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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.18  Ponta Grossa  2023  Epub 18-Set-2023

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.18.22099.068 

Artigos

Desconstruindo os arquivos da violência escolar: reflexões sobre a relação entre a docência e a Filosofia da Educação*

Deconstructing the archives of school violence: reflections on the relationship between teaching and the Philosophy of Education

Deconstruyendo los archivos de la violencia escolar: reflexiones sobre la relación entre la docencia y la Filosofía de la Educación

Amarildo Luiz Trevisan** 
http://orcid.org/0000-0002-3575-4369

**Professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU) da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA), campus de Canoas, e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Rio Grande do Sul. Docente colaborador do PPGE da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Pesquisador classificação PQ-1C do CNPq. Doutorado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: (trevisanamarildo@gmail.com(.


Resumo

Este texto apresenta uma reflexão crítica sobre os arquivos da violência escolar como um problema filosófico e psicanalítico. Utilizando a expressão “mal de arquivo”, de Derrida, como ponto de partida, discutem-se os movimentos da docência diante do problema da violência escolar. A partir de uma experiência de pesquisa, são apresentadas as opiniões de professores sobre as dificuldades que enfrentam no contexto escolar em relação à violência. Com base na hermenêutica desconstrutiva, o texto compreende a escola como um espaço de enfrentamento de estereótipos, preconceitos e fantasmas sobre a violência, facilitando a convivência com as diferenças. Conclui-se pela necessidade de pensar o arquivo escolar como uma “tela desconstrucionista”, capaz de romper com o individualismo e a indiferença em relação ao outro.

Palavras-chave: Mal de arquivo; Filosofia da Educação; Violência escolar

Abstract

This text presents a critical reflection on the archives of school violence as a philosophical and psychoanalytical problem. Using Derrida’s expression “archive fever” as a starting point, it discusses teaching movements against the school violence issue. From a research experience, teachers’ opinions about the difficulties they face in the school context in relation to violence are presented. Based on the deconstructive hermeneutics, the text understands the school as a space for confronting stereotypes, prejudices and ghosts about violence, facilitating coexistence with differences. It is concluded that there is a need to think of the school archive as a “deconstructionist canvas”, capable of breaking with individualism and indifference towards the other.

Keywords: Archive fever; Philosophy of Education; School violence

Resumen

Este texto presenta una reflexión crítica sobre los archivos de la violencia escolar como problema filosófico y psicoanalítico. Utilizando la expresión de Derrida “mal de archivo” como punto de partida, se discuten los movimientos de la docencia frente al problema de la violencia escolar. A partir de una experiencia de investigación, se presentan las opiniones de docentes sobre las dificultades que enfrentan en el contexto escolar con relación a la violencia. Con base en la hermenéutica deconstructiva, el texto comprende la escuela como un espacio de confrontación de estereotipos, prejuicios y fantasmas sobre la violencia, facilitando la convivencia con las diferencias. Se concluye con la necesidad de pensar el archivo escolar como un “tejido deconstruccionista”, capaz de romper con el individualismo y la indiferencia en relación al otro.

Palabras clave: Mal de archivo; Filosofía de la Educación; Violencia escolar

Introdução

A compreensão da temática da escola pode ser vista sob a mesma perspectiva da briga política pela memória do passado que está acontecendo atualmente no Brasil e no mundo, a qual discute se é melhor apagar ou reacender a memória do passado para entender o presente de maneira mais efetiva. MacIntyre (2001), por exemplo, em sua obra Depois da virtude, menciona a hipótese de que, em havendo uma catástrofe no campo do conhecimento, como o apagamento ou o esquecimento no universo das ciências naturais, linguagem e moral, certamente restariam apenas fragmentos dessas áreas, ou conceitos esparsos perdidos aqui ou acolá. Ele nega, porém, a interpretação correta desse fenômeno para algumas filosofias que permanecem apenas no nível descritivo do real, não contribuindo para sua transcendência ou superação do problema, porque se situam no âmbito descritivo e analítico apenas. Elas não conseguiriam reconstruir os contextos, tarefa que seria possível para aquelas áreas que entendessem ser preciso valorizar a história como um pré-requisito para a compreensão do estado confuso do mundo imaginário atual. O filme Negação (2016) aborda, por exemplo, essa problemática, especialmente a questão do negacionismo do holocausto ou genocídio, que ainda é forte nos países ricos e está envolta na problemática dos discursos de ódio e do limite da liberdade de expressão.

Em relação à educação, o relatório do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) de 2018 mostra que o clima emocional das escolas brasileiras não é bom, com altos índices de indisciplina, solidão e bullying acima da média mundial (OLIVEIRA, 2019), o que contribui para o atraso histórico do país em relação à aprendizagem de leitura, matemática e ciências. Essa violência também compromete a função socializadora da escola, que tem como tarefa difundir conhecimento às novas gerações, apagando ou comprometendo os seus arquivos. Além disso, o Brasil é campeão mundial de violência contra o professor (GOMES, 2015; PLASSA; PASCOALINO; BERNARDELLI, 2021), de acordo com uma pesquisa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o que colabora para não haver um clima seguro e saudável na convivência escolar, impactando negativamente a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças e dos jovens.

Para refletir sobre essa demanda, desenvolvemos iniciativas de dois projetos de pesquisa1 que tem como foco a interação com a escola básica. Por isso, esta pesquisa se fez valer da experiência de escolas públicas localizadas em cinco cidades-polo do estado do Rio Grande do Sul - Constantina, Cacequi, São João do Polêsine, Quaraí e São Francisco de Paula - atendidas pelo curso de Ciências da Religião da Universidade Aberta do Brasil (UAB) em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O tema da violência é caro à discussão do curso, uma vez que consta no seu Projeto Pedagógico viabilizar a compreensão do fenômeno religioso pelo estudo, pela pesquisa e pela discussão no exercício da alteridade, desenvolvendo um processo de reconhecimento recíproco, de respeito e de valorização da diversidade e das diferenças.2

Ambos os projetos estão baseados em um amplo estudo sobre o referencial teórico utilizado para analisar a violência escolar no Brasil. Em geral, os estudos sobre a violência na educação têm mais vigor e debates em outras áreas, tais como a Psicologia, referindo-se ao comportamento humano e a seus processos mentais, e a Sociologia, no que se refere à conduta humana em função do meio e aos processos que interligam os indivíduos em grupos, associações e instituições sociais. Aquino (1998) referenda essa questão, apontando a existência dessas duas abordagens, predominantes no campo da educação, do seguinte modo: “[...] uma de cunho nitidamente sociologizante, e outra de matriz mais clínico-psicologizante” (AQUINO, 1998, p. 8). Um exemplo consta no artigo Estado da arte sobre violência e escola: análises e problematizações ético-políticas, de Groff et al. (2022), que marcou a publicação de 101 artigos em revistas brasileiras de 2003 e 2017 por autores(as) da área da Psicologia. Contudo, é bastante comum não se especificar o referencial teórico nessas publicações: “Muitos estudos não apresentam abordagens nomeadas e bem especificadas, e adotam a citação eclética de autores como referencial conceitual e teórico. Tal fato é explicado para tentar evitar abordagens fechadas, com o objetivo de alcançar interdisciplinaridade”, conforme aponta estudo da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e entidades parceiras (UFMT et al., 2015, p. 89). Em geral, os estudos historicamente têm transcendido a relação da violência contra os alunos para abordar as violências plurais: aluno contra aluno, aluno contra professor e vice-versa, e, ainda, o vandalismo e a violência institucional (SANTOS; PEREIRA; RODRIGUES; 2013).

Na relação filosofia e educação, emergiu recentemente um diálogo mais incisivo sobre a violência e suas manifestações, geralmente associado a termos como barbárie, biopolítica, poder, cuidado de si, ideologia, entre outros. No entanto, é notório que há escassez de trabalhos que abordam a relação entre filosofia e psicanálise nesse campo, levando em consideração “[...] a condição real do professor no Brasil” (CHARLOT, 2006, p. 11). Reconhecer essa realidade é fundamental para mudar a educação no Brasil, indo além das idealizações do professor como figura intocável ou militante. Curiosamente, os dados referentes às violências no ambiente escolar parecem ainda ser um tema tratado como interdito, tabu ou proibido. Explorar a violência sob essa perspectiva multifacetada pode abrir caminhos para uma compreensão mais abrangente dos problemas existentes e possibilitar a busca por soluções mais eficazes e inclusivas no contexto educacional do país.

Em função da pandemia, a pesquisa foi deslocada para o ambiente virtual, realizada na disciplina de Filosofia da Educação durante o primeiro semestre de 2020 e contou com a colaboração dos estudantes da turma. O objetivo foi auscultar os saberes e as práticas de professores de escolas públicas municipais e estaduais desses municípios, sobre como a sua instituição enfrenta a questão da violência. Os docentes entrevistados foram perguntados sobre 14 questões distintas, sendo aqui apresentadas e discutidas as respostas a três perguntas iniciais. A primeira indagou se a escola é vista como um local “sagrado” e seguro, protegido da violência. A segunda questão abordou a capacidade de a escola responder ao problema utilizando os seus próprios recursos, enquanto a terceira perguntou sobre as medidas tomadas pela instituição para prevenir ou impedir a ocorrência de atos violentos.

Recebemos um total de 47 questionários respondidos, conscientes de que essa quantidade não é suficiente para garantir dados representativos da complexidade do quadro de abrangência da pesquisa. Contudo, apesar de ser uma amostra pequena e aleatória, ela pode oferecer pistas relevantes para interpretar a pesquisa qualitativa e analisar as ocorrências experimentadas. É essencial enfatizar que, em pesquisas qualitativas, o objetivo não é alcançar representatividade estatística, mas, sim, compreender nuances e identificar tendências ou padrões que possam emergir das respostas dos participantes. Consequentemente, os 47 preenchidos constituem um conjunto de informações restritas, porém significativo, que deve ser explorado e interpretado com cautela e consideração ao contexto. Para facilitar esse processo, cada resposta dos participantes foi numerada de 1 a 47, a fim de considerá-las individualmente. Essas exigências fornecem uma base inicial para a análise qualitativa, permitindo uma compreensão preliminar das questões em estudo.

Ouvir os professores permite também a compreensão a respeito dos saberes mobilizados por eles no enfrentamento do problema, desde o saber experiencial, os saberes da formação pré-profissional e profissional, bem como os saberes curriculares e disciplinares, pois manifesta como eles lidam com os desafios da sua prática. É o “amálgama” de todos esses saberes que constitui a práxis do professor e orienta a sua ação, segundo Tardif (2012). Acreditamos na necessidade da escuta da prática docente, a qual rompe com a repetição de saberes-fantasmas, dado que também “[...] os saberes não são sagrados: o valor deles vem do fato de poderem ser criticados, melhorados, tornarem-se mais poderosos e eficazes” (TARDIF, 2012, p. 206). Além disso, permite a percepção da necessidade de propor novos saberes para o campo pedagógico, já que ele pode estar sendo guiado por “saberes-fantasmas”, com o intuito de obter mais êxito nos processos diante da violência insurgente.

A análise das narrativas será realizada pelo cunho interpretativo da hermenêutica desconstrutiva, do filósofo francês Jacques Derrida. A desconstrução faz parte da estratégia teórica adotada por Derrida para se contrapor à metafísica da presença, especialmente dos pares que dicotomizam a realidade em ser e parecer, dentro e fora, essência e aparência, corpo e alma, etc., os quais jogam com a supremacia de um elemento sobre o outro, marcando a história do logocentrismo ocidental. Essa desconstrução opera por intermédio da busca de categorias que não se enquadram totalmente em um âmbito ou, então, em outro da realidade, como os termos “mal de arquivo”, “fantasma” ou “espectralidade”, que não são totalmente da ordem do sensível e nem do inteligível.

Embora a reflexão de Derrida (2001) sobre os arquivos ultrapasse o contexto escolar, o objetivo é realizar um mergulho na arqueologia dos saberes da docência sobre a violência escolar, inspirado especialmente no seu quase-conceito “mal de arquivo”. O “mal de arquivo” tem relação com a pulsão de morte, o esquecimento e a anulação da memória, trazendo implicações tanto psíquicas na memória individual quanto sociais e políticas na memória histórica. É algo que tentaremos entender melhor nas entrevistas com os professores, já que existe uma limitação no registro ou no levantamento de casos de violência nas escolas, muitas vezes restringindo-se aos casos mais graves (TREVISAN, 2022; TREVISAN et al., 2022).

Diante disso, perguntamos: em qual narrativa estamos imersos, de apagamento e naturalização da violência na escola ou de seu enfrentamento e elaboração? Como seres de linguagem, é preciso compreendermo-nos dentro de uma narrativa, que não se coaduna com o status quo da ineficiência, por exemplo, mas também não recaia no extremo das crenças fascistas, que apostam na sua resolução pelo uso da força (STANLEY, 2018). Por esse caminho, vamos debater esse tema expondo inicialmente as bases reflexivas do projeto a partir de algumas ideias presentes na obra Mal de arquivo: uma impressão freudiana, de Jacques Derrida (2001)3. Em sequência, pretendemos apresentar e comentar algumas falas extraídas da escuta dos professores. E, por último, faremos considerações sobre o problema da violência escolar do ponto de vista do mal de arquivo como “tela desconstrucionista” (SOLIS, 2014), auxiliando, assim, a interação entre dois movimentos constituintes da docência.

A contribuição do mal de arquivo segundo Derrida

Jacques Derrida (2001) discute duas tendências opostas em relação ao arquivo: a conservação e a abertura para o novo. Ele critica a visão clássica desse acervo como um documento fechado e hierarquizado, assim como a sua redução a uma experiência de memória e ao retorno da origem, do arcaico e do arqueológico. Derrida esclarece que o termo “arkhé” se refere ao princípio político e histórico, ao poder, e traz consigo os conceitos de logos e nomos, de lei-princípio e início primeiro, que governam e regem. Já “arkheîon” é a residência dos magistrados superiores, os arcontes, que guardam e interpretam os documentos, tendo o poder de representar a lei. Esses arcontes foram os primeiros guardiões dos arquivos, responsáveis pela sua segurança física e pela correta interpretação destes. Derrida desloca a questão do arquivo para a enunciação do “mal de arquivo”, evidenciando a importância de uma reflexão crítica sobre a natureza e seu papel na cultura e na sociedade. Ele encontra no conceito freudiano de pulsão de morte uma justificativa para as ações de dissimulação, de repressão e de destruição de tais repositórios pelo poder, aplicável tanto à memória individual quanto à histórica. Ele observa que, segundo Freud, a pulsão de morte atua em silêncio com a finalidade de apagar e liquidar seus próprios traços. Esse processo de aniquilação da memória resulta na sua repressão, o que caracteriza o mal de arquivo.

Desse modo, o filósofo francês indica duas formas de compreender a noção de arquivo:

  • Uma forma é como depósito de dados impressos que corroboram os fatos e que fornecem uma espécie de prova consolidada. É assim o depositário das informações, dos indicadores e dos índices de um fato ou acontecimento. E vale tanto para investigações autorais como para investigações sociais, institucionais, governamentais etc. Nesse sentido, guarda o que diz e revela o teor clássico de proteger, englobando todo o pensamento tradicional.

  • Outra forma de considerar e compreender o arquivo aborda a sua noção, segundo Solis (2014), como uma tela desconstrucionista. A dimensão arquivística não é mais compreendida como repositório fechado, como fichário inerte, mas, ao contrário, como abertura, como movimento e por vir. Essa posição se apoia na ideia de que o inconsciente se manifesta por imagens e, por isso, ele foi comparado por Freud com um “bloco mágico” e ainda com uma “máquina de escrever”. “Para se aproximar da escrita onírica”, Freud sugere ser “preciso seguir o caminho inverso da consciência, comparável a um retroceder da escrita alfabética para a escrita pictográfica” (ANDRADE, 2016, p. 100). Assim, não podemos esquecer que o arquivo é um organismo vivo - gera reações e movimento; não pode ser, portanto, reduzido a memórias, nem a um repositório fixo. Pelo contrário, é vivo e basta acioná-lo para que as representações tenham a possibilidade de vir à tona. A sua caracterização como tela tem, por conseguinte, esse potencial de emocionar, gerar reações.

Dessa maneira, o arquivo pressupõe, em geral, inscrições, marcas e a sua decodificação, pressupõe impressões, seu armazenamento e sua preservação. Ao mesmo tempo, Derrida apoia a visão de Freud sobre o arquivo inconsciente e impresso: “Impressão enquanto escritura, marca grafada” (SOLIS, 2014, p. 376), como foi o caso das marcas da circuncisão a partir de uma impressão inscrita nele próprio, no sétimo dia de seu nascimento, que configura um arquivo. Ou, ainda, “Impressão enquanto questão de herança: deixa uma impressão sobre quem depois dele falar a ele, ou falar dele, a impressão fantasmal ou espectral, o que é feito, por exemplo, por Yerushalmi ao fim do livro Moisés de Freud, no ‘Monólogo com Freud’” (SOLIS, 2014, p. 376). E, assim, o arquivo é um lugar de autoridade (DERRIDA, 2010).

O mal de arquivo incorpora a função de tânatos, o instinto de morte, o qual trabalha para omitir, esconder e destruir “o arquivo”. Para dar conta dessa percepção, Derrida propõe a invenção de um novo repositório que possa explicar esse deslocamento, o qual provoca o esquecimento, a supressão e a sua falsificação. E, por isso, conclui que não há arquivo sem o seu reverso: “Se não há memória sem suporte e também não há arquivo sem arconte e sem recalques, não há arquivo sem mal de arquivo” (SOLIS, 2014, p. 380).

Por essa via, ele abandona, em sua escrita, a ideia de começo ou fim, supondo inacabamento (DERRIDA, 1971), expondo e dialogando sobre o estado de abertura eterna do arquivo. Para esse objetivo, Derrida entende a importância do “mal de arquivo” como sendo algo que está sempre aberto às mudanças (está vivo) e que não só existe, mas se refaz em comunicação com a realidade, a sociedade e as pessoas que o leem, assistem e revivem. Quando o mal de arquivo sai de seu papel, como fase/etapa e se torna um devorador da sua identidade, ele deve ser contestado, como veremos no caso dos arquivos da violência escolar.

Por isso, Derrida propõe que outra característica dele é ser habitado por fantasmas; ele é a casa dos fantasmas. Assim como o inconsciente para Freud, o aparelho psíquico “é permeado por fantasmas” (SOLIS, 2014, p. 385). A pulsão de morte é arquiviolítica, segundo Derrida, porque apaga os traços inscritos e possibilita novas inscrições no arquivo. Possibilita um universo de rastros, portanto. Enfim, a sua compreensão não é só uma questão de registro do passado; trata-se de uma interpelação fantasmática e espectral de Freud, como registrado por Yerushalmi, de uma promessa, de um por vir. Saber o que é o arquivo significa dizê-lo em um tempo por vir e não haveria porvir sem repetição, sem o fantasma e a pulsão de morte. É com ela que temos que conversar quando falamos de violência, na tradição freudiana do termo.

Passemos agora a um segundo momento, em que vamos tratar de ouvir as narrativas dos professores sobre o problema da violência nas escolas. Afinal, ao compartilharem-se experiências e pontos de vista, as narrativas podem se tornar fontes de inspiração e renovação, oferecendo perspectivas que vão além do individualismo e da resignação.

O mal de arquivo da violência escolar

Acreditamos que falar das experiências docentes em relação aos arquivos da memória da violência chama atenção para a importância de se realizar um diagnóstico situacional dos casos de violência que possam estar afetando a saúde e a aprendizagem de crianças e adolescentes, bem como sua convivência familiar, escolar e comunitária, e seus direitos. Segundo o Caderno do Gestor do Programa Saúde na Escola (PSE):

É fundamental a realização de um diagnóstico situacional dos eventos de violência (bullying, homofobia, discriminação, preconceito e/ou outros) que possam estar interferindo na saúde e na aprendizagem das crianças e dos adolescentes, com repercussão na convivência familiar, na escola e na comunidade, e na violação de direitos. Deve-se considerar também a violência doméstica e sexual, a tentativa de suicídio e/outras, além dos acidentes no entorno e na escola. (BRASIL, 2015, p. 56).

Isso representa um chamado para a atenção sobre a necessidade de se levarem em consideração diversos tipos de violência, a fim de identificar os fatores de risco e implementar medidas preventivas e de intervenção eficazes. Trata-se, portanto, de uma abordagem ampla e integrada, que reconhece a complexidade do fenômeno da violência e suas múltiplas implicações na vida das pessoas.

Em relação à primeira pergunta - “se a escola ainda é um lugar considerado ‘sagrado’ e infenso à violência” -, em geral as descrições foram ao encontro do que revela Chrispino (2013, p. 821) quando diz que a escola não é mais uma espécie de “lugar protegido”, porque há “[...] quebra da confiança em um espaço antes visto como seguro e sagrado”. Essa percepção se confirma nas narrativas a seguir:

Não acredito que seja assim, pois senão não haveria violência dentro dela. (17).

Não, ela deixou de ser um lugar sagrado e é preciso uma mudança reflexiva capaz de acompanhar as necessidades do tempo atual. Necessitamos de políticas eficazes, capazes de educar os jovens, dar suporte aos professores, chamar a atenção das famílias para as suas responsabilidades. (27).

Não. A violência nas suas mais diferentes manifestações, está presente no cotidiano da escola. (7).

Acho que mudou muito. Antigamente a violência escolar ficava para fora do muro da escola, agora tanto faz, eles não respeitam mais. Talvez a negligência das famílias na educação dos filhos e o “tanto faz”, o “dá em nada”, é o que abre espaço para a violência aumentar. (5).

As reações dos professores revelam diferentes percepções sobre a escola, pois, enquanto alguns afirmam que a violência presente na escola é uma prova de que ela não é mais um lugar sagrado, outros argumentam que ela precisa mudar para acompanhar as necessidades do tempo atual. Além disso, há uma preocupação com a necessidade de políticas eficazes que eduquem os jovens e deem suporte aos professores. A percepção de que a violência está presente em diferentes manifestações na escola é destacada por alguns professores, indicando que esse é um problema real a ser enfrentado. Por fim, há aqueles que argumentam que a mudança na percepção da escola como um lugar sagrado tem relação com a negligência das famílias na educação dos filhos e com a sensação de que a violência não tem consequências. Em suma, as falas dos professores indicam uma reflexão profunda sobre a realidade da escola atual e a necessidade de buscar soluções efetivas para enfrentar os desafios que se apresentam.

Outra entrevista reafirma esse diagnóstico, porém acrescentando uma nova caracterização desse espaço:

É um lugar de tabus. A escola promove violência, mesmo que não objetive isso. E recebe a violência de quem a integra. Mas pouco se pode falar sobre isso, pouco se pode resolver. Casos contrários a isso sempre são inciativas muito particulares que não podem ser replicadas em todas as unidades em igualdades de condições. (42).

A resposta em questão apresenta uma visão crítica da escola, enfatizando que ela é um lugar de tabus e que promove violência, mesmo que essa não seja a intenção. Além disso, a violência é recebida por quem integra a escola, o que pode ser interpretado como uma referência à violência que pode ocorrer entre os próprios alunos, bem como entre alunos e professores. O respondente também enfatiza a dificuldade de falar sobre a violência na escola e de resolver esses problemas de forma coletiva, lembrando que as iniciativas para combater a violência são muito particulares e não podem ser replicadas em todas as unidades de ensino em igualdade de condições. Esse posicionamento evidencia a complexidade da questão da violência na escola e a necessidade de se buscarem soluções mais efetivas para enfrentá-la, que envolvam a participação de toda a comunidade escolar e a adoção de políticas públicas mais amplas.

Alguns ainda acreditam que a escola é um lugar de boa convivência e não de acertos de contas, conforme salienta o depoimento 36: “Ainda a escola é esse ‘lugar sagrado’, embora esse sentimento está ficando reduzido de ano a ano”. O informante 30 vai nessa mesma direção, questionando o uso desse conceito: “Embora o termo ‘sagrado’ talvez não seja o mais apropriado, a escola em que trabalho, sim. Não é lugar para ‘acerto de contas’. É um espaço para a cultura geral e a cultura da paz. Os que a frequentam não precisam ser amigos, mas todos se respeitam e/ou toleram”. E, para outros, a escola pode eventualmente ser considerada um lugar imune à violência: “A escola é o espaço de convivência e interação entre indivíduos, por isso é inevitável que ocorram alguns conflitos pessoais. Sendo assim, o papel da escola, além de conteúdo, é trabalhar com o intuito da valorização e do respeito” (1). Por fim, o depoente 3 defende que: “Para alguns alunos a escola continua sendo um lugar sagrado, mas para muitos a escola é uma extensão dos costumes que são usados em casa”. Essas diferentes visões mostram a complexidade da relação entre a escola e a violência, e a importância de discutir e enfrentar essas questões de forma aberta e reflexiva. É necessário considerar as perspectivas de todos os envolvidos na comunidade escolar e buscar soluções conjuntas que promovam a convivência pacífica e o respeito mútuo.

Apenas um depoimento avalia que a “escola promove a violência” (42), referindo-se, sem dúvida, à violência simbólica discutida por Bourdieu e Passeron (1982), dois dos principais teóricos da sociologia contemporânea, que afirmam que a escola reproduz a violência social de forma simbólica. Eles se referem à noção de violência simbólica, que é uma forma de violência que não se expressa fisicamente, mas que atua no campo representativo, impondo valores e normas que são internalizados pelos indivíduos sem que eles percebam. Essa violência é mais difícil de ser reconhecida e combatida do que a violência física, pois, muitas vezes, as pessoas acreditam que estão agindo de forma livre e autônoma, quando na verdade estão reproduzindo padrões culturais que foram impostos por estruturas de poder. Ao interpretar esse tipo de violência, Medeiros e Marchi Júnior (2009, p. 109) assinalam: “A violência simbólica é uma violência que extorque submissões que não são percebidas como submissões, e que extorque crenças socialmente inculcadas”. Portanto, a coerção simbólica impõe uma forma de submissão vista como natural e legítima, baseada em crenças e valores transmitidos pela sociedade. Dessa forma, perpetua desigualdades e injustiças, reforçando padrões de comportamento que favorecem alguns grupos em detrimento de outros.

Desse modo, as atividades pedagógicas carregam a sentença suavizada da reprodução do capital no plano social, mas que não deixa de ter, mesmo assim, uma função. Na verdade, a ideia da violência simbólica também atesta que a escola tem participação nesse processo, reduplicando a violência, ou melhor, acrescentando as suas próprias desigualdades às desigualdades sociais, como afirma Dubet (2001). No entanto, ela também pode se servir desse poder como uma instância contra-hegemônica e propositiva do contexto social mais amplo, desde “[...] a percepção do conflito como algo positivo que, se bem percebido e trabalhado, favorece o bom clima escolar” (CHRISPINO; SANTOS, 2011, p. 59). Essa afirmação desafia a ideia convencional de que o conflito é sempre negativo e deve ser evitado a todo custo. Em vez disso, sugere que o conflito pode ser uma oportunidade para crescimento e aprendizagem, desde que seja gerenciado adequadamente. Ao reconhecer que o conflito é uma parte inevitável das interações humanas, incluindo as interações na escola, os autores argumentam que é necessário abordar o conflito de forma construtiva. Em vez de ignorá-lo ou suprimi-lo, os conflitos devem ser vistos como oportunidades para aprender a resolver problemas, construir relacionamentos e desenvolver habilidades sociais e emocionais. Essa abordagem também enfatiza a importância do diálogo aberto e da escuta ativa na resolução de conflitos. Os conflitos não devem ser vistos como uma batalha que precisa ser vencida, mas, sim, como um processo colaborativo de encontrar soluções que satisfaçam as necessidades e os interesses de todas as partes envolvidas, o que pode levar a um ambiente escolar mais saudável e produtivo.

Já em relação à segunda pergunta, sobre a forma como a escola enfrenta a questão da violência, nota-se a manifestação de uma ou então outra adversidade, uma vez que o “fantasma” que guia a tendência a manter a escola como um lugar sagrado, que não pactua com a violência, persiste. Nesse sentido, ao ser questionado se a escola pode dar conta sozinha dessa tarefa, a grande maioria dos depoentes admitiu que, como a escola não pode conter ou mediar sozinha a violência em seu meio, ela precisa de apoios externos:

Do jeito que a violência tem aumentado, toda e qualquer ajuda à instituição é válida, principalmente da Patrulha Escolar nas escolas, um CPM [Círculo de Pais e Mestres] atuante e um Conselho Escolar também para articular projetos afins. (17).

A escola não tem como sozinha administrar isso. O papel da família, da igreja, da sociedade, do governo é fundamental. (5).

A escola precisa do apoio da família, representantes dos órgãos como Conselho Tutelar e até mesmo o Ministério Público. (30).

Não, com o aumento da violência que abrange as diversas esferas da sociedade, a escola necessita das parcerias da comunidade, do CIPAVE4 e de todos os recursos possíveis para amenizar e conscientizar a todos para trabalharem juntos esse fenômeno. (6).

Tais colocações refletem a ideia de que a questão da violência na escola não pode ser enfrentada apenas pela instituição escolar, mas requer a colaboração de diversos agentes da sociedade. É necessário um trabalho em conjunto entre escola, família, comunidade, órgãos governamentais e entidades responsáveis pela segurança pública. A existência de políticas públicas e projetos específicos voltados para a prevenção da violência na escola também é considerada importante pelos professores. A parceria com a Patrulha Escolar e o Conselho Escolar, por exemplo, pode contribuir para uma maior segurança dentro da escola. Por fim, os retornos salientam a necessidade de conscientização e sensibilização de todos os envolvidos para a importância de um ambiente escolar livre de violência.

Já o entrevistado 10 foi mais direto, falando da estrutura da escola nesses termos: “Não tem estrutura psicológica para resolver esses conflitos.” Por fim, o depoente seguinte é mais enfático ainda nesse sentido, ao asseverar:

Ela pode contribuir, muito, mas sozinha, nunca. A escola não faz nada sozinha, ela não existe sozinha, não há uma ilha heterotópica chamada escola em que as coisas funcionem como numa ficção. Embora seja uma heterotopia de desvio e temporal, a escola não pode sê-la como é um museu ou um resort. Ela depende de colaboração mútua de atores sociais, poderes, leis, organizações, de financiamento, planejamento e execução de ações cuja realização não é da autonomia da escola em si. A escola não é autônoma, mesmo que seja um espaço de exceção. Ela é uma instituição muito dependente do que acontece fora dela, então, não. A escola não pode administrar essa questão sozinha, porque não tem pessoal preparado, nem previsão em sua organização, currículo e distribuição dos afazeres e tempos de algo dessa monta. (42).

Essa argumentação aborda uma perspectiva crítica e realista em relação ao papel da escola na luta contra a violência. Ela reconhece que a escola não é uma entidade autônoma e isolada do mundo, mas uma instituição que depende de colaboração e suporte de outros atores sociais e organizações para cumprir sua missão. Além disso, destaca que a violência é um fenômeno complexo e multifacetado que precisa ser abordado de forma integrada e holística, envolvendo diversos atores sociais e poderes. A resposta reconhece, em síntese, a importância da escola na luta contra a violência, mas sublinha que ela não pode atuar sozinha e precisa do apoio de outros atores sociais e instituições para fazer a diferença.

No entanto, para um pequeno grupo, a escola pode, na autonomia que lhe é própria, administrar os conflitos de uma forma interna, dependendo do quadro de gravidade do problema.

Quando ela (a violência) não extrapola limites, pode, com o suporte de uma boa orientação educacional, uma coordenação eficiente, professores zelosos e atentos, também, no geral, uma equipe diretiva atuante, falando a mesma língua, consegue administrar. Talvez a minha escola, por ser de pequeno porte (265 alunos), tudo se torne menos difícil. (30).

O depoimento enfatiza a importância de uma boa equipe diretiva, professores atentos e uma coordenação eficiente para administrar a violência na escola, desde que tal escola não extrapole limites. O entrevistado ainda ressalta que sua escola, por ser de pequeno porte, talvez torne essa administração menos difícil. De fato, ter uma equipe bem preparada e comprometida é fundamental para lidar com a violência escolar. Ademais, o tamanho da escola pode influenciar na facilidade ou dificuldade de administrar essa questão. No entanto, é importante lembrar que a violência não deve ser tolerada em nenhuma escola, independentemente do porte. Por isso, é necessário que haja políticas públicas que ofereçam suporte às escolas e que sejam eficazes no combate à violência. As escolas também precisam trabalhar com a prevenção da violência, promovendo a cultura da paz e incentivando a reflexão sobre valores como respeito, tolerância e diálogo.

Podemos depreender que as falas dos professores reforçam a tese de que as escolas necessitam da participação da família e dos agentes públicos para gerirem a violência. Para evitar agravantes, as escolas realizam palestras e diálogo aberto e permanente com os alunos sobre a boa convivência com as diferenças. Outras asseveram a importância da prevenção, dizendo não permitir que a cultura da violência se estabeleça. Além disso, que o ideal seria contar com psicólogos por turno, para ajudar a lidarem com seus problemas, inclusive fora dos muros da escola. No geral, no entanto, salientam que qualquer escola está vulnerável à violência do seu entorno e que esta, de uma hora para outra, pode se manifestar por simples inconsequência ou impunidade.

Por fim, em relação à terceira pergunta, que versa sobre o que a escola está fazendo para prevenir ou evitar a ocorrência de casos de violência, as respostas foram plurais, mostrando que existem várias iniciativas promissoras, as quais salientam o aspecto da participação da comunidade externa à escola. Há uma multiplicidade de perspectivas de trabalhos, sendo as mais importantes, na sequência: palestras; CIPAVE; diálogos com os alunos e suas famílias; gincanas, filmes e documentários; não soube responder. O parecer do entrevistado 9 vai na direção das perspectivas diferenciadas de trabalho, enfatizando que: “Para prevenir e evitar estes conflitos a escola se utiliza de conversas abertas, palestras e diálogos francos e permanentes sobre a boa convivência com o que é diferente e com as diferenças”. Já o próximo entrevistado reafirma esses mesmos tratamentos em relação à sua escola, ao descrever, em outras palavras, que:

A escola tem grande incentivo e ajuda de diversas instituições, entre elas a Delegacia de Polícia, o Conselho Tutelar, a Brigada Militar, Psicólogos Municipais, Instituições Religiosas. Eles estão sempre ajudando e administrando palestras, propondo dinâmicas, trazendo orientações e dados estatísticos para alertar-nos e guiar os estudantes para um rumo certo. Além disso, em sala de aula os alunos, desde os pequeninos até os maiores (9º ano - 15 anos), são orientados a como proceder, trabalhando valores (honestidade, respeito, tolerância, bom senso, etc...), considerado como conteúdo para uma formação digna e proveitosa, embasada no apoio de cidadãos solidários, de professores, funcionários e Equipe Diretiva atentos, que conseguem prevenir e evitar um possível crescimento da violência em nossa escola. (16).

A narrativa alude à importância da parceria e à cooperação entre a escola e outras instituições para enfrentar a violência. É positivo saber que há colaboração do Conselho Tutelar, Brigada Militar, psicólogos municipais e instituições religiosas. Essas instituições podem fornecer recursos, informações e suporte para a escola administrar a violência. É interessante observarmos que a escola adota uma abordagem preventiva ao trabalhar valores como honestidade, respeito, tolerância e bom senso com os alunos, visando a promover uma formação cidadã mais digna e proveitosa. A resposta também advoga a importância de uma equipe diretiva atenta, professores e funcionários solidários para prevenir e evitar o crescimento da violência na escola. Também nesse sentido são os testemunhos a seguir:

Projetos para combater formas de preconceitos. Parcerias com a comunidade. (7).

Reunião com o corpo docente, reunião com os pais de alunos, reunião com os representantes de turma, palestras sobre a não violência e pela paz, convocação de equipe multidisciplinar da Secretaria de Educação e apresentação de vídeos educativos sobre o tema violência, entre outros. (8).

O Serviço de Orientação Escolar (SOE) a princípio inicia o diálogo com os alunos e os responsáveis buscando a reflexão e conciliação entre as partes envolvidas. Após, orienta os professores, principalmente desses alunos, a realizar um trabalho pedagógico na disciplinaridade. Adota também o círculo restaurativo e em última instância a polícia. (6).

A escola trabalha o diálogo, promove círculos de paz. Procura fazer, no seu dia a dia, atividades de aprendizagem mediadas pelo respeito. (9).

Todas essas exposições apresentam ideias e estratégias importantes para enfrentar a violência na escola. A primeira resposta destaca a importância de projetos que combatam formas de preconceito e pratiquem parcerias com a comunidade para prevenir a violência. Já a segunda menciona a importância de reuniões com o corpo docente, pais de alunos e representantes de turma, além de palestras e vídeos educativos para conscientizar sobre o tema da violência. A terceira assertiva enfatiza o papel do Serviço de Orientação Escolar (SOE) na promoção do diálogo e na conciliação entre as partes envolvidas, além da orientação aos professores sobre trabalho pedagógico na disciplinaridade e a adoção do círculo restaurativo, e em última instância, a polícia. Já a quarta colocação dá ênfase à promoção do diálogo, círculos de paz e atividades mediadas pelo respeito para prevenir a violência. Em geral, essas estratégias têm em comum a promoção do diálogo, a conscientização e prevenção da violência por meio de atividades pedagógicas e o envolvimento da comunidade escolar e instituições externas para enfrentar a questão da violência de forma eficaz.

Por fim, outro entrevistado reafirma esses mesmos propósitos, porém duvida da eficácia dessas iniciativas, ao salientar:

Há, às vezes, tentativas de intimidação, palestras equivocadas, como as em que se convidam evangélicos ou católicos para pregar o evangelho ou abençoar o ano letivo. Ou palestras de policiais, advogados e outros, que tentam amedrontar os estudantes com alarmismos a respeito de leis, regras sociais e condutas. A escola discute pouco a violência e é incapaz de ajudar o estudante que sofre violência dentro ou fora dela. (42).

Essa crítica levanta questões importantes sobre a forma como a escola lida com a violência e como a abordagem pode ser inadequada em alguns casos. É importante referir que a escola não deve promover palestras que possam chancelar preconceitos ou intolerância religiosa, pois isso vai contra os valores democráticos e inclusivos que a escola deve defender. Outrossim, é preocupante que a escola discuta pouco a violência e não tenha capacidade de ajudar os estudantes mais vulneráveis dentro ou fora dela. Ela precisa ter um papel ativo na prevenção e no combate à violência, além de oferecer suporte aos estudantes que sofrem a sua ação. Pode então promover debates e atividades que abordem a violência, bem como contar com profissionais capacitados para atuar com os estudantes que sofrem com a violência. É importante que a escola tenha um ambiente acolhedor e seguro, onde os estudantes se sintam confortáveis para falar sobre suas dificuldades e recebam o apoio necessário.

Os depoimentos ainda informam que, em tempos de pandemia, os professores continuam a debater, repensar, discutir e reavaliar a sua prática, discutindo sobre a violência exposta na mídia e sobre a necessidade que as escolas têm de ser um espaço reflexivo. Fazem isso em horário especial, para que os professores consigam conversar e repensar auxílios por meio do desenvolvimento de ações junto aos alunos (conversas, palestras, e atividades que promovem a cidadania), da equipe diretiva, pedagógica, orientação educacional, professores e entidades parceiras da escola. Também contam com a ajuda de profissionais como psicólogos, psicoterapeutas, educadores físicos, enfermeiros, fonoaudiólogos, pessoas que tenham experiência e preparo para ver o espaço escolar por outro ângulo e conseguir mostrar para a comunidade escolar que há outros caminhos. Ou, ainda, que, somando esforços, possam envolver a todos nas interações no espaço escolar. Por intermédio de tais ações, algumas escolas manifestam ter conseguido obter resultados que levam à redução da violência, da indisciplina, da evasão escolar e da reprovação.

Os depoimentos, enfim, apresentam relatos sobre a violência escolar e as dificuldades enfrentadas pelos professores no Rio Grande do Sul e, assim também no Brasil, especialmente em relação à violência de que muitas vezes são vítimas. Os entrevistados mencionaram as iniciativas tomadas pelas escolas para combater a violência, incluindo o envolvimento de profissionais de diferentes áreas e a promoção de atividades que visam à cidadania. No entanto, as reflexões, apesar de apresentarem iniciativas importantes e meritórias, não abordam profundamente a complexidade do problema da violência escolar no Brasil e a dificuldade que os professores enfrentam em lidar com isso, pois a violência nas escolas não é apenas uma questão de comportamento individual de alunos, mas também é influenciada por fatores sociais e políticos mais amplos, como a desigualdade socioeconômica, a falta de políticas públicas efetivas e a exclusão social. “Portanto, o problema da violência deve ser tratado essencial e previamente como uma questão educativa e social” (MAGALHÃES; SANTOS, 2016, p. 175). Embora as iniciativas mencionadas sejam admiráveis, é necessário um esforço mais amplo e estrutural para abordar o problema pelas políticas públicas de educação. Isso inclui a implementação de políticas que abordem a desigualdade social e o investimento em programas de prevenção e combate à violência nas escolas. É importante lembrar que a violência nas escolas é um problema complexo e que requer esforços mais amplos e estruturais para ser enfrentado de forma coletivamente efetiva.

O mal de arquivo como tela desconstrucionista

Para compreender melhor as iniciativas da prática escolar no enfrentamento da violência, podemos nos inspirar na hermenêutica desconstrutiva de Derrida. Sua filosofia propõe que o primeiro passo para desconstruir o arquivo (da violência) é reviver as memórias e conversar com os espectros do passado. O arquivo é como um cemitério cheio de vidas e memórias, e a função do arquivologista é revisitar essas histórias e escutar seus lamentos. Isso é exemplificado no livro Gradiva, de Jensen, interpretado por Freud-Derrida, e, também, no final do livro do historiador Yerushalmi, quando ele conversa com o fantasma de Freud; embora Freud esteja morto, como psicanalista, é sua obrigação escutá-lo.

O segundo passo envolve trazer à luz a ideia do arquivo enquanto conversamos com seus fantasmas. Isso nos torna cientes e responsáveis, porque, se a história não é questionada ou relembrada, ela tende a se repetir ou reviver. No primeiro caso, as condições para o arquivo vigorar se repetem e as assombrações são revividas em uma nova época. No segundo caso, os métodos e as técnicas do passado são trazidos para gerir o presente, impedindo qualquer evolução e criando condições para que o passado se repita.

O terceiro passo é a democratização do princípio arcôntico do arquivo. Embora Freud tenha estabelecido esse princípio, ele também desconstruiu a autoridade do primeiro princípio. Freud mostrou que esse princípio paternal e patriarcal se coloca pela repetição e retorna no parricídio. Derrida explica que o “[...] arcôntico é a tomada de poder do arquivo pelos irmãos. A igualdade e a liberdade dos irmãos. Uma ideia ainda viva da democracia” (DERRIDA, 2001, p. 123). Agora, qualquer pessoa tem a liberdade e o poder para o manipular e bem representar. Isso é facilitado pela globalização, pelas redes sociais e pela arte dos pequenos artistas. Como Solis (2014, p. 374) argumenta: “Podemos considerar, em sentido bem amplo, o arquivo também como tela, suporte onde se entrelaçam os dados, onde documentos são arranjados ou organizados”. A tela desconstrucionista tem como propósito levá-lo a diversas fontes e públicos. Todos podem guardar, acessar e interpretar essas experiências. Agora, há liberdade sobre o acesso público ao arquivo.

Nesse sentido, é notável que, apesar de as escolas tomarem iniciativas positivas, os relatos dos professores indicam que a violência está em ascensão no cotidiano escolar. Para Chrispino e Dusi (2008, p. 599), tais situações ocorrem em função da chamada 3ª revolução da escola - a da massificação, “[...] que, no Brasil, caracteriza-se pelo índice médio superior a 97% de crianças no ensino fundamental”, quando, então, “[...] deixamos de tratar de outros temas possíveis derivados desse índice e de seus rebatimentos”. Nesse rol, está a despreocupação com o tratamento da diversidade que adentrou as portas da escola nos últimos tempos, por meio do reconhecimento protagonizado pela política de cotas, com a inserção de uma preocupação com os indígenas e afrodescendentes, os grupos minoritários e os problemas da deficiência e da educação de gênero. Todos esses investimentos altamente positivos, no sentido de promover um paradigma mais integral de inclusão e de democratização do seu acesso, acabaram gerando efeitos colaterais adversos, que colaboram para o incremento da violência na escola. Assim, de um lugar seleto e de privilégio para acesso de alguns, com a massificação da oferta de ensino às classes populares, a escola passou rapidamente a ser uma arena de disputas e de acertos de contas.5 Nas palavras de Charlot (2002, p. 434), “[...] tudo se passa como se a violência na escola estivesse convertendo-se em um fenômeno estrutural e não mais, acidental e como se, depois de instalada em escolas de bairros problemáticos, ela se estendesse hoje a outros estabelecimentos”.

É importante considerar também a difícil situação enfrentada pelos professores, que muitas vezes não têm tempo ou espaço para refletir sobre sua própria prática pedagógica. Esse contexto pode permitir que a ideia da escola como um lugar “sagrado” e livre de violência, comum na pedagogia tradicional, continue a influenciar a rotina escolar. Nesse sentido, a responsabilidade pela autoridade e pelos limites é transferida, por vezes, para instâncias externas ao ambiente escolar, levando à falta de questionamento e até mesmo ao esquecimento desse comportamento. Como mencionado pelo entrevistado 31: “Estão empurrando o problema para frente. Ou seja, minimizam e passam a responsabilidade adiante”. Dessa forma, a abordagem repressiva ou corretiva da pedagogia tradicional continua vigorando em instâncias que estão além dos muros da escola.

Quando se discute o envio de dados para o programa CIPAVE do Estado do Rio Grande do Sul, é preciso levar em consideração a difícil situação dos professores atualmente, com baixos salários e uma carga de trabalho elevada. Embora as escolas afirmem que registram dados sobre violência, essas informações geralmente são repassadas para redes e programas de apoio, em vez de serem utilizadas internamente pela escola em sua rotina diária. Um entrevistado relatou um incidente de violência na sala de aula, que foi encaminhado para o Serviço de Orientação Educacional, o Conselho Tutelar e a família do aluno. No entanto, a impressão é de que a escola agiu de forma padrão e não conseguiu gerar uma nova ação a partir desse incidente. É importante lembrar que os professores enfrentam muitas dificuldades em sua rotina diária e precisam de apoio para lidar com situações de violência na escola.

Isso evidencia que a cultura escolar ainda não incorporou o princípio da não violência. Como resultado, o movimento predominante entre os professores, muitas vezes, visa a transferir a responsabilidade para fatores externos à escola, o que é importante, uma vez que a escola não é uma entidade isolada da sociedade. No entanto, é necessário questionar o “amálgama” que envolve essas percepções (TARDIF, 2012), porque, à medida que a imagem idealizada da escola como um lugar sagrado é corroída, a redução simplista do problema à sua transferência das instalações escolares pode representar uma fuga.

Ao analisar as narrativas dos professores, é possível perceber as dificuldades enfrentadas por eles, que estão sobrecarregados de tarefas e têm de desempenhar um papel que muitas vezes é das famílias, como colocar limites à violência. Observa-se, então, que as escolas utilizam dois movimentos para lidar com a questão da violência: um extraescolar e outro intraescolar. No entanto, é notável que o primeiro é priorizado em relação ao segundo, já que as escolas “transferem”, por vezes, a responsabilidade de tratar o problema para os órgãos de segurança pública e outros setores considerados “especializados” no assunto. Esse comportamento pode ser atribuído ao fato de que as escolas deixaram de lado o antigo “livro negro” (RATUSNIAK, 2012), utilizado para registrar as infrações dos alunos às regras escolares. Essa tecnologia foi usada de forma racista como um meio de controle e normalização dos corpos que não se adaptavam ao padrão da sociedade da época. É preciso, portanto, desconstruir essa suposta interpretação política e ideológica dos arquivos da violência para promover o autoesclarecimento pedagógico de educadores e alunos.

A falta de leitura dos registros dos dados de violência nas escolas resulta na não geração de ações para prevenir futuros incidentes. Isso é um problema crítico, pois impede a reflexão sobre a prática pedagógica e o envolvimento da família e da comunidade nessa questão. Além disso, o “mal de arquivo” escolar impede a detecção de lacunas ou acertos nas práticas pedagógicas e de gestão, bem como a necessidade de envolvimento do Estado na prevenção da violência nas escolas. Portanto, é necessário refletir criticamente sobre os saberes-fantasmas que ainda perpetuam na cultura escolar e obstaculizam a prevenção e o estudo de casos de violência escolar.

Conclusões

Neste texto, buscamos perceber em que direção os professores estão orientando a sua prática sob o ponto de vista da análise filosófica e psicanalítica dos arquivos da violência escolar. Para isso, auscultamos a opinião de professores de escolas públicas de cinco municípios do Rio Grande do Sul, por intermédio de uma experiência de pesquisa realizada com estudantes do curso de Ciências da Religião - UAB/UFSM.

Percebemos que os professores têm recorrido a instâncias externas à escola para lidar com a violência, tais como o programa CIPAVE, universidades e conselho tutelar, além de buscar a participação da família e da comunidade local. Esse movimento é importante, pois descentraliza e democratiza o combate à violência, evitando que a escola se sinta responsável por resolver tudo sozinha. É essencial buscar ajuda especializada em casos graves ou ameaças, exorcizando o “complexo de Atlas” (TREVISAN, 2020) que faz com que a escola sinta que deve suportar todo o peso do mundo. No entanto, é importante enfatizar que a escola tem dificuldade em reconhecer que faz parte do problema e, ainda mais, que também faz parte da solução.

Propomos uma reflexão sobre o mal de arquivo da violência escolar, percebido nas entrevistas, e a importância de um olhar sensível para a difícil condição de trabalho dos professores. Um dos saberes-fantasmas identificados é a “terceirização” do assunto, presente na simples cessão de dados para o CIPAVE ou na frequência em que a escola aciona o Conselho Tutelar e órgãos competentes para correção dos casos. Esse movimento opera como se fosse possível repassar uma fórmula mágica para lidar com as situações de violência, o que pode cair no vazio, sem iniciativas que proponham mudanças nas práticas escolares. Segundo Chrispino e Santos (2011, p. 60), isso envolve “[...] a preparação para fazer escolhas consequentes”. Portanto, é necessário repensar a abordagem da violência escolar, buscando uma maior responsabilidade e protagonismo das escolas na construção de soluções, em vez de simplesmente delegar a responsabilidade para órgãos externos.

Assim, além da transferência da responsabilidade de tratar a violência para órgãos de segurança pública e outros setores considerados “especializados” no assunto, o que sugere uma dificuldade de ação efetiva das escolas em lidar com o problema, outros saberes-fantasmas que “assombram” as escolas, guiam inconscientemente seus atos e contribuem para a violência escolar são:

  • Sobrecarga de trabalho dos professores, que têm de lidar com a violência e comportamentos inadequados dos alunos, muitas vezes sem o devido suporte das famílias e da escola.

  • Uso racista do “livro negro” da escola no passado (RATUSNIAK, 2012) como forma de controle e normalização dos corpos que não se adaptavam ao padrão da sociedade da época, o que destaca a importância de uma reflexão crítica sobre as práticas pedagógicas e a história da violência na educação.

  • Necessidade de promover o autoesclarecimento pedagógico de educadores e alunos para desconstruir a interpretação política e ideológica dos arquivos da violência e trabalhar de forma mais efetiva na prevenção e no combate à violência escolar.

Se considerarmos que a linguagem do inconsciente se manifesta por meio de imagens, é preciso repensar a escola como um lugar de desconstrução do mal de arquivo da violência, implementando abordagens singulares e coletivas com o uso de filmes, reflexões e intervenções. A adoção da gamificação para desconstruir comportamentos de bullying e cyberbullying entre adolescentes é uma iniciativa promissora (SOUZA et al., 2021). Assim, os professores em sala de aula poderiam promover debates sobre atitudes de (in)tolerância e (des)respeito com seus alunos. Além disso, é importante que diferentes profissionais se envolvam no tratamento e na prevenção da violência. O acompanhamento do estudante implicado e a participação da família também são fundamentais.

Quanto à realidade precária das nossas escolas é um fator que precisa ser levado em conta quando se trata da violência escolar; é importante um olhar sensível para a falta de recursos e estrutura que prejudicam o exercício competente da docência. É preciso um novo saber na formação dos professores e no exercício da docência, que possa auxiliar a “saber-desconstruir” os equívocos para evitar ou prevenir a violência. Nesse sentido, a sugestão proposta por Chrispino e Santos (2011) é produtiva, ao propor atividades com docentes e estudantes envolvendo a antecipação do fato gerador de conflito, a simulação dos desdobramentos sociais e grupais e a consideração das possíveis escolhas. Afinal, a questão não é se haverá conflitos na escola, mas como esses conflitos serão abordados e gerenciados.

O arquivo da violência não se limita desse modo às memórias do passado, mas se abre à dimensão de “tela desconstrucionista”, que mobiliza o aparato imagético e verbal para a projeção de cenários futuros. É importante que a escola atue de forma proativa, não focada somente na atitude clássica de arquivar as ocorrências em atas (TREVISAN, 2022), mas, sim, antecipando e prevenindo situações de violência. Isso envolve não reduzir o tratamento da violência à adoção de uma nova técnica, exterior ao processo pedagógico, mas perceber sua dimensão compreensiva, que implica saber se relacionar com o outro e a diferença, pois, como salienta Hermann (2016, p. 25): “Em última instância, a violência é a negação e a exclusão do outro”.

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TREVISAN, A. L. et al. Crítica dos arquivos da violência escolar: Um olhar filosófico e psicanalítico. Imagens da Educação, Maringá, v. 12, n. 3, p. 121-145, jul./set. 2022. DOI: https://doi.org/10.4025/imagenseduc.v12i3.60244Links ]

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO et al. Violência e preconceitos na escola: contribuições da Psicologia. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2015. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2019/07/violencia-e-preconceitos-na-escola.pdf. Acesso em: 14 jul. 2023. [ Links ]

*Pesquisa financiada com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

11) Projeto de pesquisa “Teorias da Violência na Educação: Formação de Professores para atuar em Situações de Conflito”, registrado no Gabinete de Projetos do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Maria (CE-UFSM) sob nº 045847, aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) na Chamada do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTIC/CNPq) - Edital Universal nº 28/2018 - faixa C, Processo nº 425947/2018-1, com tempo de execução previsto de 18/02/2019 a 17/02/2025 (prorrogado pelo CNPq em função da pandemia da covid-19 para 28/02/2025). O projeto foi registrado no Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) sob o Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) nº 49293021.5.0000.5346. 2). Projeto de pesquisa “Arquivos da Violência na Educação: Desafios para a relação entre Violência, Memória e Linguagem” aprovado pelo CNPq na Chamada CNPq Nº 09/2020, Processo nº 306987/2020-1, com Bolsas de Produtividade em Pesquisa - PQ-1C com tempo de execução previsto de 01/03/2021 a 28/02/2025. O projeto foi registrado igualmente no CEP sob o CAAE nº 44902321.7.0000.5346. A motivação de ambos os projetos é debater o tema da violência que ainda é considerado tabu nas escolas, ou seja, “[...] parece ser um tema ainda da ordem do interdito, do proibido” (FERRÃO, 2020, p. 116). Ao realizar pesquisas em escolas públicas sobre o tema da violência, constatamos que há uma tendência em ocultar informações, com o objetivo de proteger a imagem dos profissionais que atuam nesse ambiente (TREVISAN, 2022; TREVISAN et al., 2022). Essa atitude é motivada pelo receio de que as informações sejam divulgadas de forma incorreta, causando prejuízos irreparáveis aos envolvidos. Tal comportamento evidencia a necessidade de uma cultura mais transparente e aberta, em que as informações possam ser compartilhadas de forma clara e objetiva com o intuito de construir um ambiente escolar saudável e produtivo, em que todos possam atuar de forma segura e responsável.

2Projeto Pedagógico do Curso (PPC) e demais informações curriculares disponíveis em: https://www.ufsm.br/cursos/graduacao/educacao-a-distancia/ciencias-da-religiao/projeto-pedagogico. Acesso em: 7 jul. 2023.

3O livro surgiu de um artigo base da conferência intitulada “O conceito de arquivo. Uma impressão freudiana”, dada em um evento ocorrido em Londres, em junho de 1994, e publicado em forma de livro na França no ano seguinte. Nele, Derrida leva adiante uma abordagem que perpassa diferentes momentos de sua obra, relacionada às aparições de fantasmas em obras canônicas da literatura, história e filosofia. Exemplos são o livro O Moisés de Freud: Judaísmo Terminável e Interminável, de Yosef Hayim Yerushalmi, em que, no último capítulo, o autor conversa com o fantasma de Freud. E é assim também que Derrida interpreta a presença do fantasma (espectro) na obra de Marx, especialmente no Manifesto Comunista, escrito com Engels, quando fala que um fantasma ronda a Europa - o espectro do Comunismo. Tal é o que ocorre igualmente com o personagem principal do livro analisado por Freud e, depois, por Derrida, intitulado Gradiva: uma fantasia pompeiana, de Wilhelm Jensen. O romance narra as peripécias de um arqueólogo que subitamente começa a perseguir o fantasma de Gradiva, acabando por procurá-lo nas ruínas de Pompéia. Ao dialogar com Gradiva, aos poucos ele acaba adquirindo um distanciamento crítico de sua própria área de conhecimento, a saber, a Arqueologia. Derrida sugere ainda que a abertura de Hamlet, de Willian Shakespeare, em que o personagem fala com o fantasma de seu pai, é um exemplo de como o diálogo com fantasmas pode ser visto como uma fonte de conhecimento e reflexão crítica.

4O Programa Comissões Internas de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (CIPAVE) foi instituído no Rio Grande do Sul pela Lei nº 14.030, de 26 de junho de 2012. Composto de representantes dos alunos, pais, professores, direção da escola e funcionários, visa a resolução dos conflitos e violência junto às escolas, por meio da formação de redes de apoio regionalizadas e planejando novas ações com a participação de todos os envolvidos no processo educacional (RIO GRANDE DO SUL, 2012).

5O filme Escritores da Liberdade (2007) mostra essa realidade de forma bem relevante e incisiva, quando uma escola dita “normal” passou a ter problemas com a inclusão de alunos de etnias diversas que viviam em constante conflito, chegando a abrigar gangs envolvidas com a violência e a rivalidade das ruas e dos bairros.

Recebido: 30 de Março de 2023; Revisado: 05 de Julho de 2023; Aceito: 08 de Julho de 2023; Publicado: 21 de Julho de 2023

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