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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.17  Ponta Grossa  2022  Epub 20-Jan-2023

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.17.20159.087 

Artigos

Contribuições de Paulo Freire na Índia e suas conexões com a filosofia de Prabhat Ranjan Sarkar: expressões de internacionalização

Paulo Freire’s contributions in India and its connections with Prabhat Ranjan Sarkar’s philosophy: expressions of internationalization

Contribuciones de Paulo Freire en India y sus conexiones con la filosofía de Prabhat Ranjan Sarkar: expresiones de internacionalización

Patrícia Correia de Paula Marcoccia* 
http://orcid.org/0000-0001-5407-7685

Danilo Romeu Streck** 
http://orcid.org/0000-0001-7410-3174

*Doutora em Educação. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e líder do Grupo de Pesquisa Transdisciplinar em Internacionalização, Interculturalidade e Neo-humanismo.

**Doutor em Educação. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS).


Resumo

Este artigo discute as contribuições de Paulo Freire na Índia e suas conexões com a filosofia neo-humanista proposta por Prabhat Ranjan Sarkar, perspectiva pouco explorada. Trata, ainda, do movimento de internacionalização que Freire forjou no exílio até chegar à Índia. Baseia-se em obras de Freire, entrevistas e artigos que abordam sua experiência na Índia, obras de Sarkar e estudiosos de internacionalização. Freire identificou muitas diferenças culturais, enfatizando a necessidade de um projeto educativo comprometido com a libertação das castas oprimidas e a participação dos oprimidos no processo. Sua interlocução com Organizações não Governamentais fortaleceu experiências educativas locais de libertação, sobretudo em áreas rurais. Freire e Sarkar estão ontologicamente conectados ao anunciarem uma práxis voltada à transformação social, ancorada em uma visão universalista, sustentável e socialmente justa, na defesa de uma educação libertadora, baseada na interculturalidade, na ética, na ciência, na filosofia e na espiritualidade.

Palavras-chave: Paulo Freire; Experiências educativas na Índia; Prabhat Ranjan Sarkar.

Abstract

This article discusses Paulo Freire’s contributions in India and his connections with the neo-humanist philosophy proposed by Prabhat Ranjan Sarkar, a perspective that has been little explored. It also deals with the internationalization movement that Freire forged in exile until he arrived in India. It draws on woks by Freire, interviews and articles that address his experience in India, works by Sarkar and internationalization scholars. Freire identified many cultural differences, emphasizing the need for an educational project committed to the liberation of oppressed castes and the participation of the oppressed in the process. His dialogue with non-governmental organizations strengthened local educational experiences of liberation, especially in rural areas. Freire and Sarkar are ontologically connected by announcing a praxis focused on social transformation, anchored in a universalist, sustainable and socially just vision, in defense of a liberating education, based on interculturality, ethics, science, philosophy and spirituality.

Keywords: Paulo Freire; Educational experiences in India; Prabhat Ranjan Sarkar.

Resumen

Este artículo discute las contribuciones de Paulo Freire en India y sus conexiones con la filosofía neohumanista propuesta por Prabhat Ranjan Sarkar, perspectiva poco explorada. Trata, aún, del movimiento de internacionalización que Freire forjó en el exilio hasta llegar a India. Se basa en obras de Freire, entrevistas y artículos que abordan su experiencia en India, obras de Sarkar y estudiosos de internacionalización. Freire identificó muchas diferencias culturales, enfatizando la necesidad de un proyecto educativo comprometido con la liberación de las castas oprimidas y la participación de los oprimidos en el proceso. Su interlocución con organizaciones no gubernamentales fortaleció experiencias educativas locales de liberación, especialmente en áreas rurales. Freire y Sarkar están ontológicamente conectados al anunciar una praxis centrada en la transformación social, anclada en una visión universalista, sostenible y socialmente justa, en defensa de una educación liberadora basada en la interculturalidad, en la ética, en la ciencia, en la filosofía y en la espiritualidad.

Palabras clave: Paulo Freire; Experiencias educativas en India; Prabhat Ranjan Sarkar.

Introdução

O centenário do nascimento de Paulo Freire em 2021 propiciou, por meio da revisão da vida e da obra desse educador, a ampliação de fontes para o estudo de sua obra por intermédio do registro de memórias, de encontros e da recuperação de gravações e de documentos. Esse movimento também evidenciou algumas experiências do autor que foram pouco exploradas e que possuem escassa documentação, a título de exemplo, as viagens de Freire à Espanha1, à Austrália2, à Índia e ao Irã3. Nesse sentido, este artigo discute as contribuições de Paulo Freire na Índia e sua conexão com a filosofia neo-humanista proposta por Prabhat Ranjan Sarkar. Trata, ainda, do movimento de internacionalização que Freire forjou no exílio até chegar à Índia.

Para isso, percorremos obras de Freire (1978, 2008), entrevistas que mencionam sua experiência na Índia (FREIRE, 1978, 1979b, 1984), um texto de um pesquisador indiano que trabalhou com Freire (SIDDARTHA, [200-?]), obras de seus interlocutores sobre esse período (ANDREOLA, 2010; BHATTACHARYA, 2021; LABORDE-KÜHN, 1981; RIBEIRO, 2009; THOMAS, 2021; WEID; POITEVIN, 1978), obras de Sarkar (2000, 2001, 2009, 2010) e artigos que discutem internacionalização (ABBA; STRECK, 2019; STRECK, 2021). O contato com esses materiais ocorreu por meio de conversas com Balduíno Antônio Andreola4, Nita Freire5, esposa de Paulo Freire, e entrevista com o pesquisador indiano Siddartha, seguido do acesso ao site do Instituto Paulo Freire, no qual localizamos uma entrevista (FREIRE, 1978) e dois artigos (FREIRE, 1979b; SIMON, 2014), sendo o primeiro do próprio Freire na Índia, dialogando com educadores, e o outro sobre Ambedkar e Paulo Freire. Posteriormente, buscas no indexador da Biblioteca Eletrônica Científica Online (SciELO) em que foram identificados uma entrevista (FREIRE, 1984) e um artigo (THOMAS, 2021). Ademais, observamos as referências utilizadas nesses textos, as quais indicavam outras referências, a exemplo de Andrade (2007) e Bhattacharya (2021).

A experiência de Paulo Freire na Índia, na década de 1970, reflete a internacionalização do seu pensamento, visto que ele participou de vários seminários com instituições cristãs de ensino, sobretudo Organizações não Governamentais (ONGs), educadores(as) indianos(as) e programas governamentais no âmbito da educação de adultos(as), entre outros. Paulo Freire identificou muitas diferenças culturais quando esteve na Índia e, embora mencionasse que não tinha a pretensão de dizer o que eles(as) deveriam fazer, percebeu certa dificuldade de a sociedade indiana engajar-se em projetos políticos no âmbito da educação e, nesse sentido, buscou inspirar os(as) educadores(as) indianos(as) a partir de sua experiência no Brasil.

Quanto à conexão entre a filosofia de Sarkar e o pensamento de Freire, ressaltamos que, embora pertençam a sociedades diferentes, eles possuem propostas educativas semelhantes. As convergências entre eles expressam-se pela defesa de uma práxis insurgente contra toda a forma de opressão, com vistas à transformação social e a uma educação universalista e intercultural. Ademais, Sarkar também expressou seu movimento de internacionalização no fim da década de 1970, quando passou a visitar a Europa, a América do Sul, a África e alguns países do sudeste da Ásia e do leste da China.

Com o propósito de compreendermos as contribuições de Freire na Índia, sua conexão com a filosofia neo-humanista de Sarkar e suas expressões de internacionalização, organizamos este texto em três partes. A primeira aborda a internacionalização na perspectiva da interculturalidade e estabelece relações entre as andarilhagens de Paulo Freire durante o exílio e seu movimento de internacionalização até chegar à Índia. A segunda descreve a viagem de Freire à Índia e discute suas experiências, sobretudo sua contribuição junto às ONGs, aos(às) educadores(as) indianos(as) e às instituições educativas do governo, refletindo a internacionalização do seu pensamento. Por fim, a terceira estabelece conexões entre o pensamento de Paulo Freire e a filosofia neo-humanista proposta pelo indiano Prabhat Ranjan Sarkar.

Paulo Freire e as expressões de internacionalização

A internacionalização está presente na prática da vida da humanidade e acompanha as metamorfoses, as adaptações e os desafios que se colocam ao planeta. Segundo Streck (2021), a internacionalização da educação desde uma perspectiva crítica envolve um movimento físico e cognitivo que se expande para a dimensão afetiva e para a curiosidade epistemológica. Assim sendo, abrange a presença física, psíquica e o sentimento de querer bem qualquer povo, como aponta Freire (1978). Esse sentimento desperta o interesse de dialogar e de (re)conhecer a estrutura de pensamento dos diversos povos que habitam o planeta. Trata-se, portanto, de uma internacionalização sustentada na alteridade, conectando-se profundamente com a cultura do outro.

Segundo Freire (1979a), a cultura tem um sentido diferente e mais rico do que tem no uso cotidiano. A cultura “[...] é a contribuição que o homem faz ao dado, à natureza. [...] é todo o resultado da atividade humana do esforço criador e recriador do homem, de seu trabalho por transformar e estabelecer relações de diálogo com outros homens” (FREIRE, 1979a, p. 21). O autor ressalta que as relações entre os homens e as mulheres, além de (re)inventarem a cultura, suscitam com que eles(as) também sejam fazedores(as) da história: “[…] a história no pleno sentido do termo, a história de todo o povo e não somente dos exércitos e dos governos” (FREIRE, 1979a, p. 21). Essa história, para o autor, é a busca pelo “ser mais”, como condição de humanização de todos os seres e como possibilidade de intervenção individual e coletiva.

A perspectiva de humanização cunhada por Freire desafia6 a racionalidade dominante, compreendida aqui a partir dos princípios da modernidade, do imperialismo, do eurocentrismo e da colonialidade. Nesse sentido, percebemos que o seu pensamento dialoga com uma dimensão da interculturalidade, sobretudo de uma abordagem crítica como a discutida por Walsh (2014), a qual defende um posicionamento crítico fronteiriço, pondo em debate a constituição e as diversas fronteiras dos diferentes sujeitos. A autora propõe uma interculturalidade que pensa com os sujeitos e os coloca em diálogo com diferentes povos e seus pensamentos fronteiriços, problematizando seu contexto real, sua subjetividade, suas lutas, sua produção do conhecimento e suas histórias locais, marcadas pelos conceitos de colonialidade de poder e de saber na América Latina, na África e na Ásia. Essa abordagem abre uma perspectiva para o debate da internacionalização.

O ponto de vista defendido por Walsh (2014) vai ao encontro dos estudos de Abba e Streck (2019), os quais enfatizam a inerência da interculturalidade no processo de internacionalização da educação, visto que, por meio dele, a diversidade dos povos de várias localidades do mundo se conecta, levando-os a dialogarem e a se (re)inventarem global, regional e nacionalmente, seja por meio da mobilidade física, virtual, seja por outro meio de comunicação. Trata-se de ver a internacionalização como um processo contínuo, desprendido do padrão hegemônico e resultante de interações dialógicas críticas.

Com base nessa perspectiva, discutimos a concretude da vida de Paulo Freire durante o período em que esteve no exílio e como se constituiu o seu movimento de internacionalização. Streck (2001) chama atenção sobre o papel do exílio na construção da universalidade da obra e da vida de Freire. Sobre isso, o autor interroga, “[…] se não tivesse havido o exílio e, dentro deste, a peregrinação pela América até chegar a Genebra, onde encontrou um espaço de atuação que o colocou em contato com as experiências de libertação em todos os continentes” (STRECK, 2001, p. 33), seria Freire amplamente reconhecido? Certamente que não, visto que o fator decisivo para sua universalidade foi seu movimento de internacionalização.

O Chile foi o segundo país no qual Freire se estabeleceu durante o exílio, quando trabalhou em várias instâncias e órgãos. De acordo com Gajardo Jimenez (2021), ele realizou numerosas intervenções com seus colaboradores, os quais inseriram novos elementos na forma de pensar e de fazer educação, seja na educação de adultos(as), seja na educação geral do povo chileno. Essas intervenções tinham como ponto de partida a realidade do entorno, suas questões sociais, políticas e econômicas e as necessidades de aprendizagem dos(as) educandos(as). A ênfase estava no incentivo do diálogo e da reflexão, com base nos interesses coletivos e no reconhecimento de que os(as) jovens e adultos(as) sem escolaridade são possuidores(as) de um saber e de uma cultura própria.

Segundo Gajardo Jimenez (2021), o contexto chileno foi frutífero para que Paulo Freire conseguisse desenvolver suas ideias pedagógicas, visto que, naquele período, se estabeleciam a reforma agrária chilena e a Reforma Integral da Educação nos conteúdos dos programas de alfabetização e de educação de adultos(as). Destacamos que a maioria das atividades que Freire realizou se desenvolveu no âmbito das políticas e dos programas educativos vinculados a movimentos de transformação de reforma agrária e de desenvolvimento rural.

Foi nesse contexto que Freire construiu sua teoria pedagógica, que, mais tarde, culminou na Pedagogia do Oprimido, a qual, segundo Andreola e Ribeiro (2005, p. 109), “[…] não significa apenas um livro, [...], mas sim, um grande projeto coletivo que, como tal, já não pertence a Freire, porque está sendo repensado e recriado por milhares de educadores e milhões de outras pessoas, em todos os quadrantes da terra”. Para Gajardo Jimenez (2021), um dos legados de Freire na América Latina foi incidir nas agendas globais para que a pedagogia e a aprendizagem fossem consideradas uma questão social e política, enfatizando a necessidade de rever os métodos pedagógicos de educação escolar e não escolar.

Freire deixou o Chile no final de 1968, devido a não renovação do seu contrato de consultoria internacional com o Governo Chileno. Nesse mesmo período, recebeu convites para dialogar com algumas universidades e comunidades populares nos Estados Unidos da América (EUA). Diante disso, estabeleceu-se, nos EUA, como professor visitante da Universidade de Harvard para trabalhar e debater a teoria da ação cultural desenvolvida na Pedagogia do Oprimido. Publicou vários textos e ministrou diversas conferências em inglês, no intuito de ampliar sua teoria sobre conscientização, processos de transformação cultural e outras áreas do conhecimento relacionadas à política e à teologia.

No início de 1970, Paulo Freire deixou os EUA, devido ao término do seu contrato com a Universidade de Harvard, e se deslocou para trabalhar como consultor na área da Educação do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), em Genebra. Segundo Andreola e Ribeiro (2005), Paulo Freire via no CMI uma oportunidade para a difusão universal de sua proposta, mas, por sua vez, sempre se posicionou de forma respeitosa diante das numerosas culturas e comunidades com as quais dialogou e com os seus contextos históricos. Freire nunca teve a pretensão de impor um modelo epistemológico e a sua práxis, mas também nunca deixou de pronunciar sua palavra sobre o mundo. Nesse tempo, realizou muitas viagens por diversas regiões do mundo, como Ásia, Oceania, América e África (FREIRE, A. M. A., 2006). Ribeiro (2009) teve acesso aos documentos sobre os itinerários de Paulo Freire quando esteve no Conselho Mundial de Igrejas (CMI) e destaca que se somaram 150 viagens.

Em entrevista publicada no jornal Pasquim, Paulo Freire (1978) comentou sobre sua saída de Recife para o mundo:

Porque parece muita falta de modéstia, um treco profundamente cabotino, falar de minha universalidade como se eu fosse aqui um cara que se pensa um homem do mundo no sentido que se dá, quando se diz isso. Não, o que eu quero dizer é que sou, existencialmente um bicho universal. Mas só porque sou profundamente recifense, profundamente brasileiro. E por isso comecei a ser profundamente latino-americano e depois mundial. Eu sou capaz de querer bem, enormemente, a qualquer povo. (FREIRE, 1978, p. 10).

Ao justificar ser existencialmente um “bicho universal”, Freire (1978) menciona que essa percepção só foi possível a partir do (re)conhecimento de sua existência e de sua situação na qualidade de sujeito histórico e particular, o que fortaleceu o seu diálogo intercultural com diferentes povos e nações. A compreensão de Freire sobre a diversidade cultural assumiu outra direção a partir do exílio:

E como é diferente! Como tu não podes fazer juízo de valor a expressões culturais. A tua experiência com outros espaços históricos e culturais termina te ensinando até universaliza, rompendo com tua paroquialidade. Tu deixas de ser uma mente paroquial. Isso, então, significa uma abertura maior a outras formas de estar sendo. De outro lado o exílio possibilita a tomada de distância, não só geográfica, mas no tempo, do teu contexto original. Então, tu te re-admiras o teu contexto e ao fazer isso descobres uma série de outras coisas. Muitos brasileiros passaram a ser mais brasileiros a partir do exílio. (FREIRE, 1978, p. 11).

Observamos que a experiência de internacionalização de Paulo Freire possibilitou conhecer outras formas de “estar sendo” no mundo, e isso o levou a romper com sentimentos grupistas que tentavam manter sua humanidade confinada em uma porção limitada do mundo, sobretudo a visão paroquial mencionada por ele. Ademais, o exílio possibilitou (re)contemplar sua realidade e tecê-la sobre novos fundamentos.

A viagem de Freire à Índia despertou, certamente, seu sentido de universalidade. As experiências que ele teve quando se deparou com o jeito de ser e de viver dos(as) indianos(as) e o impacto ao constatar a relevância de sua obra na educação deles(as), sobretudo nas organizações não governamentais, possibilitou (re)inventar a si mesmo e a sua obra, assunto discutido no próximo subtítulo.

Contribuições de Freire na Índia

A sociedade indiana teve seu primeiro contato com o pensamento de Freire em 1972, quando um grupo de universitários chamado Universidade Livre trabalhou até de madrugada para mimeografar em stencil a edição pirata da obra Pedagogia do Oprimido (SIDDHARTHA, [200-?]). De acordo com Siddhartha ([200-?], p. 1, tradução nossa), “[…] no final do dia seguinte, as primeiras cem cópias do livro saíram da máquina e foram disponibilizadas para leitores indianos. Tínhamos conseguido o livro pirata das Filipinas, muitos anos antes do volume da Penguin aparecer em nossas livrarias”. A partir disso, o pequeno grupo de universitários começou a disseminar a obra de Freire nos vilarejos, nas favelas e nas tribos, sobretudo junto aos jovens dalits (ex-castas intocáveis na base da pirâmide social).

Lembro-me na época, [...] quando fui a vilarejos ao redor de Villupuram, a três horas de Chennai, onde jovens dalits se reuniam regularmente para entender as ideias de Freire. Alguns ativistas com formação universitária de Chennai ajudaram a traduzir essas ideias para o tâmil. Foi realmente um período de esperança. Em poucos meses, lutas locais contra a opressão de castas começaram a irromper em toda a área. Nos anos que se seguiram, essas ideias se espalharam por todo o estado. Mais ou menos na mesma época, movimentos locais semelhantes começaram a se desenvolver em todo o Sul da Índia e, pouco depois, também no Norte. Os livros de Freire foram traduzidos para todas as principais línguas indianas e amplamente lidos entre os ativistas sociais. As coisas nunca mais seriam as mesmas para dalits, tribais, favelados e outras comunidades excluídas. (SIDDARTHA, [200-?], p. 3, tradução nossa).

Na década de 1970 e 1980, todos os ativistas sociais da Índia conheciam o pensamento de Paulo Freire, “[…] sua contribuição [...] para o empoderamento de dalits, tribais e mulheres tem sido substancial, mesmo que haja pouca documentação sobre o que aconteceu” (SIDDARTHA, [200-?], p. 5, tradução nossa). O método de trabalho baseou-se no diálogo no interior dos círculos com os oprimidos e de confronto com o opressor. Em um período de um e/ou dois anos, as comunidades conquistaram numerosas demandas, como acesso à água por meio de um poço, sindicatos rurais criados por dalits, entre outros. Nesse período, o Conselho Mundial de Igrejas possibilitou a Freire ir à Índia duas vezes. A primeira foi no dia 3 de maio 1973, permanecendo até o dia 20 de maio de 19737, e a segunda foi em 1979, no dia 7 de fevereiro até o dia 14. Segundo Ribeiro (2009, p. 140), havia uma agenda a cumprir em cada viagem. Sobre a primeira viagem:

Nos dias 4 e 5 teve encontros fechados em Nova Delhi com a Aiache (All India Association for Christian High Education) que é uma Associação Ecumênica que reúne instituições cristãs de ensino católicas, protestantes e ortodoxas, visando o trabalho conjunto para atender necessidades e servir às comunidades nacionais. Entre os dias 7 e 12, Paulo Freire esteve participando de um Seminário Nacional sobre Educação e Mudança Social no Centro Ecumênico de Bangalore. O restante da viagem, de 13 a 20, Paulo Freire tratou sobre Educação nas cidades de Bangalore, Madras, Hyderabad e Nova Delhi. Também participou de um Seminário organizado por J. P. Nalk, assessor do Ministro da Educação da Índia. Também foi organizado um encontro de Paulo Freire com o Primeiro-Ministro da Índia. (RIBEIRO, 2009, p. 140).

A segunda ida à Índia foi a convite de “[…] P. T. Kuriakose, do Centro Internacional da Juventude para participar de alguns workshops e seminários sobre educação de adultos” (RIBEIRO, 2009, p. 157). Nesse mesmo período, VishwaYuvak Kendra convidou Paulo Freire, em 13 de fevereiro de 1979, em Nova Delhi, para reunir-se com diversos grupos, ONGs e pessoas envolvidas em programas de educação de adultos(as). Em uma dessas reuniões, Freire discutiu o significado de conscientização como um processo eminentemente político e, então, trouxe seu ponto de vista para o contexto da sociedade indiana, apontando alguns caminhos, por meio do diálogo, e para indagações que os(as) indianos(as) fizeram a ele.

As intervenções de Freire com os grupos de educação de adultos(as) em Nova Delhi tiveram como ponto de partida sua experiência de vida e os seguintes temas: conscientização, educação e sociedade, epistemologia e o sujeito do conhecimento, alfabetização de adultos(as), pequena burguesia, ideologia, o papel do(a) intelectual na reconstrução da sociedade, o contexto indiano, a dimensão política dos(as) educadores(as) e a violência e mudança.

O contexto político da Índia na década de 1970 foi um período de governo autocrático, dirigido por Indira Gandhi, primeira-ministra da Índia, que governou “[...] com mão de ferro. Seus opositores políticos foram encarcerados, assim como os jornalistas que escreveram contra a sua revogação dos direitos constitucionais dos cidadãos, ao mesmo tempo que havia inúmeros casos de morte sob custódia em todo o país” (THOMAS, 2021, p. 206). Nesse contexto, Paulo Freire percebeu que era necessária outra visão em relação à sociedade indiana e seus processos educativos. A partir disso, ele passou a defender a necessidade de os(as) indianos(as) organizarem um movimento político, não necessariamente de cunho partidário, mas comprometido com um outro projeto de libertação e de educação das castas oprimidas feito por e com eles. Reiterou a participação dos(as) oprimidos(as) no processo de transformação e o papel político dos(as) educadores(as). Embora tenha expressado que o problema na Índia é a ausência de engajamento político e o interesse em incorporar a dimensão política da teoria freiriana: “The problem in Índia is that people are not interested to learn with the militant. The question of motivation of people comes in. Your theory assumes the willingness of people to learn with you. This is not the case here8 (FREIRE, 1979b, p. 5).

A lacuna que Freire observou nas práticas dos(as) indianos(as) quanto ao movimento de conscientização e o pouco engajamento do povo no processo de conhecimento também aparece no conteúdo da carta que a ex-primeira-ministra da Índia, Indira Gandhi, enviou para ele quando lamentou sobre a sua saúde e, no final, mencionou que o sistema educacional e a própria sociedade indiana desencorajam a modificar o status quo, o qual favorecia interesses de pequenos grupos (GANDHI, 1973). Em sua primeira visita à Índia, em 1973, na cidade de Bangalore, e já tendo apropriado um pouco do contexto indiano, Freire anunciou que as diferenças culturais entre o Ocidente e Oriente precisavam ser levadas em conta, visto que isso modificava até o conceito de conscientização e as ações que derivam dele.

Conscientização... é um conceito ocidental muito forte. A tendência ocidental é agir sobre a realidade, confrontar a realidade e tentar mudá-la. A tendência indiana é entender a história como algo em que você se perde... Temos de levar em conta as diferenças culturais entre o Oriente e o Ocidente (ZACHARIAH, 1986, p. 68 apudANDRADE, 2007, p. 9, tradução nossa).

Se, por um lado, Freire percebeu a postura diferente dos(as) indianos(as) ao exercerem a práxis transformadora, por outro lado, ele anunciou que isso se expressava devido às diferenças culturais, à produção da vida, à estrutura de pensamento de um povo (FREIRE, 1979b). Para Siddartha ([200-?]), essa diferença precisava ser considerada, sobretudo o sistema de casta e a religião. Ademais, Siddartha ([200-?]) aborda que a sociedade indiana era influenciada por ideias relacionadas à impermanência, à interconectividade, à noção budista do vazio, ao significado do aqui e agora. Essas ideias não aparecem em Freire e, na percepção de Siddartha, estão para além do capitalismo e do marxismo, os quais se ancoram nas condições materiais, sem negar sua relevância. Siddartha (2022) destaca a relevância de olhar para outras perspectivas visando um diálogo mais amplo com o conceito de conscientização proposto por Freire, como valores comunitários, ecológicos e espirituais.

Nessa direção, Andrade (2007) alerta para a transposição da filosofia de Freire a outros povos e sociedades. Mesmo que seja em uma perspectiva de luta pela libertação de oprimidos(as) e de opressores(as), pode provocar equívocos se não for realizada com a participação do povo e por meio de uma postura de humildade frente aos seus saberes (FREIRE, 1979a).

Freire expôs aos(às) educadores(as) indianos(as) a sua experiência no Brasil para elucidar acerca do movimento de conscientização, o qual, na sua visão, se fez por meio de um mergulho na realidade, na teoria crítica marxista e nos valores espirituais que ele defendia:

[...] nos tornamos conscientizados juntos, pela práxis, pela ação conjunta, mas é claro que é possível em certos momentos, no tocante a certos assuntos, questões, se tenha mais conhecimento do que outros. A questão então é mudar esse conhecimento, mas nunca fui a nenhuma região do meu país pensando que ia conscientizar as pessoas, fui conscientizar e ser conscientizado e devo dizer a vocês que realmente as pessoas no Brasil com quem trabalhei me conscientizaram mais do que Marx. [...]. No meu caso, não fui para as favelas do meu país por causa de Marx. Eu fui por causa de Cristo. Foi muito interessante, eu não tenho nada a negar essa verdade. Mas quando eu cheguei lá, a realidade do meu povo me enviou para Marx, quando fui e encontrei Marx e depois de encontrar Marx, eu nunca mais precisei de parar de encontrar Cristo. Muitas pessoas dizem que sou um homem contraditório. E digo que tenho direito de ser contraditório. Deixe-me ficar em paz com minha contradição. Isso é o que sou até hoje. Quando algumas pessoas perguntam o que finalmente você é, você é cristão ou marxista, eu digo que sou homem, sou um ser humano em permanente processo de devir e nesse processo sinto-me muito bem com Cristo e Marx e tenho uma grande dívida com Marx porque é por causa de Marx que pude chegar de maneira diferente aos evangelhos. (FREIRE, 1979b, p. 11, tradução nossa).

Freire explicitou aos(às) indianos(as) que a conscientização se faz na ação coletiva, no movimento de tomada de posse da realidade e do olhar crítico. Além disso, expôs com transparência que Cristo foi sua motivação para ir às favelas, e o método marxista o ajudou a compreender essa realidade. O que Freire estava tentando demonstrar aos(às) indianos(as) ao relatar essa experiência? Será que ele estava tentando mostrar que ele reconhecia a dimensão espiritual como parte da realidade dos sujeitos e, portanto, estava defendendo uma epistemologia que também se fundamenta na espiritualidade e na diversidade religiosa? Ou ele queria mostrar aos(às) indianos(as) que é possível, por meio da práxis, captar a realidade criticamente, combater as injustiças sociais e, ao mesmo tempo, manter a espiritualidade, visto que os(as) indianos(as) possuem uma base ontológica profundamente ancorada na espiritualidade? Não sabemos qual a verdadeira intenção de Freire ao mencionar isso; todavia, ele deixou uma pista ao expor aos(às) indianos(as) que sua postura não estava a serviço dos fortes, nem se ancorava no sectarismo, na exploração e em uma atmosfera de domestificação (FREIRE, 1979b).

Entretanto, em depoimento à Revista Lua Nova, Freire revelou a sua emoção quando chegou ao país e os diálogos que teve em conjunto com um coletivo de 25 educadores, de diferentes regiões da Índia. Leiamos o que disse: “Aqueles homens discutindo algumas das sugestões, das proposições que eu faço da pedagogia, alguns com seus turbantes, outros sem, e em certo momento era como se eu me visse com um turbante também. No fundo eu era [...] um Paulo Freire reinventado na Índia” (FREIRE, 1984, p. 2).

Em entrevista ao jornal Pasquim, Paulo Freire mencionou seu encontro com um grupo de estudantes indianos, com os quais dialogou acerca da obra Pedagogia do Oprimido:

Eu chegava à Índia, por exemplo, e encontrava um grupo de estudantes que me dizia: “olha nós conseguimos uma edição do teu livro, mimeografamos, estudamos dois meses e resolvemos ir para a prática, e é a prática que nós tivemos que queremos te contar”. Eu então passava duas ou três horas conversando com esses meninos e eles dizendo, tu escreveste este livro foi para nós porque é a mesma coisa. (FREIRE, 1978, p. 11).

A obra Pedagogia do Oprimido foi ao encontro dos problemas que a Índia enfrentava, sobretudo das comunidades rurais na década de 1970 e 1980, a exemplo dos párias9. A presença de Freire, sua filosofia e sua pedagogia impactaram a educação no âmbito escolar e não escolar. É preciso ressaltarmos que a Índia é um dos países com maior diversidade de povos, de culturas, de religiões, de línguas e de dialetos. Não obstante, diante dessa colossal diversidade, há uma casta considerada impura desde o seu nascimento, sem possibilidade de ascensão. Trata-se dos párias, considerados também como intocáveis ou dalits, os quais geralmente residem na área rural e se encontram separados dos demais. Apesar de a Constituição indiana de 1950 ter abolido o status de intocabilidade, proclamando a ilegalidade de práticas que reforçam essa condição, tal postura não foi suficiente para extinguir as práticas contra os párias, especialmente nas áreas rurais.

Vale pontuarmos que o contexto político, a partir de 1977, consistia em um certo hibridismo entre esquerda e direita, que, no entanto, “[...] estava comprometido com tornar a Índia uma nação independente, sendo amplamente favorável à restauração dos direitos civis e políticos. Este também foi um período em que [...] as organizações não governamentais começaram a expandir suas ações na Índia” (THOMAS, 2021, p. 206).

Essa expansão estava ligada aos recursos financeiros de ONGs estrangeiras, instituições cristãs e fundações. Segundo Thomas (2021), as ONGs mais progressistas trouxeram para os cidadãos indianos o sentido de participação, embora não estivessem vinculadas às “[...] grandes narrativas de progresso, como a derrubada pela burguesia das classes trabalhadoras, seu foco no desenvolvimento local, nas capacidades locais baseadas na educação e no despertar da consciência eram diferentes [...] e essa não era a norma” (THOMAS, 2021, p. 207).

O padrão era o da educação bancária, juntamente aos costumes da sociedade indiana, os quais fortaleciam o status quo. Nesse sentido, o pensamento de Freire influenciou a tradição indiana em relação aos processos de participação, por considerar que todas as castas e classes fossem “[…] ouvidas, reconhecidas e consideradas na construção de seu próprio desenvolvimento” (THOMAS, 2021, p. 207). Um exemplo disso é que o pensamento de Freire foi incorporado pelas lideranças dos dalits como forma de criar espaços de justiça e de esperança. Além disso, eles observaram que muitas das ideias de Freire se conectavam ao pensamento de um líder dalit, Ambedkar10, seja pela relação com o pensamento religioso e/ou pela luta contra toda forma de dominação e de opressão. No que se refere à perspectiva religiosa, em Freire, a defesa da teologia da libertação e, em Ambedkar, a confrontação à cultura religiosa da Índia e seu sistema de castas criado há mais de dois mil anos. Esse sistema acredita na reencarnação como uma forma de carma, o que justifica o nascimento de um dalit.

Quanto às lutas contra as diversas formas de dominação, Ambedkar considerava que o casteísmo não permitiria jamais um caminho de libertação para a comunidade dalit. E, então, ele deixou de ser hinduísta e converteu-se ao budismo, que não tem o sentido de intocabilidade destinado aos dalits. “Esse grande ato de conscientização culminou os esforços de Ambedkar pela libertação de seu povo”, e, ademais, ele defendia que a luta “[…] não é pela riqueza ou pelo poder [mas] pela liberdade [e pela] recuperação da humanidade” (SIMON, 2014, p. 4-5, tradução nossa). A exploração, a opressão e a dominação conhecida por Freire no Brasil revelam aproximações com as lutas de Ambedkar contra a intocabilidade, motivo pelo qual as lideranças dos párias têm aderência ao pensamento de Paulo Freire.

Andreola (2010) menciona a respeito de um projeto de Educação Popular e Conscientização que foi realizado na Índia, por intermédio de uma ONG internacional, em uma comunidade de párias. Essa experiência está descrita na obra de Weid e Poitevin (1978), intitulada Inde: les parias de l’espoir (Índia: os párias da esperança). Segundo Laborde-Kühn (1981), esse projeto foi desenvolvido durante três anos, em 60 aldeias de párias, conforme a entrevista com Denis von der Weid (LABORDE-KÜHN, 1981). O projeto inspirou-se na referência pedagógica de Paulo Freire, em Marx e em Gandhi. Inicialmente, ele tinha a finalidade de reconstruir aldeias danificadas por ciclones; entretanto, as casas reconstruídas para os párias ficavam nas mãos das castas dominantes, porque eles sempre estavam endividados e, para extinguir suas dívidas, entregavam suas casas. Nessa direção, Weid percebeu que os párias só poderiam se libertar por eles mesmos por meio de uma ação coletiva e de um processo de conscientização organizado pelos próprios intocáveis (LABORDE-KÜHN, 1981).

A partir disso, emergiu a inspiração em Paulo Freire, com base no trabalho com palavras-chave, frases-chave e jogos de expressão cultural. Esse movimento envolveu a participação dos pais e das crianças, visto que, como mencionava Freire, pais e filhos sempre se educam juntos (LABORDE-KÜHN, 1981). O projeto culminou na organização de um sindicato e na continuidade do trabalho em várias regiões da Índia. Segundo Simon (2014), nas paredes de uma organização que trabalha com os dalits, na cidade indiana de Chennai, há uma fotografia de Paulo Freire ao lado da fotografia do líder dos direitos humanos dalit, Ambedkar. Ainda de acordo com o autor, Freire era profundamente respeitado pelos líderes dos dalit; entretanto, o autor aponta que há pouco conhecimento do seu pensamento e da sua relevância para esse contexto.

Thomas (2021) identificou que Freire era muito conhecido nas ONGs. Ele realizou trabalho de campo11 na área rural de Tamilnadu, entre 1984 e 1985, junto a ativistas de ONGs, e percebeu que “[...] tinham lido Freire e usado várias de suas ideias em seu próprio trabalho, mobilizando mulheres, adivasis (tribo) e dalits. [...] Muitas dessas organizações adotaram e adaptaram os repertórios de ação cultural associados à esquerda, incluindo o teatro político” (THOMAS, 2021, p. 210).

Atualmente, há muitos(as) educadores(as) indianos(as) que são praticantes da pedagogia freiriana e conhecedores(as) das obras de Freire. O artigo de Cafezeiro et al. (2016), publicado na Revista Scientiarum História, intitulado Aos amigos da Índia, algumas palavras brasileiras sobre Paulo Freire, matemáticas e políticas que configuram matemáticas, aponta que os educadores(as) indianos(as) conhecem as obras de Freire e trabalham com a sua pedagogia.

Lima [201-] enfatiza que um professor de física da Universidade de Brasília (UnB) foi à Índia em 2010 e visitou uma escola de Educação Fundamental, em um vilarejo pobre, na região de Thanjavour. Durante a visita, constatou que eles conheciam Freire e que suas obras estavam na estante da instituição.

Para facilitar sua apresentação e criar um clima amistoso, os colegas do Institute of Mathematical Sciences (IMSC), que com ele viajavam, informaram aos professores da escola que Amilcar era brasileiro, da terra de Pelé. Brasil? Pelé? Repetem várias vezes, De repente, um deles sorri e exclama: Ah, ah, Brasil, claro terra de Freire, Paulo Freire! E alcança na estante vários livros de um dos nossos maiores educadores, traduzido, estudado e reconhecido em todo o mundo. (LIMA, [201-], p. 109, grifo nosso).

A influência do pensamento de Freire em diferentes lugares e tempos históricos da Índia é admirável. Suas ideias e sua pedagogia responderam a alguns problemas que a Índia enfrentava, tanto na educação escolar como em espaços não escolares. No que se refere à educação de adultos(as), na década de 1980, o governo indiano e outras organizações12 passaram a se interessar pela educação dessas pessoas13 e pela produção de materiais didáticos, usando métodos freirianos na língua bengali. Esse material foi replicado para outras línguas e dialetos (BHATTACHARYA, 2021). Todavia, o governo mostrou-se interessado na técnica, ocultando a natureza política proposta na filosofia de libertação de Freire (BHATTACHARYA, 2021).

Andrade (2007) estudou sobre as tensões e as possibilidades na aplicação da pedagogia crítica freiriana para promover a alfabetização crítica no sistema educacional da Índia. A autora menciona que esse país está inserido em uma cultura diferente da visão de mundo que moldou o pensamento de Freire e, nesse sentido, considera que sua teoria para o contexto indiano necessita ser contextualizada para ser reinventada. Desse modo, a autora entende que é “[…] necessário desconstruir criticamente os pressupostos culturais e os aspectos potencialmente colonizadores embutidos em suas ideias” (ANDRADE, 2007, p. 20-21, tradução nossa). Embora considere que a alfabetização proposta por Freire se aplique a todos os tipos de casos, Andrade (2007) chama atenção para um possível processo de ocidentalização, isto é, os países não ocidentais se tornarem a imagem do Ocidente.

Segundo Andrade (2007), há iniciativas educacionais críticas não formais na Índia que se baseiam em ideias freirianas, mas as práticas realizadas no contexto da educação escolar não se baseiam em uma pedagogia crítica. Para ela, há programas educacionais na Índia que utilizam métodos freirianos, como o Programa de Educação Primária do Distrito do Governo da Índia, que faz uso de pedagogias mais ativas e de métodos de ensino criativos. Entretanto, a autora observa que alguns programas de formação de professores, apesar de utilizarem abordagens mais democráticas, dialógicas e reflexivas, mantêm práticas da educação bancária, perpetuando a ideologia dominante.

Ademais, a autora constatou a dificuldade no trabalho com os(as) educadores(as) indianos(as) no que se refere à postura crítica, questionadora, e à autonomia pessoal. Houve muita resistência, porque os(as) educadores(as) não possuíam na sua formação escolar e familiar a dimensão questionadora e crítica. Na visão de Andrade (2007), os(as) educadores(as) indianos(as) viam a pedagogia crítica como uma abordagem combativa que não estava fundamentada em suas vidas, porque violava a crença sobre a manutenção de relações harmoniosas com os(as) outros(as).

Andrade (2007) também aponta que a cultura indiana e sua educação escolar precisavam ser desafiadas devido à forma como a Índia se constituiu, dificultando a apropriação de uma pedagogia crítica. Todavia, a autora considera que, se, por um lado, a pedagogia crítica pode ser um instrumento de crítica à cultura indiana e servir para oprimir a sua população se não considerar suas diferenças; de outro lado, a pedagogia crítica, nomeadamente a freiriana, se for trabalhada com base nos pontos em comuns e nas suas diferenças, tem potência para reinventar a pedagogia freiriana no contexto da educação indiana. Segundo a autora, é preciso olhar para dentro da tradição hindu para encontrar valores semelhantes que se conectam com a pedagogia freiriana e, a partir disso, reinventar essa pedagogia.

Quando esteve na Índia, Freire reiterou que não tinha a intenção de ditar o que eles(as) deviam fazer, mas percebeu que era necessário aos(às) indianos(as) esclarecer sua ideologia política:

Minha tarefa aqui não é dizer-vos o que deve ser para vós. Essa é a sua tarefa na Índia. Não vim à Índia para vos fazer um proselitismo. Não vim aqui para vos dar a impressão de que sou neutro. Não sou. Penso que sou mais ou menos claro quanto a minha opção, não para a Índia, mas para mim próprio. Vim aqui com grande respeito para falar convosco, mas tenho a certeza de que todos vós, mais cedo ou mais tarde, percebereis que precisam estar juntos para serem eficientes e ter atitudes que esclareçam as escolhas políticas. (FREIRE, 1979b, p. 9, tradução nossa).

A advertência de Freire não permite a violação da cultura de nenhum povo, impondo-lhes uma visão de mundo. Pelo contrário, defendeu o diálogo e o respeito à cultura local e a estrutura de pensamento das pessoas. No caso dos povos indianos, ele não se propôs a dizer o que eles deveriam fazer, mas também não se manteve neutro diante da opressão e da exploração das castas e das classes mais oprimidas da Índia. Ademais, Freire percebeu que era preciso inspirar os(as) indianos(as) para processos de participação, de modo que se engajassem criticamente na construção de um projeto político de educação verdadeiramente libertador.

Paulo Freire sempre se posicionou contra a invasão cultural e, para ele, não é possível ter êxito em um “[…] programa de ação educacional ou política que não respeite a visão particular do mundo que as pessoas têm do povo” (FREIRE, 2008, p. 95). Todavia, Freire dedicou-se à causa da liberação de toda a humanidade, desprovido de qualquer sentimento nacionalista, mas, ao mesmo tempo, defendia a cultura local, as diversas línguas e a produção de conhecimento das populações do planeta.

A filosofia de Freire possibilita um diálogo com a filosofia neo-humanista14 do indiano Prabhat Ranjan Sarkar15. Os dois pensadores comprometem-se com um projeto de educação libertador. Nascido no mesmo ano de Freire, em Jamalpur, Bihar, na Índia, Sarkar vivenciou a realidade indiana frente aos desafios do sistema de casta e de classe, e, a partir dela, propôs um projeto de educação de base universalista, intitulado neo-humanismo, e uma teoria política, econômica e social denominada Teoria da Utilização Progressiva (PROUT). Comprometidas com a transformação social, essas teorias possuem muitas semelhanças com o pensamento de Freire, assunto que será discutido no próximo subtítulo.

Conexões entre o pensamento de Paulo Freire e a filosofia do indiano Prabhat Ranjan Sarkar

Prabhat Ranjan Sarkar também teve o movimento de internacionalização do seu pensamento, sobretudo quando começou a difundir a sua filosofia em diversos países da Europa, na Tailândia, em Taiwan, em Israel, na Turquia, na Jamaica e na Venezuela. Ressaltamos que, quando Sarkar esteve em Genebra, em maio de 1979, Paulo Freire estava na África, pelo Conselho Mundial de Igrejas. De maneira semelhante, eles anunciavam, nas suas andarilhagens, a necessidade de lutar coletivamente contra toda a forma de exploração e de opressão.

A educação16, para Sarkar (2000), é um instrumento importante para a transformação da sociedade é Sá vidyá yá vimuktaye [Educação é aquela que libera] de todo o tipo de geosentimento17, sociosentimento18 e pseudo-humanismo19, os quais se baseiam na supremacia de uma região geográfica, de uma comunidade, de uma economia e de uma visão antropocêntrica. Esses sentimentos levam à guerra, desagregam a humanidade e prejudicam o desenvolvimento da fraternidade universal. A educação, portanto, deve desenvolver as dimensões físicas, mentais e espirituais da humanidade.

Na percepção de Sarkar (2000), um sistema educacional que tem como pilar a fraternidade deve trabalhar com a ética e o senso de universalismo, de modo a produzir o sentimento expansivo de amor por toda a criação. Nesse sentido, a ética é essencial no currículo de todas as escolas e em todos os níveis. O sentido utilizado por Sarkar para a palavra “sentimento” não se refere à tendência emocional de absorver coisas que dão prazer no âmbito individual e/ou supervalorizam determinadas nações e grupos sociais. Contrariamente, é ter uma práxis benevolente que se expande e se identifica com toda a humanidade e o universo.

Há afinidades na compreensão da ética e do sentimento de amor por todos os seres entre os autores. No que se refere à ética, Freire tinha convicção de que não era possível pensar a humanidade distante dela, e de que o ensino dos conteúdos não poderia ser indiferente “à formação moral do educando” (FREIRE, 1996, p. 34). Quanto ao amor por toda criação, Freire (2000, p. 66) menciona a importância da “[…] reverência à vida não só humana, mas vegetal e animal, o cuidado com as coisas, o gosto da boniteza, a valorização dos sentimentos”. Andreola (2000) percebe em Freire um profundo amor pelo mundo, por todos os seres, um amor que parecia deslocá-lo do “[…] Ocidente para o Oriente e para o Sul. Lendo tuas cartas, confirmo-me nesta impressão de que, sem renunciar ao vigor da ciência e da filosofia, está muito próximo do pensamento [e] dos grandes mestres orientais” (ANDREOLA, 2000, p. 24). Ambos argumentam sobre o cultivo de sentimentos benevolentes por todos os seres, e que esses sentimentos não estão no campo do ativismo, eles se ancoram na ética universal do ser e não na ética do mercado.

No que se refere às teorias, Sarkar reconhece que a humanidade avançou no campo intelectual, embora aponte que há contradições em algumas delas, sobretudo naquelas que não propiciam conhecer a essência da realidade, mas apenas uma parte dela. Quanto às teorias que proclamam a igualdade, na sua percepção, embora expressem um discurso convincente, na prática, mostram-se limitadas por não conseguirem concretizar a lei da diversidade. Sarkar (2000) defende que o conhecimento só tem sentido se estiver interligado à prática da vida e que ele seja para a superação das injustiças que degradam a humanidade. Na sua percepção, a teoria tem de ser expressão da prática e conduzir à reflexão crítica comprometida com a transformação social. E essa transformação, para o autor, conduz ao desenvolvimento espiritual da humanidade. A “[…] espiritualidade não é um ideal utópico, mas sim uma filosofia prática, que pode ser aplicada e realizada na vida cotidiana” (SARKAR, 2000, p. 87). Sarkar posiciona-se contra a religião, porque ela fortalece o comunalismo e visa “[…] manter a mente humana num estado estático, porque qualquer coisa estática é facilmente explorada” (SARKAR, 2010, p. 18).

Quanto à relação do ser humano com a realidade e a espiritualidade, Leonardo Boff (2008) aponta que Freire compreendia que homens e mulheres são seres de transcendência20; todavia, ele defendia o equilíbrio entre imanência e transcendência, visto que são dimensões da única e da mesma condição humana. Entretanto, considerava que “[…] é no processo de libertação da situação de opressão, construindo o reino da liberdade e da criatividade que se mostra a realização da transcendência” (BOFF, 2008, p. 813). O cristianismo, fé professada por Paulo Freire, inaugurou a transcendência, pois o “[…] transcendente desceu na forma de pobreza e humildade na imanência. Daí irrompeu a transparência que é a transcendência e a imanência se interpenetrando mutuamente” (BOFF, 2008, p. 813-814). Dessa interpenetração emerge o desejo pelo infinito, o sentimento de amor por todos os seres, o encontro com o outro e o diálogo entre as pessoas e com Deus.

A abordagem da transcendência e a da imanência apontada por Freire e por Sarkar são semelhantes. Ambas apontam que elas são dimensões que fazem parte da condição humana e não podem ser separadas. O mundo empírico, a vida cotidiana, o trabalho e a espiritualidade estão conectados e abertos ao “[…] Todo e ao mesmo tempo [enraizados] concretamente no chão da vida” (BOFF, 2008, p. 812). Essa conexão conduz a um compromisso ativo com a humanização dos homens e das mulheres.

Quanto à perspectiva gnosiológica de Sarkar, ela se fundamenta na filosofia neo-humanista, proposta por ele em 1982. Segundo Bussey (2010), a filosofia neo-humanista é uma reinterpretação do humanismo21, por expandir sua filosofia a toda existência animada e inanimada. Para Oliveira (2021), o neo-humanismo é uma revisão e uma reformulação do humanismo clássico, mas também é uma (re)invenção, porque supera algumas teses desse humanismo moderno e elabora outras teses que se fundamentam na interculturalidade e na epistemologia tântrica.

A epistemologia tântrica, na perspectiva de Sarkar (2000), é aquela que libera a mente de todo o tipo de embrutecimento, seja por meio de crenças ou de religião, de dogmas, de castas, de classes sociais, dentre outros. Para ele, uma das dimensões dessa liberação é por meio das práticas espirituais. Na sua percepção, a meditação ajuda a remover o sentimento de egocentrismo e a estreiteza mental que impede o desenvolvimento ilimitado da mente humana e a percepção de que toda a existência “emerge de uma mesma fonte” (SARKAR, 2000, p. 11). Ademais, “[...] o princípio inerente ao Tantra é que cada indivíduo, ao penetrar no âmago de sua própria consciência individual, pode vivenciar a unidade de todas as coisas e transcender o fluxo turbulento da percepção sensorial a sua perspectiva fragmentadora do mundo relativo” (SARKAR, 2000, p. 11).

Freire não menciona, em suas obras, a epistemologia tântrica e a meditação, mas encontramos uma entrevista cedida a Maheshvarananda22 (FREIRE, 1997), realizada um mês antes de sua morte, na qual o educador brasileiro declarou algo sobre a meditação:

No fundo, eu acho que uma das coisas que estão faltando para nós, tanto professores como alunos, nessa experiência pedagógica, é a capacidade de... é o que você está chamando de capacidade de meditar e também, no sentido de transcendência, uma experiência de reflexão crítica em torno da presença do mundo. É isso que falta, porque, de um modo geral, o que se enfatiza na prática é a transferência do conteúdo, quer dizer, o ensino fica reduzido a uma técnica de transmissão de conteúdos, uma transmissão menorizadora, mecânica do conhecimento de Biologia, Geografia, de História, de Matemática, de forma a minimizar a minha presença no mundo. A minha formação não se esgota no treino físico, no treino técnico do conhecimento superficial do conteúdo. E isso é hoje uma das características da pedagogia neoliberal. O que eles vêm achando de pragmatismo na prática docente. Para mim, a educação é mais do que isso, a meu ver, envolve a meditação permanente. (FREIRE, 1997, p. 5, grifos nossos).

Freire expressa que falta algo à educação, à experiência pedagógica e que elas não se reduzem ao conhecimento técnico, pois isso limita a presença da humanidade no mundo. Então, ele declara que o que está faltando é a capacidade de meditar no âmbito da transcendência, acordando com o tipo de meditação do entrevistador, que é a meditação tântrica. Segundo Sarkar (2001), a prática da meditação conduz ao sentimento de unidade e de amorosidade por todas as coisas. Para Freire (2005), esse sentimento é a capacidade de a humanidade amar o mundo e comprometer-se com a causa dos oprimidos e de sua libertação. Nesse sentido, Sarkar também expressa seu compromisso com a causa dos oprimidos. Ele não se dedicou somente à filosofia e à espiritualidade e deixou de lado as questões sociais, políticas e econômicas. O que ele fez foi unir as questões filosóficas e espirituais, por meio do neo-humanismo associado à Teoria da Utilização Progressiva (PROUT), que trata de um sistema para a reorganização da sociedade e da economia visando o bem-estar de todos(as).

Quando Sarkar passou a difundir a transformação social, política e econômica da Índia, por meio da PROUT e da filosofia neo-humanista, ele despertou certa rivalidade em alguns grupos da sociedade indiana. Diante disso, no ano de 1972, a primeira-ministra Indira Gandhi mandou encarcerar Prabhat Ranjan Sarkar. Durante os seis anos em que passou no cárcere, sobreviveu a uma tentativa de envenenamento por oficiais do governo e passou a jejuar, vivendo de uma dieta líquida por cinco anos e meio, como protesto. Em 1978, foi absolvido de todas as acusações pela Corte Suprema da Índia e liberado da prisão.

Ao sair da prisão, continuou propagando o neo-humanismo e o sistema de PROUT, o qual prevê a utilização máxima e a distribuição racional de todas as potencialidades, no âmbito físico, mental e espiritual. Sarkar compreende que a humanidade só poderá se dedicar à epistemologia tântrica, ou seja, à expansão da mente se possuir suas necessidades básicas atendidas. Para o pensador, portanto, só seria possível desenvolver uma espiritualidade plena ao haver uma descentralização da economia para as classes oprimidas. A característica essencial de PROUT “[…] é o compromisso de liberar os seres humanos dos problemas materiais, de modo que todos possam ter, cada vez mais, oportunidade de alcançar a liberação intelectual e espiritual” (SARKAR, 2009, p. 11). A obra Democracia Econômica de Sarkar (2009) detalha o sistema de PROUT e propõe outro modo de produção da vida que não se ancora no capitalismo e nem no comunismo, pois, para ele, esses sistemas compreendem que a base da vida humana está no materialismo. Entretanto, o autor considera que a “[…] utilização da ciência material e da tecnologia pode ajudar a aumentar a riqueza de um país e deste modo aliviar as dificuldades financeiras do povo, mas ao resolver os problemas econômicos não se resolvem todos os problemas. [...]. Há muito mais para a vida humana do que isto” (SARKAR, 2009, p. 20).

No período da ditadura militar no Brasil, Freire também foi perseguido e preso em 1964. Ficou exilado por quase 16 anos, por defender uma educação que não estimulasse “[…] a submissão ou a interdição à leitura do mundo aos segmentos desprivilegiados da sociedade”, conforme Nita Freire (2006, p. 347). Ele propôs que o povo pronunciasse a palavra que leva à sua humanização e à inserção político-econômico-social de todos e de todas em suas sociedades. De modo semelhante, ambos (Freire e Sarkar) anunciavam a necessidade de lutar coletivamente contra toda a forma de exploração e de opressão e propagavam um projeto universalista voltado à transformação social e a uma educação libertadora.

Considerações finais

O objetivo deste artigo foi discutir as contribuições de Paulo Freire na Índia e suas conexões com a filosofia neo-humanista proposta por Prabhat Ranjan Sarkar. Tratou, ainda, do movimento de internacionalização que Freire forjou no período do exílio até chegar à Índia.

No que se refere às expressões de internacionalização em Freire, consideramos que o exílio propiciou uma profunda conexão com a cultura dos diversos povos que habitam o planeta. Por meio dessas experiências, Freire vivenciou a interculturalidade por meio do diálogo entre culturas, línguas, etnias e saberes, que fortaleceram a troca de conhecimentos, de experiências, de vínculos e a convivência sem qualquer forma de imposição e de anulação da diversidade.

Quando Freire esteve na Índia, olhou para a realidade dos(as) indianos(as) e percebeu as diferenças culturais, as exclusões, as desigualdades e os desafios que eles(as) enfrentavam para produzir a sua existência. Contudo, reiterou que não tinha a intenção de dizer o que os(as) indianos(as) deveriam fazer. O que ele fez foi por meio do diálogo, auxiliando ONGs, grupos de educadores, estudantes, lideranças dos dalits, entre outros, contando sua trajetória pessoal e profissional, e a partir disso provocou reflexões críticas sobre a sociedade e a educação indiana, propondo ações comprometidas com um projeto de educação voltado à participação de todos(as) e a libertação das castas oprimidas. Sua interlocução com ONGs fortaleceu experiências educativas locais de libertação, sobretudo em vilarejos, tribos e favelas. Em síntese, por meio de sua experiência e do diálogo intercultural, provocou, evocou e convocou a sociedade indiana, sobretudo as ONGs a refletirem criticamente sobre suas realidades.

Quanto à educação escolar, sobretudo à educação de adultos(as), o governo indiano incorporou aspectos da pedagogia freiriana, no entanto, desconsiderou a dimensão central, a política. A contribuição do pensamento de Freire conduziu uma série de vitórias às comunidades de dalits e tribais nas décadas de 1970 e 1980, visto que aprenderam a importância do trabalho coletivo e a mobilização política. Ademais, o trabalho com a pedagogia freiriana afastou o sentimento de que eram inferiores e impuros, embora fossem economicamente os mais pobres dos pobres.

Freire e Sarkar estão ontologicamente conectados por anunciarem uma práxis voltada à transformação social, ancorada em uma visão universalista, e por defenderem uma educação libertadora baseada na ética, na ciência, na filosofia e na espiritualidade. Ambos compreendiam a imanência e a transcendência como dimensões da vida humana que se interconectam mutuamente. Dessa interconexão, emergiu o sentido de humanização proposto por Freire, que implica um movimento permanente de se autofazer no mundo para superar as situações limites e construir novas formas de viver que elevem cada vez mais a humanização do planeta.

1Segundo Igelmo Zaldivar e Quiroga Uceda (2021), foram quatro viagens de Freire à Espanha a convite de três instituições de Educação Superior: a Pontifícia Universidade de Salamanca, em 1984; a Universidade de Barcelona, em 1988 e 1994; e a Universidade Complutense de Madri, em 1991. De acordo com os autores, há alguns textos, livros, artigos e vídeos na Internet sobre o trabalho de Freire nesses espaços acadêmicos. Vale ressaltarmos que a presença de Paulo Freire contribuiu para o fortalecimento da Pedagogia Social.

2 Streck, Loureiro e Rosa (2021) realizaram a transcrição e a tradução de quatro fitas K-7 com palestras e diálogos de Paulo Freire com educadores da Austrália, no ano de 1974. Segundo os autores, o conteúdo das fitas revela a preocupação de Freire em conectar-se por meio do diálogo com sujeitos de outras culturas e, também, fazer um movimento interdisciplinar, relacionando Pedagogia e Teologia; “[...] soma-se a isso a dificuldade de expressar pensamentos complexos em um idioma que não era o seu e que, com isso, aumentava o risco da incompreensão” (STRECK; LOUREIRO; ROSA, 2021, p. 128).

3A tese de Ribeiro (2009) aborda as viagens de Freire quando ele esteve no Conselho Mundial de Igrejas. O texto de Jevdet Rexhepi (2019), intitulado Reading Freire in the Middle East: vision 2030 and the reimagining of education in Saudi Arabia, discute Freire no Oriente Médio.

4Indicou bibliografias sobre experiências com o pensamento de Paulo Freire nas comunidades rurais na Índia.

5Comentou que não havia registro do período em que Freire esteve na Índia; contudo, fez referência a uma situação que ele vivenciou na Índia relacionada à sua saúde e também mencionou acerca do livro de Venício A. de Lima, intitulado Parceiros de caminhada: reconhecimento e memória, o qual aborda a experiência de um professor de física em uma escola de Educação Fundamental no sul da Índia, quando um dos professores demonstrou saber sobre Paulo Freire.

6Desafia no sentido de pôr em diálogo todas as formas de conhecimento, a partir dos contextos de vida de cada sujeito, cuja finalidade é cunhar processos de transformação social e outras formas de “poder”.

7Na obra Pedagogia da Esperança: um reencontro da pedagogia do oprimido, Freire menciona que recebeu cartas da Índia “[…] para discutir e debater pontos teórico-práticos dos livros” (FREIRE, 2008, p. 122). Quanto a essas cartas, Andreola faz referência à de Indira Gandhi, escrita em 16 de maio de 1973. Indira lamenta: “[…] por uma indisposição de saúde, tivesse cancelado uma visita à Índia, expressando a esperança de ainda encontrar-se com ele, para conhecer melhor suas ideias em educação, das quais confessa ter apenas uma noção” (GADOTTI, 1996, p. 57). Na palestra realizada em 22 de novembro de 1994, Freire mencionou que, quando esteve na Índia, teve uma grave infecção e precisou retornar às pressas para a Europa. Essa palestra, realizada no auditório do Centro de Divulgação Científica e Cultural (CDCC) em 22 de novembro de 1994, foi patrocinada pelo Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo (USP) e pela Escola Educativa (FREIRE, 1994).

8“O problema na Índia é que as pessoas não estão interessadas em aprender com o militante. A questão da motivação das pessoas surge. Sua teoria assume a disposição das pessoas em aprender com você. Este não é o caso aqui” (FREIRE, 1979b, p. 5, tradução nossa).

9Os ex-párias representam mais de cem milhões na Índia, “[…] estigmatizados pela intocabilidade, desumanizados e em grande parte isolados de uma economia globalizada e de normas de justiça e os caminhos para a emancipação são raros” (SIMON, 2014, p. 2, tradução nossa).

10Ambedkar, líder dalit, nasceu em 1891. Teve acesso à escola primária, assim como alguns outros dalits. Eles frequentavam uma sala separada que ficava com a porta aberta para que pudessem ouvir as lições. “Ele foi o único Dalit da escola a passar nos testes. Enquanto outros internalizavam as opressões [...], Ambedkar desenvolveu uma determinação para se libertar. [...] com a ajuda de um professor Brahman [...] no ensino médio, Ambedkar era o único intocável, [que chegou] até a Universidade de Colúmbia” (SIMON, 2014, p. 2, tradução nossa). Cursou dois mestrados e um doutorado em Economia. Ao regressar à Índia, tornou-se uma grande referência para os dalits e para a futura classe de dirigentes na Índia. Vale ressaltarmos que Ambedkar defendia a anulação da casta e, nesse sentido, discordava de Gadhi, que argumentava pela sua preservação. “Gandhi renomeou intocáveis ‘harijan’ (filhos de Deus), mas os dalits rejeitaram esse nome porque simbolizava ‘meninas dalits pobres dadas aos templos hindus, [...] geralmente forçadas a viver como escravas sexuais de sacerdotes e doadores ricos para o templo’” (SIMON, 2014, p. 2, tradução nossa).

11Parte do trabalho de campo desse autor foi realizada junto a Association for the Rural Poor (ARP), fundada no início dos anos de 1970 e “[…] uma das primeiras organizações envolvidas em alternativas radicais de desenvolvimento na Índia. A maior parte de seus organizadores eram dalits” (THOMAS, 2021, p. 213). Seus fundadores basearam-se em Gandhi, Freire, teologia da libertação, marxismo e métodos de Saul Alinsky sobre movimentos populares.

12A Liga do Serviço Social de Bengala foi uma, dentre outras organizações, que começou a produzir material didático usando métodos freirianos.

13Segundo Bhattacharya (2021), a população alfabetizada na Índia era baixíssima. “No início dos anos 80, constituíram metade da população analfabeta do mundo” (BHATTACHARYA, 2021, p. 162).

14A filosofia neo-humanista considera que a existência não é a única realidade, mas um contínuo de vários níveis da mente, como consciente (sentidos), subconsciente (intelecto) e superconsciente (criatividade, intuição e espiritualidade). Essas dimensões quando desenvolvidas criam um elo profundo entre humanidade, animais, plantas e objetos inanimados.

15Nasceu em 21 de maio de 1921 e faleceu em 20 de outubro de 1990.

16Em 1963, Sarkar fundou o Departamento de Educação, Socorro em Bem-Estar (ERAWS) na Ánanda Márga Prácaraka Sagha, que significa Organização para a propagação do Caminho da Bem-Aventurança, instituição não governamental criada pelo indiano em 1955, inicialmente na Índia e, mais tarde, em diversos países. Atualmente, sua filosofia está estabelecida em mais de 100 países.

17Significa a superioridade de um território e desprezo pelo restante, limitando o desenvolvimento de outros territórios. “O fascismo surge desta mentalidade, como também o imperialismo, o capitalismo, a oligarquia e a burocracia” (SARKAR, 2001, p. 25). Disso resultam outros sentimentos, como geopatriotismo, geoeconomia, georreligião, entre outros. Ressaltamos que a noção de território dos movimentos sociais não se alinha ao geosentimento apontado por Sarkar, visto que os movimentos sociais não têm a intenção de explorar e de isolar um território em detrimento de outro. Para os movimentos sociais, o uso do território é para moradia e produção e reprodução da vida de diferentes culturas.

18Sentimento que visa o bem-estar de uma comunidade, de seus interesses, que não podem violar o crescimento de outras comunidades. Disso resultam as formas de racismo, de misoginia, de machismo; enfim, a superioridade de um grupo e a exclusão de outros.

19Defende que todos os seres humanos são iguais, mas desconsidera outras formas de vida, como os animais e as plantas, disso resultam conflitos sociais.

20Segundo Boff (2008, p. 813), a transcendência não pode ser enquadrada “[…] dentro de nenhuma fórmula, instituição ou religião [...]. Esta [a transcendência] nunca desaparece porque ela é intrínseca e escapa ao poder humano de afogá-la”.

21Foi um movimento intelectual europeu que teve início no século XIV, na Itália, comprometido em melhorar as condições de vida da humanidade, por meio do desenvolvimento científico, artístico, estético e de uma racionalidade baseada na lógica e na razão. Esse movimento teve vínculo com o Renascentismo, e, após um século e meio, assumiu as aspirações universalistas do iluminismo, culminando na Revolução Francesa e Industrial. Ressaltamos que o homem Vitruviano de Leonardo da Vinci representa um dos princípios do humanismo, que é o antropocentrismo.

22Estudou a obra Pedagogia do Oprimido em uma universidade dos EUA, no Curso de Ciência Política, há mais de três décadas, e considera que ela o “[…] inspirou muito a dedicar minha vida pela causa da mudança mundial, de ajudar a criar uma verdadeira revolução baseada no amor e na solidariedade aos desfavorecidos” (FREIRE, 1997, p. 4).

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Recebido: 10 de Março de 2022; Revisado: 22 de Julho de 2022; Aceito: 20 de Agosto de 2022; Publicado: 28 de Agosto de 2022

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