dizer que o objetivar significa tratar da “[...] pertença ao universo escolástico, prestando particular atenção à ilusão da ausência de ilusão, do ponto de vista puro, absoluto, ‘desinteressado’” (BOURDIEU, 2004b, p. 130). É em torno dessa premissa que ele reconstitui algumas facetas da trajetória de Heidegger, como podemos notar na passagem seguinte: “Não há dúvida que os desafios de Heidegger – e é nisso que ele é filósofo – são primordialmente, senão exclusivamente, inscritos no campo filosófico e que se trata para ele, antes de tudo, de criar uma nova posição filosófica, definida basicamente com relação a Kant ou mais exatamente aos neokantianos” (BOURDIEU, 1989, p. 76). Importante assinalarmos que o lugar das ideias também assume um sentido forte na sociologia dos intelectuais de Bourdieu, pois ele faz dois movimentos: de uma parte, apresenta as principais disputas do campo filosófico em que estava enredado Heidegger; de outra, mostra a produção ontológica desse filósofo. Nesse sentido, podemos dizer que consiste no momento de explicitação do pensamento na escrita da história intelectual.

Entretanto, Bourdieu recupera a produção filosófica de Heidegger (notadamente nos quatro últimos capítulos), a fim de mostrar as homologias entre campo filosófico e campo político, pois não há tomada de posição filosófica “[...] que não traga em si, por acréscimo, uma escolha acadêmica e uma escolha política e que não deva a esta segunda escolha mesmo que mais ou menos inconscientemente assumida, uma parte de suas determinações mais profundas” (BOURDIEU, 1989, p. 78). Heidegger, ao transportar para o espaço filosófico a primazia da filosofia em relação à ciência, assim como da intuição ao conceito e julgamento (confrontação desse filósofo aos neokantianos), materializava a “[...] consonância imediata com as manifestações do irracionalismo que se observam no campo político” (BOURDIEU, 1989, p. 88). Ou, ainda, “[...] as condições acadêmicas e políticas do pensamento puro nunca cessam de ressoar no campo filosófico e além dele” (BOURDIEU, 1989, p. 88). Converte-se a inautenticidade da existência à dimensão histórica, própria do ente, própria “[...] da condição ‘comum’ do homem ‘comum’, [...] a ‘alienação’, reduzida ao sentido völkisch de ‘desenraizamento’ se encontra constituída como ‘estrutura ontológico-existencial’ do Dasein, isto é, como deficiência ontológica” (BOURDIEU, 1989, p. 89). Em contraposição, “[...] Heidegger não negaria, que o pensamento essencial (das wesentliche Denken) é essência” (BOURDIEU, 1989, p. 89).16 Todo trabalho do filósofo consiste em pôr em forma, seja consciente ou inconscientemente, os problemas vividos e enunciados na linguagem do mundo comum, em um outro modelo, “[...] ornado do conjunto de signos, de uma sintaxe, um léxico, referências, etc., aos quais se reconhece um discurso filosófico e pelos quais um discurso é reconhecido como filosófico” (BOURDIEU, 1989, p. 93). Esse movimento caracteriza a eufemização dos problemas do mundo político. Na avaliação de Bourdieu, isso pode ser compreendido na homologia entre autenticidade/inautenticidade (problema filosófico) e elite/massas (problema político). Tratar-se-ia de uma possibilidade universal, estimulando o uso adequado da liberdade para potencializar a autenticidade do Ser.

A retradução de um problema político em uma questão filosófica requer toda uma atenção da história intelectual ou da sociologia dos intelectuais, como nos mostra Bourdieu. No caso de Heidegger, há uma série de regras do campo filosófico, que condiciona a uma “leitura interna e o respeito das formas”, funcionando como uma verdadeira fronteira entre iniciados e não-iniciados, consagrando os escritos a “[...] uma leitura interna, no duplo sentido da leitura acantonada nos limites do próprio texto e inseparavelmente reservada ao grupo fechado dos profissionais da leitura que aceita como evidente a definição ‘internalista’ da leitura” (BOURDIEU, 1989, p. 112). Esse processo está contido naquilo que apresentamos no primeiro item deste artigo, em particular ao que Bourdieu descreve em Meditações pascalianas, isto é, como a expressão refinada do recalque das condições sociais de uma obra.

Considerações finais

O problema dos estudos dos intelectuais consistiu no principal objeto desta reflexão. Esse neologismo, de origem francesa do final do século XIX, difundiu-se a diferentes cantos do mundo e tornou-se ponto de encontro e divergência de variadas áreas do conhecimento. Sem a pretensão de fazer qualquer incursão por essa antiga e atual celeuma, este texto revisitou a sociologia dos intelectuais de Pierre Bourdieu para mostrar sua fecundidade aos escritos de história intelectual. Dentro dos limites de um artigo acadêmico, procuramos acompanhar dois escritos de Bourdieu (Meditações pascalianas e A Ontologia política de Martin Heidegger) a fim de sublinhar suas potencialidades para uma escrita da história intelectual, seja ao salientarmos o sentido dos limites e poderes do pensamento, seja ao destacarmos o esforço desse sociólogo para explicitar sua forma de análise de um pensador reconhecido do campo filosófico.

De Bourdieu depreendemos uma premissa fundamental aos estudos dos intelectuais, qual seja: a indissociabilidade entre autor/a e obra, isto é, entre trajetória de um/a intelectual e seus escritos. Esse princípio posiciona-nos em contraposição ao modo de escrita da história da filosofia ou da clássica história das ideias. Não obstante, ainda não nos desembaraça de possíveis relações com uma história determinista do pensamento. O movimento desse sociólogo é apresentar também uma hipótese de rompimento com uma ciência social reducionista. Nessa perspectiva, Flaubert, Manet e Heidegger representariam um centro de atração de seus respectivos campos, mas também de alguma homologia com as questões do mundo social, pois as trajetórias deles evidenciam as complexas relações entre as forças de um campo específico (literário, pintura e filosófico) e de outros espaços sociais (econômico, político, etc.). Aqui reside a importante contribuição de Bourdieu, pois mesmo uma grande personagem não estaria alheia aos condicionamentos sociais, como sublinha no texto “Esboço para uma autoanálise” (BOURDIEU, 2004b) e aplica em A ontologia política de Martin Heidegger (BOURDIEU, 1989). No entanto, tais condicionamentos precisam ser avaliados em cada contexto, pois as relações são dinâmicas como atestam as produções de Bourdieu (1989, 1996, 2013) e o fecundo livro de Sapiro (1999), que mostra a retração dos interesses culturais perante as forças políticas e ideológicas no momento de Ocupação alemã na França. Dessa maneira, reiteramos o efeito de sentido da sociologia dos intelectuais de Bourdieu, pois, se, nas análises de personagens consagrados, as obras e as condições sociais são indissociáveis, mais contundentes se mostram tais dependências nos estudos que retratam personalidades de contextos em que as fronteiras entre os diferentes espaços sociais são mais porosas, ou mesmo de estratos intermediários (vulgarizadores), como aqueles que exerciam a função de despertadores do humor ideológico que se desenvolvia à margem da Universidade Alemã, como mostra Bourdieu (1989) no capítulo “A filosofia pura e o zeitgeist”.

À vista disso, a fecundidade de Bourdieu seria dupla. De um lado, prevenir-nos contra a tentação de reduzir as ideias às determinações sociais. De outro, a romper com a sedução do pensamento puro. O grande desafio é a operação metodológica dessa proposição. Não há um manual a ser seguido. Entretanto, um caminho promissor é acompanhar seus escritos de sociologia dos intelectuais, pois neles se apresentam os três níveis de análise: o posicionamento de uma personagem nos complexos elementos do mundo social (origens sociais, culturais, familiares, religiosas, etc.), bem como em um espaço específico (religioso, político, literário, artístico, filosófico, acadêmico ou científico, educacional, etc.) e no universo escolástico (illusio ou crença, “desinteresse”). Heidegger, por exemplo, funciona quase como um caso típico, dimensão criticada por François Dosse (2009, p. 195), uma vez que “[...] o indivíduo, então, só tem valor na medida em que ilustra o coletivo”. Apesar dessa crítica, retemos que o filósofo alemão representa um caso exemplar para mostrar a indissociabilidade entre problemas teóricos (filosóficos) e questões políticas, explicitada por todo o processo de retradução à linguagem própria da “república dos filósofos”. Nas trajetórias de intelectuais de estratos intermediários (mediadores e despertadores), as homologias entre interesses políticos e elementos de um campo específico tendem a ser quase diretas, sem as mediações lexicais tal qual se apresentam no pensamento heideggeriano (sublimação filosófica ou eufemismo), a exemplo daqueles que difundiam o “humor völkisch”.

Bourdieu mostra-se, portanto, útil, tanto aos estudos de personagens ou grupos com forte inserção em espaços especializados quanto com baixa ou nenhuma integração em universos de expertos, exigindo que se evite aplicar mecanicamente sua teoria dos campos e se examine a relação de uma personagem ou um grupo com as forças de produção ideológica e os interesses de espaços específicos, tais como o acadêmico, o científico, o pedagógico, o educacional, o cultural, etc.

1Esta discussão poderá ser utilizada em estudos de uma personagem ou de um grupo (prosopografia) que podem estar associados a diferentes facetas da vida social, a saber: intelectuais e religião, intelectuais e música, intelectuais e pintura (Manet), intelectuais e literatura (As regras da arte que se refere a Flaubert), intelectuais e cinema, intelectuais e filosofia (A ontologia política que aborda Heidegger), intelectuais e imprensa, intelectuais e educação ou formação humana. Trata-se de um artigo que parte de Bourdieu com a pretensão de produzir reflexões gerais a respeito do problema dos intelectuais. Para uma discussão de intelectuais e educação, consultar Carlos Eduardo Vieira (2011), Juçara Luiza Leite e Claudia Alves (2011).

2Para uma síntese dessa teoria, ver Afrânio Mendes Catani et al. (2017, p. 64-99) e Gisèle Sapiro (2020a, 2020b, p. 126-152).

3Há uma versão em espanhol, traduzida na Espanha, de 2007 (DOSSE, 2007a).

4Ver artigo em português de Christophe Charle (2003).

5Em 1975, Bourdieu escreveu um longo texto que tratou de Martin Heidegger, retomado e ampliado em 1988 em formato de livro, no momento em que a polêmica a respeito do filósofo alemão ganhou reverberação com o livro Heidegger et le nazisme (1987), publicado na França pelo filósofo chileno Victor Farias. A ontologia política de Martin Heidegger foi publicada, no Brasil, em 1989.

6Mostra-se como se origina a disposição escolástica, como bem ilustra a história da filosofia. A respeito desse livro, manifesta-se Roger Chartier: “Para mim, o livro mais grandioso de Bourdieu é Meditações pascalianas, porque nele podemos encontrar toda a armadura teórica de Bourdieu” (CHARTIER, 2008, p. 88, tradução nossa). Esse livro de Bourdieu foi publicado, no Brasil, em 2001.

7No livro À beira da falésia, notadamente no capítulo “História intelectual e história das mentalidades”, Chartier (2002) apresenta uma síntese dos contornos dessa crítica no contexto francês. Para uma discussão sobre isso, ver Névio de Campos (2015), Carlos Eduardo Vieira (2008), Marcos Antônio Lopes (2003), Helenice Rodrigues da Silva (2002).

8Esse texto é originário de uma conferência proferida por Bourdieu na Universidade de Freiburg, Alemanha, em 1989. Foi publicado em alemão em 1990, sendo traduzido para a língua portuguesa e publicado em 2002.

9Um pouco do clima desse debate pode ser acessado em Gisèle Sapiro (2020a).

10Os dois volumes foram publicados em 1991, sendo traduzidos no Brasil em 1993 (DOSSE, 1993a, 1993b).

11Para melhor compreender a questão da relação autor/a e obra, sugerimos consultar Sapiro (2019, 2020c), Foucault (2015), Chartier (2021).

12Uma síntese pode ser encontrada em José Luis Moreno Pestaña (2017) e Laurent Perreau (2020).

13“Apesar de não ter construído uma teoria do campo filosófico como tal, Pierre Bourdieu forneceu numerosas análises tanto conceituais (sobre o campo, as disciplinas) quanto concretas” (PINTO, 2017, p. 81).

14O livro La guerre des écrivains, de Gisèle Sapiro (1999), é exemplar, pois apresenta as instituições de maior e menor reconhecimento na França dos períodos da Ocupação e Liberação, sem deixar de indicar as posições e as tomadas de posição de personagens consagrados (dominantes) e não reconhecidos (dominados).

15Bourdieu chama esse discurso de humor ideológico, alimentado por uma literatura de vulgarização (Spengler) e ligado a inúmeros autores da literatura e filosofia, como Tolstoi e Nietzsche. “Essas inúmeras ‘fontes’, que jorram de todas as partes, ensinam o caráter fundamental de uma configuração ideológica feita de palavras que funcionam como exclamações de êxtase ou de indignação e de temas meio eruditos reinterpretados. São produtos ‘espontâneos’ de invenções individuais objetivamente orquestradas, pois fundadas sobre a orquestração dos hábitos e sobre o acordo afetivo de fantasmas divididos que dão, ao mesmo tempo, a aparência de unidade e de infinita originalidade. Mas o humor völkisch é também um conjunto de questões por meio das quais é a própria época que começa a refletir” (BOURDIEU, 1989, p. 20-21).

16“Bourdieu esforça-se por mostrar o caráter essencialmente equivocado do discurso heideggeriano construído a partir de ‘significações suspeitas’ que podem ser apreendidas em um registro político ordinário (crítica das massas, do socialismo, do intelectualismo, dos judeus) e, simultaneamente, em um registro propriamente filosófico (o ser contra o ente, a ontologia contra o naturalismo). Heidegger leva a seu ápice certas virtualidades do discurso filosófico que, graças aos meios da ‘eufemização’, pode dizer as coisas dizendo que não as diz” (PINTO, 2017, p. 83, grifo do autor).

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Recebido: 10 de Janeiro de 2022; Revisado: 06 de Abril de 2022; Aceito: 08 de Abril de 2022; Publicado: 21 de Abril de 2022

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