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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.18  Ponta Grossa  2023  Epub 11-Ago-2023

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.18.21381.060 

Artigos

Um estado da arte possível: contribuições da pesquisa em educação sobre pandemia no Brasil*

A possible state of art: contribution of research in education about the pandemic in Brazil

Un estado del arte posible: contribuciones de la investigación en educación sobre pandemia en Brasil

**Universidade de Caxias do Sul (UCS), Mestra e Doutoranda em Educação. E-mail: <iaroncarelli@ucs.br>.

***Universidade de Caxias do Sul (UCS), Doutora em Educação. E-mail: <nstecane@ucs.br>.


Resumo

Este texto visa analisar aspectos evidenciados nas pesquisas sobre Educação Básica e pandemia, realizadas em 2020 e 2021. De natureza qualitativa, de caráter exploratório e do tipo estado da arte, o estudo localizou cinco dissertações e 19 artigos em revistas A1 e A2, no Qualis Capes 2013-2016. O tratamento dos dados seguiu as etapas sugeridas em Romanowski e Ens (2006). A análise considerou, especialmente, os contributos de Chauí (2020), Freire (2015, 2017), Freire e Shor (1987), Saviani e Galvão (2021), entre outros. Foi possível perceber que os dilemas do Ensino Remoto foram bastante presentes, evidenciando desigualdades e dificuldades de diferenciação entre o Ensino Remoto Emergencial e a Educação a Distância. Os desafios de ensinar e aprender sinalizam a necessidade de rever políticas educacionais, práticas pedagógicas e formação docente para o enfrentamento de futuros atravessamentos que acometam o cotidiano escolar.

Palavras-chave: Ensino Remoto; Educação Básica; Prática docente

Abstract

This text aims at analysing the aspects highlighted in research on Basic Education and the pandemic, carried out between 2020 and 2021. Of qualitative nature, exploratory character and state-of-the-art type, the study located five dissertations and 19 articles in A1 and A2 journals, according to the Qualis Capes 2013-2016. Data treatment followed the steps suggested by Romanowski and Ens (2006). The analysis especially considered the contributions of Chauí (2020), Freire (2015, 2017), Freire and Shor (1987), Saviani and Galvão (2021), among others. It was possible to notice that the dilemmas of Remote Teaching were quite present, evidencing inequalities and difficulties of differentiation between Emergency Remote Teaching and Distance Education. The challenges of teaching and learning alert for the need to review education policies, pedagogical practices, and teacher training to cope with future crossings that may affect the daily school life.

Keywords: Teaching; Basic Education; Teaching practice

Resumen

El texto tiene como objetivo analizar los aspectos destacados en investigaciones sobre Educación Básica y pandemia, realizadas entre 2020 y 2021. De naturaleza cualitativa, de carácter exploratorio y de tipo estado del arte, el estudio localizó cinco disertaciones y 19 artículos en revistas A1 y A2, en Qualis Capes 2013-2016. El tratamiento de los datos siguió las etapas sugeridas por Romanowski y Ens (2006). El análisis consideró, especialmente, los aportes de Chauí (2020), Freire (2015, 2017), Freire y Shor (1987), Saviani y Galvão (2021), entre otros. Fue posible percibir que los dilemas de la Educación Remota estuvieron bastante presentes, evidenciando desigualdades y dificultades de diferenciación entre Educación Remota de Emergencia y Educación a Distancia. Los desafíos de enseñar y aprender señalan la necesidad de revisar las políticas educacionales, prácticas pedagógicas y formación docente para el enfrentamiento de futuros cruces que afecten al cotidiano escolar.

Palabras clave: Enseñanza Remota; Educación Básica; Práctica docente

Introdução

Este texto resulta de estudo cujo objetivo foi mapear e analisar os principais assuntos abordados nas pesquisas em educação no período pandêmico, publicadas em teses e dissertações da área, além de periódicos com classificação A1 e A2 segundo avaliação no Qualis Capes1 2013-2016. O intuito visou compreendermos o que ficou em evidência na Educação Básica brasileira entre os anos de 2020 e 2021. A pesquisa que mobiliza as reflexões aqui apresentadas é de natureza qualitativa, de caráter exploratório e do tipo estado da arte, denominado aqui como “possível”, uma vez que a temática é emergente e está em constante atualização. A pergunta orientadora do estudo envolveu a seguinte indagação: Que aspectos do cotidiano escolar foram evidenciados pelas pesquisas que associam Educação Básica e pandemia, nos anos de 2020 e 2021, nas dissertações e nos artigos de períodicos A1 e A2 avaliados no Qualis Capes 2013-2016, ancorados na área da Educação?

A organização e o tratamento dos dados seguiu as etapas sugeridas em Romanowski e Ens (2006), e a análise do corpus considerou, especialmente, os contributos de Chauí (2020), Freire (2015, 2017), Freire e Shor (1987), Saviani e Galvão (2021), entre outros. Antecipamos que, entre os achados da pesquisa, foi possível percebermos que os dilemas do Ensino Remoto foram bastante presentes, evidenciando desigualdades e dificuldades de diferenciação entre o Ensino Remoto Emergencial (ERE) e a Educação a Distância (EAD). Destarte, os desafios de ensinar e aprender sinalizam a necessidade de rever políticas educacionais, práticas pedagógicas e formação de professores(as) para o enfrentamento de futuros atravessamentos que acometem o cotidiano escolar.

Entendemos que os contributos da pesquisa podem ser situados em pelo menos três dimensões: científica, pedagógica e política. A primeira, por meio do mapeamento realizado, indica os aspectos que vêm sendo pesquisados sobre o recente fenômeno da pandemia, abrindo possibilidades de novas pesquisas a partir das categorias evidenciadas nos trabalhos localizados e das lacunas que demandam mais investigação. A segunda, por meio do diagnóstico feito pelos autores dos textos acessados, evidencia a premência da luta pelo reconhecimento do direito à educação, especialmente no tocante à formação docente, à infraestrutura e ao enfrentamento das “desigualdades multiplicadas” (DUBET, 2001)2 que emergiram e/ou que ficaram mais aparentes durante a pandemia. Já a terceira dimensão, de ordem política, abarca as anteriores e desafia a denúncia de um cenário dramático e os anúncios já conhecidos para a superação do agravante quadro instalado - antes, durante e após o período pandêmico -, de modo a conclamar os responsáveis para o atendimento das necessidades requeridas, notadamente a presença dos gestores públicos.

Na primeira seção deste artigo, apresentamos a metodologia de pesquisa utilizada, baseada nos autores que orientaram este estado da arte (FERREIRA, 2002; ROMANOWSKI; ENS, 2006) e descrevemos o processo de busca, categorização e análise dos dados. Nas três seções subsequentes, tecemos uma articulação entre os achados de pesquisa, apresentando as três principais categorias emergentes, relacionando os dados com os estudos de Chauí (2020), Freire (2015, 2017), Freire e Shor (1987), Lemons (2015), Nunes (2021), Roncarelli (2019), Saviani e Galvão (2021), autores que ancoram nossa análise. Por fim, na última seção, apresentamos nossas considerações finais, retomando o caminho feito e anunciando possíveis cenários futuros, a partir do que foi evidenciado pelos estudos abarcados no recorte analisado, para o vivido pelos atores da Educação Básica ao longo da pandemia.

Estado da arte: descrição do processo

Para organizar o presente estado da arte, foi necessário um recorte temporal para que o trabalho pudesse ser concluído, pois, no momento de sua realização, a pandemia da covid-19 ainda estava em curso no Brasil. Cabe destacarmos que outras pesquisas surgiram na sequência, podendo compor estudos futuros. Para isso, ancoramo-nos nas orientações de Romanowski e Ens (2006), no entendimento de que:

Estados da arte podem significar uma contribuição importante na constituição do campo teórico de uma área de conhecimento, pois procuram identificar os aportes significativos da construção da teoria e prática pedagógica, apontar as restrições sobre o campo em que se move a pesquisa, as suas lacunas de disseminação, identificar experiências inovadoras investigadas que apontem alternativas de solução para os problemas da prática e reconhecer as contribuições da pesquisa na constituição de propostas na área focalizada. (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 39).

Apresentamos, assim, “um estado da arte possível”, pois, segundo Ferreira (2002), ao ler um conjunto de trabalhos sobre determinado assunto e, a partir deles, narrar uma história ou construir um texto com suas contribuições, é narrar apenas uma possibilidade dessa história, de acordo com um ponto de vista, permeado pela subjetividade de quem analisa. Portanto, as contribuições dos textos apresentados compõem apenas um olhar possível sobre a pesquisa em educação no Brasil no período da pandemia da covid-19. Em seguida, narramos a forma como a busca e a análise dos textos localizados foram realizadas.

A fim de iniciarmos o processo de varredura dos textos sobre a temática de pesquisa, realizamos uma busca na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), em busca de teses e dissertações defendidas entre 2020 e 2021 que poderiam contribuir com o estudo. Começamos aplicando os descritores “Covid-19 e Educação”; como resultado, encontramos 139 textos, sendo 115 dissertações de Mestrado e 24 teses de Doutorado. Após lermos o resumo, selecionamos nove dissertações para realizar a leitura completa, por serem as únicas que se relacionavam com a temática. Foram descartados trabalhos que não tinham relação com a pandemia, que não tratavam da Educação Básica, além daqueles relacionados a especificidades como: Educação Financeira, Educação Ambiental, Educação do Campo e Educação Inclusiva. Também foram descartados trabalhos que tratavam especificamente de uma disciplina, dando prioridade aos trabalhos que tratavam das realidades das escolas no geral, ou das percepções de estudantes e professores(as) acerca da emergência enfrentada. Essa triagem foi necessária para proporcionar uma análise em profundidade dos textos.

Optamos, então, por nova busca, incluindo os descritores “Ensino Remoto e Covid-19”, a partir dos quais encontramos 47 trabalhos, sendo 42 dissertações e cinco teses. Realizamos o mesmo processo de leitura dos resumos para os critérios de inclusão/exclusão, restando, após esse movimento, apenas textos que já haviam sido contemplados na primeira busca. Por fim, em uma última busca, com os descritores “Ensino Remoto e Pandemia”, localizamos 62 escritas, sendo 56 dissertações e seis teses. Da mesma forma, após os descartes, restaram apenas os cinco trabalhos já encontrados na primeira busca, os quais estão listados no Quadro 1.

Quadro 1 Trabalhos encontrados na BDTD 

Título do trabalho Autor(a) Dissertação/Tese Ano
Ensino Remoto na pandemia: urgências e expressões curriculares da cultura digital Carolina Gil Santos Wolff Dissertação 2020
A pandemia de 2020 e a escola: análises sobre autonomia de estudantes em uma escola da rede pública do Estado de Minas Gerais Lucas Reis Ávila Dissertação 2021
Os conflitos vivenciados em torno do trabalho docente na perspectiva de professores da Educação Básica em contexto de pandemia Míriam Fernanda Costa Dissertação 2021
Adolescência, escola e pandemia: contribuição da psicanálise à educação Marcos Venâncio Mendes Dissertação 2021
Repercussões do isolamento social durante a pandemia de covid-19 no cotidiano de adolescentes 2020 Ariana Paula da Silva Dissertação 2021

Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados da pesquisa realizada na BDTD, 2022.

Levando em consideração o baixo número de resultados de teses e dissertações encontradas, somente cinco dissertações e nenhuma tese3, bem como a emergência do tema, optamos por realizar buscas em periódicos já que, no geral, apresentam pesquisas com delimitação temporal mais recente. Para isso, fizemos uma busca na Plataforma Sucupira das revistas com avaliação A1 e A2 no Qualis Capes4, referente à área de Educação. Em cada uma das revistas, buscamos por artigos publicados em 2020 e 2021 com temática relacionada à pandemia e Educação Básica no Brasil.

Importante situarmos que, no Qualis Capes 2013-2016, havia 55 revistas classificadas como A1, sendo 39 com publicações no período selecionado, e 213 revistas avaliadas como A2, sendo 83 com publicações nos anos analisados, totalizando 432 volumes publicados no período. Desses periódicos, somente nove tiveram publicações relacionadas à pandemia e Educação Básica no contexto brasileiro, levando em consideração os critérios de exclusão supracitados. Com isso, 17 artigos foram selecionados para compor o corpus da pesquisa, conforme mostra o Quadro 2 a seguir.

Quadro 2 Artigos encontrados nos periódicos 

Título Autor(es)/Autora(s) Periódico Qualis Ano
Mais uma lição: sindemia covídica e educação Alfredo Veiga-Neto Educação & Realidade A1 2020
Um sentido para a experiência escolar em tempos de pandemia José Sérgio Fonseca de Carvalho Educação & Realidade A1 2020
Sustentar a transferência no ensino remoto: docência em tempos de pandemia Simone Bicca Charczuk Educação & Realidade A1 2020
Covid-19 e o fim da educação: 1870 - 1920 - 1970 - 2020 António Nóvoa e Yara Cristina Alvim Revista História da Educação A1 2021
Encontros e desencontros entre professores e o ensino remoto emergencial Lara Carlette Thiengo, Maria Fernanda Diogo, Bianchetti Lucídio, Kaue Tortato Alves e Neiva de Assis Revista Educação (Santa Maria Online) A1 2021
Cenários virtuais de aprendizagem como recurso pedagógico diante da pandemia do novo coronavírus: relatos das experiências docentes Willian Lima Santos, Anne Alilma Silva Souza Ferrete e Manoel Messias Santos Alves Revista Educação (Santa Maria Online) A1 2021
Educação em tempos de covid: o que as instituições de ensino estão fazendo de acordo com a mídia online Eduardo Henrique Celestino e Adriana Backx Noronha Viana Revista Educação (Santa Maria Online) A1 2021
Ensino a distância, dificuldades presenciais: perspectivas em tempos de covid-19 Thaís Janaina Wenczenovicz Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação (RIAEE) A2 2020
Tempos da escola em tempo de pandemia e necropolítica Walter Omar Kohan Práxis Educativa A2 2020
A educação em tempos de covid-19: ensino remoto e exaustão docente Karla Saraiva, Clarice Traversini e Kamila Lockmann Práxis Educativa A2 2020
Lições de quarentena: limites e possibilidades da atuação docente em época de isolamento social Luciana Haddad Ferreira e Andreza Barbosa Práxis Educativa A2 2020
Transformações educativas em tempos de pandemia: do confinamento social ao isolamento curricular José Carlos Morgado, Joana Sousa e José Augus Pacheco Práxis Educativa A2 2020
Possível reconfiguração dos modelos educacionais pós-pandemia Bernardete A. Gatti Estudos Avançados A2 2020
O discurso do ensino remoto durante a pandemia de covid-19 Luis Cláudio Dallier Saldanha Educação e Cultura Contemporânea A2 2020
Pandemia de Covid-19, projeto colonial e inflexões anticoloniais na educação escolar Lúcia Helena Alvarez Leite, Bárbara Bruna Moreira Ramalho e Paulo Felipe Lopes de Carvalho Currículo sem Fronteiras A2 2020
A atualidade de Paulo Freire em tempos de pandemia: tecendo diálogos sobre os desafios da educação e do fazer docente Mairce da Silva Araujo, Daniel Pereira de Oliveira, Regina Aparecida Correia Trindade e Geisi dos Santos Nicolau Práxis Educativa A2 2021
Ensino a Distância em tempos de pandemia: reflexões sobre seus impactos Tatiana de Cassia Nakano, Rodrigo Hipólito Roza e Allan Waki de Oliveira Revista e-Curriculum A2 2021

Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados da pesquisa realizada no repositório de cada periódico, 2022.

A partir da leitura dos artigos e das dissertações, foram elencadas quatro categorias de análise, ancoradas nos temas emergentes comuns entre os textos, nomeadas da seguinte forma: (a) Educação, pandemia e disputas sociopolíticas; (b) Ensino Remoto versus Educação a Distância; (c) Desafios do Ensino Remoto; (d) Perspectivas de futuro.

O movimento realizado na organização do corpus do estudo seguiu as orientações de Romanowski (2002) para as pesquisas denominadas do tipo estado da arte, cuja sugestão é a adoção de entre oito e 12 procedimentos. A par do que já descrevemos anteriormente, detivemo-nos no que a autora denomina de “[...] leitura analítica das informações contidas nas tabelas” (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 44) e, na sequência, na construção de uma síntese seguida de “inferências e considerações”. Diversas contribuições foram encontradas, as quais explicitamos nas seções que estruturam o presente artigo, organizadas a partir das categorias emergentes dos trabalhos selecionados, lidos e analisados.

Contexto sócio-histórico: a educação pandêmica em espaço de disputas

Com a suspensão das aulas presenciais nas escolas de todo o país, em março de 2020, diversos desafios passaram a fazer parte do cotidiano da Educação Básica, por isso, para além de abordar questões específicas do Ensino Remoto e suas implicações no cotidiano escolar, é preciso refletir sobre o contexto da sociedade vivenciado no período. As notícias falsas acerca da covid-19 e suas consequências espalharam-se rapidamente pelo Brasil e impactaram também as escolas. Para Veiga-Neto (2020):

Uma característica traiçoeira das fakenews e das cheatnews é que muitas delas são bem elaboradas, se apresentando de forma palatável, plausível e geralmente simples, o que as torna pretensamente verdadeiras. Isso funciona muito bem principalmente para aqueles que não estão suficientemente aparelhados para pensar criticamente. (VEIGA-NETO, 2020, p. 20)

O fenômeno das fake news, de acordo com Loureiro e Gonçalves (2021), está ligado à necessidade humana de adequação à realidade exterior, bem como a um contexto de semi-informação. Nas palavras dos autores:

A produção, reprodução e o consumo de fake news, em especial por meio das redes sociais online da internet, podem ser concebidos com uma busca de adequação à realidade exterior. Ainda que com olhos e ouvidos abertos, as pessoas estão entorpecidas e carecem de uma educação dos sentidos que lhes possibilitem sair do recôndito subsolo da psique, com seus sedimentos reprimidos pelo ego fraco, cujas escolhas abstratas pouco podem ser justificadas pela razão. (LOUREIRO; GONÇALVES, 2021, p. 3, grifo do autor).

O papel da escola no combate às notícias falsas e na disseminação da ciência ficou, portanto, ainda mais evidente durante a pandemia, reforçando a necessidade de fortalecer uma educação científica e dos sentidos, que promova o pensamento crítico, a autoconfiança dos sujeitos e o aguçamento das percepções sobre a realidade vivenciada. Entretanto, com a escola adentrando as casas e perdendo seu espaço de encontro físico, as disputas de poder que já dominavam o cenário educacional se intensificaram. De acordo com Gatti (2020):

Tanto a educação básica como a superior, por meio de suas escolas e instituições, públicas ou privadas, se inserem nesse movimento e nessa situação pandêmica, e não estão isentas dos conflitos, das disputas de poder, de interesses diversos e do jogo econômico, no bojo, também, das desigualdades institucionais e entre redes de ensino. (GATTI, 2020, p. 30).

Por isso, as disputas promovidas pela disseminação das fake news adentraram o cotidiano escolar e influenciaram nos modos como os(as) docentes desenvolveram seu fazer pedagógico. Além disso, “[...] no ‘ensino’ remoto, ficamos com pouco ensino, pouca aprendizagem, pouco conteúdo, pouca carga horária, pouco diálogo” (SAVIANI; GALVÃO, 2021, p. 42), reforçando a impossibilidade do desenvolvimento, por parte das escolas, de um trabalho de combate aos discursos falsos que circularam na sociedade.

As disputas entre os diferentes setores da sociedade sobre o retorno presencial das aulas causou angústias nos(as) professores(as) que, além de se preocuparem com a pandemia, com seu trabalho remoto e com sua própria saúde, precisaram lidar com os discursos de marginalização do seu trabalho. É claro que, de acordo com Gatti (2020, p. 39), “[...] a educação tem tudo a ver com a preservação da vida em todos os seus aspectos”, porém o discurso massificado por meio das fake news reforçou a importância da manutenção da economia acima de tudo e, por consequência, a necessidade do retorno presencial das aulas, para que os cuidadores das crianças pudessem voltar efetivamente para suas tarefas de trabalho, no mesmo ritmo do anterior. Esse discurso, que vai de encontro com as orientações dos órgãos de saúde de todo mundo, está pautado no viés neoliberal da política adotada no país e evidencia as disputas de poder presentes na sociedade.

A escola, frente a esse cenário, precisou se adaptar rapidamente para atender aos(às) estudantes, ainda que sofrendo pressões constantes quanto à validade do trabalho realizado, inflado pelo discurso de negacionismo científico enfatizado por muitos segmentos da sociedade. Nesse contexto, o Ensino Remoto foi adotado por grande parte das instituições de ensino como tentativa de minimizar as consequências na aprendizagem de crianças e adolescentes, decorrentes do afastamento da escola, não sem ter presente que se tratava de medida paliativa, caracterizada por uma “inclusão precária”5 que, possivelmente, culminaria em “desigualdades multiplicadas” (DUBET, 2001).

Ensino Remoto versus Educação a Distância: desafios e desigualdades

Com a suspensão das aulas presenciais, muitas instituições de ensino, especialmente as privadas, organizaram-se para iniciar aulas em plataformas virtuais, notadamente aquelas de transmissão ao vivo. Esse movimento foi também incentivado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) por intermédio dos pareceres emitidos e reforçados pelo Ministério da Educação (MEC) e pela mídia como um todo, ainda que alguns pesquisadores não tenham visto como a solução mais adequada. É o que afirmam Saviani e Galvão (2021) a respeito do Ensino Remoto:

Seu esvaziamento se expressa na impossibilidade de se realizar um trabalho pedagógico sério com o aprofundamento dos conteúdos de ensino, uma vez que essa modalidade não comporta aulas que se valham de diferentes formas de abordagem e que tenham professores e alunos com os mesmos espaços, tempos e compartilhamentos da educação presencial. (SAVIANI; GALVÃO, 2021, p. 42).

Ainda assim, a orientação foi seguida por grande parte das instituições do país. Muitas das normativas e das notas emitidas no início da pandemia pelo MEC passaram a utilizar o termo “Educação a Distância (EAD)” para se referir às atividades realizadas remotamente pelos(as) estudantes da Educação Básica, causando estranhamento para a comunidade científica que pesquisa essa modalidade de ensino, além de gerar confusão para os familiares que acompanhavam a vida escolar de crianças e de adolescentes. Conforme Charczuk (2020), a adoção dessa estratégia de ensino no país

[...] ocasionou uma série de críticas e resistência dos envolvidos (isto é, professores, familiares e alunos), como também da sociedade civil. Esse movimento se centrou em dois grandes focos de problematização: (i) a enorme desigualdade socioeconômica dos brasileiros e, consequentemente, a falta de acesso aos recursos necessários para o acompanhamento de aulas remotas por grande parte da população; e (ii) a contraposição entre ensino presencial e educação a distância (EaD), ou ensino remoto, e a pretensa qualidade daquele em detrimento destes. (CHARCZUK, 2020, p. 2).

A EAD é uma modalidade educativa bastante comum no Ensino Superior6. Por um lado, essa modalidade prevê uma organização político-pedagógica específica, com diretrizes próprias, além de possuir uma equipe técnica responsável pela organização e produção dos materiais que serão estudados. Por outro lado, o Ensino Remoto “[...] não pode ser considerado uma modalidade educativa, mas, sim, uma ação pedagógica, na qual se processa certa transposição do ensino presencial para o ensino mediado por ferramentas digitais, predominantemente, ou pela proposição de apostilas e materiais impressos remetidos aos alunos” (CHARCZUK, 2020, p. 4-5).

Diversos(as) pesquisadores(as) que integram o corpus deste estudo (CELESTINO; VIANA, 2021; CHARCZUK, 2020; LEITE; RAMALHO; CARVALHO, 2020; MENDES, 2021; SALDANHA, 2020; SARAIVA; TRAVERSINI; LOCKMANN, 2020; SILVA, 2021; THIENGO et al., 2021, WENCZENOVICZ, 2020) tensionaram o uso do termo EAD para se referir às atividades remotas realizadas durante a pandemia e promoveram discussões sobre a diferença entre a EAD e o Ensino Remoto. Para Saraiva, Traversini e Lockmann (2020):

No ensino remoto, é necessário, em geral, um envio de evidências de desenvolvimento de atividades não avaliativas, que funcionam como uma forma de controle do uso do tempo, uma das características da disciplina. Na EaD, as atividades a serem desenvolvidas são, na maior parte das vezes, avaliações. (SARAIVA; TRAVERSINI; LOCKMANN, 2020, p. 7).

No Ensino Remoto, adotado por grande parte das instituições de Educação Básica do país, há um caráter emergencial, desse modo, é um modelo adotado somente no período em que a emergência sanitária perdura (SALDANHA, 2020). Nesse caso, as atividades realizadas remotamente são uma espécie de transposição do ensino presencial, adaptadas à realidade online ou, nos casos em que não há acesso às tecnologias digitais, adaptadas ao modelo não presencial. É comum, no ERE, que as escolas marquem horários para as aulas ocorrerem ou para as atividades serem realizadas pelos(as) estudantes, o que reforça também a diferença do ERE para a EAD, uma vez que, na EAD, a flexibilidade de tempo é uma das premissas (SARAIVA; TRAVERSINI; LOCKMANN, 2020).

Nos estudos de Saraiva, Traversini, Lockmann (2020) e Saldanha (2020), fica evidente que a confusão sobre a utilização de Ensino Remoto ou EAD foi presente também nos discursos governamentais. Ao longo de 2020, diversos termos distintos para tratar das atividades remotas foram utilizadas tanto pelo MEC quanto por alguns governos dos estados. A variedade na utilização dos termos, além de demonstrar as disputas conceituais e políticas7, relaciona-se, também, com a dificuldade de caracterizar as aulas não presenciais para a Educação Básica, uma vez que foram inúmeras as formas de implementação do ERE no país, visto que a diversidade entre as redes e as escolas impossibilita que todas as instituições sigam exatamente as mesmas orientações. Celestino e Viana (2021) concluem que as etapas necessárias para a implementação da EAD não foram seguidas pelas instituições, o que reforça a diferença entre a EAD e o modelo que foi adotado pela maior parte do país. Nas palavras dos autores, “[...] devido ao caráter de imediatismo presente nas escolas e instituições de ensino, a adoção do ensino a distância está acontecendo de maneira não planejada e sem a execução de etapas necessárias para o sucesso desse método” (CELESTINO; VIANA, 2021, p. 17).

A adoção do Ensino Remoto Emergencial foi, portanto, uma tentativa de minimizar as perdas dos(as) estudantes, referentes às aprendizagens e, também, ao vínculo com a escola, tentando suprir as ausências e a impossibilidade de comparecimento no espaço escolar, ainda que se tivesse presente que não seria possível, com esse formato, atender plenamente aos(às) estudantes da mesma forma como eram atendidos presencialmente. Em contrapartida, levanta-se o questionamento: “[...] esse modelo tão precarizado e ínfimo do ponto de vista do cumprimento dos objetivos da educação escolar corrige realmente essa suposta ausência ou é apenas um engodo?” (SAVIANI; GALVÃO, 2021, p. 43). Claro que, no momento da adoção do ERE, havia a esperança de que logo se reestabeleceria a normalidade, pois, conforme Thiengo et al. (2021, p. 15), para os(as) professores(as), “[...] o emergencial parece ter sido vivido, ao menos inicialmente, como se fosse acabar a qualquer instante. Esta esperança, de certa maneira, transpassava e direcionava as escolhas e a organização das atividades pedagógicas pelos docentes”.

Contudo, essa expectativa não se confirmou, e o Ensino Remoto acabou por se estender em 2020 e 2021, causando tensões e diferentes percepções da comunidade científica: “[...] se o ERE é analisado acriticamente pelos autores mais pragmáticos, que buscam refletir sobre sua viabilidade e objetivação, por outro lado, é visto com desconfiança por um grupo de professores, intelectuais e por diversas associações” (THIENGO et al., 2021, p. 8). Isso se justifica pelas dificuldades enfrentadas por diferentes realidades educacionais, as quais impedem que o Ensino Remoto seja acessado por todos(as) os(as) estudantes do país. Ademais, segundo os autores, esse “[...] tipo de ensino acaba, em alguns contextos, servindo [...] aos interesses de grandes conglomerados educacionais e plataformas de tecnologia” (THIENGO et al., 2021, p. 8). Em complemento, Wenczenovicz (2020) acrescenta que,

[...] dentre os obstáculos do ensino emergencial remoto também destacam-se as questões estruturais, ou seja, os problemas de acesso a computadores e de conexão com internet, a falta de espaço apropriado para o estudo a domicílio/em casa e a relação família-escola. [...]. Outro fator a não se desconsiderar é o fato da baixa escolaridade dos familiares. Inúmeros são os relatos em que os responsáveis não conseguem acompanhar as demandas da escola. (WENCZENOVICZ, 2020, p. 7).

Esses obstáculos já eram presentes no contexto educacional do Brasil, mas foram intensificados com a necessidade de adoção do ERE. Nas afirmativas de Silva (2021):

No Brasil, a transição do ensino presencial para o remoto não ocorreu de forma homogênea. Em geral, percebe-se que as instituições de ensino privadas tiveram maior condição de adaptação do ensino, enquanto as instituições públicas enfrentaram grandes desafios para fazê-lo. Tais dificuldades são de âmbito interno, como falta de plataforma adequada para ministrar as aulas, pouca ou nenhuma preparação dos professores para essa modalidade de ensino e resistência político-governamental. Do ponto de vista dos alunos, as dificuldades dizem respeito à desigualdade social, pois muitos estudantes não têm acesso à internet e/ou aparelho eletrônico para assistir as aulas. (SILVA, 2021, p. 35).

A desigualdade presente entre as escolas foi evidenciada. De acordo com Wenczenovicz (2020), nas escolas particulares, além dos(as) estudantes possuírem maior acesso às tecnologias digitais, os(as) docentes tiveram mais oportunidades de formação para uso pedagógico das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC), bem como maior apoio das gestões escolares na efetivação do trabalho remoto, enquanto nas escolas públicas o uso das ferramentas digitais foi escasso e a formação docente teve foco na instrumentalização e não na discussão do uso pedagógico das ferramentas.

Tais desigualdades reforçam a necessidade de políticas e investimentos na educação pública do Brasil, uma vez que o abismo entre as escolas privadas e públicas parece ter aumentado, por conta das diferentes possibilidades de uso das tecnologias, de recursos disponíveis, de acompanhamento familiar e de sobrevivência das famílias na pandemia. Para Leite, Ramalho e Carvalho (2020), “[...] neste desastre, há aqueles que se encontram abrigados em grandes navios, outros em pequenas embarcações, e, ainda, os que, mergulhados nas violentas águas salgadas, não portam sequer um colete salva-vidas”. A percepção de que nem todos(as) têm as mesmas oportunidades foi sinalizada em todos os trabalhos lidos. Todos(as) os(as) pesquisadores(as) pontuaram as desigualdades como grande barreira para a efetivação plena do ERE no país. Conforme Mendes (2021),

[...] esse modelo de ensino não abarcou o princípio constitucional da Educação para Todos, à medida que não considerou a existência das diversas realidades brasileiras colocadas para os alunos. [...] a adoção desse modelo aumentou o índice de desigualdade social e escolar, impedindo muitas vezes, a participação efetiva do aluno por não dispor de recursos materiais para o seu acesso, apontando para a necessidade de se criar políticas públicas que atendam os princípios básicos da Constituição, garantindo o direito à educação para todos, independentes da realidade social que o sujeito está inserido e do momento histórico que a sociedade encara. (MENDES, 2021, p. 122-123).

Embora a denúncia de todas essas dificuldades e desigualdades, diversos estudos destacam a importância do movimento desencadeado, uma vez que as escolas precisaram ficar com as aulas presenciais suspensas por um tempo considerável e, nesse caso, não adotar o ERE poderia ser ainda mais prejudicial (SARAIVA; TRAVERSINI; LOCKMANN, 2020; WENCZENOVICZ, 2020). No próximo tópico, retomaremos a questão das desigualdades e seus impactos nas práticas adotadas pelas escolas da Educação Básica, na medida em que narramos as estratégias de ERE descritas nas pesquisas.

Desafios de ensinar e aprender remotamente: experiências em diferentes contextos

Como já discutido, foram diversas as formas de ERE adotadas pelas escolas do Brasil. Frente aos tensionamentos entre o Ensino Remoto e a EAD, as instituições organizaram-se, algumas com certa autonomia, outras seguindo orientações das mantenedoras, de forma a melhor atender aos(às) estudantes durante a suspensão das aulas presenciais. Na sequência, destacamos as ações vividas pelas escolas participantes dos estudos acessados.

Na pesquisa de Wolff (2020), realizada em uma escola particular de classe média alta de São Paulo, a inserção das tecnologias e a adaptação curricular foi um dos maiores desafios do período pandêmico, diferentemente da realidade de outras escolas (ÁVILA, 2021; COSTA, 2021; MENDES, 2021; SANTOS; FERRETE; ALVES, 2021) que, por estarem inseridas em contextos de vulnerabilidade social, ainda enfrentaram desafios muito maiores.

Para Wolff (2020, p. 27), “[...] o grande desafio decorrente do ensino remoto, do ponto de vista do currículo, foi realizar um currículo que tinha sido planejado para acontecer no modo presencial e que agora deveria ser proposto [a] distância”. A autora destaca, em sua dissertação, que a falta de um estudo anterior à implementação do ERE fez com que algumas práticas apenas fossem transpostas para o ambiente virtual, o que não é o mais adequado levando em conta que:

A matriz curricular organiza os conteúdos conceituais, atitudinais e procedimentais em um determinado tempo didático e com algumas estratégias. A partir do momento em que esse currículo deve ser realizado de forma remota, não é possível simplesmente fazer uma transposição, como pede o senso comum e inúmeras vezes pode ser cobrado pelas famílias, é preciso uma nova articulação dos conteúdos, metodologias, didática, enfim é necessário um novo currículo. (WOLFF, 2020, p. 37).

Ferreira e Barbosa (2020) corroboram a afirmação de Wolff (2020) quando destacam que os sujeitos podem ser os mesmos, mas, dispostos em ambiente diferente e com uso de outras ferramentas de comunicação e interação, não é possível que as práticas adotadas no ensino presencial sejam adequadas a esse contexto, sem nenhuma modificação. Por isso, ainda que não haja um estudo de currículo específico para essa prática, como ocorre na EAD, uma readequação dele e uma adaptação das práticas se mostrou essencial.

No contexto do ERE, “[...] a entrada das TDIC, que, anteriormente, ocorria de forma cuidadosa na formação de professores, precisou ser rapidamente assimilada, ao menos como instrumento de trabalho” (WOLFF, 2020, p. 21). Isso não significa que todos(as) os(as) docentes passaram a utilizar as tecnologias digitais como estratégia de ensino, nem que seu uso foi com intencionalidade pedagógica, isso variou muito de escola para escola. Além disso, a diferença de formação dos(as) professores(as) também influenciou na forma como cada um passou a fazer uso das tecnologias, ou apenas modificou sua forma de utilizá-las, durante a pandemia. Essas diferenças na adaptação dos(as) docentes em relação ao uso das TDIC foram percebidas inclusive dentro da mesma instituição (WOLFF, 2020), demonstrando que a singularidade do fazer docente e seus percursos identitários influenciam na maneira de atuar remotamente.

Wolff (2020), ao questionar professores(as) da escola em que realizou a pesquisa acerca das mudanças positivas ocorridas no trabalho docente, levando em conta a perspectiva das TDIC, obteve 15 respostas diferentes, mas que levam ao mesmo direcionamento: a docência movimentou-se durante o ERE, permitindo aos(às) docentes (re)avaliar práticas, modificar modos de intervenção e adotar novas metodologias. De acordo com Wolff (2020, p. 89), “[...] prática da sala de aula invertida; atividades investigativas; aprofundamento de pesquisas autorais; colaboração entre os alunos” foram práticas que estiveram mais presentes ao longo do período. Os(As) docentes também foram questionados(as) sobre as práticas aprendidas no que deveriam permanecer no retorno presencial, tendo a maior parte das respostas relação com o uso de ambientes virtuais de aprendizagem como forma de complementação daquilo que é realizado na escola, ou como suporte do trabalho presencial. Além disso, cabe destaque às respostas relacionadas ao fazer pedagógico: “[...] prática do registro de intervenções; compartilhamento com alunos(as) e professores(as); pesquisa e levantamento de conhecimentos prévios; sala de aula invertida; união de diferentes áreas para propor projeto em comum” (WOLFF, 2020, p. 90).

Algumas redes particulares logo se organizaram e adaptaram à nova realidade, pois já eram incentivadas a utilizar plataformas educacionais ainda antes da pandemia; dessa forma, mesmo que tenham enfrentado dificuldades na articulação do currículo no novo formato, a assimilação e o acesso às tecnologias foram facilitados, podendo, inclusive, conforme explicitado por Wolff (2020), já esboçar novas perspectivas para o uso das tecnologias no retorno às aulas presenciais. O mesmo não ocorreu em muitas escolas públicas que tiveram cortes orçamentários, e algumas nem sequer acesso à internet possuíam (ÁVILA, 2021; COSTA, 2021).

Se para a escola do município de São Paulo investigada por Wolff (2020) a maior dificuldade foi a adequação do currículo e a transposição didática, para escolas do estado de Minas Gerais, investigadas por Ávila (2021), a autonomia didático-pedagógica dos(as) docentes é que esteve em xeque durante o ERE. De acordo com o autor, o governo do estado de Minas Gerais disponibilizava as atividades que eram entregues aos(às) estudantes, as quais deveriam ser seguidas pelos(as) professores(as), ferindo a autonomia didático-pedagógica e, além disso, ignorando as diferentes realidades escolares. O que as escolas poderiam decidir era como realizar a comunicação com os(as) estudantes e a entrega de atividades. Também foram organizadas transmissões ao vivo pelo Governo do Estado via televisão e YouTube, por meio das quais professores(as) explicavam os conteúdos disponibilizados na semana. Cada área do conhecimento, para cada ano escolar, tinha 20 minutos semanais de transmissão. Ávila (2021) ressalta que houve uma priorização pelo uso das tecnologias digitais para o ERE, assim como foi citado por Wolff (2020), na tentativa de aproximá-las da educação, acontece que, a realidade apresentada pelo autor difere, em grande parte, das instituições privadas. Segundo Ávila (2021, p. 64), “[...] a prioridade das ações do governo aos alunos que possuíam acesso à internet em detrimento dos demais estudantes aprofundou e escancarou as diferenças socioeconômicas que [...] não se iniciaram com a pandemia”.

Mesmo com as inúmeras dificuldades de acesso, a adequação curricular também foi uma preocupação evidenciada na pesquisa de Ávila (2021). De acordo com o autor,

[...] com o estado de excepcionalidade imposto pela pandemia, nem todas as ofertas de ensino não presencial oferecidas pelos governos e escolas particulares possuíam um arcabouço teórico ou pedagógico que confirmava sua eficácia, principalmente quando oferecidas para crianças em processo de alfabetização ou com pouca familiaridade com as Tecnologias de Informação e Comunicação [...]. (ÁVILA, 2021, p. 69).

Diversos problemas referentes ao ERE foram identificados por Ávila (2021): falta de interação entre professores(as) e estudantes; impossibilidade de construção coletiva; falta de autonomia das escolas; estudantes adolescentes que precisaram se afastar dos estudos para se dedicar ao trabalho; inúmeras dificuldades de conexão e acesso à internet; e intensificação das questões de vulnerabilidade social.

Os desafios descritos por Ávila (2021) são recorrentes também em outros estudos que tratam da educação pública. Costa (2021) evidenciou a solidão docente no trabalho pandêmico, a falta de autonomia pedagógica e, ainda, as dificuldades de acesso e utilização das tecnologias digitais, tanto por docentes quanto por discentes. Mendes (2021) discutiu como o afastamento da escola aproximou os(as) jovens do subemprego e fez com que perdessem seus espaços de constituição de redes de apoio para a passagem pela adolescência. Silva (2021), por sua vez, destacou a falta de autonomia dos(as) jovens para buscar sanar suas dúvidas. Kohan (2020) evidenciou a importância da escola como espaço de encontro, de acolhimento. Leite, Ramalho e Carvalho (2020) retomaram a dimensão social da escola na garantia de direitos como saúde e alimentação, como um espaço de socialização e cuidado. Ferreira e Barbosa (2020) denunciaram a fragmentação dos conteúdos e a perda da dimensão crítica da educação. Inúmeros foram os desafios de ensinar remotamente em um cenário desigual.

A dificuldade de manter um coletivo de trabalho foi relatada pelas professoras participantes do estudo de Costa (2021), pertencentes à Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora, Minas Gerais, que se sentiram solitárias trabalhando de suas casas. Além disso, pela organização da rede em que atuam, as docentes consideravam que suas escolas estavam paradas, pois não tinham regularidade no envio de atividades aos(às) estudantes, apenas foi feito um bloco de atividades para que não perdessem o vínculo com a escola.

O discurso de que os(as) professores(as) da rede pública não estavam trabalhando se espalhou rapidamente e foi difundido por diferentes meios. O estereótipo criado de que só o(a) docente da rede particular estava trabalhando tem relação com a ideia de que muitos desses(as) professores(as) estavam em transmissão ao vivo e diária com os(as) estudantes, ao passo em que grande parte dos(as) docentes das escolas públicas, muito por conta do contexto de desigualdade, não faziam esse tipo de aula diariamente. Contudo, estes últimos estavam envolvidos na criação e na correção de atividades, busca de estratégias para chegar aos(às) estudantes, gravação de vídeos, troca de mensagens por aplicativo de celular, entre outras estratégias utilizadas pelas redes (ÁVILA, 2021; COSTA, 2021; SANTOS; FERRETE; ALVES, 2021; THIENGO et al., 2021).

A ideia de desvalorização do fazer pedagógico da escola pública, que já era presente no país antes da pandemia, fez com que muitos(as) docentes se sentissem ainda mais desmotivados(as) e pressionados(as) durante o período de isolamento social (COSTA, 2021). O discurso, portanto, contribui ainda mais para que a privatização da educação e massificação do ensino a distância (e do homeschooling) ganhassem maior visibilidade no Brasil.

Além do sentimento de desvalorização do trabalho docente, há relatos de professores(as) que se sentiram angustiados(as), tristes, cansados(as) e impotentes, visto que desejavam fazer mais e não se sentiam capazes por conta dos recursos disponíveis e das dificuldades enfrentadas (COSTA, 2021; THIENGO et al., 2021). De acordo com Mendes (2021, p. 29-30): “Tanto os professores quanto os alunos foram surpreendidos com as transformações geradas pela pandemia na educação e ambos têm sofrido e enfrentado os desafios impostos nesse cenário. Sintomas de mal-estar estão presentes e abarcam muitos sujeitos envolvidos no contexto educativo”.

Os estudos demonstram, portanto, que as angústias vividas nesse período se fizeram presentes também nas percepções de estudantes e familiares, que não conseguem se envolver nas atividades propostas pelas escolas. Conforme constatado na pesquisa com 321 professores e professoras de 14 estados brasileiros, realizada em julho de 2020, por Thiengo et al. (2021, p. 17), “[...] os motivos relacionados à baixa participação dos estudantes envolveram, em regra, dois aspectos: o acesso restrito à internet e equipamentos para as atividades online e a pouca participação da família”. Em outros estudos, há, porém, o aparecimento da desmotivação e angústia dos(as) estudantes, mesmo quando havia comprometimento familiar e equipamentos adequados. Carvalho (2020, p. 5) corporifica essa angústia ao transcrever a fala de uma estudante: “‘Pai, tem um monte de gente morrendo, a gente fica olhando uma tela, fazendo exercícios de matemática e de inglês. Depois eles perguntam como estamos nos sentindo! Ah, faz favor...vamos almoçar’”. A indignação da jovem, emaranhada com a tristeza e o tédio, reforça que, mesmo as escolas que conseguiram se preparar tecnologicamente para aquele momento, não conseguiram, em sua maioria, promover práticas que fizessem sentido aos(às) estudantes. De acordo com Ávila (2021):

A oferta de aulas não presenciais na pandemia, trazendo como referência as mesmas estratégias adotadas em sala de aula, de pura e simples transmissão de conteúdo, dão ao jovem o que menos lhe interessa na escola, o que pode explicar também os baixos índices de participação, inclusive, dos poucos com acesso à internet e às ferramentas digitais. (ÁVILA, 2021, p. 160).

Silva (2021) realizou uma pesquisa acerca dos impactos da pandemia para adolescentes, assim como fez Mendes (2021), porém, na pesquisa de Silva (2021), houve a participação predominante de adolescentes de classe A e B, bem diferente do estudo de Mendes (2021), que conversou com jovens de periferia. Ainda assim, dois adolescentes participantes da pesquisa de Silva (2021) tiveram problemas de conexão e acabaram desistindo da participação, o que mostra que mesmo em realidades econômicas mais favoráveis o problema de acesso aos recursos digitais para acompanhamento de atividades, como as aulas, por exemplo, foi presente, prejudicando a socialização e a aprendizagem desses(as) jovens. De acordo com Nakano, Roza e Oliveira (2021), o mau funcionamento dos equipamentos tecnológicos utilizados por estudantes e professores(as) é um dos vilões para a efetivação do ERE de qualidade.

Ao mesmo tempo, aqueles que tiveram acesso às ferramentas adequadas relataram a dificuldade em acompanhar as aulas online, em manter-se concentrados e em tirar as dúvidas com os(as) professores(as), corroborando o que foi apresentado por Ávila (2021) acerca da ineficácia das estratégias adotadas pelas escolas. Muitas vezes, os(as) adolescentes escutados(as) por Silva (2021) não procuraram os(as) docentes quando tinham dificuldade; outras vezes, procuraram e não obtiveram retorno, especialmente por e-mail, demonstrando, também, a dificuldade de alguns(mas) professores(as) em lidar com as ferramentas digitais utilizadas. Segundo a autora:

A maior dificuldade relatada diz respeito à adaptação e aprendizado com essa nova modalidade de ensino. Muitos descrevem dificuldades em aprender o conteúdo, pouca ou nenhuma interação entre professor e aluno, falta de didática adequada ao ensino online, e sobrecarga de trabalhos e provas, contribuindo para que a rotina durante a pandemia fique muito mais pesada. (SILVA, 2021, p. 35).

O baixo índice de participação dos(as) estudantes, especialmente dos(as) jovens, nos materiais enviados pelos(as) professores(as) ou nas aulas online, esbarra em outro aspecto bastante presente nos dilemas docentes vividos na pandemia, evidenciado por Costa (2021), no que diz respeito às diferenças de organização de cada escola. Por mais que, no geral, as redes estaduais e municipais tenham estabelecido diretrizes para todas as escolas pertencentes aos seus quadros, nem sempre as instituições conseguiram realizar o trabalho da mesma maneira. Algumas escolas públicas conseguiram fazer uso de plataformas como recursos, enquanto outras, da mesma rede de ensino, não possuíam os meios para sua utilização. Algumas escolas, portanto, conseguiram buscar melhores estratégias para estimular a participação estudantil, enquanto outras apenas reproduziram práticas e, muitas vezes, nem tiveram a possibilidade de contato com os(as) estudantes. As escolhas que precisaram ser feitas por cada instituição e, muitas vezes, por cada turma/professor(a) dentro de uma mesma escola, fizeram com que o trabalho docente fosse ainda mais comparado entre uma turma e outra, ou uma escola e outra, causando sentimento de insegurança para alguns(mas) docentes. Além disso, a pressão das famílias e a observação constante do fazer do(a) professor(a) causaram tensões entre o papel da escola e o papel da família durante o momento de isolamento social (WOLFF, 2020).

As diferenças de abordagem do ERE pelas redes e escolas também fizeram com que os(as) docentes percebessem a intensificação das desigualdades. Para Costa (2021), ainda que a desigualdade já fosse uma preocupação, ela ficou ainda mais evidente neste momento, em que professores(as) se sentiram impotentes e, por vezes, viram estudantes de outras escolas tendo diversas atividades enquanto as redes em que trabalhavam estavam paradas ou fazendo um trabalho considerado por muitos como insuficiente. Nos estudos de Mendes (2021) e Santos, Ferrete e Alves (2021), os desafios das desigualdades de acesso ao ERE também foram evidenciados nas narrativas de docentes angustiados(as) com a falta de acesso dos(as) estudantes aos materiais enviados ou a baixa devolutiva das atividades. Na reflexão de Mendes (2021),

[...] o que se percebe neste cenário é uma separação entre duas grandes categorias - aqueles que acessam os conhecimentos escolares e aqueles que não os acessam - devido às barreiras tecnológicas e as da comunicação em rede, assim como em decorrência da limitação das políticas públicas em propor alternativas educacionais que promovam o acesso ao conhecimento no contexto da pandemia. (MENDES, 2021, p. 31).

Cabe destacarmos que, apesar de alguns(mas) docentes sentirem-se culpados(as) pela situação, é sabido que as desigualdades sociais, econômicas e étnicas não podem ser resolvidas somente pela escola (FREIRE; SHOR, 1987). Há muitos outros aspectos que fazem com que o trabalho docente não seja “o ideal”, mesmo para aqueles(as) que tiveram acesso às tecnologias digitais, uma vez que foi necessário lidar com falta de tempo para realizar as tarefas, com uma rotina de trabalho intensificada (no caso dos(as) adolescentes), com dificuldade de compreender as atividades sem apoio constante do(a) professor(a), com as interferências de familiares durante seus estudos, com a falta de local adequado para estudar (MENDES, 2021). As dificuldades geradas pelos contextos desiguais são inúmeras e refletem também na forma como cada escola pode proporcionar as atividades de ERE, a depender do contexto da sua comunidade escolar.

As diferenças de abordagem das escolas no envio das atividades, e das angústias docentes frente a isso, esbarra na autoria e na autonomia pedagógica. Na pesquisa realizada por Costa (2021), há relatos docentes que afirmam preferir receber orientações claras e objetivas do que devia ser feito, o que devia ser enviado para a casa dos(as) estudantes, com que frequência, com a especificação da quantidade das atividades. Já no estudo de Ávila (2021), a falta de autonomia de cada escola é que causou insegurança e impotência. A questão que se apresenta frente a isso diz respeito à falta de autoria no trabalho docente. Há insegurança quando é necessário alterar as práticas já estabelecidas, criar estratégias e, mais do que isso, assumir a autoria do seu fazer. A autoria e a autonomia pedagógica estão interligadas no que diz respeito à tomada de decisão docente. Freire (2017) discute que é impossível ser autônomo sem tomar decisões, por isso, na prática pedagógica autoral e autônoma, a tomada de decisão é saber fundamental e, muitas vezes, difícil de ser assumida, especialmente em situação de emergência, que escapam da costumeira zona de conforto do trabalho exercido pelos(as) professores(as).

Lemons (2015), em seu estudo acerca das culturas de intervenção pedagógica, afirma que há práticas pedagógicas nas escolas que objetivam intervir e favorecer a aprendizagem dos(as) estudantes, mesmo em situações adversas em que as políticas educacionais não suprem todas as necessidades das instituições de ensino. No contexto da pandemia, ainda que tenham dificuldades de intervenção ou de exercer a autoria pedagógica, há movimento docente na tentativa de promover aprendizagens. Apesar disso, há as amarras do sistema que ainda fazem com que alguns(mas) docentes tenham medo de desafiar o que já está posto. Para Ávila (2021):

A pandemia, no fim das contas, não inventou a desigualdade no acesso às tecnologias, ou à forma e a concepção do Estado sobre a finalidade do percurso educativo. Ela expôs a situação educacional do país de forma mais visível, mostrou que as prioridades das diretrizes educacionais são as da construção de um processo de ensino conteudista, em que os estudantes e professores possuem atuação limitada, sem autonomia e protagonismo. (ÁVILA, 2021, p. 171).

Ao mesmo tempo em que demonstram insegurança em exercer sua autoria pedagógica durante o ERE, há a preocupação docente com os(as) estudantes, suas necessidades e suas singularidades. Por isso, ao mesmo passo que se queixam de não receber diretrizes específicas de como produzir o conteúdo a ser enviado para casa, os(as) professores(as) também relatam não acreditar nas atividades prontas e padronizadas enviadas por algumas escolas ou redes para todos(as) os(as) estudantes (ÁVILA, 2021; COSTA, 2021). Além disso, sentem-se, por um lado, cobrados(as) pelo governo e pelas secretarias para utilizar as tecnologias digitais em suas aulas, mas, por outro lado, sabem que a maior parte dos seus e das suas estudantes não têm acesso aos recursos necessários para acompanhar as aulas ao vivo ou até mesmo acessar um recurso enviado pelo(a) docente (WENCZENOVICZ, 2020). Conflitos entre o medo do desconhecido e a necessidade de evocar saberes já antes construídos podem proporcionar movimentos na docência, por meio da ação-reflexão-ação, evidenciada por Freire (2017).

As professoras da pesquisa de Ferreira e Barbosa (2020) relatam momentos de alegria e de satisfação ao poder realizar as primeiras chamadas de vídeo com os(as) estudantes, vê-los(as) e escutá-los(as) em momentos de partilhas de sentimentos e angústias. Tais momentos, porém, se reconfiguraram ao longo do período, visto que muitos(as) estudantes passaram a não abrir mais suas câmeras ou microfones, fazendo com que as docentes permanecessem horas e horas em um exaustivo monólogo na frente da tela do computador. Isso, é claro, nas realidades em que era possível contar com o acesso dos(as) estudantes às transmissões ao vivo e às tecnologias digitais requeridas. Cabe destacarmos, acerca dessas tecnologias, que são apenas um complemento das outras tecnologias, as não digitais, que precisam ser evocadas tanto por docentes quanto por estudantes para enfrentar os desafios de ensinar e aprender, seja em contexto pandêmico ou não. Se estudantes não veem mais sentido em abrir as câmeras ou microfones nas aulas online, é essencial que as tecnologias da linguagem, das artes, e até mesmo as sensibilidades docentes, sejam requeridas para resgatar as relações que eram estabelecidas nas aulas presenciais. Nunes (2021, p. 104) refere a necessidade de “[...] haver uma qualidade pedagógica da apropriação tecnológica”, ao que acrescentamos a necessidade de produzir os sentidos para as conexões e de garantia das conectividades. Nas palavras do autor,

[...] o que diferencia uma suposta qualidade da escola hoje não é mais o manejo das últimas tecnologias digitais, mas sim o projeto, ético e pedagógico, de construir valores, de orientar condutas apropriadas, diante do mundo da tecnologia, das redes sociais e das potencialidades da rede mundial de computadores e de seus dispositivos ou produtos. (NUNES, 2021, p. 104).

A concepção de evocar outras tecnologias também se relaciona com o “esperançar”, do qual Freire (2015) nos fala, e que se fez presente no cotidiano de muitos(as) professores(as) ao longo do período de Ensino Remoto. Esperança de dias melhores, de retorno presencial, de recuperação das aprendizagens, de estreitamento dos vínculos, de evolução em suas práticas pedagógicas. Ao mesmo tempo, momentos de profunda angústia e sentimento de impotência apareceram no dia a dia docente que, por mais que estivessem fazendo o que era possível no cenário apresentado, se sentiam impossibilitados(as) de ajudar de verdade os(as) estudantes com dificuldade de aprendizagem, aqueles(as) com deficiências, aqueles(as) que não tinham acesso aos materiais e às aulas ministradas, aqueles(as) que passavam por dificuldades financeiras, aqueles(as) que eram acometidos pelo vírus e por outros problemas de saúde, inclusive psicológicos (FERREIRA; BARBOSA, 2020; GATTI, 2020). O desejo de abraçar o mundo e o cuidado com os(as) estudantes demonstram o amor pela profissão independentemente dos desafios.

Outro aspecto bastante presente no vivido pelos(as) docentes nesse período diz respeito ao cumprimento dos conteúdos programáticos e a realização das atividades avaliativas. Apesar das inúmeras proposições de especialistas e pesquisadores(as) da área da educação apontarem para a necessidade de adequação dos currículos para o ERE (ÁVILA, 2021; FERREIRA; BARBOSA, 2020; WOLFF, 2020), muitos(as) professores(as) foram pressionados(as) pela gestão das escolas e pelas mantenedoras a fazer um checklist dos conteúdos para o ano em curso e daqueles que realmente foram “ensinados e aprendidos”. E, aqui, destacamos as palavras “ensinados” e “aprendidos”, pois entendemos que ensino e aprendizagem, além de serem processos distintos, são permeados pela relação, pela troca e pelo acompanhamento constante do(a) docente com os(as) estudantes (FREIRE, 2017), processos que não ocorreram de forma satisfatória. Ademais, o que foi aprendido por todos(as) durante o isolamento muito provavelmente não esteja nas “listas de conteúdos ou habilidades” programadas, frutos de uma concepção neoliberal de educação8, ou mesmo descritas em documentos orientadores, tampouco integrarão os indicadores que monitoram e medem a qualidade da educação.

Lidar com as desigualdades na oferta do ERE e as angústias das escolhas feitas por docentes não diz respeito somente ao papel da escola e dos(as) professores(as) em promover a construção do conhecimento, mas também ao seu papel socializador e de construção de laços para crianças e adolescentes. As angústias docentes perpassam a preocupação com o conteúdo a ser aprendido ou com a imensa sobrecarga de trabalho (ARAUJO et al., 2021) e transitam também pela preocupação com a falta de referências positivas nas vidas de crianças e jovens afastados da escola, na ausência de um espaço seguro para falar sobre os problemas enfrentados em casa, bem como na falta de convívio com outras crianças ou adolescentes (MENDES, 2021). As desigualdades sociais que impactaram nas aprendizagens nesse período impactaram também nesses outros aspectos da vida dos(as) estudantes. Em sintonia com Leite, Ramalho e Carvalho (2020):

A escola, para muitas crianças e adolescentes, é, além de um contexto de aprendizagem dos saberes tradicionais, um espaço, por excelência, de socialização e de cuidado. Muitas famílias contam com a merenda escolar para a sobrevivência de seus filhos; muitos jovens têm na escola um dos poucos espaços de encontro e troca de experiências. Nessa perspectiva, a instituição escolar, para esses sujeitos Outros, que têm seus direitos negados sistematicamente, pode e deve ser lugar de resistência, de emancipação e de transformação social. (LEITE; RAMALHO; CARVALHO, 2020, p. 722).

Gatti (2020) corrobora com essa afirmativa e destaca:

Do ponto de vista psicossociológico a escola representa para os alunos não só um lugar para estudos, mas um lugar para encontros, um lugar para socializar, cultivar amizades, confrontar-se, definir sua identidade. A escola, como um coletivo, é o ambiente que permite às crianças a entrada em um primeiro ensaio de vida pública, de certo tipo de cidadania, fora do círculo familiar. (GATTI, 2020, p. 34).

Nos relatos dos adolescentes participantes da pesquisa de Mendes (2021), os laços de amizade foram prejudicados com o afastamento da escola. Já para os interlocutores respondentes do estudo de Silva (2021), esses não tiveram suas amizades prejudicadas por conta da falta de contato físico. Alguns(mas) adolescentes, inclusive, relataram melhora nos laços de amizade, que foram mantidos por redes sociais, e diminuição nas desavenças que aconteciam nas relações presenciais. O círculo de amizades reduziu, mas as amizades que foram mantidas são as que mais “fizeram sentido” para os(as) adolescentes, aumentando laços com os “melhores amigos”, como relatado pelos(as) jovens (SILVA, 2021).

Essa diferença entre os laços de amizade mantidos na pandemia, presente entre as pesquisas de Mendes (2021) e Silva (2021), também diz muito sobre a desigualdade e seus impactos. Enquanto na pesquisa de Mendes (2021), com jovens de periferia e pouco acesso à internet de qualidade, os laços de amizade reduziram ou se perderam, na pesquisa de Silva (2021), as redes sociais e o mundo digital aproximaram adolescentes. No que diz respeito ao papel socializador da escola, parece que, para as classes menos favorecidas economicamente, esse papel se intensificou, uma vez que não há muitos outros espaços de convivência entre os(as) adolescentes fora da escola, sejam eles físicos ou virtuais. As demandas vinculadas ao trabalho, que aumentaram significativamente para os(as) jovens da pesquisa de Mendes (2021), também podem estar relacionadas à impossibilidade de manter alguns vínculos de amizade, visto que as rotinas e o tempo livre dos(as) adolescentes sofreram alterações.

O ERE, portanto, afetou diversos aspectos da vida escolar de crianças e jovens, além da vida profissional e pessoal de professores e professoras. As angústias, os medos, as incertezas e o desejo de fazer mais perpassaram o vivido pelos atores da escola e reforçaram a importância da presentificação do espaço escolar como local de partilha, de aprendizagem em comunhão, de socialização e de afetos.

Um vivido que não terminou: algumas considerações

O cenário educacional na pandemia no Brasil é extremamente diverso e inacabado. O estudo aqui apresentado foi nomeado como Um estado da arte possível, pois não é único e não abarca a realidade de todas as escolas do país, pelo contrário, por mais que existam experiências distintas relatadas pelos pesquisadores e pelas pesquisadoras, elas representam somente algumas das inúmeras que foram vividas, estudadas e publicadas no país. Os recortes de tempo (2020 e 2021) e espaço (teses, dissertações e periódicos de Qualis A1 e A2 em Educação) foram necessários para que fosse possível circunscrevermos esta escrita, ainda que, no momento em que a construímos, as escolas ainda enfrentavam a pandemia, algumas com mais segurança, outras nem tanto, uma vez que o retorno presencial total das aulas já ocorreu no país.

Os estudos apresentados evidenciaram, em sua maioria, o vivido por estudantes e professores(as) ao longo do ERE, com foco na utilização das tecnologias digitais e nas desigualdades presentes no cenário educacional do país. Em um contexto geral, é possível afirmar que as escolas participantes dos estudos analisados optaram por utilizar recursos digitais como forma de comunicação com os(as) estudantes, ainda que, em muitos casos, outras estratégias (como material impresso, por exemplo) precisaram ser adotadas para complementar as ações pedagógicas. Nesse sentido, são pertinentes os dizeres de Ávila (2021), pois,

[...] as ferramentas escolhidas para a efetivação deste processo revelam a tendência de desumanização do processo educacional como um todo, uma vez que, em um momento tão peculiar e atípico da nossa história, as formas escolhidas de buscar suprir o papel da escola na vida de crianças e de adolescentes foi justamente o da massificação, centralização e unificação do processo, através de ferramentas conteudistas e sem a possiblidade do exercício do contraditório, dos questionamentos e participação por parte dos estudantes e professores. (ÁVILA, 2021, p. 65).

A massificação do ensino fez-se presente, de alguma forma, em quase todas as instituições retratadas nas pesquisas aqui analisadas (ÁVILA, 2021; COSTA, 2021; FERREIRA; BARBOSA, 2020; LEITE; RAMALHO; CARVALHO, 2020; SILVA, 2021). Mesmo as escolas e redes que conseguiram garantir a autoria e a autonomia pedagógica dos(as) docentes (WOLFF, 2020) tiveram situações em que precisaram cumprir diretrizes, utilizar ferramentas desenvolvidas sem participação coletiva ou intervir no fazer de professores(as) que não se sentiam seguros(as) para exercer sua autoridade pedagógica. Nos discursos da mídia, que logo se espalharam entre a comunidade escolar, a preocupação com os conteúdos não aprendidos foi bastante presente, reforçando o viés conteudista da escola e ignorando aspectos psicossociais dos(as) estudantes.

Ao mesmo passo em que há a cobrança em relação aos conteúdos não ensinados, há a falsa ideia de que apenas resolver o acesso às TDIC solucionaria as desigualdades entre as redes e, portanto, seria viável implementar ações de EAD ou homeschooling na Educação Básica. De acordo com Nóvoa e Alvim (2021), esse é um dos futuros que já estavam se desenhando por meio das novas correntes pedagógicas, voltadas ao neoliberalismo, que está ainda mais próximo após a pandemia, ainda que seja indesejado por pesquisadores e pesquisadoras que compreendem a educação para além da transmissão de conteúdos. Nóvoa e Alvim (2021) reforçam:

Uma coisa é certa: de forma confusa, caótica, desordenada, estamos a viver a maior experimentação na história da educação. O ano de 2020 marca, inevitavelmente, um tempo de transformações profundas na educação, na escola e nas aprendizagens. Positivas? Negativas? Desejáveis? Indesejáveis? (NÓVOA; ALVIM 2021, p. 11).

Os questionamentos desses autores produzem ecos sobre o futuro da educação, especialmente da escola, e se conectam com as quatro categorias sistematizadas do material analisado no corpus do estudo realizado: (a) Educação, pandemia e disputas sociopolíticas; (b) Ensino Remoto versus Educação a Distância; (c) Desafios do Ensino Remoto; (d) Perspectivas de futuro. Ecoam dessas assertivas a necessidade de retomar/ampliar o debate sobre a qualidade da educação escolar e sua relação com as tecnologias digitais evocadas no período pandêmico, de modo a transcender o mero vínculo com a dimensão empresarial do conceito de qualidade. Para Nunes (2021, p. 104, grifos do autor), “[...] a escola tem que ter qualidade social, humana e pedagógica”. E isso sublinha a necessidade do estabelecimento de relações orgânicas entre as instituições responsáveis pela socialização das gerações em formação, nomeadamente, a família e a escola. No entanto, também alarga o debate e convoca o poder público e a sociedade como um todo às responsabilidades sobre o território educativo e a educação para além dos muros da escola (PEDRO; STECANELA, 2019). Nesse âmbito, o próprio conceito de tecnologia precisa ser retomado, pois, como sistematiza Nunes (2021, p. 104), pode ser entendido como sendo “[...] todo artefato que o ser humano inventou para o seu bem-estar”.

Em termos de práticas docentes, diversos são os atravessamentos no seu fazer pedagógico. As angústias vividas pelos(as) docentes ao longo da pandemia, sejam elas relacionadas à vida profissional, pessoal, sejam ao contexto social enfrentado, demonstraram fragilidades profissionais em momentos de incertezas, mas, ao mesmo tempo, lançaram luzes ao fato de que há desejo por mais protagonismo por parte dos(as) docentes e, também, sentimento de falta de formação e apoio. De qualquer modo, mesmo que o trabalho docente tenha sofrido muitas adaptações durante o isolamento social, ele “[...] continua sendo central, independente da estratégia utilizada para o ensino, ou seja, mesmo as atividades sendo transferidas para os ambientes domésticos, mesmo com as tentativas de sucatear o trabalho docente, os professores continuam sendo essenciais no processo ensino-aprendizagem” (COSTA, 2021, p. 117).

O sentimento de invisibilidade docente, que já era presente nas narrativas de professores e professoras antes da pandemia (RONCARELLI, 2019) ficou em evidência no momento de crise (WENCZENOVICZ, 2020). Ainda que estivessem enfrentando inúmeros obstáculos para tentar ensinar remotamente, o discurso social de que “professores não queriam voltar a trabalhar” causou diversos desconfortos, angústias e desmotivação (COSTA, 2021). Em muitas realidades do país, além do papel pedagógico, a escola desempenha um papel social e assistencial muito presente, com o agravamento da crise política e econômica no Brasil, com o avanço do coronavírus, esse papel se intensificou, fazendo com que docentes assumissem tarefas no âmbito da assistência para tentar cobrir as lacunas deixadas pelo Estado. Muitas vezes, professores(as) que enfrentaram parcelamento e redução de salários na pandemia, uniram-se dividindo o pouco que tinham para auxiliar famílias de estudantes que passaram por necessidades extremas. Para Saraiva, Traversini e Lockmann (2020):

A docência nos tempos de pandemia é uma docência exausta, ansiosa e preocupada. Que quer acertar, mas que avança no meio da incerteza e da adversidade - e que não tem a menor ideia do caminho. Como todos, os professores estão imersos em uma névoa e seguem através dela, buscando fazer o melhor, mas sem garantias. (SARAIVA, TRAVERSINI, LOCKMANN, 2020, p. 17).

A exaustão e as angústias sentidas não são privilégio docente, outros atores da escola, como gestores e gestoras, familiares e estudantes, também foram afetados(as) pelas mudanças na educação neste período (NAKANO; ROZA; OLIVEIRA, 2021). Gestores e gestoras precisaram rever a forma de organizar a escola e atender a estudantes; crianças e adolescentes sentiram-se sozinhos(as), impossibilitados(as) de conviver e até mesmo de expressar e de solucionar suas dúvidas; pais, mães e responsáveis, angustiados(as) por não conseguirem auxiliar seus filhos e suas filhas da melhor maneira. De acordo com Morgado, Sousa e Pacheco (2020, p. 2), a situação requisitou “[...] grande capacidade de colaboração, partilha e inovação entre os atores da comunidade educativa”, tarefas nem sempre fáceis, devido às desigualdades enfrentadas.

Enquanto a comunidade escolar lida com as dificuldades de educar na pandemia, a crise política e sanitária avançou. Consoante Kohan (2020, p. 4), “[...] a educação no Brasil encontra-se encurralada entre a pandemia e a necropolítica. Enquanto assistimos a cenas de corpos apilhados nos hospitais e nos cemitérios das grandes cidades, alguém poderia perceber, com diferente grau de satisfação, a morte da própria escola”.

A metáfora da morte da escola é presente também nos estudos de Nóvoa e Alvim (2021), mas os autores reforçam a ideia de que a pandemia não é a única propulsora dessa morte (ou transformação). Antes do coronavírus, a escola já estava se transformando, com duas perspectivas diferentes: para a massificação, com a intensificação do neoliberalismo e da EAD, ou para o retorno ao comunitário, por meio dos movimentos que resistem aos ideais liberais. Esses autores indagam se, após a pandemia, emergiria uma nova realidade educativa, devido à crise sanitária. Em suas sínteses, a resposta: “Não. Porque nas últimas décadas esta mudança tornou-se necessária e até inevitável. Mas as reações à pandemia mostraram que, para além de necessária, esta mudança é possível” (NÓVOA; ALVIM, 2021, p. 17).

Duas vias são evidenciadas com essa crise: a de uma educação privatizada, longe das comunidades e dos afetos, mediada pelas tecnologias digitais; ou a valorização da educação como bem público comum, daquilo que é produzido pelos(as) professores(as) e estudantes, utilizando tecnologias, mas recusando modelos prontos vindos de fora. De qualquer um dos modos, o que os autores tensionam é que o modelo escolar como conhecemos está acabando. Gatti (2020, p. 37), com um discurso um pouco mais otimista, reforça que essa “[...] é a oportunidade que se espera que possa ser utilizada para dar novos formatos e significado à educação na escola básica não só nessa transição da pandemia para a volta às escolas, mas para o futuro”.

Observa-se o desejo para concretizar uma melhor educação do país; contudo, mudanças precisam ser implementadas na própria escola e em uma esfera maior, as quais dependem de vontade política, investimentos públicos e novas políticas educacionais que promovam à equidade. Das mudanças que são necessárias de dentro para fora, ou seja, da escola para a comunidade, há a formação de professores(as) no contexto das suas práticas e o uso das tecnologias como intermediação pedagógica em permanentes reflexões, haja vista que, consoante Santos, Ferrete e Alves (2021, p. 23), “[...] a falta de apropriação tecnológica dos professores que não foram formados com o uso das TDIC ainda é um desafio emergente na educação, principalmente neste momento, em que tiveram de se reinventar com a imersão no mundo digital para dar continuidade às atividades letivas”.

Para além disso, há a preocupação do uso pedagógico dessas tecnologias, uma vez que instrumentalizar docentes não substitui os momentos reflexivos acerca do que será realizado, com que objetivo, para quem e com que abordagens pedagógicas (NUNES, 2021). Portanto, ainda que as transformações da escola caminhem em direção a um futuro tecnológico, a intencionalidade pedagógica do uso das tecnologias é que vai fazer a diferença na escola pós-pandemia. Mais uma vez, a docência é posta em evidência, na medida em que precisa adaptar-se às novas transformações, porém é necessário reforçar seu caráter científico e pedagógico, na medida em que docentes precisam (re)pensar processos, evocar saberes e exercitar a autoria pedagógica. Para que isso possa ser efetivado, entretanto, o papel das políticas educacionais de formação de professores e de professoras e de investimento e manutenção da educação é de suma importância.

Os estudos aqui apresentados suscitaram diversas reflexões sobre o vivido pelos atores das escolas participantes das pesquisas analisadas, durante a pandemia. A necessidade de voltar o olhar da pesquisa em educação para a educação e seus percursos pandêmicos é evidenciada. Por mais que muitos estudos tenham tratado da docência, ainda há muito a ser dito. As histórias vividas por cada rede de ensino, por cada escola, por cada docente, cada estudante e cada família, ao longo de 2020 e 2021, podem contribuir para ampliar o olhar sobre a Educação Básica e sobre a experiência docente e familiar.

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* A presente pesquisa possui fomento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

1Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

2Dubet (2001, p. 5), argumenta sobre a “dupla natureza das desigualdades”, pois entende que “[...] algumas se reduzem enquanto outras, ao contrário, se ampliam”.

3Cabe destacar que, no geral, os cursos de Doutorado costumam ter uma duração de quatro anos, portanto, entre os anos de 2020 e 2021, ainda não havia teses finalizadas sobre a temática.

4Conforme o quadriênio de avaliação de 2013 a 2016, último disponível na plataforma durante a realização da pesquisa.

5Martins (2003, p. 20) desenvolveu o conceito de inclusão precária e o caracteriza como um fenômeno que “[...] atenua a conflitividade social, de classe, politicamente perigosa para as classes dominantes”. Stecanela (2010, p. 93) argumenta que não se trata de uma política de exclusão, contudo, “[...] ela é implementada pelo modelo de desenvolvimento presente na sociedade brasileira em favor da reprodução do capital. Através dela, as pessoas são incluídas nos processos de consumo (material e simbólico), na produção e na circulação de bens e serviços”, sem a necessária equidade.

6Fato que nos remete a reflexões acerca do contexto em que muitos cursos são oferecidos, de massificação e de mercantilização da Educação Superior, aspectos que não serão abordados como foco principal neste estudo, mas que merecem consideração, uma vez que denunciam o desejo de cenário futuro também para a Educação Básica, em um contexto neoliberal.

7Em decorrência de os grupos interessados na expansão da EAD para a Educação Básica utilizarem a pandemia como possível alavanca para tal expansão, validando seus discursos de massificação da educação.

8Marilena Chauí (2020) postula que o neoliberalismo é uma nova forma de totalitarismo, no qual ocorre uma inversão no papel do Estado que passa a ser absorvido pela sociedade, culminando com a conversão das instituições em organizações. Nesse âmbito, até a escola, assim como os hospitais, a cultura, o próprio Estado e todas as esferas sociais e políticas se constituem em “um tipo determinado de organização” (CHAUÍ, 2020, p. 321): a empresa. Segundo a autora, “[...] o neoliberalismo é o encolhimento do espaço público dos direitos e o alargamento do espaço privado dos interesses de mercado” (CHAUÍ, 2020, p. 312).

Recebido: 14 de Dezembro de 2022; Revisado: 07 de Junho de 2023; Aceito: 10 de Junho de 2023; Publicado: 23 de Junho de 2023

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