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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.17  Ponta Grossa  2022  Epub 23-Fev-2022

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.17.18536.018 

Dossiê: Relações étnico-raciais: práticas e reflexões pedagógicas em contextos, espaços e tempos

Poética do movimento e interculturalidade quilombola: corpo e danças decoloniais na perspectiva freireana*

Poetics of quilombola movement and interculturality: body and decolonial dances from the Freirean perspective

Poética del movimiento quilombola y la interculturalidad: cuerpo y danzas decoloniales en la perspectiva freireana

Thais de Jesus Ferreira** 
http://orcid.org/0000-0002-2149-2169

Maria Cecilia de Paula Silva** 
http://orcid.org/0000-0002-3506-8510

**Doutora em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (FACED/UFBA) – linha de pesquisa Educação, Cultura Corporal e Lazer. Mestra em Dança pelo Programa de Pós-Graduação em Dança (PPGDANÇA) da UFBA. Docente do Instituto Federal do Paraná (campus Palmas) e Coordenadora de Ensino, Pesquisa, Extensão e relações com a comunidade (FAMA). E-mail: <thaisedfisica@hotmail.com>

**Doutora em Educação Física (com bolsa concedida pela Capes) e Mestre em Educação Física (com bolsa concedida pelo CNPq) pela Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, pela Linha de Pesquisa Educação e Cultura. Professora Titular do Programa de Pós-Graduação e Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Pesquisadora convidada da Université de Strasbourg. Pós-doutorado em Sociologia e Antropologia (2016) (Capes) e em Educação e Sociologia (2012) (Capes/Cofecub) pela Université de Strasbourg. Coordenadora do PPGE da UFBA 2017-2021. Líder do grupo de pesquisa História da Cultura Corporal, Educação, Esporte, Lazer e Sociedade (HCEL) da UFBA – CNPq. Editora Associada da Revista Entreideias: educação, cultura e sociedade. E-mail: <ceciliadepaula.ufba@gmail.com>


Resumo:

Neste artigo, analisaram-se danças decoloniais quilombolas na perspectiva freireana, a partir da investigação das matrizes estéticas e motrizes culturais constituintes do samba de roda e fandango caiçara. Considerou-se como a textualização dos corpos de quilombolas expressam a perspectiva decolonial da dança. Trata-se de pesquisa histórica do tempo presente. Utilizaram-se referenciais teóricos e observações de práticas artístico-culturais de danças quilombolas, mais especificamente o samba de roda do Quilombo Buri, Bahia; e o fandango do Quilombo Batuva, Paraná. Concluiu-se que a interculturalidade expressa nos sentidos e nos significados das danças decoloniais desvela historicidade e memórias do Atlântico negro e da diáspora e se atualiza no tempo presente. O samba de roda do Quilombo Buri revela a produção do interconhecimento que evidencia salvaguarda da cultura, resistência e reinvenção dos saberes. No Quilombo Batuva, registros da dança decolonial são históricos. Fandango não compõe as práticas artístico-culturais do quilombo, mas ele significa e traduz as relações de educação, corpo e cultura da comunidade.

Palavras-chave: Dança; Decolonialidade; Quilombo

Abstract:

In this paper, the quilombola decolonial dances were analyzed from the Freirean perspective, based on the investigation of the aesthetic matrices and cultural motives that constitute the samba de roda and fandango caiçara. It was considered how the textualization of quilombola bodies express the decolonial perspective of dance. It is a historical investigation of the present time. Theoretical references, observations of artistic and cultural practices of quilombola dances were used, more specifically the samba de roda of the Quilombo Buri, Bahia; and the fandango of the Quilombo Batuva, Paraná. It was concluded that the interculturality expressed in the senses and meanings of decolonial dances unveils historicity and memories of the black Atlantic and diaspora and it is updated in the present time. The samba de roda of the Quilombo Buri reveals the production of inter-knowledge that highlights the safeguarding of culture, resistance and reinvention of knowledge. At the Quilombo Batuva, records of decolonial dance are historical. Fandango is not part of the quilombo’s artistic and cultural practices, but it signifies and translates the relations of education, body and culture of the community.

Keywords: Dance; Decoloniality; Quilombo

Resumen:

En este artículo, se analizaron danzas decoloniales quilombolas en la perspectiva freireana, a partir de la investigación de las matrices estéticas y matrices culturales constituyentes de la samba de roda y el fandango caiçara. Se consideró cómo la textualización de los cuerpos de quilombolas expresan la perspectiva decolonial de la danza. Se trata de una investigación histórica del tiempo presente. Se utilizaron referenciales teóricos y observaciones de prácticas artístico-culturales de danzas quilombolas, más específicamente la samba de roda de Quilombo Buri, Bahía; y el fandango de Quilombo Batuva, Paraná. Se concluyó que la interculturalidad expresada en los sentidos y los significados de las danzas decoloniales desvela la historicidad y memorias del Atlántico negro y la diáspora y se actualiza en el tiempo presente. La samba de roda de Quilombo Buri desvela la producción del interconocimiento que evidencia salvaguarda de la cultura, resistencia y reinvención de los saberes. En Quilombo Batuva, los registros de danza decolonial son históricos. Fandango no compone las prácticas artísticas y culturales del quilombo, pero significa y traduce las relaciones de educación, cuerpo y cultura de la comunidad.

Palabras clave: Danza; Decolonialidad; Quilombo

Corpo(reo)grafar: devires decoloniais e insurgências quilombolas

Tecemos este artigo com base no pensamento poético (GLISSANT, 2005). Para o autor essa perspectiva poética possibilita traçar um “rizoma com o mundo”, no sentido de irrigar a escrita na delicada busca de deciframento do real, tanto no campo estético quanto nos campos histórico, político e ideológico. No processo de elaboração desse rizoma, as transformações do espaço-tempo e das realidades culturais bem como os deslocamentos e as errâncias tornam-se constitutivos da própria escrita. O encontro entre culturas tem como resultante a imprevisibilidade (GLISSANT, 2005).

O entrecruzar de culturas quilombolas é estratégia de descolonização do pensamento, de identificação e de afirmação de saberes e de experiências historicamente silenciados. Discorrermos sobre essas comunidades, no tempo presente, via poética do movimento, possibilita reconhecer lógicas coloniais e projetos decoloniais.

Para Quijano (2007), a colonialidade do poder é a classificação social da população mundial ancorada na noção de raça, originária do caráter colonial. Entretanto, já provou-se ser mais duradoura e estável do que o colonialismo histórico, em cuja matriz foi estabelecida. O discurso colonial vê o corpo colonizado como corpo destituído de vontade, de subjetividade, pronto para servir e destituído de voz (HOOKS, 1995). Para a autora, corpos negros escravizados foram entendidos como destituídos de alma, reduzidos à objetificação e à subalternização.

A universalização da epistemologia dominante, embora travestida de neutralidade, é masculina, branca e eurocentrada. Em contrapartida, a decolonialidade como projeto elabora um pensamento de fronteira, de perspectivas de povos subjugados e sujeitados. Para Walsh (2013), decolonialidade é visibilizar as lutas contra a colonialidade a partir das pessoas, das suas práticas sociais, epistêmicas e políticas. Assim, as danças quilombolas em uma perspectiva intercultural e decolonial representam uma estratégia que supõe criação e construção que pode gerar emancipação para além da superação da descolonização. “Sua meta é a reconstrução radical do ser, do poder e do saber” (OLIVEIRA; CANDAU, 2010, p. 24).

Para Costa e Grosfoguel (2016), na perspectiva do projeto decolonial, as fronteiras não são somente o espaço onde as diferenças são reinventadas, são também loci enunciativos de onde são formulados conhecimentos a partir das cosmovisões ou das experiências dos sujeitos subalternos. Há conexão implícita entre lugar e pensamento.

As diferenças coloniais são centrais no projeto decolonial, assim como os múltiplos devires e heterogêneas insurgências dos sujeitos e das comunidades subalternizados pela colonialidade do poder. Santos (2010) entende a urgência do diálogo intercultural e transmoderno, fundamentado no sul global e na produção de novas epistemologias. A decolonialidade é, por assim dizer, um projeto de existência, de vida (WALSH, 2013). Alicerçada no diálogo pluri-universal e transepistemológico.

Com base na decolonialidade e nos fundamentos da interculturalidade, colocamos em foco os trajetos da produção coreográfica de diferentes quilombos, Buri, na Bahia, e Batuva, no Paraná, que acontecem centrados em investigações que ocorrem pelo/no corpo. Seguimos, como Freire (2015, p. 257), “na luta de reinvenção do mundo” para analisarmos configurações das danças quilombolas, a partir da investigação de matrizes estéticas e motrizes culturais, constituintes das corporeografias do samba de roda baiano e do fandango paranaense. Em específico, possíveis expressões decoloniais da dança na textualização dos corpos quilombolas nessas comunidades.

A perspectiva freireana, considerada decolonial, evidencia a humanização e a desconstrução de lógicas opressoras de produzir conhecimento. Para Freire (2016), toda prática social – a exemplo das danças quilombolas – é uma prática educativa e política. O autor considera que todo ato educativo é um ato político. Assim, a educação corporalizada, por ser uma prática de liberdade, é emancipatória.

As corpografias quilombolas constituem-se em experimentações e territorializações estéticas que possuem o corpo e a cultura como eixos de investigação nos processos criativos e de composição. Corpografias são cartografias corporais, história e memória inscrita no corpo (BRITTO, 2008). Matos (2014) sustenta que a cartografia pode ser entendida como espaço de (re)apropriação. O corpo que dança ao movimentar-se transgride o seu lugar, transforma o espaço e gera mudanças corporificadas.

Ao analisar coreografias, na perspectiva decolonial, compreendemos que o corpo é cartografante e o mapa produzido pela corpografia é mutante, não linear e não conclusivo. Pode apresentar paradoxos, múltiplas forias e disforias (MATOS, 2014). Para a autora, “[...] o corpo se inscreve no espaço ao mesmo tempo que o espaço se inscreve no corpo” (MATOS, 2014, p. 17). Inscrições corporais territorializadas delineiam o entendimento de corporeografias quilombolas ao considerar relações intrínsecas entre processos criativos corporificados, composições estético-coreográficas e hibridismos culturais (CANCLINI, 2015).

O mosaico de múltiplas cenografias constituído em solos movediços da cultura quilombola desvela pluralidade e transepistêmes derivadas da diáspora Africana e (re)territorializações estéticas em dança. Esse mosaico é aqui considerado poética do movimento, descortinado a fios das corporeografias. Corporeografias que re-singularizam o ser social-cultural e constróem novas formas de significar territórios e identidade. Danças implicadas em matrizes estéticas e/ou motrizes culturais desvelam a decolonialidade.

Para Bião (2009, p. 374), as matrizes estéticas são formas culturais aparentadas e identificadas por suas características estéticas, “[...] aquilo que dá cimento, que dá ligação comunitária, é o estético, o que se sente e o que se considera como belo”. Essa noção de matriz estética tem como base a ideia de que é possível definir-se uma origem social comum constituída ao longo da história, em uma família de formas culturais aparentadas, identificadas por suas características sensoriais e artísticas, portanto estéticas, em duplo sentido: amplo (de sensibilidade) e restrito (de criação e de compreensão do belo).

Estudarmos manifestações culturais sob perspectivas estéticas e artísticas pressupõe reconhecermos a noção de motrizes culturais (LIGIERO, 2011). O autor considera motrizes culturais no plural para conceituar a complexidade das dinâmicas promovidas pelas performances culturais afro-brasileiras, verdadeiras forças que movimentam a construção da cultura. Ele define motrizes não somente como uma força que provoca ação, mas como uma qualidade implícita do que e de quem se move. E a adjetiva, pois, segundo o autor, em determinados momentos, a motriz cultural é o próprio substantivo; e, em outros, caracteriza ações individuais ou coletivas, distinguindo-as.

As matrizes estéticas e motrizes culturais aqui apresentadas possuem um caráter complementar e dialógico, não constrastivo ou comparativo. Da mesma forma, a corporalidade e as produções estéticas em danças decoloniais que tratamos, definidas como samba de roda e fandango, serão discutidas na perspectiva dialógica a partir de seus territórios, na Bahia e no Paraná, que se entrecruzam.

Trata-se de uma pesquisa histórica do tempo presente (SCHUESTER, 2015). Utilizou-se de referenciais teóricos, observações de práticas artístico-culturais de danças quilombolas e entrevistas. As entrevistas semiestruturadas possibilitaram analisar as narrativas de líderes quilombolas – ambos professores/educadores – firmadas na história oral (THOMPSON, 1992). Como loco investigativo, elegemos o samba de roda do Quilombo Buri, município de Pedrão, Bahia, e o fandango do Quilombo Batuva, município de Guaraqueçaba, Paraná.

A ética da pesquisa seguiu as discussões que norteiam a área da educação (ANPED, 2019) e baseou-se na dignidade, na liberdade e na diversidade de indivíduos e grupos humanos e nos “[...] princípios de integridade, transparência e responsabilidade na condução da pesquisa e seus resultados” (HERMANN, 2019, p. 35). Reconhecemos a complexidade ética, as relações interculturais e decoloniais estabelecidas em lógicas e cosmovisões díspares entre pesquisadores e comunidades quilombolas que a todo o instante se reorganizam e ressignificam o conceito de ética, redimensionando-o. As narrativas e os documentos utilizados foram devidamente autorizados.

De acordo com Ligiéro (2011), a história é o que se consegue articular, em discurso, do que se viveu, do que se imaginou, e o que somos capazes de interpretar com nossas palavras, nosso corpo, nosso repertório de imagens e de associações. E a narrativa não é apenas um texto, mas um elemento propiciador da performance oral, em que a história narrada não só exemplifica a relação do sujeito com o tema, mas o posiciona como criador de imagens vivas.

Espera-se que o espectador-leitor seja enredado pela natureza das narrativas quilombolas, ativando sua percepção das danças decoloniais e lhe dando poder de imaginar, transformando-o em um ativo viajante das palavras e corpos textualizados. Que transite entre o escrito, o vivido e o imaginado!

Matrizes estéticas e motrizes culturais: o que pode o corpo decolonial?

Entendemos que as matrizes estéticas das culturas quilombolas, aqui pesquisadas, são formas aparentadas e estão diretamente implicadas pela colonização e suas tentativas de branqueamento dos povos. Os quilombos, comunidades remanescentes de povos escravizados, localizam-se em lugares/espaços de invisibilidade e de silenciamento. No que tange à pesquisa desenvolvida nestes dois locais, Paraná e Bahia, deparamo-nos com situações em que o fandango e o samba de roda, aqui apresentados, possuem aproximações relacionadas às suas matrizes e às múltiplas influências decorrentes dos fluxos culturais da América, da África e da Europa.

Bião (2009) aborda a noção de matrizes estéticas como uma possível identificação de origens aparentadas em determinada cultura e comunidade, a partir do entrecruzar de características artísticas e sensoriais e de compreensão do belo. Já, para Ligiéro (2011), as dinâmicas das motrizes culturais se processam no corpo do performer como um todo. O corpo é seu texto. “Nele se corporifica uma literatura viva [...], refletindo o conhecimento que se tem da tradição” (LIGIÉRIO, 2011, p. 111). Mais do que marcas, símbolos e formas, as motrizes se efetivam pelo conhecimento que o performer traz em seu próprio corpo quando a executa, na combinação dos seus movimentos no tempo e no espaço. Ligiério (2011, p. 111) destaca, ainda, “[...] o adjetivo motriz [...], que faz mover, é também substantivo, classificado como força ou coisa que produz movimento”.

As danças quilombolas, derivadas do continente africano e reconfiguradas no solo brasileiro, apresentam características semelhantes em suas funções e em seus elementos constituintes. Nesse sentido, as distintas configurações de danças quilombolas se assemelham não apenas por influências mútuas, mas, sobretudo, nas formas corporais e na manipulação de recursos sonoros, nos estilos de se criar ou recriar ou, muitas vezes, reinventar no imaginário das heranças africanas (LIGIÉRO, 2011). Neste estudo, afirmamos, portanto, que as noções de matrizes estéticas (BIÃO, 2009) e motrizes culturais (LIGIÉRO, 2011) possuem caráter complementar, não comparativo nem contrastivo. Entendemos que os conceitos são compositivos para pensar/refletir/investigar corpo, em uma perspectiva decolonial e intercultural.

Reconhecemos teóricos do campo das pedagogias decoloniais como Mignolo (2007), Oliveira e Candau (2010), Quijano (2007) e Walsh (2013), porém entendemos que a obra de Paulo Freire se constitui como a gênese do pensamento decolonial. Assim sendo, apresentamos esta análise de corpo nos baseando nas obras de Freire (1967, 2011, 2015, 2016). Pensar o corpo em uma perspectiva decolonial é reconhecer suas matrizes estéticas e motrizes culturais e entender sua existência em e com o mundo. Freire (2011) anuncia a compreensão crítica dos seres humanos como existentes no mundo e com o mundo. Ele propõe a análise da conscientização dos sujeitos e sugere que o homem com consciência crítica pode transformar o mundo por meio da sua ação e de sua linguagem criadora.

Para o autor, o domínio da existência é o domínio da cultura, da história, dos valores – domínio em que os seres humanos experimentam a dialética entre determinação e liberdade. Para Freire (2011), existir é, assim, um modo de vida que é próprio ao ser capaz de transformar, de produzir, de decidir, de recriar, de comunicar-se. Nesse sentido, indagamos: o que pode o corpo decolonial na perspectiva freireana?

Partimos da premissa de que somos capazes de refletir sobre nossas próprias limitações. Reconhecendo-as, somos capazes de romper com lógicas coloniais na busca de libertarmo-nos. A reflexão em questão não pode estar imersa em incertezas, imprecisões e vacuidades, mas precisa estar alicercada em conscientização e ações transformadoras da realidade. Nessa lógica, o corpo decolonial está alicerçado em práticas libertárias, criativas, inventivas e conscientes que envolvem intencionalidade, temporalidade, transcendência, reflexão e ação transformadora. “Para os seres humanos, como seres da práxis, transformar o mundo, processo em que se transformam também, significa impregná-lo de sua presença criadora, deixando nele suas marcas” (FREIRE, 2011, p. 55).

As marcas de corpos decoloniais, nessa perspectiva, pressupõem relações implicadas não apenas com o território/espaço físico que ocupam, mas também em suas relações históricas e culturais. Nesse sentido, as relações corporificadas são em si históricas e produzem conhecimento. E o corpo revela, em suas marcas, a historiografia individual e coletiva.

Na perspectiva freireana, o corpo decolonial compõe-se de ações culturais para a libertação, via conscientização. O corpo decolonial é intencionalidade no mundo. Ele é conhecimento em processo, que supõe dialogias entrecruzadas. O entendimento de corpo decolonial conjectura a unidade entre ação e reflexão sobre a realidade. Freire (2001) defende como sendo a própria presença no mundo em relação dialética com a realidade objetiva e em permanente processo de conscientização.

A consciência crítica da história gera ruptura e descolonização dos corpos e das epistemes, que superam lógicas coloniais e se reconhecem no protagonismo das suas reinscrições corporais. O corpo decolonial, na perspectiva freireana, desse modo, está hibridizado em uma estrutura social, a qual não é a soma nem a justaposição das matrizes estéticas com as motrizes culturais, mas a dialetização entre as duas. A conscientização, tecida a fios das matrizes e das motrizes – história e cultura –, pode gerar processos de libertação de opressões. Processos libertos que desvelam a poética do movimento decolonial.

“Um povo sela a sua libertação na medida em que ele reconquista a sua palavra” (FREIRE; GUIMARÃES, 2011, p. 29). Nessa citação, reinterpretamos o termo “palavra” e o ressignificamos como “textualidade corporal”. Compreendemos que o povo sela a sua libertação na medida em que reconquista sua textualidade corporal, seu corpo. É liberto no momento em que significa a sua existência corporificada, na perspectiva decolonial.

O corpo decolonial, na perspectiva freireana, é emergência para quilombolas, localizados em territórios sociais marginalizados, no qual o poder racializado opera sobre seus corpos. Em resposta à questão anteriormente apresentada, argumentamos: o que não pode o corpo decolonial? E, na sequência, indagamos: Como as danças quilombolas, pautadas na descolonização de corpos, podem constituir novas epistêmes?

Danças decoloniais e (re)(de)colonização de corpos quilombolas

Baldi (2014, p. 10) sustenta que, no entendimento decolonial, o conhecimento é corporalizado; assim, o intelectual, as emoções e o movimento significam e essa “[...] corporificação pode ser entendida como a construção de corpografias, ou seja, de (es)(ins)critas do/no corpo, um corpo-sujeito que tem suas memórias, suas marcas, que é inscrito por elas e, ao mesmo tempo escreve”. Para a autora, o conhecimento corporalizado é localizado geopoliticamente, as origens e os territórios reverberam nos modos de operar, de pensar, de questionar e de viver. A decolonialidade problematiza o conhecimento e ensina a aprender, a desaprender e a desconstruir. Em dança, isso significa valorizar a processualidade e não o produto final. Na dança decolonial, via educação para a libertação, não há sujeitos que libertam e objetos que são libertados (FREIRE, 1989). Não há dicotomia. Há relações horizontalizadas. A dança decolonial é um processo consciente e criativo.

A partir da perspectiva decolonial apresentada, acreditamos que as relações (em dança) não devam ser verticalizadas, mas multidirecionais. As danças decoloniais acontecem a partir do local de pertencimento (BALDI, 2018). A construção epistêmica tem como base a interculturalidade, reconhece silenciamentos e invisibilidades e produz novos discursos com base na poética do movimento. Na perspectiva freireana, a dança decolonial, como ação cultural para libertação, é um processo dialógico, um ato de conhecimento, de consciência e um ato criador (FREIRE, 1989).

Analisamos as danças de dois quilombos, o samba de roda do Grupo Raízes do Quilombo, presente no quilombo Buri (Pedrão/BA), e o fandango caiçara do Quilombo Batuva (Guaraqueçaba/PR). Salientamos que, apesar do fandango não mais estar presente no cotidiano do Quilombo Batuva, essa expressão continua viva em suas memórias e histórias corporificadas.

Principiamos com a apresentação de um gráfico sobre as matrizes estéticas de danças decoloniais. A Figura 1, de Amoroso (2017), apresenta-nos a formação do samba de roda, localizada entre os séculos XVIII e XIX, que desvela as matrizes estéticas derivadas do triângulo Portugal, África e Brasil.

Fonte:Amoroso (2017, p. 60).

Figura 1 Samba de Roda: matrizes estéticas do triângulo Portugal, África, Brasil 

Nela, observamos uma formação do samba de roda com base em heranças e traços culturais entrecruzados de Portugal, África e Brasil. Visualizamos a influência do fandango espanhol, que, de acordo com Tinhorão (2008), tinha como principal característica o sapateio. E este, na composição com a fofa, fado, lundu, batuques hibridiza elementos estéticos e, conforme sugere Amoroso (2017), significa a poética do movimento do samba de roda. A autora buscou apresentar os elementos estéticos que, de geração em geração e em fluxos de idas e vindas, se transformaram e continuaram nos corpos que transitaram e foram gerados no Atlântico negro. Essa primeira análise nos oportunizou realizar uma releitura da apresentação desses elementos estéticos, no sentido compositivo. Objetivamos, com isso, apresentar as matrizes estéticas do fandango caiçara, seus principais elementos e heranças entrecruzadas no trânsito do Atlântico da diáspora africana (África, América, Europa) (Figura 2).

Fonte:Ferreira (2020, p. 129).

Figura 2 Fandango caiçara: matrizes estéticas do triângulo Europa, África, América 

A influência dos europeus na dança do fandango deu-se em relação à musicalidade desvelada nos instrumentos e nas coreografias e expressas pelos sapateados e tamanqueados dos homens e passeados das mulheres (PEREIRA, 1996). De acordo com Tinhorão (2008), da África, foram herdados os sons, os batuques, os movimentos de percussão e os traços culturais corporificados e dançados que, na roda, foram entrecruzados com características das danças indígenas, em especial índios carijós, os quais habitavam o litoral paranaense. Das danças indígenas, o fandango herdou a organização circular e a relação da liderança na dança (pajé/mestres de fandango), o canto e a marcação firme dos pés (BOARETTO; PIMENTEL, 2015). Ressalta-se que os batuques, em diferentes momentos, foram confundidos com fandango e, por vezes, no Paraná, eles eram considerados sinônimos (PEREIRA, 1996).

A Figura 2 permitiu-nos registrar alguns dos elementos estéticos ressignificados pelo trânsito do/no Atlântico negro. Concordamos com Ligiério (2011) que a pluralidade das culturas trazidas da África tem um paralelo com a multiplicidade das culturas nativas das Américas e as formas espetaculares e ritualizadas de suas performances. Essa multiplicidade compõe as danças do fandango e samba de roda. Nesse sentido, compreendemos que as matrizes estéticas do samba de roda e do fandango, elaboradas a partir de alguns de seus elementos formativos, possibilitam cartografar danças decoloniais. A cartografia baseada na heterogeneidade das múltiplas influências, vistas como composições horizontalizadas e com trocas imparciais, desvelam traços e marcas estético-culturais das diferentes configurações de danças quilombolas.

Consideramos que essas duas composições sugeridas anteriormente, se situadas como importantes indicativos matriciais, podem desvelar as motrizes culturais constituídas pelas trocas interculturais, ou, ainda, nos possibilitar apontar trilhas cartográficas para pensá-las – e foi essa a nossa escolha investigativa. A partir dessas matrizes estéticas cartografadas, buscamos, como Freire (2016), a consciência crítica da história e as memórias quilombolas traduzidas em poéticas do movimento. Para tanto, apontamos um argumento a partir da seguinte indagação: O que é possível sinalizar como reverberação das matrizes estéticas nas poéticas dos movimentos das danças decoloniais quilombolas? Essa inquietação levou-nos a propor um desvelar de performances corporeografadas como memorial e literatura viva que convida a todos para cantar-dançar-batucar (LIGIÉRO, 2011).

O sentido obtido pela análise das representações figurativas desse entrecruzamento de saberes possibilitou-nos a reflexão acerca das matrizes estéticas de proposições de danças decoloniais desses quilombos bem como a identificação de aproximações entre ambas. A denominação corporeografia que estamos a utilizar se baseia em uma noção ampliada, na perspectiva de mapeamento corpográfico, prática social, cultural e política, performances ou memórias em movimento.

Como ponto de partida, tomamos a prática artístico-cultural do fandango implicada por tensões sociais que (per)formam fissuras na história da comunidade quilombola do Batuva. Mergulhamos na performance do samba de roda do Quilombo Buri, um fenômeno cultural e social de perspectivas múltiplas e experimentais, que possibilita uma análise do passo/gesto que é tecido e tece o contexto histórico-social da comunidade.

Memorial corporeografado do fandango no território do Batuva

O fandango que acontecia no território que hoje é o quilombo Batuva, ficou registrado nas memórias corpóreas de quilombolas que reverberam sentimentos de nostalgia. A saudade deriva de um tempo em que as simbologias e os signos das danças não eram atravessados por interesses capitalistas e ambientalistas, os quais transfiguraram modos de dançar e fazer fandango, recolonizando-o a partir de outras referências. Para compor esta seção do artigo, utilizamo-nos de entrevista com o líder do quilombo, Ilton Gonçalves da Silva1. Destacamos que, no Batuva, ser fandangueiro precede ser quilombola.

A constituição da temporalidade do fandango e do quilombo neste território e as transições dos acontecimentos existentes neste período atinge o ontem e reconhece o hoje. De acordo com Freire (1989, p. 41), o homem existe no tempo, “[...] herda. Incorpora. Modifica. Porque não está preso a um tempo reduzido a um hoje permantente que o esmaga, emerge dele. Banha-se nele. Temporaliza-se”.

Na medida em que Ilton faz uma emersão no tempo, ele o discerne e suas relações com o mundo se impregnam de um sentido consequente: “Quando existia o fandango aqui eu nem me reconhecia como quilombola, fui me reconhecer depois quando eu já tinha parado de dançar. Dancei muito fandango [...], eu só dançava o bailado” (informação verbal). Ilton relatou sobre a organização do fandango. Ele descreveu que é composto por rabeca, viola, pandeiro, cavaquinho. As músicas são inventadas por fandangueiros. Ilton comentou que era contação de história em música. Um acontecimento durante o trabalho virava moda de fandango. “Se você estivesse colhendo arroz e um escorregasse. Já saia cantando no fandango. [...]. Se você tava indo pra roça e deparasse com uma onça e corresse, podia contar que virava moda. Tudo era coisa criada na hora” (informação verbal).

Com base em Freire (2016), é imprescindível aos sujeitos desenvolverem consciência crítica da história, na busca por emancipação. Ao contextualizar o fandango, o líder declarou que a manifestação nasceu de um trabalho e afirmou com autoridade – de quem realizou muitos fandangos, mutirões-puxirões – como era esse acontecimento no Batuva. Para Ilton, o mutirão consistia em realizar uma roçada que finalizava com o fandango. Este era configurado como paga de trabalho. “Se eu fosse o dono do fandango, eu dava café da manhã, almoço, pinga o dia inteiro, janta, café a noite, pinga a noite inteira. O pagamento do serviço era o fandango. Pagamento do trabalho” (informação verbal).

Ao descrever o fandango, Ilton rememora o passado com entusiasmo e com os sentidos, com gestual e oralidade atentos aos detalhes do que foi experienciado. A escuta e a observação da sua narrativa permitem-nos imaginar as potencias corpóreas e simbologias que envolviam o universo do fandango, iniciado com mutirão de trabalho e finalizado com um grande baile, de forma ritualística e brincante. Ele declarou um incomodo em relação à nova configuração da dança e apresentou uma crítica aos fandangos atuais. Relatou, ainda, que há o desconhecimento das pessoas a respeito da gênese da manisfestação como paga de trabalho. Reiterou que, atualmente, as relações particularizadas e de interesses desfiguram os modos tradicionais da prática do fandango.

Conforme relato de Ilton Gonçalves da Silva, as leis ambientais obliteraram os processos de realização dos fandangos ao proibirem os mutirões para realização das roçadas. As leis ambientais foram instauradas na região entre as décadas de 1980 e 1990. Com isso, as práticas corporais, como o trabalho do plantio, a colheita e a realização de mutirões ou pixirões, foram obliterados.

A crítica em relação as leis ambientais severas no Quilombo Batuva decorrem da sua localização. O Batuva está dentro de uma Área de Proteção Ambiental (APA), fazendo parte do último remanescente da Mata Atlântica. De acordo com Rocha (2004), a criação da APA, em 1985, gerou um embate entre o desenvolvimento local e a proteção ambiental. Em relação a essa questão, Ilton contou-nos que os ambientalistas “[...] não se acusam em proibição nenhuma, mas eles querem fazer com que cumpra a legislação” (informação verbal). E complementou:

Você pode falar com qualquer um dos fiscais ambientais que nenhum diz que proibiu de trabalhar [...]. Mas o que acontece? Se pegar roçando ele multa, prende [...]. Então hoje quem vai fazer um mutirão pra dar um fandango? Ou fazer um fandango sem o trabalho? Vai gastar de 5 a 8 mil pra fazer um fandango. Vai fazer só pra manter a tradição?! Não faz. (Informação verbal).

Leis ambientais desconsideraram que os quilombolas criam o seu mundo transformando a realidade com seu trabalho. Ao condicionarem as práticas culturais no Batuva, instituíram a cultura como produto. Tentaram, de algum modo, transformar o Fandango em mercadoria. Obliteraram as maneiras de pensar e de experienciar o mundo no quilombo, condicionando os modos de vida de acordo com pautas demarcadas pela ideologia de grupos dominantes. Nesse contexto, não era possível aos quilombolas permanecerem no estado em que se encontravam com relação aos enfrentamentos com o mundo e às condições de trabalho no quilombo. Outras estratégias e formas de resistência precisaram ressignificar as relações culturais homem-mundo no Batuva. A extinção do fandango foi uma delas.

De acordo com Freire (1989), essa maneira impositiva de pensá-los e produzí-los condicionou suas ações culturais. Assim, estruturas fundadas naqueles que não tiveram experiências territorializadas se consolidaram. Como resultância desse processo, homem-mundo no Batuva foi recolonizado e o fandango negligenciado.

Antonio Gonçalves da Silva, irmão do Professor Ilton, também professor e líder do Quilombo Rio Verde (localizado na mesma região) relatou que o uso da terra pelos quilombolas resultou em dificuldade pelas restrições apresentadas pelos órgãos ambientais, o que provocou grande impacto nas comunidades. Ele declarou: “Dizem que o papagaio da cara roxa está em extinção, mas o que está em extinção aqui é o ser humano” (ITCG, 2008, p. 80 2). Em consequência de imposições e de tentativa-êxito de (re)colonização de práticas corporais/sociais/culturais, aconteceu a migração do campo para a cidade, em busca de melhores condições de existência.

Além das questões ambientais, o líder do Batuva ressaltou que seu afastamento do fandango também derivou de questões religiosas. Para Ilton, a religião é uma questão que exige respeito e complementou: “[...] na religião dos evangélico não pode ir numa casa de fandango pra dançar. Se ele não vai dançar, o que que ele vai fazer?” (informação verbal). Essa busca pelas normatizações de corpos implica cuidado, controle e vigilância.

Pensar sobre religião é pensar sobre o corpo, sobre suas formas de educação e de apreensão do mundo (RIGONI, 2013). Educação e corpo são constituídos pelos diferentes contextos e esferas da vida. Religião é uma delas. Por isso, é preciso ampliar a compreensão dos sujeitos e suas ações cotidianas corporificadas. Educação e corpo podem/devem ser entendidos como prática de liberdade (FREIRE, 2016).

Em relação às questões religiosas, Rigoni (2013) afirma que mudanças na esfera religiosa dizem muito a respeito das mudanças visíveis nos corpos e suas gestualidades. Isso porque as religiões podem exercer um poder normativo sobre os corpos, quando são submetidos a uma educação marcada por práticas religiosas diversas. Normatização que pode resultar em alienação. De acordo com Freire (1967), o homem não é resultado exclusivo da transitividade da sua consciência. A sua transcendência é a raiz da sua finitude. E a consciência dessa finitude propicia a busca da plenitude na ligação com seu Criador3. “Ligação que, pela própria essência, jamais será de dominação ou de domesticação, mas sempre de libertação” (FREIRE, 1967, p. 40). Ele declara que é a religião – religare – que encarna o sentido transcendental das relações do homem, a qual jamais deve ser um instrumento de alienação.

Ilton relatou que o fandango não é só de quilombola, “[...] é de todo pessoal da região e inclusive aonde não existe essa restrição ambiental e de religiosidade, ainda fazem mutirão, com pouca frequência mas ainda fazem”; e finaliza afirmando: “[...] o fandango pra mim, ele tá totalmente fora do contexto” (informação verbal).

Concordamos com Freire ao sinalizar que, ao considerar o fandango como fora do contexto, Ilton rompe com a aderência cultural. Para o Freire (2011), isso significa ir mais além do mero estar no mundo, é acrescentar à vida outra forma de existência. “Existir é, assim, um modo de vida que é próprio ao ser capaz de transformar, de produzir, de decidir, de criar, de recriar, de comunicar-se” (FREIRE, 2011, p. 53).

As memórias, as histórias e as críticas que emergem das práticas do fandango na região do Batuva refletem as dinâmicas culturais desse território. Ao cartografrar outras simbologias da vida quilombola, compreendemos que as invisibilidades dos passos de dança decorrem de decisões subjetivas de existência derivadas de condições impostas pelas legislações ambientais e por diferentes trocas culturais imparciais.

Os processos de recolonização no quilombo Batuva são tentativas contínuas de silenciamento da cultura. A decolonização dos saberes é incessantemente contrastada com empreendimentos recolonizantes relacionados à invizibilização das ações corporificadas, educação e linguagem de quilombolas. O Professor Ilton, comprometido com a comunidade quilombola com “um projeto de ação para pedagogicamente andar” (WALSH, 2013, p. 67), declara permanecer resistindo:

Nós estamos fazendo educação do campo e aos poucos vem e muda nossa cultura, desfazem nossa cultura. [...]. Mudaram nosso linguajar, desde meus avós era de um jeito, agora mudaram coisas da nossa linguagem. No dicionário, você encontra a palavra padrão e não é isso que nós queremos, queremos nossa linguagem. [...]. Temos que lutar por nossa cultura, errado ou certo nós sempre se entendemos... A comunidade entende! (Informação verbal).

Entendemos, como Ilton, que o mundo não se reduz à linguagem, mas a linguagem se reduz ao mundo. Para Freire (1989), a leitura do mundo precede a leitura da palavra. A educação do campo, em específico no quilombo, é decolonial e requer a transgressão de padrões de fala, escrita e linguagem corporalizada. Para Walsh (2013), assumir o projeto pedagógico decolonial possibilita produzir conhecimento e experiências, em consonância com o reconhecimento das matrizes estéticas, conforme sugere Bião (2009), e motrizes culturais, como pontua Ligiéro (2011), em uma perspectiva de sobrevivência e insurgência.

As memórias do fandango no Batuva estão inscritas nos corpos dos quilombolas, marcados por resquícios históricos de performances estéticas de bailados e de batidos. Escrituras corporais dos quilombolas desvelam e expressam marcas e traços de suas danças passadas, (ins)escritas e grafadas nos seus corpos. Assim, a dança do fandango compõe o memorial quilombola batuvano.

Samba de roda e poética do movimento: cantar-dançar-batucar no Quilombo Buri

“Cantar-dançar-batucar não é apenas uma forma, mas uma estratégia de cultuar uma memória, exercendo-a com o corpo em sua plenitude. Uma espécie de oração orgânica” (LIGIÉRO, 2011, p. 130). Para o autor, a filosofia e a visão cósmica da tradição garantem sua verdadeira continuidade, a qual é expressa, nesta seção do artigo, como poética do movimento. Para sua composição, utilizamo-nos de entrevista da sambadeira e líder do quilombo, Angélica Maria Ferreira de Souza4.

Os discursos corporais expressos em cantos, danças e batuques materializam entendimentos de determinada cultura. Os gestos das sambadeiras e dos sambadores do grupo de samba de roda Raízes do Quilombo do Buri têm simbologias que comunicam histórias, memórias e ancestralidade, ao mesmo tempo em que insurgem sentidos e significados decorrentes da contemporaneidade.

A líder quilombola contou-nos que, no grupo de samba de roda Raízes do Quilombo, a organização da roda tem início com os tocadores que começam o solo dos instrumentos e, posteriormente, as mulheres principiam a formação da roda. A partir daí, segundo Angélica, começa a música e a dança (informação verbal). Para ela, o samba de roda do Buri significa a propagação da identidade do quilombo.

A sobrevivência de passos e de gestos no Buri são motrizes culturais que codificam as presenças neste tempo e configuram as percepções das dançarinas e dos dançarinos acerca das construções identitárias no quilombo. Conforme Amoroso (2019, p. 479), é “[...] no corpo que dança que as subjetividades são produzidas e engajadas a questionamentos identitários do tempo presente para além de uma identidade imaginada”.

As identidades no samba são constituídas das relações com o mundo e no mundo, de estar com ele e estar nele. Conforme Freire (2011), isso se dá pelos atos de criação, de recriação e de decisão, por meio dos quais o homem dinamiza o seu mundo, domina a sua realidade, vai humanizando-a. Ele acrescenta a ela algo que ele mesmo produz, temporaliza espaços geográficos; e, assim, faz cultura.

Essa ligação comunicativa com o mundo possibilita a criação de subjetividades expressas no samba de roda. Angélica descreve: “[...] eu danço na ponta dos pés, com um requebrado e um molejo que toda mulher quilombola tem” (informação verbal). As dinâmicas corporais no samba do quilombo indicam, ao mesmo tempo, singularidade e pluralidade. As relações interativas na roda remetem a uma temporalidade suspensa que desvela o encontro da comunidade e sua ancestralidade, do passado-presente, que é remoto e imaginário.

Para Oliveira (2012), a ancestralidade no contexto latino-americano tem no corpo, no mito e no rito componentes singulares e possui o desafio de construção de mundos. A ancestralidade produz encantamento mais do que conceitos. Convive com paradoxos, é propositiva e não analítica. Para o autor, a ancestralidade “[...] é singular e reclama seu direito ao diálogo planetário. Fala desde um matiz cultural, mas não se reduz a ele” (OLIVEIRA, 2012, p. 30). Está além de relações consanguíneas ou de parentesco simbólico.

As relações de vínculo que transcedem são aqui entendidas como enraizamento. Na perspectiva freireana, é “[...] herdando a experiência adquirida, criando e recriando, integrando-se as condições de seu contexto [...], objetivando-se a si próprio, discernindo, transcendendo” (FREIRE, 2011, p. 42) que nos enraizamos no mundo e com o mundo. Nesse sentido, enraizar é relacional. Enraizamento no samba é relação poética. Conota pluralidade, criticidade, historicidade, transcendência e temporalidade. E a poética das relações possibilita transformar-se ao permutar com outros (GLISSANT, 2005). No samba de roda, a poética das relações possibilita transformar-se ao umbigar com outros.

Nas relações estabelecidas no samba de roda, há objetividade e subjetividade, há emocionalidade e passionalidade. Há, ainda, diferentes temporalidades desveladas corporalmente. Passos e gestos de danças quilombolas salvaguardam memórias e escrituras corporais ancestres no tempo presente. Gilroy (2012) afirma que é no corpo que a sobrevivência e a ressignificação dos elementos estéticos africanos se deram no contexto da diáspora. Para Amoroso (2019), o passo do samba de roda, o miudinho, sendo uma herança diaspórica, é, por ele mesmo, uma sobrevivência na dança. A autora complementa que, no intento de invisibilizar passos/gestos, eles se transfiguram e resistem na transformação.

Com base nessas reflexões, indagamos: O que configura o passo e o gesto no samba de roda? E como esses dizeres do corpo desvelam a decolonialidade? Para Amoroso (2019), o passo é patrimônio do corpo. Compreende o passo como código coreográfico. E, por ser código, permite ser acessado. Os passos/gestos dançados são guardiões de uma imaterialidade sensível que se materializa quando dançada. Nesse sentido, entendemos que codificar passos é codificar histórias e memórias. Para Freire (2011), a compreensão crítica da história é fundada em relações interculturais que se dão de forma dialética, por isso é processual e decolonial. Assim, a cultura quilombola gesta a ideologia de resistência em função de sua experiência de luta. Ao gestar ideologias, codifica-as em passos do samba como projetos de natureza político-pedagógica no sentido da transformação ou de reinvenção do mundo.

Para o autor, é a história que nos faz e refaz enquanto a fazemos. A consciência histórica possibilita diferentes maneiras de refletirmos sobre nossa presença no mundo em que e com que estamos. A história, no fundo, é a história de uma constante procura. No samba de roda, as ações não são apenas históricas, mas também historicamente significadas e condicionadas. Nem sempre, ao sambarmos, estamos conscientemente elucidados acerca da concepção da história que nos marca e codifica. Marcas e códigos históricos são aqui considerados passos de dança. E seguimos Amoroso (2019) ao interpretarmos que a percepção do passo permite que ele seja pensado enquanto gesto. Para a autora, a ancestralidade do gesto é atemporal e transgressora de fronteiras do passado, do presente e do futuro.

A descrição de passos e de gestos no samba de roda do Buri transgride fronteiras e é expressa pela codificação criada por Angélica ao ensinar. O primeiro código é oralizado como forma de encorajamento. Angélica comunica: “[...] a primeira coisa que eu falaria, você quer sambar? Você gosta de samba? Então vem pra cá! Vem pra roda!” (informação verbal). Para ela, para dançar samba de roda, basta ter coragem e vontade de entrar na roda, mesmo não sabendo sambar ou não tendo molejo. “Com o toque dos instrumentos o teu corpo vai te levando para o samba. Basta ter vontade que o samba acontece”.

O desconhecimento ao sambar é entendido por Angélica como tempo de possibilidade e não de determinações históricas. A coragem e a vontade mencionadas pela líder desvelam a luta por uma forma possível de inserir-se na história e fazer o samba acontecer. Em Freire (2011, p. 19), “[...] se é tempo de possibilidades, a primeira conseqüência que vem à tona é a de que história não apenas é mas também demanda liberdade”. Para o autor, história é a possibilidade que criamos ao longo dela, para nos libertar. É assumirmo-nos como sujeitos-objetos da história, capazes de reinventar o mundo em uma direção ética e estética. Essa concepção possibilita pensar danças decoloniais quilombolas além de codificações e de passos padrões. O sentido do samba é de continuidade, de criação e de inovação. Samba é roda, é libertário.

Angélica Maria Ferreira de Souza – sambadeira, cantora e instrumentista – relatou que, após encorajar, ensinaria o gingado do “ponta-calcanhar” até a pessoa começar a se balançar. Ela complementou: “[...] eu entraria na roda com a pessoa e quando ela começasse no gingado acelerando um pouco, eu deixaria ela sozinha na roda. Pra que ela mostrasse o seu gingado. Aí tenho certeza que a pessoa aprende a sambar rapidinho” (informação verbal).

Entrar junto na roda é relacional e, nas relações, subjetividades são tecidas e tecem. Segundo Amoroso (2019, p. 481), cada dançarina possui expertise e especialidade em passos “[...] na análise sensível do movimento assim como o entendimento do gesto em termos cinestésicos, físicos e simbólicos vão dialogar diretamente com a dança e sua poética”. A poética do movimento constitui-se na contemporaneidade e na historicidade.

De acordo com Freire (2011), o indivíduo é o sujeito da história. Sua consciência é a fazedora arbitrária da história. Assim, suas singularidades corporificadas desvelam historicidade. E, no samba, os passos traduzem as subjetividades do ser histórico-social-cultural que adentra a roda e nela se ressignifica. Gestos e passos, como expressos no samba de roda, são comunicativos e expansivos, fronteiriços e limiares. Constituem-se de processos abertos, porosos, atemporais e acíclicos. Desvelam diferentes planos cósmicos e espirituais, memórias históricas e políticas hibridizadas em subjetividades, experiências e resistências corporalizadas.

Corpo que não pertence só ao sujeito em si mesmo. Partilha sua história com o acontecer do universo e com o passo infatigável da história coletiva – ancestral (ZAMBRANO, 2013). A percepção do gesto ao dançar o samba de roda é caminho de construção e de desconstrução de passos. É processo criativo de códigos móveis. É estudo e investigação. É experiência e acontecimento.

Samba de roda do Buri acontece na perspectiva do interconhecimento, de múltiplas fusões, em uma poética do movimento (em movimento) que possui alto teor simbólico e presença rítmica marcante. Corpo é expressão. É discurso. Samba é linguagem indizível. É território decolonial em contínuo processo de ritualização e circularidades. Para Ligiéro (2011), cantar-dançar-batucar é um todo indizível e inseparável. No samba de roda, quando há ausência de palavras é preciso corporalizar.

Proposições finais de corporeograficas decoloniais

Entendemos a dança e a poética do movimento decolonial como territórios convergentes, complementares e indissociáveis, constituídos por matrizes-motrizes estéticas-culturais. Processos criativos em danças quilombolas são constituintes de passos e gestos que (re)significam a cultura e evidenciam a decolonialidade dos corpos que dançam.

Corporeografar a dança decolonialmente é estar em processo, é produzi-la de uma forma outra e fruí-la de um jeito outro. Dança na poética do movimento decolonial é (re)cartografada constantemente. Constitui-se na processualidade e no dinamismo da cultura, está pautada na problematização e na reinvenção, em diferentes formas de (re)existência, e evidencia a interculturalidade e o engajamento histórico de povos quilombolas.

Apresentamos a análise das danças quilombolas de diferentes territórios a partir de suas corporeografias. De um lado – sul do Brasil –, expressa pela memória; e, do outro – nordeste do Brasil –, expressa por passos/gestos que são tecidos e tecem o contexto histórico-social das comunidades. Nesse sentido, territórios distintos evidenciam configurações distintas de dança que traduzem as culturas insurgentes determinadas pelas suas localizações, no intento de comunicar memórias, histórias e saberes invisibilizados e/ou silenciados.

A composição de matrizes/motrizes estéticas/culturais e a interculturalidade implicada em quilombos propõe o entendimento de corpografias que reconhecem diferentes epistêmes e experiências. No trânsito de territórios Paraná-Bahia, distintas configurações de corpo, cultura e educação se desvelaram. De um lado, vislumbramos o memorial batuvano do fandango caiçara, e, de outro, o dançar-cantar-batucar do samba de roda que desvela, ao mesmo tempo, ancestralidade e presença. Concluímos, neste trânsito dialógico, que corpos decoloniais, seus passos insurgentes e seus gestos emergentes traduziram de formas distintas a interculturalidade, histórias e memórias quilombolas.

*Financiamento da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB).

1Entrevista concedida por Ilton Gonçalves da Silva em 2020 à Thais de Jesus Ferreira.

2Instituto de Terras, Cartografia e Geociências.

3Teologia da Libertação “[...] significa uma radical ruptura com a forma mágico-mítica de religiosidade e, pondo suas raízes na experiência concreta tempo-espacial, dos homens e das mulheres, do Povo de Deus, fala de outra compreensão da História, na verdade feita por nós. De acordo com esta inteligência da História, Deus é uma Presença nela que, porém, não me proíbe de fazê-la. Pelo contrário, empurra-me a fazê-la. E de fazê-la não no sentido da negação dos direitos dos outros, só porque diferentes de mim” (FREIRE, 2011, p. 19).

4Entrevista concedida por Angélica Maria Ferreira de Souza, em 2020, à Thais de Jesus Ferreira.

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Recebido: 27 de Julho de 2021; Revisado: 28 de Dezembro de 2021; Aceito: 31 de Dezembro de 2021; Publicado: 31 de Janeiro de 2022

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