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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.18  Ponta Grossa  2023  Epub 11-Ago-2023

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.18.21450.058 

Artigos

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Currículo Catarinense: travessias perigosas na luta contra as desigualdades sociais

Common Core State Standards (BNCC) and the Common Core from Santa Catarina: dangerous crossings in the struggle against social inequalities

Base Nacional Común Curricular (BNCC) y el Currículo de Santa Catarina: travesías peligrosas en la lucha contra las desigualdades sociales

Anderson Luiz Tedesco* 
http://orcid.org/0000-0002-7425-1748

Bruno Antonio Picoli** 
http://orcid.org/0000-0001-6831-2199

Altair Alberto Fávero*** 
http://orcid.org/0000-0002-9187-7283

Marcio Giusti Trevisol**** 
http://orcid.org/0000-0001-6127-1750

*Pós-doutorado em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (PPGE/Unochapecó). Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PPGF/PUCPR). Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Oeste de Santa Catarina (PPGEd/Unoesc). Participa do Grupo de Pesquisa: REDE SUR PAIDEIA da Universidade Tuiuti do Paraná (PPGE/UTP) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia e Educação (GEPeFE) do (PPGEd/Unoesc). E-mail: <anderson.tedesco@unoesc.edu.br>.

**Professor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), campus Chapecó. Doutor em Educação. E-mail: <bruno.picoli@uffs.edu.br>.

***Professor da Universidade de Passo Fundo (UPF). Pós-doutorado em Docência Universitária pela Universidad Autónoma del Estado de México (Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes) e Pesquisador Produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: <altairfavero@gmail.com>.

****Doutor em Educação pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Professor Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc) e Membro Institucional do Comitê de Bioética do Hospital Universitário Santa Terezinha (HUST). E-mail: <marcio.trevisol@unoesc.edu.br>.


Resumo

Este artigo tem como objetivo refletir sobre os desafios sociais ocorridos a partir da implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), como uma política pública que assume, em sua proposição, o combate às desigualdades sociais na construção dos currículos dos estados no território brasileiro. A reflexão problematiza o processo e a construção do Currículo (agora homologado), do Ensino Médio da área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas de Santa Catarina. Trata-se de uma pesquisa exploratória, de natureza qualitativa do tipo bibliográfico com coleta de dados participante e documental. Os resultados indicaram fragilidades na construção do currículo nos aspectos que constituem uma perspectiva de formação humana: crítica, ética e integral dos jovens catarinenses. Conclui-se que, da forma como foi construído, o texto do currículo do Estado de Santa Catarina, do Ensino Médio da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, a ênfase do processo educacional se sustentou em lógicas neoliberais, de competição e de meritocracia, que, nesta leitura, amplificam as desigualdades sociais do território catarinense.

Palavras-chave: Base Nacional Comum Curricular; Currículo Catarinense; Ciências Humanas e Sociais Aplicadas; Desigualdades sociais

Abstract

This article aims to reflect on the social challenges arising from the implementation of the Common Core State Standards (called in Brazil Base Nacional Comum Curricular - BNCC), as a public policy that assumes in its proposal the fight against social inequalities in the construction of the common core of the states in the Brazilian territory. The reflection problematizes the process and the construction of the Common Core (now homologated) of the High School of the area of Applied Social Sciences and Humanities of Santa Catarina. It is an exploratory investigation, of a qualitative nature of the bibliographic type with participant and documental data collection. The results indicated weaknesses in the construction of the common core in the aspects that constitute a perspective of human formation: criticism, ethics and integral education of young people from Santa Catarina. It is concluded that, in the way in which the text of the Common Core of the State of Santa Catarina was elaborated, of High School of the area of Applied Social Sciences and Humanities, the emphasis of the educational process was sustained in neoliberal logics, of competition and meritocracy, that in our reading, they amplify the social inequalities of the territory of Santa Catarina.

Keywords: Common Core State Standards; Common Core from Santa Catarina; Applied Social Sciences and Humanities; Social inequalities

Resumen

Este artículo tiene como objetivo reflexionar sobre los desafíos sociales ocurridos a partir de la implementación de la Base Nacional Común Curricular (BNCC), como una política pública que asume en su proposición el combate a las desigualdades sociales en la construcción de los currículos de los estados en territorio brasileño. La reflexión problematiza el proceso y la construcción del Currículo (ahora homologado), de la Enseñanza Secundaria del Área de las Ciencias Humanas y Sociales Aplicadas de Santa Catarina. Se trata de una investigación exploratoria, de naturaleza cualitativa de tipo bibliográfico con recolección de datos participante y documental. Los resultados indicaron fragilidades en la construcción del currículo en los aspectos que constituyen una perspectiva de formación humana: crítica, ética e integral de los jóvenes catarinenses. Se concluye que, de la forma en que fue construido, el texto del currículo del Estado de Santa Catarina, de la Enseñanza Secundaria del Área de Ciencias Humanas y Sociales Aplicadas, el énfasis del proceso educativo se sustentó en lógicas neoliberales, de competencia y de meritocracia que, en esta lectura, amplifican las desigualdades sociales del territorio de Santa Catarina.

Palabras clave: Base Nacional Común Curricular; Currículo Catarinense; Ciencias Humanas y Sociales Aplicadas; Desigualdades sociales

Introdução

Em 2018, foi publicado, pelo Ministério da Educação (MEC), o documento Base Nacional Comum Curricular (BNCC) em sua versão final (BRASIL, 2018a), incluindo o Ensino Médio, ausente na versão anterior e que passou por uma reforma em sua estrutura em 2017 (BRASIL, 2018a). Em decorrência disso, em 2019, o Estado de Santa Catarina deu início ao processo de criação do Currículo Base do Ensino Médio do território catarinense. Tais atividades se intensificaram em 2020, com a publicação de edital para seleção voluntária de 250 professores efetivos das escolas estaduais que passaram a contribuir na elaboração do documento com a participação de: redatores, pesquisadores - consultores e coordenadores de áreas e as coordenações gerais das áreas das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, de Linguagens e suas Tecnologias, de Matemática e suas Tecnologias e de Ciências da Natureza e suas Tecnologias. Após a sua homologação, o currículo elaborado nesse processo está sendo implementado nas 726 escolas catarinenses, segundo o aplicativo “Educação na Palma da mão” no site da Secretaria da Educação de Santa Catarina (SANTA CATARINA, 2021).

O objetivo deste artigo é, então, refletir sobre os desafios sociais da implementação da BNCC como uma política pública que assuma, em sua proposição, o combate às desigualdades sociais na construção dos currículos dos Estados no território brasileiro. Trata-se de um olhar crítico para a realidade brasileira, especialmente para o território catarinense, em relação aos desafios que são apresentados para os jovens do Novo Ensino Médio: tornarem-se empreendedores de si. Em decorrência disso, problematiza-se a construção do Currículo Catarinense da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas em seu conjunto de disciplinas: Filosofia, Geografia, História e Sociologia.

Trata-se de uma pesquisa de objetivo exploratório. Para Gil (2008), a pesquisa exploratória objetiva, com um planejamento flexível, tornar mais explícita a construção da hipótese com base no levantamento do problema e sua familiaridade. Como metodologia, caracteriza-se como qualitativa de corte bibliográfico. De acordo com o autor, essa abordagem considera a subjetividade do fenômeno como central para gerar significado, cujos pressupostos teóricos norteiam o processo investigativo. Já as pesquisas bibliográficas, de acordo com Nardi e Santos (2003), dizem respeito à coleta de informações em uma fonte prevista de dados já organizados e analisados.

Ainda, como coleta de dados, foi utilizada a pesquisa participante e documental. A pesquisa participante, segundo Severino (2007, p. 120), é aquela “[...] em que o pesquisador, para realizar a observação dos fenômenos, compartilha a vivência dos sujeitos pesquisados, participando de forma sistemática e permanente, ao longo do tempo da pesquisa e das suas atividades”. A pesquisa de dado documental, para Gil (2008), é caraterizada pela coleta de documentos que não receberam tratamento analítico, ou, ainda, que possam ser analisados de acordo com o objetivo da pesquisa. As pesquisas combinadas permitem a coleta de dados e a análise sistemática. O universo da pesquisa compreendeu a BNCC (BRASIL, 2018a), o Currículo Catarinense com ênfase na Área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (SANTA CATARINA, 2020) e a participação dos investigadores no grupo de trabalho com coleta de dados participante (em sua elaboração contou com a participação de 80 professores de um total de 250); ainda fizeram parte do processo de construção do documento redatores e cinco pesquisadores consultores.

Os dados coletados foram interpretados a partir de um conjunto de atores e pesquisadores que se debruçam em estudar e compreender a educação. Destaca-se, como fontes de referência para análise dos dados: Biesta (2017, 2018), Hypolito (2019), Laval (2004), Nussbaum (2015), Silva (2018) e Silva e Scheibe (2017). O artigo encontra-se organizado em três partes, a saber: na primeira, é problematizada a questão da BNCC e seus compromissos com o enfrentamento das desigualdades educacionais; na segunda, é apresentado o processo de construção do documento que ampara o currículo formativo para a Área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas no território catarinense; por fim, na terceira, são apresentados, em forma de conclusão, os desafios de elaboração de um Currículo Catarinense que seja capaz de gerar inclusão social, superar as desigualdades e valorizar as humanidades como princípio formativo.

Nesse sentido, na época da escrita deste artigo, o texto do Currículo Catarinense ainda poderia passar por alterações e correções até a sua homologação e oficialização, pois a versão utilizada para esta proposta reflexiva foi da data de 4 de novembro de 2020. Entretanto, isso não anula o exercício da crítica ao documento. Ainda, tais reflexões teóricas não se pretendem ser restritas à abstração, pelo contrário, tensionam as possíveis implicações desse documento na vida de milhares (milhões) de jovens catarinenses. Trata-se de uma preocupação ética no sentido de problematizar os projetos de implementação das políticas públicas em educação, cujas pretensões se camuflam em falsas tentativas de combater as desigualdades sociais. A política das competências, por exemplo, amplamente divulgada como novidade na educação, significa a defesa de uma ideia de competência ligada à utilidade, a qual pode ou deve ser adotada e seguida como uma resposta para superar déficits de emprego, demandas empresariais, econômicas e a superação das condições sociais, como as desigualdades e a mobilidade social. Tais políticas foram amplamente influenciadas pelos organismos internacionais e se materializaram, no Brasil, por meio das políticas recentes como a Reforma do Ensino Médio e a BNCC (BRASIL, 2018a).

A Base Nacional Comum Curricular da Educação Básica e o enfrentamento às desigualdades: há enfrentamento?

A Constituição Federal de 1988, precisamente no art. 205, estabelece: “A educação como um direito de todos e dever do Estado e da família, a qual deve ser promovida em prol do pleno desenvolvimento do estudante, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988, p. 137). A noção de Educação Básica no Brasil não é um desdobramento natural de processos, mas é uma conquista social, resultado de lutas históricas e sociais, travada por inúmeros sujeitos para que o acesso à Educação Básica assumisse o caráter de um direito fundamental das crianças, dos adolescentes, dos jovens e dos adultos, de forma gratuita, obrigatória e laica. Esse entendimento é ratificado pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB) - Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 -, que estabeleceu a Educação Básica como um nível da educação nacional que congrega, organicamente, três etapas (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) (BRASIL, 1996). Cada qual é direcionada a uma das fases da vida, cuja finalidade, conforme indicado no art. 22, é assegurar a “[...] formação comum indispensável para o exercício da cidadania” e fornecer os “[...] meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores” (BRASIL, 1996, n.p.). Não por acaso, a LDB explicita, em seu art. 1º, § 1º, que tal educação se desenvolve, predominantemente, por meio do “ensino em instituições próprias” (BRASIL, 1996, n.p.).

Para Cury (2008, p. 294), “[...] a expressão ‘educação básica’, no texto de uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN - é um conceito, é um conceito novo, é um direito e também uma forma de organização da educação nacional”. Por isso, tal conceito constitui-se em um profundo esforço de democratização e justiça social. Nesse sentido, Cury (2008) considera que a função social da instituição escolar é de assegurar a formação comum indispensável para o exercício da cidadania, por meio de currículos que mobilizem conhecimentos científicos e desenvolvam atitudes e valores necessários à vida coletiva.

É evidente o que é Educação Básica, para quê e como ela deve estar organizada não é ponto pacífico na discussão política, econômica e educacional. A escola brasileira é constante alvo de críticas pela imprensa, pelos políticos e pelos agentes do mercado que denunciam sua ineficácia, obsolescência e, até mesmo, inutilidade de muitas das coisas que compõem seu currículo “tradicional”. Essas críticas advêm de vários espectros do campo político, da esquerda à direita (ESTEVES; VALVERDE, 2019). É nesse cenário de desconfiança e, supostamente, como medida para superar a crise da educação brasileira, que, entre 2015 e 2018, foi proposta, debatida e aprovada a BNCC, que, conforme o então Ministro da Educação, Rossieli Soares da Silva, é “[...] um documento completo e contemporâneo, que corresponde às demandas do estudante desta época, preparando-o para o futuro” (BRASIL, 2018a, p. 5).

O processo de construção da BNCC assim como o processo de reforma do Ensino Médio foram alvos de críticas de entidades e pesquisadores do campo da educação (ANTUNES, 2019; HYPOLITO, 2019; PICOLI, 2020; ZANOTTO; SANDRI, 2018), especialmente pelo caráter acelerado e antidialógico do processo, pela ênfase na competitividade e pela concepção gerencialista da educação. Diferentemente de outras políticas no campo, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), que, embora também foram concebidas sob a óptica das reformas neoliberais (CECHETTI; TEDESCO, 2020), a BNCC assume um caráter de documento normatizador, estabelecendo o currículo, ou seja, o que deve e o que não deve ser ensinado, o que pode e o que não pode ser ensinado nas escolas brasileiras (PICOLI, 2020). A BNCC é um documento

[...] de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica

[...] a BNCC integra a política nacional da Educação Básica e vai contribuir para o alinhamento de outras políticas e ações, em âmbito federal, estadual e municipal, referentes à formação de professores, à avaliação, à elaboração de conteúdos educacionais [...]. (BRASIL, 2018a, p. 7-8).

Isso significa que, a partir da publicação da BNCC, Estados e municípios deveriam reorganizar seus currículos para adequá-los às normativas do documento nacional. Nesse sentido, e ainda antes da publicação da versão final com o Ensino Médio incluso, o MEC criou o Programa de Implementação da BNCC (ProBNCC), pela Portaria No 331, de 5 de abril de 2018 (BRASIL, 2018b), com o objetivo de auxiliar na implementação da BNCC nos Estados e municípios e monitorá-la (BARBOSA; SILVEIRA; SOARES, 2019), com o auxílio da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e do Conselho de Secretários Estaduais de Educação (Consed). Para assegurar o alinhamento dos currículos estaduais e municipais às novas normativas, a BNCC estabelece que a União vincularia recursos a essas esferas sob a condição de revisão dos currículos (BRASIL, 2018a). Tal dispositivo consolidou

[...] a transição do que era uma Base Nacional Comum (um documento orientador de referência) para uma Base Nacional Comum Curricular: uma prescrição propensa à homogeneização de conteúdos, à padronização da avaliação e à normalização, rotinização e mecanização das relações entre os sujeitos envolvidos no processo educativo. (PICOLI, 2020, p. 5).

A partir disso, o Estado de Santa Catarina, por meio da Secretaria Estadual de Educação em parceria com a Undime/SC, iniciou o processo de criação do Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense. Em edital específico (SANTA CATARINA, 2020a), o Estado de Santa Catarina realizou processo seletivo simplificado para a “Seleção de profissionais da educação para participação do Ciclo de Seminários para elaboração do Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense”. Foram selecionados 250 professores colaboradores das escolas públicas de diversas regiões do território catarinense para contribuírem nas quatro áreas do conhecimento que constituem o Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense. Dentre esses 250 colaboradores, 80 professores e mais cinco consultores elaboraram, no decorrer de 2020 e a partir dos seminários do ciclo, o documento de área de Ciências Humanas, que engloba as disciplinas de Filosofia, Geografia, História e Sociologia.

Antes de tratar do Currículo Base para o Ensino Médio do Estado de Santa Catarina, é importante aprofundar algumas questões sobre a BNCC, especialmente a promessa da democratização da educação e superação das desigualdades sociais (BRASIL, 2018a). O caráter gerencialista da BNCC, dito de outro modo, a ênfase na performance, na melhora dos indicadores de desempenho, nos testes padronizados inspirados no Programme for International Student Assessment (PISA), organizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCED) (BRASIL, 2018a) implica a padronização do currículo e o estímulo à competição, além de ter como corolário a responsabilização de professores e escolas pelo sucesso ou fracasso dos estudantes nos exames sistêmicos (AVELAR; BALL, 2017; BALL, 2012; PONGRATZ, 2006). Tal caráter indica que o principal motor das reformas são as demandas do mercado, especialmente a necessidade de adaptação e de flexibilidade diante um mundo de rápidas, senão dramáticas, mudanças, sem que essas mudanças (e essas demandas) sejam colocadas em questão (HYPOLITO, 2019). Ao contrário, elas são naturalizadas (PICOLI, 2020).

Nesse sentido, Laval (2004) aponta que a escola e os currículos precisam se atentar para a formação do trabalhador flexível. A engrenagem visa à eliminação de toda a rigidez em nome de uma adaptação constante dos sujeitos aos ditames do mercado de trabalho. A presunção neoliberal institui como ideal nos sistemas educacionais a formação de jovens que atendam a representação do gerencialismo. Nesse aspecto, Fávero, Tonieto e Consaltér (2020, p. 27) tem denunciado a “[...] retórica de que sob uma perspectiva do gerencialismo empresarial a escola poderia gerar resultados melhores do que sob a lógica de uma educação pública”. Tal retórica tem pavimentado o que Tello (2013) denomina de “neoliberalismo pedagógico”, que consiste em um processo que, além de favorecer a perpetuação do setor privado sobre o público, “[...] pode acarretar a perda de sentido e de identidade da escola como um bem público e da própria democracia educacional sob o ponto de vista da escola enquanto entidade construída por um colegiado representativo” (FÁVERO; TONIETO; CONSALTÉR, 2020, p. 27). Assim, o neoliberalismo pedagógico favorece a produção de um sujeito flexível e adaptável ao processo de privatização de todos os espaços públicos possíveis.

No contexto da produção flexível, a instabilidade de posições gera incertezas e inseguranças em âmbito profissional, social e familiar. Reside, aqui, o grande desafio formativo, que Laval (2004) denominou de “nova pedagogia”, que se propõe a formar os jovens que sejam capazes de se adaptarem às incertezas e às inseguranças do modelo produtivo. Competências e habilidades como de organização, de comunicação, de adaptabilidade, de trabalho em equipe, de resolução de problemas e as habilidades socioemocionais são vistas por Laval (2004) como as diretrizes para a organização de documentos e políticas educacionais. Nessa mesma direção, em estudo recente, Tonieto, Fávero e Silva (2022) denunciam que o discurso a respeito das competências na educação ainda é ambíguo e gera muitas controvérsias a respeito de suas possibilidades formativas, muitas vezes sendo indicado como um “discurso salvacionista”.

A posição apresentada está de acordo com a pesquisa desenvolvida por Dantas (2020), o qual considera que a BNCC valoriza as competências socioemocionais como uma condição formativa. Tais competências precisam favorecer a perspectiva formativa que promova o empreendedorismo, a flexibilidade e, como definem Dardot e Laval (2016), formar para um éthos do empresário de si. Consagra-se, com isso, um modelo curricular-formativo que torna absoluta a racionalidade empreendedora como condição para o desenvolvimento de competências profissionais necessárias para a inserção no mercado de trabalho. Desse modo, a BNCC reforça a proposição de que se trata de uma formação administrada e contraria uma educação e um ideário de escola que vai ao encontro de uma formação crítica e emancipatória (SILVA, 2018)

Tal condição está em acordo com o conceito de “revolução controlada” empregado por Fávero, Centenaro e Bukowski (2021), quando indicam que a BNCC, ao mesmo tempo que propõe um discurso “inovador” do protagonismo juvenil, resgata o discurso tecnicista de 1990 ao ligar a formação aos aspectos da empregabilidade. A condição pedagógica evidenciada na BNCC coloca, entre muitos aspectos, na berlinda, a formação para a vivência ética. Os componentes que possuem a condição objetiva de formação para vivência democrática tendem a perder espaço para dar lugar a componentes que possuem como objetivo a formação do trabalhador flexível e dócil às dinâmicas do neoliberalismo. Essa condição se coloca frontalmente em oposição ao conceito educativo que valoriza a formação para a vivência cidadã e democrática. A contradição da nova ordem pedagógica, assinalada por Laval (2004), reside na dificuldade de mobilizar atividades intelectuais dos estudantes que correspondam a uma formação para a assimilação de virtudes requeridas para o sucesso no mundo dos negócios.

Tal lógica exerce uma espécie de violência simbólica, ao imprimir uma homogeneização curricular voltada às competências consideradas úteis para o desenvolvimento e o progresso dos países. Como assinalam Trevisol e Almeida (2019), a educação sob a égide global do neoliberalismo deve operar, para a formação de gerações dóceis aos princípios neoliberais, pela redução de áreas de saberes considerados “inúteis” ou meros “ordenamentos” diante da lógica da utilidade produtiva e pela formação de trabalhadores com competências a habilidades requeridas pelo setor produtivo. Tais mudanças têm colocado, de acordo com Trevisol, Fávero e Bechi (2023), a formação de jovens aptos para se adaptarem às regras do jogo da flexibilidade e da constante mudança decorrentes de uma sociedade que valoriza a tecnologia e a inovação como molas propulsoras do progresso.

A valorização de requisitos considerados indispensáveis para o “novo” trabalhador do século XXI caminha de “mãos” dadas com a desvalorização de componentes culturais e científicos. Nesse sentido, “ideologia da profissionalização”, nas palavras de Laval (2004), e a “lógica perversa da profissionalização”, nas palavras de Fávero, Pagliarin e Cruz Sobrinho (2020), passou a ser o embasamento da ordem pedagógica. Da mesma forma que os documentos internacionais, a BNCC também incorpora a ideologia da profissionalização ao estabelecer mecanismos para aproximar saberes típicos do campo empresarial com os saberes próprios da escola. Tal condição é confirmada nos argumentos utilizados pelos “idealizadores” da BNCC que consideram que ensino brasileiro está distante da realidade e que os jovens não saem preparados para o exercício profissional. Ao menos dois pontos são utilizados para justificar a implementação da reforma educacional. O primeiro é a constatação de que o Ensino Médio atual estaria distante da cultural juvenil, e o segundo apontaria para a ineficiência do atual modelo diante das novas exigências contemporâneas (BRASIL, 2018a), o que tornaria o Ensino Médio pouco atraente e motivador para as juventudes.

Os argumentos construídos colaboram para um conjunto de aprendizagens considerado essencial para formação das juventudes. Segundo Gonçalves e Deitos (2020), as aprendizagens para os trabalhadores do século XXI são descritas nas dez competências gerais recomendadas na BNCC. Essas competências, segundo Silva e Scheibe (2017), contribuem para a solidificação de linha mercantil da escola que contraria seu caráter público e inclusivo. Dessa forma, a prioridade da BNCC estaria na consolidação dos seguintes objetivos: a) preparar os estudantes para responderem a testes padronizados em larga escala; b) preparar jovens para o ingresso no mercado de trabalho, seja para conter a pressão por acesso à Educação Superior, seja para atender a essas demandas do setor produtivo; c) flexibilizar o currículo com a intenção de atender às demandas do mercado de trabalho regional; d) atender à ideologia de máxima eficiência, competividade e concorrência próprias da organização mercantil; e) reorganizar o currículo em hierarquias de componentes para eliminar ou diminuir determinados componentes considerados desnecessários para a formação dos estudantes. Assim, há um discurso apresentado como “novo” que esconde um velho discurso, que reitera finalidades que estavam sufocadas nos últimos anos na Educação Básica, atuando como vetor formativo para a empregabilidade (SILVA, 2018).

A ênfase (não explícita) na competição implica afirmar que a BNCC não representa uma estratégia de superar as desigualdades social e educacional que, no Brasil, compreendem verdadeiros abismos. Ao individualizarem-se o sucesso e o fracasso, projeta-se sobre os estudantes (e sobre os professores) a responsabilidade (e a culpa). O texto da BNCC está de tal maneira construído que escusa a própria política pública, ou seja, a própria BNCC da responsabilidade pelas consequências sociais e educacionais que podem ser (e tendem a ser) a ampliação das desigualdades: o fracasso se daria (dará) pela incompetência de aplicar na prática as diretrizes dispostas na BNCC (HYPOLITO, 2019; ZANOTTO; SANDRI, 2018). Assim, o contexto escolar, social, cultural, assim como as dificuldades de partida que atingem de formas desiguais os jovens de várias regiões, etnias e classes sociais não são levadas em consideração. Tais realidades exigem um currículo pensado para as diferenças, em uma escola que atenda às singularidades e às necessidades desses grupos, não o engessamento do currículo e a vinculação a testes padronizados (de abrangência nacional) que anima a BNCC (HYPOLITO, 2019; PICOLI, 2020; ZANOTTO; SANDRI, 2018). Como consequência, o argumento de que a BNCC enseja um esforço de oportunizar o acesso educacional em equidade para crianças de distintas classes sociais, com respeito às diferenças regionais, culturais, raciais no sentido de superar a histórica desigualdade brasileira (BRASIL, 2018a) não encontra espaço nos termos da própria BNCC.

O engessamento dá-se na medida em que os testes, utilizados como critério de mensuração sobre o sucesso escolar, estabelecem o que importa e o que não importa no processo educacional (BIESTA, 2017). Contudo, pergunta-se: E se o que uma comunidade precisa para superar sua condição de atraso e pobreza não for mensurável por meio de um teste padronizado? Como os professores, diante do eventual fracasso nos exames padronizados, poderão justificar a manutenção de uma intervenção pedagógica que atenda às demandas sociais e educacionais daquela comunidade? Pressionados por gestores e pelo tribunal da opinião pública, em razão dos cada vez mais comuns em ranking de desempenho escolar (GUILHERME; PICOLI, 2019), é possível que os professores direcionem seus esforços para melhorar os indicadores de desempenho e não em ajudar seus estudantes a superar as condições sociais em que se encontram (BIESTA, 2009, 2017, 2018; PICOLI, 2020). Por isso, a parte que segue trata da proposta, ainda em elaboração, do Currículo Base do Ensino Médio do território catarinense para a área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.

A Base Nacional Comum Curricular e os seus perigos no Currículo Catarinense

Iniciamos a discussão com a apresentação da área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Para a BNCC (BRASIL, 2018a), o Ensino Médio precisa ter uma organização escolar que acolha as diversidades e que garanta o protagonismo dos estudantes no seu próprio processo de escolarização. Significa assegurar, então, que os jovens possam definir seu projeto de vida tanto em nível do trabalho como em relação às suas escolhas de estilos de vida. Para atingir tais objetivos, a etapa do Ensino Médio organiza o ensino com base no desenvolvimento de competências, que orienta os princípios de uma educação integral. Assim, podemos observar, na Figura 1, que a BNCC (BRASIL, 2018a) é a base para a construção dos currículos da Educação Básica.

Fonte: Imagem extraída da BNCC (BRASIL, 2018a, p. 469).

Figura 1 Competências gerais para a Educação Básica itinerários 

De acordo com a BNCC (BRASIL, 2018a), a área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas deverá comprometer-se com o desenvolvimento das competências de identificação, análise, comparação e interpretação de ideias, pensamentos, fenômenos e processos históricos, geográficos, sociais, econômicos, políticos e culturais. Os estudantes precisam desenvolver competências relacionadas à leitura de mundo sustentada por uma visão crítica e contextualizada da realidade, de domínio conceitual e na elaboração de interpretações sobre as relações, os processos e as múltiplas dimensões da existência humana.

É importante destacar que, na organização das áreas de conhecimento no documento da BNCC, não são definidas as matrizes epistemológicas de forma clara entre os componentes. No caso das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, os conteúdos são tratados no mesmo bloco de saberes com as mesmas potencialidades para História, Sociologia, Filosofia e Geografia. A BNCC, etapa do Ensino Médio, limita-se a organizar os conteúdos curriculares a partir das categorias, a saber: Tempo e Espaço, Território e Fronteira, Indivíduo, Natureza, Sociedade, Cultura e Ética, Política e Trabalho (BRASIL, 2018a). Para Fávero, Centenaro e Bukowski (2021), ainda que conste, na BNCC, questões inerentes à formação humana por meio das competências e dos itinerários formativos, não esconde sua preferência para a educação tecnológica, empreendedora e flexível, mais agradável aos interesses e às demandas do neoliberalismo, pois opera, nesse caso, a institucionalização por meio do currículo da cultura dominante, nacional e hegemônica da formação de trabalhadores flexíveis. Assim, o documento da BNCC assumiu um papel administrativo, para responder às necessidades de mão de obra para a indústria, em que impera a racionalidade técnica do neoliberalismo.

O conceito de currículo administrado pelo viés da teoria das competências permite ao Estado imprimir padrão hegemônico de aprendizagens que se torna prescritivo e altamente controlado (FÁVERO; CENTENARO; BUKOWSKI, 2021). Ao definir o padrão curricular, a BNCC inviabiliza o reconhecimento das identidades culturais, regionais e sociais. A educação que deveria ser um instrumento de democratização e inclusão se torna, por vias curriculares, um elemento que acentua as desigualdades. No entanto, o Estado neoliberal, para manter a aparência de eficácia do modelo educacional, estipula as avaliações de larga escala, como forma de aferir qualidade educativa para as instituições que tiverem bom desempenho em tais avaliações.

A educação tomada por uma avaliação em larga escala, segundo Trevisol e Almeida (2019), responsabiliza a individualidade e favorece um autocontrole da qualidade. Para Schneider e Nardi (2012), nas últimas décadas, temos assistido, nos países capitalistas ocidentais, à disseminação de políticas de avaliação em larga escala, de prestação de contas e de responsabilização sem necessária correspondência entre os pilares que constituem esse sistema. Propaga-se um modelo regulatório de accountability, cujas concepções político-ideológicas sobrepujam os governos nacionais e descaracterizam o sistema como instrumento para a legitimação de um regime democrático substantivo, participativo e crítico. É aquilo que Laval (2004) chama de Estado regulador, que é conhecido por definir as grandes perspectivas e avaliar, a posteriori, os resultados da gestão com o auxílio de sistema estatístico que permite a “pilotagem” dos sistemas de ensino e das unidades escolares.

Os pontos elencados são confirmados pelos estudos de Dantas (2020), que, ao analisar as 600 páginas do texto da BNCC, afere que o documento reservou apenas 18 páginas para as Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Para o autor, a BNCC apresenta 1.658 códigos alfanuméricos (habilidades), sendo a metade para os componentes de Língua Portuguesa e Matemática, as quais são assumidas como áreas prioritárias. Ainda deve-se considerar que a BNCC (BRASIL, 2018a) atribui ao currículo um quinto itinerário formativo denominado de Formação Técnica e Profissional, que, alinhado às instituições parceiras das escolas, assegura a profissionalização dos estudantes para as atividades laborais. Existe, nesse caso, a valorização dos aspectos práticos do modelo produtivo acobertado pelo conceito de liberdade e protagonismo juvenil na escolha dos itinerários formativos.

O fundamento discursivo da BNCC (BRASIL, 2018a) está na insistência injustificada que os jovens devem possuir formação para a empregabilidade. O quinto itinerário formativo reintroduz uma lógica ultrapassada de que a educação deve voltar-se para atender às demandas de mercado. Tal perspectiva assinala que a reforma do Ensino Médio é marcada pela generalização de uma política educacional para a profissionalização. Essa condição formativa, na organização da BNCC (BRASIL, 2018a), poderá ser assumida pelas instituições parceiras que não possuem um compromisso com a formação para o emprego; no entanto, negligencia a formação integral e para a cidadania. Na lógica produtiva neoliberal, os saberes da área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, em especial os componentes de Filosofia e Sociologia, são considerados na BNCC como “coadjuvantes”. Frente a tamanho arranjo formal, não é particularmente difícil entender que os governantes e as lideranças, ávidos por desenvolvimento econômico e aumento do Produto Interno Bruto (PIB), têm incentivado reformas educacionais e investido recursos para áreas consideradas prioritárias para o mercado de trabalho (NUSSBAUM, 2015).

Tal condição reduziu a educação a um insumo econômico, que, para Nussbaum (2015), colocou a democracia como projeto civilizatório em crise. A autora tem razão ao afirmar que desde a Educação Básica até a Educação Superior os componentes das humanidades e das artes estão sofrendo diminuição ou eliminação dos currículos com a argumentação de que são pouco eficazes ou agregadores para o atual contexto de competividade global. Nesse sentido, consolida-se uma “encruzilhada” educacional. Por um lado, como pondera Nussbaum (2015), o currículo formativo padronizado e hegemônico tem levado à formação de sujeitos lucrativos, produtivos, com capacidades e habilidades adequadas para o trabalho flexível. Tal padronização tem “domado a escola” (FÁVERO; DALQUIAVON; FARIA, 2020), reproduzido a “lógica empresarial” como sendo uma “nova linguagem da escola” (FÁVERO; SILVA; CENCI, 2020), assim como transformado a educação em um negócio ao tornar a ideologia neoliberal na educação a partir da cristalização do novo senso comum pedagógico (FÁVERO; TREVISOL, 2020). Por outro lado, perdemos a dimensão ética da formação para a autonomia, a capacidade de pensar por si, de criticar a tradição e entender o sofrimento dos outros.

A BNCC (BRASIL, 2018a), ao enfatizar um modelo curricular administrado e alinhado às diretrizes dos documentos internacionais, como os da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e da OCDE, consolida um modelo educacional fortemente marcado pela ideologia da empregabilidade e pelas exigências econômicas globais. Esse percurso educacional naturaliza um modo de vida que se guia pela maximização do lucro e pelo sucesso e êxito econômico (DALBOSCO, 2015). Dessa maneira, na BNCC, há pouco apreço para as Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, especialmente para os componentes de Filosofia e Sociologia que são abordados de forma genérica e generalista. Para Dantas (2020), na área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, não são citadas as principais correntes epistemológicas, além de não indicarem referenciais bibliográficos. Na BNCC (BRASIL, 2018a), a ausência de referenciais bibliográficos nos componentes, por exemplo de Filosofia e de Sociologia, dificulta a localização teórico-metodológica que fundamenta as competências para a aprendizagem. Destarte, a teoria das competências, como base filosófica e pedagógica da BNCC, mobiliza o conhecimento para solucionar problemas, o que apresenta um tratamento periférico e coadjuvante à área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.

Em nome de uma pseudointerdisciplinaridade, segundo Dantas (2020), a BNCC realiza todos os tipos de relação pedagógica entre componentes, em uma insistência de organização em blocos de saberes que coloca as humanidades em situação de miséria epistemológica e com uma organização curricular polissêmica. Consoante a isso, as humanidades, quando contempladas, são adaptadas aos desígnios de um discurso produtivista e neoliberal que tem invadido a educação e formado sujeitos a partir de suas condições materiais de existência. Sobre esse aspecto, em estudo recente, Fávero, Centenaro e Santos (2020, p. 3) analisam e denunciam “[...] a exclusão/flexibilização da filosofia pelas reformas curriculares como uma das faces do ataque ao pensamento reflexivo” bem como problematizam “[...] a maneira como as reformas educacionais em curso representam um ataque ao pensamento reflexivo na medida [em] que realizam um processo sutil de exclusão da filosofia no currículo da educação básica”.

Ao analisar o Currículo Catarinense, percebe-se que houve um grande esforço por parte dos coordenadores, redatores, consultores e dos 80 professores colaboradores, que fizeram parte da elaboração do texto base e dos Itinerários Formativos da área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Certamente, traduziu-se em um trabalho árduo e complexo dada as diversas abordagens teóricas, metodológicas e epistemológicas da área. No entanto, todo esse esforço pode ter sido inútil se a proposta curricular estiver vinculada aos interesses das grandes organizações financeiras que instrumentalizam a escola para a formatação de sujeitos flexíveis e dóceis para um suposto mercado de trabalho, para uma lógica consumista e para uma ilusória ideia de que é possível ser empreendedor de si mesmo.

Essas corporações das diretrizes nacionais e impulsionadas pelos interesses internacionais ditam as regras de uma formação para o mercado de trabalho para aqueles estudantes de classes mais pobres, que colocam um distanciamento no combate às desigualdades sociais. Tais preocupações são evidenciadas no Currículo Catarinense quando esses interesses econômicos estão vinculados às soluções dos problemas da educação, descrito como a “crise da educação”. Existe quem defenda a necessidade de um currículo claro e objetivo que dê caminhos para superar a falta de preparo do professor e a inadequação dos materiais didáticos. Tais exemplos do Currículo Catarinense são sinais inconscientes das inconsistências formativas interpretadas de modo apressado da BNCC, que se caracterizam como “[...] noção de currículo como documento escriturístico, ou como arma social (entendida como fator de homogeneização dos conhecimentos) que por isso mesmo tem o poder de aprofundamento de uma linha abissal já existente” (SÜSSEKIND, 2014, p. 1517).

Em um trecho do currículo, considera-se que:

Essa riqueza de possibilidades, dada a multidimensionalidade e multiescolaridade espaço-temporal de associações possíveis, tende a ser complexa, pois há que se considerar que cada componente curricular resulta de um processo histórico singular, guardando consigo distintos caminhos teórico-metodológicos e epistêmicos, bem como aportes conceituais/categoriais próprios do seu campo intelectual, os quais auxiliaram o desenvolvimento das competências e habilidades definidas para o ensino médio, articuladas às competências gerais da Educação Básica. E a Área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas no ensino médio contribui para consolidar, aprofundar e ampliar a formação integral dos sujeitos [...]. (SANTA CATARINA, 2020a, p. 58).

Essa perspectiva de um “documento escriturístico” ou como “arma social” resulta em perceber como são abissais as diversidades e as desigualdades sociais do currículo do território catarinense. Ainda como tentativa de superar essas fragilidades, no texto introdutório da formação básica da área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, se considerou como problematização que as disciplinas de “Filosofia, Geografia, História e Sociologia podem fomentar nos(as) estudantes a capacidade de análise sobre a sua própria realidade e da sociedade, por meio de procedimentos investigativos que remetem à desnaturalização, ao estranhamento e a sensibilização” (SANTA CATARINA, 2020a, p. 59, grifos do autor). Esses conceitos de “desnaturalização”, “estranhamento” e “sensibilização”, na percepção deste texto, são frágeis enquanto possibilidades de contribuir para uma formação integral dos estudantes catarinenses. Eles assumem proposições superficiais para a realização de uma leitura crítica das diversidades culturais e sociais que constituem a identidade do Estado de Santa Catarina.

É nesse sentido que Azevedo, Oliveira e Catani (2016), ao analisarem de forma macro a condição das humanidades, pontuam que o modo de produção engessado na quarta revolução priorizam áreas de criação de tecnologias, invenções e inovações materiais, em desapreço às humanidades, com o propósito de obter vantagens competitivas no mundo de produção de mercadorias. A ênfase na defesa de currículos que valorizam aspectos de formação de competências requeridas pelo mundo produtivo encontra eco nos discursos que sustêm que o desenvolvimento competitivo de uma nação é resultado de investimentos na formação de jovens habilidosos, empreendedores e inovadores. Como resultado, nas reformas educacionais, deve ser eliminado tudo aquilo que é considerado inútil ou contrário à lógica de produção global capitalista.

Essa constatação encontra abrigo e evidências nos estudos de Nussbaum (2015), que considera que os países obcecados pelo PIB descartam de forma imprudente competências indispensáveis para manter viva a democracia. Se essa tendência continuar, haverá gerações altamente produtivas e lucrativas, incapazes, porém, como cidadãos, de elaboraram pensamento crítico e reflexivo que se oponha às injustiças sociais. Para Nussbaum (2015), tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, as humanidades e as artes estão sendo eliminadas. Um dos argumentos proferidos por administradores públicos e alguns políticos é que as humanidades e as artes são enfeites inúteis, em um contexto em que as nações precisam eliminar todos os elementos inúteis para que se mantenham competitivas no cenário da economia global. Por fim, a crise das humanidades levará a uma crise civilizatória que colocará em ameaça o futuro da democracia. Qualquer sociedade que pretenda ser democrática e consolidar uma convivência ética global precisa investir na formação humana pautada por valores éticos de respeito e de reconhecimento do outro.

Esse tipo de abordagem metodológica e conceitual empregada no currículo do Ensino Médio catarinense, para Cinelli e Garcia (2008), é considerada uma “cegueira epistemológica”, que

[...] nesse trabalho implicaria em obstáculo à necessária desinvizibilização das práticas emancipatórias presentes nos currículos vividos cotidianamente nas práticas escolares. Isto porque entendemos que em nossos modos hegemônicos de ver e conceber a escola, a cultura e o currículo, julgando conhecer/visitar a escola, não percebemos o que ela contém ou oculta. (CINELLI; GARCIA, 2008, p. 3).

Por “cegueira epistemológica”, compreendemos como uma preocupação de ordem prática no explicar as realidades do território catarinense, também no retratar as diversas subjetividades que possibilitam planejar os itinerários formativos que deverão ser organizados por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino e será feito de acordo com critérios de cada sistema de ensino (BRASIL, 2017). Ainda nesse processo de construção do currículo, cada escola deverá ofertar pelo menos um itinerário formativo, ou, de acordo com o art. 4º, parágrafo 3º, da Lei Nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017, os sistemas de ensino por critério próprio poderão optar por organizar “itinerário formativo integrado” (BRASIL, 2017, p. 1).

Também se considerou no Currículo Catarinense na área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas a “[...] consolidação de saberes e do projeto de vida dos(as) estudantes [...], a partir da convivência democrática, do desenvolvimento da autonomia e do protagonismo estudantil [...]” (SANTA CATARINA, 2020a, p. 58). Na concepção aqui apresentada, o projeto de vida é extremamente complexo de ser pensado e constituído em realidades tão diferentes, e as intenções que estão por trás dos projetos de vida de cada escola podem ser perigosas e seus resultados catastróficos em uma sociedade de desigualdades sociais.

Evidencia-se, assim, a proposição de que a implementação da BNCC, como uma política pública, reforça as desigualdades sociais e, ainda, se considera que assume o sentido da expressão em alemão Tuchen in das Eiswasse, a qual quer dizer: “mergulhar na água gelada”. Assim, a construção do currículo do Ensino Médio catarinense é um mergulho em águas geladas quando se pensa a partir das competências no currículo de Santa Catarina. Tal “[...] conceito de competência, adotado pela BNCC, marca a discussão pedagógica e social das últimas décadas e pode ser inferido no texto da LDB” (BRASIL, 2018a, p. 13). Também nessa direção, o documento traz: “Para assegurar o desenvolvimento das competências específicas de área, a cada uma delas é relacionado um conjunto de habilidades, que representa as aprendizagens essenciais a ser garantidas no âmbito da BNCC a todos os estudantes do Ensino Médio” (BRASIL, 2018a, p. 33).

Nessa perspectiva, o currículo da área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas do território catarinense considera os “[...] conceitos, procedimentos, práticas cognitivas e socioemocionais, atitudes e valores que visam a contribuir para o sujeito em formação” (SANTA CATARINA, 2020a, p. 64-65). Na percepção deste estudo, uma formação por meio das competências como um projeto político de combate às desigualdades sociais reforça ainda mais uma lógica excludente e um individualismo perverso no mundo globalizado.

Considera-se no texto da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas que, a partir das competências, se assegura aos “[...] estudantes serem protagonistas de seu próprio processo de escolarização e formação, reconhecendo-os como interlocutores legítimos do currículo, do ensino e da aprendizagem” (SANTA CATARINA, 2020a, p. 65). Em tese, o protagonismo é fantástico, mas, na prática, quando se observa as diversidades e as diferentes realidades das escolas no território catarinense, identificam-se os respectivos desafios com infraestruturas dos espaços escolares, evasão dos estudantes do Ensino Médio, ausências de cursos de formação continuada aos docentes e políticas de reajustes salariais (SANTA CATARINA, 2020a). Tais aspectos são perceptíveis no território catarinense, com mais de 726 escolas do Ensino Médio, e colocam em risco o projeto educativo emancipatório quando os fundamentos da formação ocorrem por meio das competências.

Nesse sentido, o currículo do território catarinense não consegue contemplar todas as subjetividades das culturas dos povos originários, afro-brasileiros, caboclos e migrantes de várias nacionalidades, que constituem seus modos de vidas, tradições, diferentes comportamentos, suas diversidades étnicas, religiosas, políticas e econômicas que retratam as características de cada região do Estado. Não é possível homogeneizar esses saberes e condicioná-los em competências e habilidades de um currículo único. Ainda, para Süssekind (2014, p. 1515), “[...] as ideias de currículos como territórios de desenvolvimento, planejamento, medição da melhoria e eficiência da pessoa/escola/sociedade revelaram-se bastante mercadológicas habitando discursos, programas e fomentos de grandes organizações financeiras”. São concepções legítimas que precisam ser questionadas e identificadas as forças (econômicas, políticas e educacional) que estão por trás da construção do Currículo Catarinense. Segundo o documento:

Fundamentando-se nos pressupostos presentes na Proposta Curricular de Santa Catarina (SANTA CATARINA, 2014) e na Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018) este documento, que é específico para Santa Catarina elenca como categorias fundamentais a serem trabalhadas na área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas no Ensino Médio: Conhecimento científico, ethos, social, tempo, espaço, memória, patrimônio, Indivíduo, identidades, sociedade, territórios, natureza e ambiente, relações de poder, relações de saber/poder, poder, política, cidadania, diversidades, cultura, saúde, mundos do trabalho, trabalho e ética.

Estas categorias ampliam as possibilidades de análise, investigação e problematização de seu objeto de estudo em diversos tempos, espaços e escalas. (SANTA CATARINA, 2020a, p. 67, grifo do autor).

Uma proposta de educação por competências precisa fazer escolhas em suas categorias de estudos, conforme se destaca no Currículo Catarinense; entretanto, tais recortes efetivamente contemplam as temáticas que precisam ser estudadas, compreendidas e debatidas no Ensino Médio?

A vinculação das Competências Gerais com os critérios de avaliação dos exames padronizados denuncia que a competência mais importante para os elaboradores da BNCC está omissa, pelo menos textualmente: a capacidade de competir, de obter bons resultados. A educação torna-se, então, um serviço prestado para melhorar a empregabilidade. (PICOLI, 2020, p. 5).

A BNCC (BRASIL, 2018a) determina a construção do currículo por competências. Como política curricular proposta para nortear a educação nacional a ser recriada nas unidades federativas e no contexto das práticas escolares, o documento promete a superação das insuficiências escolares ligadas ao ensino, como a aplicabilidade dos conhecimentos em situações reais, insatisfação com os baixos resultados na prova do PISA e a urgência em padronizar o ensino, a fim de propor as competências essenciais a serem desenvolvidas em cada etapa da Educação Básica brasileira (BRASIL, 2018a). A opção pelas competências segue resquícios dos documentos, dos discursos e das reformas nacionais que datam dos anos de 1990, tais como parâmetros e diretrizes curriculares nacionais (TONIETO; FÁVERO; SILVA, 2022). Atualmente, elas são uma retomada dos discursos anteriores aliadas a uma forte influência do modismo internacional e da difusão de uma linguagem que dá status ao uso do termo competência na educação, promovida pelas organizações internacionais, como a OCDE.

Historicamente, a OCDE caracterizou-se por ser um importante organismo internacional capaz de influenciar e persuadir os diversos países em escala global para adotarem suas normativas e políticas para o avanço da economia, competitividade global e para o desenvolvimento de cada país. Em 1997, o conceito de competência entrou de modo mais especial nas discussões da OCDE acerca da educação, o que delineou o projeto econômico que essa entidade tem desenvolvido no tocante à educação. Nesse período, foi lançado, pela mesma organização, o PISA, programa de avaliação internacional que propõe a avaliação do desempenho dos estudantes em diversos países (CHIZZOTTI; CASALI, 2012).

Está óbvio que as regras do jogo delineadas em documentos como a BNCC são pensadas e promovidas a partir de uma sociedade capitalista que enxerga nas competências um meio de realização de seus interesses econômicos. Segundo Santos (2011, p. 1), “[...] o latim, a poesia ou a filosofia só serão mantidos se algum Macdonald informático vir neles utilidade”. Por isso, considera-se como problemático o Currículo Catarinense quando pensado em uma educação socioemocional que camufla a ênfase na competição e não na solidariedade, na colaboração e na responsabilidade, não no compromisso de coletivamente superar a pobreza, a desigualdade. Ela individualiza as responsabilidades. Cada um resolve (por suas competências) os seus desafios - mesmo que isso signifique amplificar os desafios dos outros -, em outras palavras, aumenta a desigualdade pela competitividade.

Considerações finais

O Currículo Base para a área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas para o Ensino Médio de Santa Catarina enfrenta os desafios que se impõem para uma educação que visa superar a desigualdade estrutural da sociedade brasileira e que ajude os jovens catarinenses construírem, no decorrer de suas vidas, formas de se moverem no mundo de um modo ético e responsável. Certamente são desafios complexos, problemáticos e abrangentes que exigirão a atenção e o empenho de pesquisadores, educadores, gestores, políticos e cidadãos em geral para compreendê-los, enfrentá-los e superá-los. Difícil elencá-los em uma agenda programática, mas, a título de exemplos, pode-se listar alguns: defender uma educação pública e democrática; dar voz aos sujeitos da escola para que possam expressar seus dilemas e projetos na elaboração e condução das políticas educacionais; criar mecanismos de contensão para que os empresários da educação não sejam os indicadores das agendas educacionais; fomentar espaços de difusão do conhecimento acadêmico aproximando as Universidades das Escolas Públicas; obter recursos financeiros para garantir infraestruturas para que as escolas públicas possam oportunizar uma educação de qualidade a todos as crianças e a todos os jovens; efetivar uma política de valorização profissional dos professores; tornar a formação continuada de professores uma prática cotidiana com aportes financeiros garantidos; tornar a educação a agenda prioritária de todos os governos, independentemente do alinhamento político e ideológico.

Concorda-se com Biesta (2017) quando afirma que, embora as questões sobre conteúdo e sobre efetividade da aprendizagem sejam importantes, a questão central, que todo projeto educacional efetivamente preocupado com democracia, com redução das desigualdades e com ingresso adulto em um mundo plural não deve negligenciar é sobre “[...] como podemos agir responsavelmente ao que e a quem é outro, e como podemos viver pacificamente com o que e com quem é outro” (BIESTA, 2017, p. 31). É a educação o momento em que se opta (ou não) por ajudar as crianças e os jovens a ingressar em um mundo perigoso, a se inserir em um mundo de forma saudável, sem sofrer em demasia com as dificuldades que o mundo apresenta e sem se tornar um perigo para os Outros que com eles compartilharão o mundo (ARENDT, 2016).

Associa-se, aqui, ao pensamento de Vasconcelos e Boto (2020, p. 15) quando dizem que a escola tem três grandes funções: 1) “[...] se colocar como instância intermediária entre a família e a vida social”, dito de outro modo, preparar “[...] a criança para o seu ingresso no mundo público”; 2) dar “acesso à cultura letrada”, quer dizer, “ensinar a criança a lidar com os códigos da cultura escrita”; 3) possibilitar “um aprendizado da ética e da civilidade”, que diz respeito a dar condições para “[...] um aprendizado de valores e de códigos de comportamento considerados adequados e condizentes com o que a sociedade considera importante”.

Dessa forma, refletir sobre a Educação Básica é estar atento às terríveis lógicas hegemônicas que reduzem a escola à função instrumental de preparar para o mercado de trabalho e à manutenção de um ethos fundamentalista que legitima as discrepâncias sociais, cinicamente ilustradas pelos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e as várias tentativas de destruição ou fragilização do acesso ao Ensino Superior pela prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) - conforme denúncia de Süssekind (2019, p. 102), “[...] a ignorância malévola sobrevive do epistemicídio, da antidemocracia e da desigualdade”.

No aspecto legal e executivo, é preciso enfrentar o duelo entre as exigências e as condições que foi deflagrado pelas políticas curriculares da Reforma-BNCC-Diretriz-Ensino Médio. Em uma sociedade democrática, conforme se entende na previsão da LDB, as exigências locais são prioridade em relação às suas condições. As comunidades escolares possuem direitos e, entre eles, está o de superar as condições (de desigualdade) locais. Nesse sentido, as condições, quando desfavoráveis, tornam-se exigências e não o contrário. Logo, o caminho da reforma curricular não deve partir das condições, mas das exigências locais (SÜSSEKIND; FERNANDES, 2019).

A BNCC trata-se, nesta leitura, de um projeto enraizado em lógicas capitalistas, colonizadoras e horizontais, que, em hipótese alguma, corresponde a erradicar os índices de analfabetismo, de reprovação escolar, de evasão, de indisciplina e de uma formação integral e humanizadora. Esses mecanismos são originários de convicções políticas pragmáticas que desconhecem ou fingem desconhecer as diversidades do próprio território brasileiro, da interdependência e das criações inventivas no cotidiano de cada ser humano, criança, jovem, adulto. Trata-se de uma lógica predominante do neoliberalismo economicista que convenciona tornar a escola uma fábrica de competências e de desubjetivações competitivas e desumanas, para, então, transformá-las em locais de qualificação instrumental, como experiências vivenciais e aprendentes, navegando por reflexões criativas inter e transdisciplinares, nas quais os saberes transversais, consideram a proximidade, a afetividade, a colaboração como formas de reenaltecer a história da dinâmica evolutiva que se ancora em pressupostos de colaboração, de compartilhamento de interdependência. A lógica de subjetivação dessa competência é assinalada por Dardot e Laval (2016) como dispositivos de eficácia. Tais dispositivos possuem como condição básica educar corpos e mentes aptos para compor o circuito da produção e do consumo. No campo da educação, as reformas e a elaboração de currículos passam a comprometer-se, à maneira de Dardot e Laval (2016), na educabilidade de indivíduos úteis, dóceis ao trabalho e dispostos ao consumo.

Em decorrência disso, as instituições escolares sofrem os efeitos curriculares das lógicas instrumentais e dos ditames neoliberais, que distanciam suas expectativas, seus sonhos e suas condições de uma vida ética, um espaço de humanização, socialização e singularização (CHARLOT, 2006). Trata-se de pensar em políticas educacionais que incluam, em seus currículos, os invisíveis ou marginalizados da sociedade, aqueles e aquelas que estão em todos os lugares sobrevivendo ao desemprego, à pobreza, às misérias e às doenças, estão despidos de qualquer tipo de dignidade como seres humanos que não tiveram possibilidades de se realizarem no mundo. Essas políticas educacionais são insensíveis e não consideram esses grupos vulneráveis, porque eles não têm condições de produzirem e gerarem mais lucros.

Projetos de políticas educacionais homogêneos e lineares reforçam as desigualdades sociais, “[...] essa lógica do sacrifício sempre esteve no coração do neoliberalismo, que deveríamos chamar de necroliberalismo. Esse sistema sempre operou com a ideia de que alguém vale mais do que os outros. Quem não tem valor pode ser descartado” (MBEMBE; BERCITO, 2020, p. 1). Além disso, na concepção neoliberal, a educação não é um direito, mas uma commodity (GUILHERME; PICOLI, 2019). O neoliberalismo procura cobrir e integrar à sua lógica todas as instituições, e isso significa que a Educação (a escola) é parte fundamental desse sistema e uma das áreas nas quais os formuladores de políticas estão dispostos a implementar mudanças (MCLAREN; FARAHMANDPUR, 2001). As políticas alinhadas ao neoliberalismo procuram controlar o discurso educacional para incutir valores em crianças e jovens, particularmente em relação ao sucesso individual (autodeterminação) e liberdade de escolha nas trocas entre o indivíduo e os outros. Pongratz (2006) e McLaren e Farahmandpur (2001) afirmam que, na lógica desse pensamento, o fracasso e a pobreza são tomados como responsabilidades de indivíduos que não conseguem sucesso porque são demasiadamente preguiçosos, ignorantes ou não procuraram tornar-se mais qualificados para o mercado de trabalho em transformação, não investiram, portanto, no desenvolvimento de sua empregabilidade, de sua competência para competir.

Na percepção dos autores deste artigo, a BNCC, que inspira e obriga a construção dos currículos em cada estado brasileiro, tornou-se hospedeira de um capitalismo perverso, que individualiza e causa mais pobreza no Brasil por não criar condições diferentes de inclusão e de acesso à educação. Considera-se, “[...] sem meias palavras, [que] o capitalismo é um sistema parasitário. Como todos os parasitas, pode prosperar durante certo período, desde que encontre um organismo ainda não explorado que lhe forneça alimento” (BAUMAN, 2010, p. 9). Por mais que existam boas intenções na construção do Currículo Catarinense, temem-se outras forças que percebam nessa implementação de uma política pública um hospedeiro de parasitas contrários àquilo que se defende como uma educação que crie condições para o agir responsável e ético. Posto isso, observa-se que os eixos estruturantes: a) Investigação Científica, b) Processos Criativos, c) Mediação e Intervenção e d) Empreendedorismo, das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, são “[...] condicionantes dos eixos estruturantes, carrega em si as habilidades que poderão ser desenvolvidas a partir das competências da BNCC [...]” (SANTA CATARINA, 2020b, p. 47). Esses dispositivos legais, a exemplo da BNCC, criam condições de políticas educacionais sob a égide do controle e da punição nos respectivos currículos dos Estados, cujas características podem ser um verdadeiro “naufrágio”, porque não há um interesse de incluir discussões sérias sobre educação democrática no território brasileiro.

A Educação Básica, como dito, é um conceito; logo, não é algo natural. É uma construção histórica, fruto de disputas que ainda não se encerraram e que, talvez, nunca se encerrem. É necessário, portanto, sempre afirmar o que se entende por Educação Básica. Essa afirmação é, ao mesmo tempo e indissociavelmente, acadêmica e política. Entende-se por Educação Básica a etapa da vida de uma pessoa em formação para seu ingresso qualificado na condição de adulto em um mundo plural. Adultez que não tem relação com a dimensão etária apenas. Como diz Biesta (2018, p. 28), “[...] estar no mundo de um modo adulto [...], pode ser parecido com uma resposta ao que está ‘fora’, que vem ao encontro, que desafia, que chama adiante”. São possibilidades de “[...] interrupções - nos modos de como se é, nos desejos, nos questionamentos sobre esses desejos, ou seja, se o que se deseja é desejável”.

Por isso, o conceito de Educação Básica constitui-se em um profundo esforço de democratização e justiça social contrário à nova ameaça dada pela implementação da BNCC e seus efeitos no próprio Currículo Catarinense. Essa política educacional pode ser traduzida na “metáfora do iceberg”, quando vista de longe não apresenta perigo, é inofensiva, mas de perto sua dimensão representa um projeto grandioso da falência democrática no acesso à educação. Tais políticas educacionais representam a própria destruição da Educação Básica, na medida em que não a “[...] reconhece como bem público, de caráter próprio e cidadã” (CURY, 2008, p. 298). Permanece o desafio que possamos adensar uma discussão teórica que sirva de subsídios para ampliar espaços de resistência e proposições de políticas educacionais inclusivas que possam produzir a denúncia fundamentada das políticas neoliberais que adentram a educação bem como indicar alternativas democráticas para fortalecer a educação pública.

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Recebido: 02 de Fevereiro de 2023; Revisado: 23 de Maio de 2023; Aceito: 27 de Maio de 2023; Publicado: 23 de Junho de 2023

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