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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.17  Ponta Grossa  2022  Epub 30-Maio-2022

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.17.19332.065 

Dossiê: Relações étnico-raciais: práticas e reflexões pedagógicas em contextos, espaços e tempos

Abordagens das culturas indígenas na Educação Básica brasileira: reflexões para um ensino intercultural

Indigenous culture approaches in the Brazilian Basic Education: reflections for an intercultural teaching

Enfoques de las culturas indígenas en la Educación Básica brasileña: reflexiones para una enseñanza intercultural

Cristine Gabriela de Campos Flores* 
http://orcid.org/0000-0001-9336-8557

Luana Barth Gomes** 
http://orcid.org/0000-0002-3598-1772

Cledes Antonio Casagrande*** 
http://orcid.org/0000-0003-1499-1661

1Doutora em Educação pela Universidade La Salle. Analista de Pesquisa Científica na Universidade La Salle

2Doutoranda em Educação pela Universidade La Salle, com bolsa concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/Programa de Suporte à Pós-Graduação (Capes/Prosuc). Professora do Colégio Israelita Brasileiro

3Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade La Salle


Resumo

Este artigo tem por objetivo refletir sobre como as práticas educativas e os materiais didáticos presentes na Educação Básica brasileira tematizam, tradicionalmente, as culturas indígenas e apontar alternativas para a construção de uma educação intercultural que promova o reconhecimento e o diálogo com esses povos. Para tanto, utiliza-se a hermenêutica como abordagem metodológica. A discussão está fundamentada em teóricos do pensamento decolonial bem como em publicações de escritores indígenas. O artigo ressalta a importância da reflexão crítica sobre as narrativas históricas e sobre as concepções do conhecimento e dos modos de ser e viver. Por fim, apontam-se alguns dos erros comuns na abordagem das culturas indígenas nas escolas e apresentam-se alternativas para o desenvolvimento de propostas pedagógicas interculturais.

Palavras-chave: Educação intercultural; Interculturalidade; Temática indígena

Abstract

This article has as its goal to reflect on how educational practices and courseware present on Brazilian Basic Education traditionally thematize the indigenous cultures and to point out alternatives for the construction of an intercultural education that promotes the recognition and the dialogue with these people. For that, the hermeneutics as methodological approach is used. The discussion is founded on theorists of the decolonial thinking, as well as publications of indigenous authors. The article highlights the importance of a critical reflection about historical narratives and the conceptions of knowledge and ways of being and living. Finally, some of the errors commonly found in the approach of indigenous culture on schools are pointed out and alternatives for the development of intercultural pedagogical proposals are presented.

Keywords: Intercultural education; Interculturality; Indigenous thematic

Resumen

Este artículo tiene como objetivo reflexionar sobre cómo las prácticas educativas y los materiales didácticos presentes en la Educación Básica brasileña tematizan, tradicionalmente, las culturas indígenas y señalar alternativas para la construcción de una educación intercultural que promueva el reconocimiento y el diálogo con estos pueblos. Para eso, se utiliza la hermenéutica como enfoque metodológico. La discusión está fundamentada en teóricos del pensamiento decolonial, así como en publicaciones de escritores indígenas. El artículo destaca la importancia de la reflexión crítica sobre las narrativas históricas y sobre las concepciones del conocimiento y de las formas de ser y de vivir. Por fin, se señalan algunos de los errores comunes en el enfoque de las culturas indígenas en las escuelas y se presentan alternativas para el desarrollo de propuestas pedagógicas interculturales.

Palabras clave: Educación intercultural; Interculturalidad; Temática indígena

Introdução

Conhecer a cultura do outro É respeitar sua vivência, Conhecer a sua dor. (KAMBEBA, 2020a, p. 92).

Atualmente, vivem 305 povos indígenas conhecidos no Brasil, cada um com sua própria cultura. No entanto, a população brasileira, de forma geral, desconhece as culturas de seus povos originários. Algumas das ideias presentes no senso comum, em relação aos indígenas, são os estereótipos de selvagens, preguiçosos, que representam um atraso ao desenvolvimento, ou a imagem romantizada do indígena, visto como um ser puro e inocente. São crenças equivocadas, que podem gerar intolerância, preconceito, desrespeito, dentre outras formas de violência, que esses povos vêm enfrentando desde o período colonial. Para superar esse desconhecimento, é necessária uma educação que tenha, como fundamentos, o diálogo e a abertura ao outro. É preciso ensinar, desde a primeira infância, que existem diferentes formas de ser, viver e conhecer.

A escola deve ser um espaço de proteção, zelo e de encontro com o outro, onde crianças e jovens podem aprender a conviver com a alteridade, ou seja, um ambiente adequado para que o desconhecimento e toda classe de intolerância sejam superados (VICENZI; PICOLI, 2022). No entanto, muitas práticas pedagógicas e materiais didáticos, que circulam nas escolas, as tornam reprodutoras de ideias sobre as sociedades indígenas fundadas no pensamento moderno, impregnadas de perspectivas excludentes e racistas, contribuindo para reforçar os estereótipos, profanar o sagrado e produzir invisibilidades (GOMES et al., 2021; GOMES; SILVA; CASAGRANDE, 2020; MUNDURUKU, 2009; VICENZI; PICOLI, 2022).

Por muito tempo, a escola brasileira reduziu o conhecimento das culturas indígenas ao Dia do Índio. Essa data, criada pelos não indígenas, geralmente é tematizada de maneira que resulta na reprodução, cada vez maior, de culturas e identidades estereotipadas. Em 2008, foi aprovada a Lei No 11.645, de 10 março, que instituiu a obrigatoriedade do ensino da História e da Cultura Afro-Brasileira e Indígena nos estabelecimentos de Educação Básica (BRASIL, 2008). Essa Lei representa um avanço, no entanto, mesmo após 13 anos de sua vigência, ainda há muito que se melhorar em termos de conceitos e de práticas de ensino intercultural (GOMES et al., 2021; GOMES; SILVA; CASAGRANDE, 2020; MUNDURUKU, 2009, 2016; VICENZI; PICOLI, 2022).

Entende-se, por interculturalidade, uma relação que tem como base o reconhecimento de diversos modos de ser, viver e conhecer. Isso significa que nenhum sujeito, povo ou civilização pode ser considerado como superior ou inferior ao outro, apenas são diferentes (BOACIK; RUBIN-OLIVEIRA; PELOSO, 2022). Um ensino intercultural só poderá ser construído por meio da troca mútua e do diálogo horizontal com os povos indígenas, ouvindo-os, conhecendo suas culturas, reconhecendo seus saberes, conceitos e modos de existir.

Tendo em vista o contexto apresentado, este artigo tem dois objetivos. O primeiro é refletir sobre como as práticas educativas e os materiais didáticos presentes na Educação Básica brasileira tematizam, tradicionalmente, as culturas indígenas. O segundo é apontar alternativas para a construção de uma educação intercultural que promova o reconhecimento e o diálogo com esses povos. Para tanto, utiliza-se a hermenêutica como abordagem metodológica. A abordagem hermenêutica é uma forma de produzir conhecimento por meio do ato de compreender e interpretar os sentidos e os significados expressos na linguagem, buscando a construção de um horizonte comum entre as diferentes perspectivas dos interlocutores (HERMANN, 2002). O exercício hermenêutico possibilita o diálogo intercultural e interepistêmico, proposto no artigo. A discussão será desenvolvida fundamentada em teóricos do pensamento decolonial, como Rodolfo Kusch, Boaventura de Souza Santos e Walter Mignolo, bem como em publicações de escritores indígenas, com destaque para Márcia Kambeba, Daniel Munduruku, Ailton Krenak e Linda Tuhiwai Smith.

O artigo está dividido em três partes. Na primeira parte, discute-se o conceito de narrativas, explanando como a história oficial brasileira oculta as violências que os povos indígenas brasileiros vêm sofrendo desde o período colonial e que perduram até os dias atuais. A segunda parte do artigo trata da questão dos paradigmas e o modo como eles influenciam a sociedade e, consequentemente, a maneira como a educação compreende o conhecimento, a ciência e os diferentes modos de se viver. O último tópico discorre sobre alguns dos erros comuns cometidos pela escola ao tematizar as culturas indígenas e apresenta alternativas possíveis para a construção de um ensino efetivamente intercultural.

As narrativas históricas

Histórias são contadas a partir de um ponto de vista, seja do ponto de vista daquele que a viveu ou daquele que foi espectador e decide narrá-la de acordo com suas percepções ou interesses. Nenhuma narrativa é neutra, pois ela sempre carrega os sentidos de mundo da pessoa que está contando os fatos. Adichie (2019) defende a importância de conhecermos diferentes narrativas e perspectivas de uma mesma história. Para a autora, a história humana vem sendo contada unicamente sob um olhar eurocentrado. Por isso, a narrativa sobre alguns povos, dentre eles, os povos indígenas, é feita de forma incompleta e empobrecida.

Semelhantemente, Kusch (2007) analisa as narrativas construídas a partir dos conceitos de pequena história e grande história. A pequena história contém a narrativa dos vencedores, daqueles que detêm o poder, é aquela que exalta um líder e faz dele um herói, silenciando os relatos dos povos que o acompanharam; ou exalta as batalhas e as conquistas materiais de um povo ou país, ocultando os movimentos de resistência de seus oponentes e, também, as mazelas deixadas nos territórios conquistados. A grande história está mais próxima da representação do todo, compreende as diferentes narrativas de comunidades e povos oprimidos e pode ser relacionada aos movimentos da espécie humana em busca da sobrevivência.

O processo de colonização do Brasil é um exemplo de como a pequena história pode se sobrepor à grande história. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, encontraram povos que aqui viviam. Esses povos tinham suas próprias culturas, línguas, organizações sociais e políticas. Aos olhos dos portugueses, estavam descobrindo uma terra nova, passível de ser conquistada. No entanto, essa terra não era nova, aqui havia gente. Para Munduruku (2009, p. 24), “[...] se quisermos pensar em descobrimento, temos que negar a história dos que são nativos dessa terra”. Desse modo, chamar a invasão portuguesa de descobrimento do Brasil é narrar a história a partir dos olhos do colonizador.

Em sua participação no primeiro episódio do documentário Guerras do Brasil (2019), Ailton Krenak afirma que os primeiros portugueses chegaram às terras brasileiras exaustos, famintos, doentes e não teriam sobrevivido sem a ajuda dos povos locais. Uma narrativa diferente da que se encontra na maioria dos livros didáticos escolares, em que homens com postura heroica chegam em suas caravelas trazendo desenvolvimento aos povos selvagens. Acredita-se, também, que os indígenas receberam os portugueses de forma pacífica, pois fazia parte da cultura desses povos associar-se a outros, por interesses políticos e econômicos (GUERRAS DO BRASIL.DOC, 2019).

Munduruku (2009, p. 81) conta, sobre esse assunto, que foram estabelecidas, “[...] alianças para vencer inimigos comuns, além das trocas econômicas, e, enquanto os europeus foram úteis aos indígenas, as alianças prosperaram e deram excelentes resultados para ambos os lados”. Com o passar dos anos, os povos nativos passaram a perceber que a intenção dos portugueses não era uma convivência baseada em acordos, negociações igualitárias e no compartilhamento de saberes, mas estavam interessados em dominar, escravizar, saquear e extorquir. Uma política que, posteriormente, ficou conhecida como exterminacionista, pois tinha como objetivo o extermínio dos povos indígenas e de suas culturas, por considerá-los um empecilho ao progresso e ao desenvolvimento (MUNDURUKU, 2017).

Diante dessa situação, os povos indígenas passaram a resistir e o que se passou foi um dos maiores genocídios da história da humanidade. Muitas etnias foram dizimadas. De acordo com Munduruku (2009), estima-se que, na região brasileira, viviam em torno de mil povos, que formavam uma população de aproximadamente cinco milhões de pessoas. Havia, também, diversidade de línguas: acredita-se que eram faladas cerca de 1.100 línguas e dialetos. Atualmente, existem em torno de 305 povos conhecidos, somando uma população de aproximadamente 900 mil indígenas brasileiros, que falam mais de 240 línguas diferentes. Ainda existem cerca de 54 grupos que não foram contatados pelos não indígenas, que vivem nas florestas da Amazônia e são conhecidos como grupos isolados (MUNDURUKU, 2009).

Munduruku (2017, p. 75) analisa que “[...] o que aconteceu foi, certamente, um desencontro que culminou em uma relação desigual, desumana e violenta. Essa violência não foi apenas física, com o extermínio de muitas vidas, mas também espiritual e moral”. Os indígenas que sobreviveram foram submetidos à política assimilacionista, que se baseava na crença de que os indígenas não eram gente, mas que poderiam vir a ser, se fossem ensinados. Assim, em 1549, chegaram os primeiros jesuítas ao Brasil, com o objetivo de evangelizar os indígenas e ensinar os valores positivos europeus. Acreditava-se que, dessa maneira, eles deixariam de viver uma existência considerada inferior e selvagem (MUNDURUKU, 2017).

Em 1831, D. Pedro II assumiu o trono e o desafio de construir uma identidade para o país. A solução encontrada foi a de elaborar a imagem do índio como um símbolo nacional. Por óbvio, não se tratava do indígena real, mas, sim, de uma imagem construída, que reduziu toda pluralidade cultural dos diversos povos em um único arquétipo, criando o estereótipo do índio romantizado. Nesse período, pensava-se que o modelo de ser e de viver europeu era o único possível e que a maneira de viver dos povos indígenas deveria fazer parte apenas de um passado exótico. Por isso, até hoje, acredita-se que os indígenas vivem no passado, que sua forma de estar no mundo não é possível na contemporaneidade (MUNDURUKU, 2017).

O discurso ideológico do século XIX também encontrou resistência por parte de indígenas, que não aceitaram deixar de ser e de viver de acordo com seus preceitos. Aconteceram conflitos que foram omitidos pela história oficial. Para cumprir seus objetivos, o estado não poupou esforços, com perseguições, mortes e destruição das culturas. As ações do estado eram justificadas como “um mal necessário” diante dos benefícios que os indígenas teriam ao se renderem a uma vida civilizada (MUNDURUKU, 2017).

Para colocar em prática o projeto de criar uma identidade nacional brasileira, alguns escritores romancistas caracterizaram a imagem dos povos indígenas como bom selvagem, ou seja, indígenas que, supostamente, eram aliados aos não indígenas e lutavam pelos mesmos ideais. As obras Iracema e O Guarani, de José de Alencar, por exemplo, retratam o indígena como um ser dócil, puro, bondoso, romântico, quase como um elemento da natureza. Contudo, também há a versão que retrata o indígena como preguiçoso, um anti-herói e um empecilho para o desenvolvimento do país, como em Macunaíma, de Mario de Andrade, obra do século XX, pertencente ao movimento modernista (GOMES, 2011).

Conforme Schwarcz (1998), o romantismo brasileiro alcançou grande penetração, tendo o indígena como símbolo. Na literatura e na pintura, os ameríndios idealizados nunca haviam sido tão brancos. Foi a melhor resposta encontrada para a elite, que se perguntava sobre sua identidade. Os indígenas passaram a ser representados como puros, bons, honestos e corajosos, atuando como reis no exuberante cenário da selva brasileira e em total harmonia com ela.

Ao longo dos séculos, existiram muitas tentativas de apagamento e de distorção das histórias, culturas e línguas ameríndias. Cristino Wapichana, durante uma entrevista com Daniel Munduruku (2016), analisa o quanto a imagem de Macunáima foi deturpada por Mário de Andrade, a começar pelo nome que foi modificado para Macunaíma. Enquanto o escritor apresenta Macunaíma como um herói sem nenhum caráter, para o povo Wapichana, Macunáima é um semideus muito respeitado. Dessa maneira, a história foi deslocada e transformada (MUNDURUKU, 2016).

Apesar do empenho, as políticas exterminacionista e assimilacionista não foram capazes de resolver o problema que os povos indígenas representavam para o Estado brasileiro. Por isso, no final do sistema colonial, surgiu a política integracionista, sob influência das ideias positivistas. O discurso da política integracionista era que populações indígenas poderiam se integrar por vontade própria ao novo modelo de país, que surgiu após a independência (MUNDURUKU, 2017).

Em 1910, criou-se o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), que, em 1967, foi substituído pela Fundação Nacional do Índio (Funai). A política do SPI consistia em aldear os indígenas, estabelecer a tutela e buscar a assimilação destes e sua integração1 na sociedade nacional.

O Brasil republicano inaugurou um novo momento no indigenismo oficial, ao criar pela primeira vez um órgão de Estado com a finalidade de estabelecer relações de caráter laico com os povos indígenas. Fundado em 1910, o Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais, a partir de 1918 seria apenas Serviço de Proteção aos Índios (SPI). O discurso oficial do novo órgão destacava a proteção e a tutela dos índios - em oposição à violência da conquista dos povos indígenas até então. (BERGAMASCHI; ANTUNES; MEDEIROS, 2020, p. 11).

Foram criados postos em aldeias, que eram administrados pelo chefe. Logo surgiram as escolas, nas quais houve a imposição da fala e da escrita na língua portuguesa. Após alfabetizarem-se, as crianças eram introduzidas em serviços, como o agrícola. Depois de uma série de denúncias de violência e má administração, o SPI foi extinto em 1967. Em 1970, surgiu a Funai, que seguiu os mesmos moldes do órgão anterior. Para Munduruku (2020), a Funai

[...] não representou mudança alguma para as populações originárias. Essa instituição acabou se tornando apenas um instrumento de implantação de políticas desenvolvimentistas para ocupar o território nacional, praticando a remoção, o confinamento, a cooptação das lideranças indígenas e a mistura entre diferentes povos. (MUNDURUKU, 2020, p. 85).

Esses órgãos que, teoricamente, deveriam proteger os povos originários, mantinham, na prática, a política de expulsão, remoção e inserção de terceiros nos territórios indígenas. Ao longo desse período, muitos indígenas migraram para as cidades, pois foram desapropriados de seu território. Em entrevista a Jailson de Souza e Silva, Ailton Krenak (2018a) fala sobre a experiência de migração de seu povo para a cidade.

Esse grupo que saiu do Rio Doce, já na segunda metade da década de 1960, tinha experimentado a dissolução dos coletivos que vivíamos pela violência que chegava lá devido à ocupação daquele território, com disputa de terra, conflitos fundiários agudos e uma negação permanente do direito de a gente ser e de ter uma experiência de viver coletivos. Nossos vizinhos tinham sítios, inclusive aqueles que tomaram a terra dos índios tinham pequenas propriedades. Era uma família, pessoas, indivíduos que eram donos daqueles sítios. A maneira de existir coletivamente não cabia mais naquele lugar, e ficou inviável para a gente como coletivo naquele lugar. Os que estavam resistindo, eram à custa da própria vida; tinha gente sendo assassinada, porque não cabiam mais naquele lugar. Tivemos que buscar outro lugar. (KRENAK, 2018a, p. 5).

Em 1960, em meio à ditadura militar, a Igreja Católica iniciou um movimento em favor dos pobres e necessitados. A partir da corrente conhecida como Teologia da libertação, a instituição religiosa passou a ouvir as necessidades daqueles que se encontravam em situação de vulnerabilidade social, a fim de encontrar soluções por meio de reinvindicações ao poder público. Nesse contexto, estavam os indígenas. Segundo Krenak (2018a), esse foi o primeiro momento em que os indígenas puderam ser protagonistas e debater a realidade em que viviam, pois, até então, sempre foram vistos como incapazes, como aqueles que apenas esperavam doações de comida e agasalho.

A partir desse espaço, alguns indígenas iniciaram um movimento de articulação e comunicação entre diferentes povos. Assim, surgiu a Assembleia de Caciques, que contava com a participação de líderes de diferentes estados brasileiros. Nesses encontros, ao compartilharem suas dificuldades, os caciques perceberam que viviam os mesmos problemas: descaso público, fome, violência institucional. Até esse momento, muitos povos viviam praticamente isolados e mal sabiam da existência de tantos outros povos indígenas no país. Ao conversarem, perceberam que a sociedade precisava ouvir os indígenas, mas que isso só seria possível se fosse realizada uma ação integrada (MUNDURUKU, 2017).

De acordo com Munduruku (2017), durante a década de 1970, os povos indígenas seguiram se articulando e buscando estratégias para resistir ao projeto de apagar suas identidades. Entretanto, foi no início da década de 1980, em Brasília, que surgiu a primeira mobilização política efetivamente indígena. Jovens de diversos povos, que haviam sido enviados por suas comunidades para estudarem na universidade, passaram a se reunir para jogar futebol e, após as partidas, temas como a demarcação das terras e os direitos indígenas foram surgindo em suas conversas. Unidos, fortaleceram suas identidades étnicas e estabeleceram o seguinte lema: “Posso ser quem você é, sem deixar de ser quem eu sou” (MUNDURUKU, 2017, p. 101). Dessa maneira, reafirmavam sua identidade brasileira, mas lutavam pelo direito à diferença.

Como resultado da luta do movimento indígena, a nova Constituição Federal (BRASIL, 1988) reconheceu o direito dos povos indígenas ao usufruto exclusivo das terras habitadas tradicionalmente, à autorrepresentação diante da sociedade, à organização política, ao acesso a uma educação bilíngue, intercultural, específica e diferenciada. A Carta Magna ainda garantia que, até 1993, todas as terras indígenas seriam demarcadas, compromisso que até hoje não foi cumprido pelo Estado Brasileiro.

Esse tópico narrou, brevemente, algumas das formas de violência que os povos indígenas brasileiros vêm sofrendo desde a colonização e que não estão presentes na história oficial. Destacou-se a resistência e a luta desses povos, não só para não serem mortos, mas também para serem ouvidos, para conquistarem o direito aos seus territórios e para viverem de acordo com suas culturas. Defende-se, aqui, que conhecer essa outra narrativa histórica sobre os povos indígenas brasileiros é o primeiro passo para a mudança dos discursos e das práticas pedagógicas, fundamental para a construção de uma escola intercultural. Portanto, mesmo que alguns avanços tenham ocorrido, ainda há desafios a serem superados, tanto para garantir que os direitos assegurados na Constituição sejam, de fato, cumpridos, como para que a sociedade supere a visão preconceituosa e estereotipada sobre os povos indígenas. Nesse sentido, a educação tem um papel essencial, como defende Munduruku (2009):

Se na escola tivermos referências positivas sobre outras culturas, certamente desenvolveremos ideias positivas dessas culturas. Se, ao contrário, nos forem passadas informações negativas, fatalmente cresceremos com imagens negativas, preconceituosas e discriminatórias com relação ao outro. (MUNDURUKU 2009, p. 22).

Contudo, para que a Educação Básica brasileira possa cumprir esse papel, faz-se necessário superar questões de ordem paradigmática e construir um diálogo intercultural e interepistêmico com os povos indígenas, questões que serão abordadas a seguir.

As concepções sobre as diferentes formas de ser, viver e conhecer o mundo e suas implicações na educação

Assim como a importância da compreensão de que podem existir diferentes narrativas sobre uma mesma história e que a narrativa oficial representa, muitas vezes, a versão de quem detém o poder, para a construção de uma educação intercultural é essencial, também, refletir sobre a maneira como a sociedade compreende o conhecimento e os modos de ser e de estar no mundo. Essas questões, de ordem paradigmática, precisam ser pensadas e discutidas, pois o desenvolvimento de um paradigma está associado, também, a uma cultura e a um projeto de sociedade - como é o caso do paradigma moderno, que foi construído sob uma perspectiva colonialista, racista e eurocêntrica, aspectos que serão abordados ao longo deste tópico.

Paradigma pode ser entendido como uma forma de pensar e de agir, fundamentada em um conjunto de crenças e de pressupostos teóricos e práticos de determinada comunidade científica. Nas palavras de Thomas Kuhn (2006), o conceito de paradigma pode ser compreendido de dois modos:

De um lado, indica toda a constelação de crenças, valores, técnicas etc., partilhadas pelos membros de uma comunidade determinada. De outro, denota um tipo de elemento dessa constelação: as soluções concretas de quebra-cabeças que, empregadas como modelos ou exemplos, podem substituir regras explícitas como base para a solução dos restantes quebra-cabeças da ciência normal. (KUHN, 2006, p. 220).

Um paradigma influencia não só a forma como se faz ciência, mas a maneira como a sociedade se organiza política e economicamente e, consequentemente, a forma como a escola concebe o aluno, seleciona e organiza os conteúdos escolares. Nesse sentido, é preponderante que os educadores estejam conscientes dos pressupostos a partir dos quais operam. Ou, como afirma Mário Osório Marques (1992, p. 547): “Trata-se de repensar o próprio pensamento no que tem ele de impensado, nos seus pressupostos mais esconsos. [...] torna-se imperioso repensar a educação nos seus paradigmas, entendidos estes como as estruturas mais gerais e radicais do pensamento e da ação educativa”.

Com o advento da Revolução Científica, entre os séculos XVI e XVII, surgiu o que pode ser denominado de paradigma moderno, centrado na premissa de que somente por meio da matemática é possível realizar a análise, a investigação e a representação das estruturas da matéria. Na perspectiva da racionalidade moderna, somente objetos quantificáveis podem ser conhecidos com precisão, e aqueles objetos que não podem ser quantificados passam a ser irrelevantes para a ciência. Dessa forma, as ciências exatas são consideradas as únicas verdadeiras, e as demais, incertas (SANTOS, 2009).

No entanto, autores como Dussel (2016), Mignolo (2006) e Santos (2009, 2006) argumentam que o método da ciência da natureza é apenas uma das formas de se produzir o conhecimento, e não a única. Esses autores defendem que a tradição de método racionalista não é suficiente para responder todas as demandas provenientes das diversas áreas do conhecimento humano, pois existem elementos históricos, sociais, políticos e culturais que não são passíveis de serem traduzidos em números ou tabelas.

Em 2006, Boaventura de Sousa Santos organizou o livro Conhecimento prudente para uma vida decente: um discurso sobre as ciências revisitado e ampliou as reflexões a respeito do paradigma moderno. A obra, que contou com a colaboração de diversos cientistas, inclusive brasileiros, teve como objetivo debater a ciência enquanto “forma de conhecimento e prática social” (SANTOS, 2006, p. 17) por meio de uma ação coletiva, internacional e transdisciplinar, ou seja, em uma perspectiva de pluralidade epistemológica, para além do modelo paradigmático do pensamento moderno ocidental eurocentrado.

Walter Mignolo, semiólogo argentino, participa do debate proposto por Santos (2006) e faz uma crítica profunda à ciência moderna ao discutir não apenas sua prática, mas a concepção racista sob a qual foi concebida. O autor defende que a revolução científica “[...] foi concebida como um triunfo na modernidade na perspectiva da modernidade, uma autocelebração que correu em paralelo com a crença emergente da supremacia branca” (MIGNOLO, 2006, p. 617). Dessa forma, a celebração da ciência moderna, enquanto triunfo da humanidade, significava negar que o restante dos seres humanos era capaz de pensar. Na visão do autor, o conceito ocidental de conhecimento exerce opressão epistêmica, pois nega todos os outros conhecimentos. A essa violência epistêmica dá-se o nome de epistemicídio, isto é, o apagamento sistemático de produções e de saberes realizados por pessoas de grupos oprimidos (RIBEIRO, 2019).

Segundo Linda Tuhiwai Smith (2018), socióloga do povo Maori, a concepção moderna de indivíduo está baseada em séculos de debates filosóficos, em discussões de princípios e sistemas de organização social completamente eurocêntricos. Quando confrontada por concepções alternativas de outras sociedades, a realidade ocidental tornou-se reificada como representante do melhor, refletindo alto nível de pensamento e sendo menos inclinada ao dogma, à feitiçaria e ao imediatismo de pessoas e de sociedades tão primitivas (SMITH, 2018). A autora aponta que, para a sociedade ocidental, essa ideologia desenvolveu formas de pensar que parecem verdades universais e são compreendidas como critérios necessários para uma sociedade civilizada.

Os saberes dos povos indígenas não se enquadram na ordem eurocêntrica e não seguem a lógica do paradigma racionalista moderno, e, por isso, vêm sendo continuamente negados ou marginalizados (VICENZI; PICOLI, 2022). Diferentemente do pensamento racionalista, que fragmenta para compreender, o conhecimento dos povos indígenas é holístico, porquanto, concebe e compreende o mundo a partir de sua totalidade, bem como cultiva uma relação de interação com o meio ambiente, em oposição à relação de superioridade e dominação, própria do pensamento ocidental. É um saber que se baseia no coletivo, não almejando sucessos e conquistas individuais, mas buscando a sobrevivência e o crescimento de todo povo (MUNDURUKU, 2020).

Outra característica do paradigma moderno é o pensamento dualista, que não encontra ressonância no pensar latino-americano. Torres (2018) explica que o pensamento dos povos tradicionais da Mesoamérica é gerado em torno de dualidades, que não estão em oposição, mas que estão em constante imbricação. Dessa maneira, vida e morte, luz e sombra, feminino e masculino são partes de um todo e estão entrelaçadas em um movimento fluido. A imbricação das dualidades garante o equilíbrio do mundo, ao contrário do pensamento dualista, que divide e opõe.

Pode-se apontar, também, a diferença entre a linearidade do pensamento ocidental e a ciclicidade do pensamento indígena. Kusch (2007) identifica o pensamento popular e indígena da América Latina como um pensamento seminal, relacionado ao compasso da vida. Nessa forma de compreender o mundo, entende-se que tudo que é vivo participa de um mesmo movimento: nasce, desenvolve-se, torna-se fértil, dá frutos e, algum dia, morre e volta à terra para nutri-la e permitir o nascimento de outros seres.

A maneira de ser, viver e de educar tradicional dos povos indígenas é baseada em uma concepção de homem que pode ser compreendida pela indissociabilidade de corpo, mente e espírito. As crianças aprendem, desde pequenas, que o corpo é sagrado e, por isso, devem cuidar dele e suprir suas necessidades. Treinam técnicas de sobrevivência, aguçam seus sentidos e, assim, compreendem seu estar no mundo. A responsabilidade da educação da mente e do espírito das crianças fica a cargo dos mais velhos, pois eles são os guardiões da memória e ensinam as crianças por meio das histórias antigas e dos conhecimentos tradicionais (FLORES, 2021).

Ao referir-se à educação tradicional, Daniel Munduruku (2009) afirmou que esta se dava no silêncio, que os pais os ensinavam a sonhar com aquilo que desejavam. Na sociedade indígena, educar é arrancar de dentro para fora, fazer brotar os sonhos. As crianças são criadas com grande liberdade, sem nenhuma imposição. Isso as torna, quase sempre, bem comportadas. Conforme crescem, é solicitado que acompanhem os pais nos afazeres. Dessa forma, desenvolvem sua percepção geográfica e o domínio do ambiente em que vivem.

Em relação à educação tradicional do povo Mbya Guarani, Bergamaschi e Menezes (2016) afirmam que a formação do Guarani se dá nesta ambiguidade: a pessoa é responsável por si, pois só ela poderá empreender essa busca, mas, ao mesmo tempo, se constitui no coletivo, sob a égide da reciprocidade, no seio do modo de ser Mbya Guarani. Nesse sentido, a experiência de vida na aldeia é a base da formação da pessoa, sendo a tradição o texto que se reatualiza no presente, como continuidade do passado, para sustentar o modo de vida Guarani. O ritual é um tempo-espaço de formação na coletividade e explicita essa ambiguidade de um ser que é individual e coletivo a um só tempo.

Os povos indígenas organizam-se a partir do seu modo de ser e de estar no mundo e seus conhecimentos são transmitidos de geração em geração, priorizando a oralidade. Os mais novos aprendem, na prática, acompanhando os mais velhos (família extensa) nas tarefas cotidianas da aldeia. Não se percebe censura aos atos da criança, mas um acompanhamento próximo, enquanto esta explora o ambiente ao seu redor.

A oralidade e a palavra são fortes e presentes na vida da pessoa Guarani, e na aprendizagem das crianças, não apenas na fala, mas na escuta respeitosa e atenta: escutar e entoar os cantos e se dispor ao ensinamento que é oferecido pela palavra são marcas importantes nos processos próprios de aprendizagem (BERGAMASCHI; MENEZES, 2016). Encontra-se, também, em outras etnias ameríndias a força e a potência da oralidade como meio de formação dos indivíduos dentro de uma educação tradicional.

Como os povos indígenas não fragmentam o saber, tampouco localizam a espiritualidade em uma dimensão oposta à razão e à vida comum, a espiritualidade indígena está presente no cotidiano, seja em suas manifestações artísticas e culturais, tais como o grafismo, as pinturas corporais, o canto e a dança, como na forma de se relacionar com o meio ambiente. Por isso, abordar as culturas indígenas em sala de aula implica destacar o conhecimento tradicional e sagrado desses povos. Sobre isso, Munduruku (2020, p. 35), diz que: “As pessoas falam do Curupira, por exemplo, como folclore e assim essa ideia fica distante, como algo extraordinário, elas não percebem que é realidade. Por quê? Porque o ocidente foi criando esses bloqueios, fez a separação entre o sentir e o saber [...]”.

Trabalhar a temática indígena em sala de aula exige, portanto, abertura epistêmica. É preciso refletir para além do pensamento racionalista e abrir-se para o conhecimento do outro, estabelecendo um diálogo horizontal. O equívoco de olhar para as culturas indígenas pelas lentes do paradigma moderno é um dos responsáveis pela reprodução de preconceitos, generalização, estereótipos e apagamentos (FLORES; CASAGRANDE, 2022; VICENZI; PICOLI, 2022).

Para que essa visão se transforme, é necessário que os educadores pesquisem e conheçam melhor as histórias e as culturas indígenas para, a partir daí, passarem a tematizar as formas de vidas dos ameríndios contemporâneos. A seguir, serão citadas algumas das distorções causadas pelo desconhecimento em relação aos povos originários e alternativas possíveis para o desenvolvimento de propostas pedagógicas fundamentadas na interculturalidade.

Alguns erros comuns na abordagem das culturas indígenas nas escolas e alternativas para o desenvolvimento de propostas pedagógicas interculturais

Por muito tempo, a escola não indígena difundiu conhecimentos equivocados a respeito dos povos originários. A partir das denúncias dos autores indígenas Daniel Munduruku (2009, 2016), Ailton Krenak (2020), Márcia Kambeba (2020b), Raquel Kubeo (2021) e do estudo de Gomes, Silva e Casagrande (2020), esta seção apresenta, em forma de tópicos, alguns exemplos acerca do imaginário sobre os povos originários, produzido nos currículos da Educação Básica. Após, esses equívocos serão discutidos.

Entre os erros comuns na abordagem das culturas indígenas nas escolas, podem ser listados:

  1. o apagamento do indígena urbano: ideia de que os indígenas não vivem nas cidades. Esse pensamento exclui as terras indígenas demarcadas ou em processo de retomada no meio urbano, bem como as aldeias indígenas e multiétnicas urbanas2, que surgiram para atender as necessidades em um contexto de crise;

  2. a generalização e o etnocídio: pensamento de que todos os indígenas são iguais e de que todos os indígenas falam Tupi, de forma a excluir toda a pluralidade étnica, cultural e linguística, já que há, no Brasil, 305 povos originários falantes de mais de 270 línguas distintas. Etnocídio é desconsideração da multiplicidade de povos indígenas existentes no Brasil e no mundo, reunindo todos em uma única palavra: índios;

  3. a reprodução de estereótipos: associação da imagem de que todo indígena tem cabelo liso, olho puxado, não possui pelos e tem estatura baixa. Em função da miscigenação e da política de branqueamento ocorrida entre os séculos XIX e XX, veem-se muitos ameríndios com tons de peles diferentes, cabelos cacheados, pessoas afro-indígenas, dentre outras características;

  4. a aculturação: ideia de que os indígenas estão perdendo a cultura. Deve-se levar em consideração que a cultura é fluida, está sempre em movimento, não é estática. Portanto, todos os povos sofrem influências e modificações ao longo dos anos;

  5. a crença de que as culturas indígenas são atrasadas: pensamento de que as culturas indígenas são desatualizadas, pois não se adequaram ao modo ocidental de viver no mundo. Os povos originários são retratados em livros didáticos como pessoas que pararam no tempo ou como seres do passado, desconsiderando a atualização de suas culturas;

  6. a crença de que os indígenas são contra o progresso: concepção de que os ameríndios atrasam o desenvolvimento do país. Essa visão está associada às demarcações de terras indígenas que, em tese, estariam ocupando áreas produtivas que poderiam estar sendo utilizadas para a agricultura e a pecuária. Segundo a Funai (BRASIL, 2021), atualmente existem 443 terras indígenas regularizadas que representam cerca de 13,75% do território nacional, localizadas em todos os biomas, com concentração na Amazônia Legal3. A presença de ameríndios em locais de reservas ambientais, comprovadamente, auxilia a preservação e a manutenção dos biomas;

  7. a narrativa de que o Brasil foi descoberto: reprodução dos ideais da colonização, perpetuando a história oficial que exalta e identifica, como heróis, aqueles que foram os invasores da terra;

  8. a celebração do Dia do Índio: não há como trabalhar a pluralidade dos povos indígenas e de suas culturas em um dia ou uma semana do ano;

  9. o uso de adereços: em épocas de datas comemorativas, vê-se, nas escolas, professores e estudantes confeccionarem cocares, fazerem pinturas que imitam grafismos e entoarem músicas vazias de sentido. É preciso levar em consideração que tais adornos são símbolos sagrados e não devem ser trabalhados de forma descontextualizada;

  10. a utilização do termo “índios”: tal palavra deveria ser abolida de nosso vocabulário, pois remete à denominação dada pelo colonizador, que generaliza os povos e as culturas indígenas, induzindo ao apagamento. Deve ser substituída pelo nome da etnia ou por povos indígenas.

Tanto as questões de ordem histórica, como incompreensões de ordem paradigmática, influenciam a visão que, de forma geral, a educação brasileira tem sobre os povos indígenas. O senso comum desconhece a diversidade dos povos, suas distinções, identidades e baseia-se em perspectivas estereotipadas, tais como o índio preguiçoso, atrasado e selvagem ou romantizadas, que compreendem o indígena como um ser puro, inocente e relegado ao passado. Existe também, a crença de que se um indígena vive na cidade perde sua identidade étnica (KAMBEBA, 2020b).

Os povos indígenas são contemporâneos, são cidadãos brasileiros. Alguns indígenas vivem em aldeias e, a esses, Ailton Krenak (2020, p. 7) chama de cidadãos da floresta, “[...] são pessoas que têm um exercício cidadão dentro da floresta com a defesa dos territórios, da floresta, da biodiversidade, da capacidade desses povos de se articularem e se moverem em amplos espaços, que não tem que ser na cidade”. No entanto, há indígenas que vivem no meio urbano, sobrevivem da renda obtida por meio da venda de artesanato, de apresentações culturais, estudam em escolas e universidades não indígenas.

É preciso compreender que a cultura não é estática, mas dinâmica. Para muitos indígenas, morar nas cidades, aprender a língua portuguesa e estudar em escola não indígena foi uma forma de resistência. Segundo Munduruku (2016), seu povo precisou entrar no processo civilizatório, mas isso não representa que se entregaram. Pelo contrário, foi a maneira que encontraram de resistir, pois, naquele momento, continuarem vivos era uma forma de resistência. Para o autor, um indígena não perde sua identidade por ocupar espaços urbanos ou por frequentar uma universidade, mas, sim, a fortalece e reafirma na medida em que consegue atualizar os saberes ancestrais.

Em relação à presença indígena na universidade, Smith (2018) aponta que existem duas vias distintas por meio das quais a agenda de pesquisa indígena vem sendo desenvolvida. A primeira passa pelas ações e pelos projetos da comunidade, iniciativas locais e nacionais ou a pesquisa tribal com base e em torno das reivindicações. O segundo caminho passa pelos espaços conquistados dentro das instituições pelos programas de estudo e os centros de pesquisas indígenas. A autora fala que, para os povos indígenas, há modos claramente distintos de pensar e nomear a pesquisa. A metodologia maori é chamada de pesquisa kaupapa maori ou pesquisa centrada nos maoris. Essa forma de nomear implica trazer ao centro e privilegiar os valores indígenas, suas atitudes e práticas.

Negar o movimento dos povos e das culturas é sustentar o discurso de que as identidades indígenas devem continuar presas ao passado e às imagens que lhes foram atribuídas pelos colonizadores. Sobre isso, Cruz (2017), antropólogo pertencente ao povo Tuxá, denuncia o dilema vivido pelos indígenas: por um lado, se não dominam a linguagem e os códigos dos não indígenas, são considerados como incapazes e aculturados; por outro lado, se dominam, deixam de ser considerados indígenas e suas reinvindicações são invalidadas. Desse modo, ou é tido como inferior ou não é encarado como legítimo, de qualquer maneira, a voz indígena é silenciada.

Nesse sentido, a educação escolar tem um papel fundamental, pois pode, por um lado, contribuir para a construção de uma sociedade intercultural, na qual várias culturas possam conviver em uma relação horizontal, ou seja, sem que uma se considere superior e imponha seus saberes e modo de viver sobre as outras. Por outro lado, a escola também pode contribuir para a manutenção do status atual da nossa sociedade e continuar reproduzindo os estereótipos, os preconceitos e as invisibilidades para com os povos indígenas (VICENZI; PICOLI, 2022).

Munduruku (2016) problematiza como as escolas, tradicionalmente, abordam a temática indígena, como, por exemplo, o conhecido Dia do Índio, comemorado no dia 19 de abril. Para o autor, o índio celebrado nessa data não é o indígena real, mas, sim, um índio imaginário, que foi sendo construído pela narrativa ocidental. Assim, a sociedade olha para os indígenas como um personagem folclórico e não como um ser humano. Segundo o autor,

[...] as escolas capricham na decoração, no enfeite, nos indiozinhos, na exposição, no ensaio da música da Xuxa, “Índio fazer barulho”. E depois os pais das crianças, pintadas com duas faixas vermelhas no rosto, com um cocar feito de cartolina, uma saia de garrafa pet, porque é ecológico, saem felizes da escola porque finalmente relembraram a presença do índio. Está na hora de rompermos com isso. Precisamos começar a chamar esses povos pelo nome, dizer quem eles são de fato, onde estão, como vivem, e porque, na nossa contemporaneidade, existe um massacre dessas populações. (MUNDURUKU, 2016, n.p.).

Como visto, Munduruku (2016) sugere que crianças e jovens tenham contato com essas culturas de forma contextualizada e crítica, ou seja, conhecendo os nomes dos povos, o território que ocupam, suas manifestações artísticas, seu modo de ser e de viver e, também, suas realidades. É preciso refletir junto aos alunos: Quais dificuldades esses povos enfrentam? Qual a origem dessas dificuldades? Quais suas reinvindicações? E, também, o que se pode aprender com os povos indígenas?

Com o intuito de promover o debate e a educação para as relações étnico-culturais, surgiu a Lei No 11.645/2008, que instituiu a obrigatoriedade do ensino das Histórias e Culturas Afro-Brasileira e Indígena nos estabelecimentos da Educação Básica (BRASIL, 2008). A Lei pretendia que o ensino das temáticas indígena e afro-brasileira se estendessem para além das datas comemorativas, trazendo toda a complexidade e a subjetividade para dentro da sala de aula, promovendo, enfim, uma educação intercultural. Contudo, apesar da legislação, poucas mudanças foram notadas nos currículos escolares, que seguem perpetuando estereótipos e generalizações acerca dos povos originários.

Outra abordagem comum é identificar seres sagrados da cultura de alguns povos indígenas, como é o caso do Curupira e da Iara, como meros personagens de uma narrativa fantasiosa, um tratamento que é considerado desrespeitoso e que não é observado como divindades pertencentes a outras culturas ou religiões. Como já foi dito, os conhecimentos pertencentes às culturas indígenas, tais como o grafismo, a música, a dança, a pintura corporal, os seres sagrados, devem ser abordados nas escolas de forma contextualizada, respeitando e valorizando a diversidade dos povos indígenas brasileiros.

Tais informações e reflexões dificilmente são encontradas nos livros didáticos. O estudo de Gomes, Silva e Casagrande (2020) analisou o modo como os povos indígenas são representados em ilustrações de livros didáticos atuais. Segundo os autores, os livros representavam o ameríndio a partir de dois estereótipos: a) o indígena como bom selvagem, aquele que cuida da natureza, vive em ocas, não usa roupas e pinta o corpo; b) o ameríndio selvagem e ameaçador. Além disso, os autores também indicam uma tendência a relacionar a figura do indígena ao passado, atitude que traz a ideia de que os povos indígenas não existem mais e que aqueles que se encontram na cidade não podem ser considerados como indígenas.

Do mesmo modo, Munduruku (2009, p. 24) faz uma crítica aos livros didáticos e às apostilas, argumentando que, durante muito tempo, esses materiais apresentaram os indígenas como “[...] seres inferiores, citando a ausência de história, a pouca inventividade tecnológica ou, ainda, aspectos exóticos para criar um sentimento de repulsa nos educandos. Além disso, tal atitude legitima a agressão europeia, que sempre é vista como benéfica e civilizadora”.

Para Munduruku (2009), apenas recentemente a narrativa sobre o “descobrimento” do Brasil e a imagem estereotipada do indígena, como um ser exótico e que vive do passado, começou a ser repensada. Um exemplo é a Lei Nº 11.645/2008 (BRASIL, 2008), citada anteriormente. No entanto, a existência dessa Lei não garante sua aplicação, pois as mudanças avançam de forma lenta e encontram obstáculos, como a falta de preparação e de formação dos profissionais de educação para trabalhar, de forma adequada, conteúdos que abordam os povos originários.

Para que mudanças ocorram, é necessário reconhecimento, diálogo e reflexão. É preciso, antes de tudo, ouvir os povos indígenas (FLORES; CASAGRANDE, 2022). Atualmente, existem muitos representantes dos povos indígenas que estão apontando os equívocos da escola ao abordar suas culturas, bem como caminhos possíveis para a construção de uma educação intercultural. São escritores, ativistas, cineastas, youtubers, artistas visuais, musicistas, dentre outros, cujas produções estão acessíveis a todos os profissionais da educação. O contato com esses materiais, somado a uma reflexão crítica, pode ser um caminho promissor para suprir, até certo ponto, a lacuna deixada pela formação inicial do docente.

Pensando nisso, serão sugeridas algumas possibilidades de como abordar as culturas dos povos indígenas na escola desde uma perspectiva intercultural. A literatura indígena é uma das formas mais conhecidas de abordar os ameríndios em sala de aula. A partir dela, traz-se a visão de autores de diferentes etnias sobre seus povos, suas culturas, seus modos de viver, dentre outros aspectos. Além disso, as obras indígenas abordam a ancestralidade, a busca pelo conhecimento de nossas origens, não só genéticas, mas também de um povo com uma memória, cultura e história coletiva. Conforme Munduruku (2009),

[...] uma solução é fazer que os alunos busquem sua ancestralidade. Quando a gente se percebe continuador de uma história, nossa responsabilidade cresce e o respeito com a história do outro também. É preciso trazer a figura dos antepassados para dentro da escola. Trazer suas histórias, seus comprometimentos, suas angústias, sua humanidade. (MUNDURUKU, 2009, p. 18).

Trazer a fala de autores como Eliane Potiguara, Daniel Munduruku, Kaká Werá Jecupé, Davi Kopenawa, Márcia Kambeba, Auritha Tabajara, Ailton Krenak, dentre outros, propicia discutir com os alunos sobre outros modos de ser, de viver e de pensar o mundo e nossa relação com ele. Proporciona ver o mundo por meio de outros olhos e até mesmo repensar a relação do não indígena com o espaço que o cerca.

Além disso, atualmente existem artistas visuais indígenas que participaram de documentários, filmes e curtas-metragens como produtores, diretores ou atores. Alguns exemplos são Índio cidadão? (2014), A Febre (2020) e O último Curupira (2021). É importante citar também artistas plásticos ameríndios, como: Xadalu Tupã Jekupé, Denilson Baniwa, Kadu Xukuru, Daiara Tukano e Yacunã Tuxá. Estes retratam aspectos cotidianos da vida dos povos originários dentro e fora das aldeias. A partir de suas obras, pode-se fazer uma discussão crítica e para o conhecimento de outras realidades desde o ponto de vista dos seus protagonistas.

Outra forma de arte relevante é a música. Atualmente, diversos musicistas indígenas divulgam suas produções em plataformas digitais gratuitas como o YouTube ou o Instagram. Dentre esses, pode-se citar Brisa Flow4, Katú Mirim5, Kunumi Mc6, Edivan Funi-ô7 e Kaê Guajajara8. A partir de suas letras, esses artistas falam sobre ancestralidade, celebrações, demarcação de terras, dentre outros assuntos. Dessa forma, trazem visibilidade e legitimam as vozes de seus povos.

Por fim, também se faz importante acompanhar influenciadores digitais ameríndios, como Alice Pataxó, Tukumã Pataxó e Wari’u. Conhecidos como “guerreiros digitais”, estes debatem de forma divertida e com seriedade temas recorrentes entre os não indígenas, tais como: a generalização das suas culturas, o apagamento cultural, narrativas empobrecidas sobre seus encantados, histórias de seus povos e muitos outros. Nesse sentido, a tecnologia tem auxiliado muito para mostrar a realidade e as formas de resistência atuais.

Kubeo (2021) defende que se fazem urgentes projetos pedagógicos dentro das escolas para desconstruir as datas estereotipadas do calendário e estender os conhecimentos das culturas indígenas durante todo o ano escolar. Para tanto, a autora sugere que uma solução seria que as Secretarias de Educação pudessem contar com a presença de um indígena e que as escolas promovessem contação de histórias com indígenas, por exemplo. Tais alternativas contribuiriam para a garantia da representatividade e do protagonismo indígena no ensino de suas culturas.

É fundamental e urgente que os educadores incluam os povos originários no currículo, trabalhem a literatura e os diversos tipos de arte indígena, a fim de que a imagem anterior que se tinha dos ameríndios seja desconstruída para que outra entre em seu lugar: a dos povos indígenas contemporâneos. Por fim, destaca-se a importância de uma reflexão sobre as práticas e os materiais até então abordados nas escolas, visando superar a visão única das narrativas eurocêntricas, o epistemicídio causado pelo pensamento moderno e, assim, evitar a reprodução de estereótipos, apagamentos e generalizações a respeito dos povos originários.

Considerações finais

Este artigo teve por objetivos refletir sobre como as práticas educativas e os materiais didáticos presentes na Educação Básica brasileira tematizam, tradicionalmente, as culturas indígenas e apontar alternativas para a construção de uma educação intercultural, que promova o reconhecimento e o diálogo com esses povos. Para isso, utilizou a hermenêutica como abordagem metodológica, buscando estabelecer um diálogo interepistêmico por meio das elaborações de alguns teóricos do pensamento decolonial e de publicações de escritores indígenas.

A primeira parte do artigo problematizou as narrativas históricas, argumentando que a história oficial da colonização e da consolidação do Estado brasileiro oculta as violências sofridas pelos povos indígenas e seus movimentos de resistência. Defendeu-se, ainda, que a narrativa hegemônica embasou, durante muitos anos, a forma como a história do povo brasileiro foi contada na escola, tendo como base um currículo eurocêntrico e etnocêntrico.

Após, foram discutidas questões paradigmáticas e o modo como a ciência moderna desconsiderou outros saberes, negando-os e marginalizando-os. Salientou-se que a ciência indígena, diferentemente da cultura ocidental, busca compreender o mundo em sua totalidade, apoiando-se em um saber que é construído coletivamente, baseado na formação integral do ser.

Por fim, apontou-se e discutiu-se como, muitas vezes, a escola não indígena tematiza os povos ameríndios, de forma a criar diversos estereótipos, apagamentos e generalizações, bem como foram apresentadas possibilidades para se conhecer as culturas dos povos originários e como vivem contemporaneamente, a partir da escuta e da troca mútua. Nesse sentido, foram indicados alguns escritores, artistas plásticos, cineastas e musicistas indígenas, pois, por meio do contato com suas produções, é possível ouvir suas vozes, acessar seus saberes e entender suas lutas.

Defendeu-se, assim, uma educação que tenha como fundamento as relações étnico-raciais. Com essa perspectiva, salientou-se a importância de a escola não indígena promover um ensino intercultural, que evidencie e valorize a diversidade, uma escola que forme seres humanos mais tolerantes e prontos para conviver, isto é, para viver com o outro.

1Integrar significava incluir os indígenas no projeto de nação, transformando-os em trabalhadores economicamente produtivos e desenvolvendo neles um sentimento de nacionalidade (BERGAMASCHI; ANTUNES; MEDEIROS, 2020).

2Um exemplo de aldeia multiétnica é o Centro de Referência Indígena-afro do Rio Grande do Sul. Este surgiu no início de 2020, em meio à pandemia de Covid-19, com o objetivo de auxiliar as mulheres artesãs cuja renda dependia da comercialização das suas produções. As responsáveis pelo projeto arrecadavam alimentos, material de higiene e até eletrodomésticos usados para distribuir em aldeias e quilombos da região metropolitana de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Disponível em: https://www.instagram.com/indigenaafrodors/?utm_medium=copy_link. Acesso em: 11 jun. 2021.

4Página pessoal da artista. Disponível em: https://instagram.com/brisaflow?utm_medium=copy_link. Acesso em: 29 jul. 2021.

5Página pessoal da artista. Disponível em: https://instagram.com/katumirim?utm_medium=copy_link. Acesso em: 29 jul. 2021.

6Página pessoal do artista. Disponível em: https://www.instagram.com/kunumi.mc/?hl=pt. Acesso em: 29 jul. 2021.

7Página pessoal do artista. Disponível em: https://instagram.com/edivanfulnio?utm_medium=copy_link. Acesso em: 29 jul. 2021.

8Página pessoal da artista. Disponível em: https://instagram.com/kaekaekae?utm_medium=copy_link. Acesso em: 29 jul. 2021.

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Recebido: 07 de Agosto de 2021; Revisado: 29 de Abril de 2022; Aceito: 30 de Setembro de 2022; Publicado: 09 de Maio de 2022

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