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Linhas Críticas

versión impresa ISSN 1516-4896versión On-line ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.24  Brasília  2018  Epub 13-Feb-2019

https://doi.org/10.26512/lc.v24i0.19721 

Dossiê Didática desenvolvimental: diferentes concepções histórico-culturais

Controle e autorregulação da aprendizagem na teoria de P. Ya. Galperin

Isauro Beltrán Núñez1 
http://orcid.org/0000-0003-3224-4694

Magda Maria Pinheiro2 
http://orcid.org/0000-0001-8241-0967

Paulo Gonçalo Farias Gonçalves3 
http://orcid.org/0000-0001-5714-2008

1Doutor em Educação. Professor Titular Centro de Educação/UFRN. Líder do Grupo de Pesquisa sobre a Formação Planejada de Ações Mentais e de Conceitos. Pesquisador \CNPQ Nivel 1B.

2Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação da UFRN. Diretora do Núcleo Permanente de Concursos/UFRN. Membro do Grupo de Pesquisa sobre a Formação Planejada das Ações Mentais e de Conceitos

3Mestre em Ensino de Ciências Naturais e Matemática. Doutorando em Educação da UFRN. Membro do Grupo de Pesquisa sobre a Formação Planejada das Ações Mentais e de Conceitos. Professor Assistente da Universidade Federal do Cariri.


Resumo

Durante as últimas décadas, a autorregulação da aprendizagem considerada um aspecto da personalidade relacionado aos mecanismos da atenção voluntária que o sujeito realiza sobre suas ações, tem sido uma preocupação relevante na investigação educacional. No caso da aprendizagem, a autorregulação diz respeito à atividade para aprender. Sendo assim, neste artigo, realiza-se uma discussão sobre o processo de formação do controle interno como forma de atenção e mecanismo da autorregulação da aprendizagem por parte dos estudantes, na educação escolar, com base na Teoria de Formação Planejada das Ações Mentais e dos Conceitos de P. Ya. Galperin, no contexto da Didática Desenvolvimentista.

Palavras-chave Controle interno; Aprendizagem; Teoria de Galperin

Abstract

During the last decades, self-regulation of learning has been a relevant concern in educational research and considered a personality aspect related to the mechanisms of voluntary attention that the subjects devote to their actions. In the case of learning, self-regulation concerns the activity performed in order to learn. Thus, this article discusses the process of content internalization as a form of attention and mechanism of self-regulation in the school setting, based on the Theory of Planned Formation of Mental Actions and Concepts by P. Ya. Galperin, in the context of Developmental Didactics.

Keywords Content internalization; Learning; Galperin's Theory

Resumen

Durante las últimas décadas, la autorregulación del aprendizaje, considerara un aspecto de la personalidade relacionada a los mecanismos de la atención voluntária que el sujeto realiza sobre sus acciones, há sido considerada una preocupación relavante en la investigación educacional. En el caso del aprendizaje, la autorregulación dice respecto a la actividad para aprender. Siendo así, en este articulo se realiza una discusión sobre el processo de formación del control interno como forma de atención y mecanismo de la autorregulación del aprendizaje por parte de los estudiantes en la educación escolar, fundamentada en la Teoria de Formación Planificada de las Acciones Mentales y de los Conceptos de P. Ya. Galperin, en el contexto de la Didáctica Desarrolladora.

Palabras clave Control interno; Aprendizaje; Teoria de Galperin

Résumé

Au cours des dernières décennies, l’autorégulation de l’apprentissage fait l’objet d’une importante réflexion dans la recherche en éducation, considérée comme un aspect de la personnalité lié aux mécanismes d’attention volontaire que le sujet effectue sur ses actions. Dans le cas de l'apprentissage, l'autorégulation concerne l'activité à apprendre. Ainsi, dans cet article, nous présentons une discussion sur le processus de formation du contrôle interne en tant que forme d’attention et de mécanisme d’autorégulation de l’apprenant* dans l’enseignement scolaire, basée sur la Théorie de la Formation Planifiée des Actions Mentales et des Concepts de P. Ya. Galperin, dans le contexte de la Didactique du Développement.

Introdução

A autorregulação da aprendizagem tem sido uma preocupação relevante na investigação educacional e na Psicologia, durante as últimas décadas. Essa autorregulação pode ser considerada como um aspecto da personalidade relacionado aos mecanismos da atenção voluntária que o sujeito realiza sobre suas ações. No caso da aprendizagem, a autorregulação diz respeito à atividade para aprender, o que pressupõe a existência do estudante como um sujeito ativo de sua aprendizagem, que dirige e regula sua atividade de estudo para atingir objetivos e metas, concorrendo, assim, para o seu sucesso acadêmico. Dessa forma, a autorregulação da aprendizagem é uma habilidade que favorece ter acesso, de forma cada vez mais autônoma, ao conhecimento e aos recursos da cultura historicamente produzida pela humanidade, o que supõe a participação criativa na vida social.

Diversos têm sido os estudos realizados sobre a autorregulação da aprendizagem dos estudantes em contexto escolar, sob diferentes perspectivas teóricas. Muitas dessas perspectivas se enquadram nas demandas sociais do que se tem caracterizado como o “aprender a aprender”, ou seja, como habilidade necessária para a aprendizagem ao longo da vida. A capacidade de aprender a aprender tem como uma de suas finalidades promover formas de vida que potencializem o autodesenvolvimento dos estudantes.

Desenvolver, nos estudantes, habilidades para aprender a aprender demanda didáticas e práticas pedagógicas inovadoras que respondam, de forma crítica, aos desafios que as sociedades do século XXI demandam das escolas como instituições responsáveis pela transmissão criativa e responsável da cultura produzida pela humanidade e necessária à educação para a cidadania. No contexto da Didática Desenvolvimentista, fundamentada nas ideias de L. S. Vigotsky e de seus continuadores, como P. Ya. Galperin, V. V. Davidov, N. F. Talízina, encontram-se referenciais importantes para uma educação dirigida com esse propósito.

Neste artigo, realiza-se uma análise das contribuições da Teoria da Formação Planejada das Ações Mentais e dos Conceitos de P. Ya. Galperin sobre a formação do controle interno, como forma da atenção que se constitui numa condição necessária à autorregulação da aprendizagem, o que pode configurar-se como uma referência que possibilite pensar em atividades e desenvolvê-las para ensinar os estudantes a controlar sua aprendizagem e, dessa forma, a regular esse processo, podendo ter influência positiva no seu desenvolvimento.

Aprendizagem, controle e a autorregulação da aprendizagem na teoria de P. Ya. Galperin

Na Teoria da Formação Planejada das Ações Mentais e dos Conceitos de P. Ya. Galperin, reconhece-se o papel determinante da educação e da aprendizagem para o desenvolvimento intelectual dos estudantes, no contexto escolar. Nos processos ativos de assimilação da experiência social, impulsiona-se esse desenvolvimento intelectual, que não se reduz à assimilação de conhecimentos e de habilidades, mas implica câmbios substanciais nas estruturas de pensamento do estudante. A aprendizagem e a educação devem também ser fatores que impulsionem o desenvolvimento intelectual dos estudantes. Segundo as ideias de Vigotsky (1997), a educação que desenvolve vai à frente do desenvolvimento, conduzindo-o, estimulando-o e o orientando.

Segundo Galperin, um objetivo da aprendizagem é o desenvolvimento de ações mentais de orientação que garantam a qualidade das habilidades, os hábitos e os novos conhecimentos, segundo determinados indicadores de qualidade definidos nos objetivos. Para Galperin (2001d), “[...] chamamos aprendizagem a toda atividade que resulta na formação de novos conhecimentos e habilidades em quem aprende, ou a incorporação de novas qualidades aos conhecimentos e habilidades que já se possuem” (p. 85).

Dessa forma, a atividade de aprendizagem se caracteriza por ser social, mediada, consciente, voluntária e autorregulada. A aprendizagem deve levar em conta a própria autoaprendizagem, da qual faz parte o autocontrole e a autorregulação como expressão do desenvolvimento intelectual do estudante. No entendimento de Núñez (2009), a aprendizagem, segundo a Teoria de Galperin, leva ao aparecimento ou à modificação, no estudante, do reflexo psicológico de orientação da realidade, o qual une as dimensões cognitivas e afetivas, o que permite a realização, com autonomia e criatividade, de diversas atividades e transforma não só o objeto da atividade como também o próprio protagonista desse processo, o estudante. Essa autonomia intelectual, por sua vez, propicia a este uma participação mais significativa nas atividades que lhe são exigidas como membro de um determinado grupo.

Talízina (2000), ao tratar do processo de aprendizagem, diferencia os conhecimentos e as ações (ou as habilidades) que devem ser assimiladas pelo estudante como parte dos conteúdos curriculares. As habilidades, de acordo com a autora, podem ser específicas (relativas aos conteúdos das disciplinas) ou gerais (constituem elementos importantes da assimilação consciente, refletida e crítica dos conteúdos de várias disciplinas). Dentre as habilidades gerais, situam-se as lógicas, as de planejar e controlar a atividade de aprendizagem, as quais estão presentes em qualquer atividade de estudo. O desenvolvimento dessas habilidades constitui um indicador importante do nível de desenvolvimento intelectual dos estudantes. Sendo assim, o controle interno (ou a atenção) como habilidade deve ser formado e desenvolvido para proporcionar uma melhor qualidade da aprendizagem.

A formação de uma habilidade geral para o estudo, como o controle da aprendizagem, deve garantir que a habilidade seja formada no nível intelectual de forma que se torne um ato do pensamento, um método para aprender novos conhecimentos, e deve assegurar a aplicação destes na solução de diferentes problemas (Galperin & Talízina, 1965).

O controle e a autorregulação da aprendizagem na teoria de Galperin

Galperin considera o controle um mecanismo da autorregularão das ações, necessário a todos os processos de solução de problemas e a diversas atividades que o estudante realiza para aprender, sendo essa autorregulação uma formação psicológica qualitativamente superior, como qualidade e meta do desenvolvimento psicológico humano. Nessa perspectiva, a autorregulação da atividade da aprendizagem se relaciona com a atenção voluntária, que realiza a função de controle interno e deve ser objeto de formação, quando necessário. O controle externo, ao passar ao plano mental como controle interno e, em decorrência disso, se automatizar, constitui-se na atenção, ou seja, a atenção como um produto da assimilação da ação de controle.

A atenção é uma função psicológica superior (Vigotsky, 1997), que se forma e se desenvolve na atividade dos sujeitos, tendo uma origem histórico-cultural. Considerada uma função psicológica superior da mesma forma que são a memória, a linguagem e o pensamento, a atenção é consciente, voluntária e mediada. Desempenha a função de controle consciente durante a atividade e representa um controle interno. (Galperin & Talízina, 1965). A atenção voluntária se diferencia da involuntária em virtude das finalidades da atividade consciente à qual se dirige. Face à tarefa, o estudante determina, conscientemente, os objetos e os objetivos (ou metas), os quais são imprescindíveis à ação e a tudo que se faz necessário para fixar a atenção no processo de solução da tarefa.

A atenção, para Galperin (1989), nunca é um processo independente, pois ela se expressa numa orientação, como componente de alguma atividade mental. Ela se forma no controle do conteúdo, objeto de uma ação. No entendimento de Galperin (1989), o controle de uma ação é realizado com base em um plano e requer a comparação e a verificação da execução dessa ação com o plano previamente organizado. A verificação é a parte essencial do controle, inseparável da atividade mental, na medida em que pode ser considerada como atividade.

A atenção é voluntária se seguir um plano, ou seja, se a verificação de uma ação é realizada com base em um plano previamente organizado, usando critérios e métodos previamente estabelecidos para aplicá-los. A existência de tal plano, critérios e métodos torna o controle possível (Galperin, 1989, p. 89).

Diferentemente de outras ações que geram algum produto, a atividade de controle não tem um produto específico, pois é direcionada para o produto da ação que transforma o objeto, não se separando da ação de orientação nem da ação de execução.

Galperin e Talízina (1965) sustentam que as pesquisas sobre a origem e a formação das ações mentais possibilitaram abordar o estudo da atenção sob um novo ponto de vista, diferente do enfoque dado pelo pensamento científico da psicologia da época. Nessa abordagem, a formação planejada por etapa das ações mentais permite a elaboração de representações mentais que têm em si uma dupla formação: o conteúdo objetal imaginado e a representação de si mesma. Quando a ação se internaliza, ou seja, chega ao plano mental, intrapsicológico, seus componentes pertencem a um nível superior do desenvolvimento intelectual de forma tal que a parte orientadora passa a ser a compreensão da ação.

Quando se alcança o nível adequado da compreensão, a execução se reduz a seus elementos essenciais, e o controle se configura como um ato no qual a atividade própria do sujeito e a atenção interna (a consciência como ato) se fundem numa única consciência que se apresenta à introspeção como algo indivisível. Essas reflexões demonstram as possibilidades da formação do controle interno, como atenção e mecanismo da autorregulação da aprendizagem dos estudantes.

A formação do controle interno e as etapas de assimilação da teoria de P. Ya. Galperin

Na teoria de Galperin, é possível afirmar que a formação das ações mentais e dos conceitos se fundamenta em três ideias básicas: a definição de um sistema de orientação, o estabelecimento de um sistema de parâmetros ou de características que definem os níveis de desenvolvimento da ação e as etapas da formação da ação mental e dos conceitos (Núñez, 2009), o que representa as condições necessárias para garantir, de forma planejada, a formação das novas ações mentais e dos conceitos. Essas ideias básicas constituem subsistemas que devem ser vistos, na sua integração, como dinâmicos e subordinados uns aos outros.

Galperin avalia que as ações mentais, por sua natureza, são ações objetivas que, inicialmente, se realizam com o apoio de objetos externos na medida em que estes são manipulados, passando-se por uma série de etapas. Posteriormente, as ações são realizadas no plano mental e se tornam propriedades da psique, segundo determinados parâmetros de qualidade do desenvolvimento intelectual, considerando que o desenvolvimento intelectual dos sujeitos se caracteriza pelo enriquecimento do conteúdo do intelecto com novas ações, qualitativamente superiores, pela transformação destas em ações mentais assim como pela mudança de estágio da atividade mental, realizada num novo plano e como novas formas de pensamento.

Referenciado na Teoria de A. N. Leontiev, Galperin (1989) entende que a ação está formada por componentes estruturais e funcionais. Como componentes estruturais, ele considera os objetivos, os motivos, as operações, o processo e o sujeito que a realiza. A ação, de acordo com suas funções, pode ser dividida em três partes: a orientadora, a de execução e a de controle e de regulação.

Quando o estudante enfrenta uma situação problema que exige uma nova ação ou uma ação que deve ser aplicada de outra maneira, embora não seja nova, o primeiro que faz é orientar-se para a procura de respostas. Dessa forma, a orientação é uma etapa inicial no processo de solução de novas tarefas. Ela é elaborada quando o estudante tem uma necessidade ou um desejo de compreender, de forma racional, uma nova atividade com sentido pessoal, que pode conduzir à satisfação da necessidade ou do desejo em questão (solução com sucesso da nova tarefa ou situação problema).

A orientação da ação, como representação mental, permite planejar e realizar o controle e a regulação da execução da ação de forma consciente, segundo um dado modelo, possibilitando as correções necessárias. A execução possibilita as transformações do objeto da ação (ideal ou material) pelo sujeito, segundo a orientação, realizando as operações com os conhecimentos necessários. Por sua vez, o controle se dirige ao acompanhamento e à regulação consciente da ação, ao serem comparados os resultados parciais ao final com o modelo da ação definido na orientação, a fim de se detectarem os erros e serem feitas as correções necessárias.

Esses momentos são interdependentes, sendo a orientação a que determina a qualidade da realização da ação e de seu controle, os quais, por sua vez, possibilitam o aperfeiçoamento da orientação e da execução. No entendimento de Galperin (2001b), a essência da atividade mental radica no fato de ser ela uma atividade de orientação. Esta representa a instância diretiva e, fundamentalmente, dela depende a qualidade da execução e da regulação do processo. Constitui a representação que tem o sujeito da ação e do conjunto de condições necessárias para uma realização com sucesso dessa ação.

A orientação da ação é um modelo da ação, um modelo para o pensamento, vinculado ao conceito da ação a ser formada. Ela não é estática, uma vez que, no próprio desenvolvimento da atividade, ela se reconfigura e se atualiza em função das novas experiências dos estudantes.

Segundo a teoria de Galperin, a aprendizagem se concretiza quando o estudante elabora ou reelabora uma base orientadora como modelo mental e de compreensão da ação. Essa orientação lhe permite planejar, resolver e autorregular a solução de situações-problema dentro dos limites de generalização definidas, e ainda transferir as aprendizagens para outras situações fora dos referidos limites.

Desde o início da aprendizagem, a nova ação é mostrada e explicada. Dessa forma, o estudante forma uma dada representação não só de seu conteúdo e de seu produto como também do que pode servir de apoio para a correta realização. A representação antecipada da tarefa assim como a do sistema de orientadores, que são necessários para seu cumprimento, formam o plano da futura ação, a base para sua direção. A esse plano, nós o denominamos de base orientadora da ação (Galperin, 2001b, p. 81).

A Base Orientadora da Ação (BOA) deve se estruturar a partir de três modelos integrados: o modelo do objeto (neste, é definida a ação, uma dimensão conceitual), o modelo da ação (representa o sistema das operações necessárias à execução da ação, possibilitando a transformação do objeto da ação) e o modelo do controle (neste, estão explicitados os critérios para o acompanhamento, o controle e a correção da execução). Dessa forma, constata-se que o modelo do controle é parte do modelo da BOA (Núñez, 2009).

Existem diversas variantes da base orientadora da ação, e todas podem ter uma ou outra importância e determinam diferentes tipos de aprendizagem e de controle. Como explica Galperin (2001b), cada tipo de orientação corresponde a um determinado processo de formação da ação, um determinado produto final e, consequentemente, tipos específicos de aprendizagem e de ensino. Ou seja, nem toda orientação é potencializadora do desenvolvimento intelectual dos estudantes.

Galperin (2001b) diferencia três tipos de aprendizagem segundo os elementos orientadores da ação. O primeiro tipo, BOA I, caracteriza-se por uma composição incompleta da orientação. As orientações para a solução das tarefas estão representadas de forma particular. É uma aprendizagem casual inconstante, por tentativas e erros, suscetível de esquecimento fácil. A transferência dos conhecimentos é limitada. No segundo tipo de orientação, BOA II, típica do ensino tradicional, são dadas aos estudantes, de forma elaborada, todas as condições necessárias para o cumprimento correto da ação, mas tais condições são particulares, pois só servem para a orientação em um determinado caso.

O terceiro tipo de orientação, BOA tipo III (aprendizagem e ensino do tipo III), tem uma composição completa e generalizada. Ela contém a essência invariante da atividade por se tratar de uma orientação teórica e, por meio dela, se expressa o que é essencial ao objeto de assimilação em questão (invariante), o que permite responder a uma variedade de problemas propostos dentro dos limites da generalização. É uma orientação completa que possibilita solucionar não apenas tarefas concretas como também todo um conjunto de tarefas de uma mesma classe (Núñez, 2009). Por sua vez, fornece aos estudantes uma ferramenta cultural para a generalização teórica, que propicia a compreensão de um conjunto de situações ou de um dado domínio do conhecimento.

Na interação com os conteúdos, como ferramentas culturais, objeto de assimilação, não é suficiente incluir o estudante em interações inespecíficas e espontaneístas. Faz-se necessário envolver os estudantes em atividades adequadas que, como referências, proporcionem bases orientadoras as quais permitam o seu desenvolvimento psicológico. Embora os estudantes possam elaborar diversas orientações para uma dada ação, nem todas são adequadas e eficientes. Nesse sentido, Galperin (1992) introduz o conceito de Esquema da Base Orientadora Completa da Ação (EBOCA) como uma referência do professor para o ensino e dos estudantes para a aprendizagem.

O EBOCA é uma orientação esquematizada, de forma gráfica e materializada, e representa uma orientação externa. Na verdade, há, fundamentalmente, dois EBOCAs. Um elaborado pelo professor, como EBOCA desejado, que é resultado da modelação da ação e de sua estrutura, como dos conceitos a serem formados. O outro, elaborado pelos estudantes sob a mediação do professor, referenciado no EBOCA do professor na etapa de elaboração da base orientadora da ação.

O EBOCA elaborado pelo professor, de forma externa, concretiza as exigências da ação considerada correta e constitui um modelo essencial para o controle e a regulação, ou seja, para que seja estabelecida uma correspondência entre o que se deve fazer e o que foi feito, a fim de que sejam feitas as correções necessárias e, conscientemente, se conheça como se aprende. É um esquema externo que ajuda à elaboração ou reconfiguração da base orientadora de cada estudante, para se constituir numa ferramenta de reflexão, nos processos da etapa materializada na formação da ação.

Esse EBOCA representa uma base orientadora do tipo III, a qual não é, no geral, encontrada pelos estudantes, o que implicaria uma atividade criativa. Essa é uma condição essencial para a formação de ações mentais com alta possibilidade de transferência as novas situações-problema, o que representa um efeito desenvolvimentista na aprendizagem dos estudantes.

Núñez (2009) chama a atenção para o fato de que dispor de uma orientação como um modelo completo em imagens generalizadas não significa reduzir o ensino e a aprendizagem a um processo dedutivo que não estimula a criatividade, no qual só se pode reproduzir ou aplicar um modelo predeterminado para a ação. A formação de ações mentais, dentre elas as de controle, exige não só a sistematização da ação para seu domínio como também a participação criativa do estudante na elaboração de novos modelos de ação, em situações de transferências de aprendizagem para dar respostas a novas situações-problema.

Quando tem domínio da ação de orientação, o estudante executa, corretamente, a ação e regula esse processo, podendo se, então, afirmar que uma habilidade foi formada, a qual não só se refere à questão prática, externa da execução, mas também ao aspecto psíquico, à ação mental de orientação na qual se inclui o controle interno.

O sistema dos indicadores qualitativos da ação e de seu controle

No processo de controle da aprendizagem, faz-se necessário que o estudante elabore e utilize um conjunto de critérios que permitam determinar se as ações e as operações realizadas são as necessárias para a solução das tarefas, e se essas ações têm a qualidade necessária. Dessa forma, o estudante deve conhecer e usar os critérios da qualidade do produto desejado da atividade de aprendizagem, os quais são, por sua vez, os critérios de formação dessa atividade. Para Galperin (2001c), não se trata apenas de formar a ação, mas também de fazer isso com determinadas propriedades ou indicadores qualitativos. Esses critérios caracterizam a ação a ser formada e, consequentemente, são utilizados para o controle e a regulação do processo de aprendizagem. Segundo Talízina (1988):

Não é possível estabelecer as verdadeiras etapas da formação dos conceitos sem fazer a separação entre o sistema de características psicológicas essenciais e o processo de assimilação, o qual permite descrever seus diferentes estados, e sem aplicar o método genético que possibilita acompanhar esse processo desde o princípio até o fim nos mesmos alunos (p. 45).

Quanto às características da ação, Galperin (2001a) as define como: a forma na qual se realiza a ação, o grau de generalização, o grau de detalhamento, o grau de consciência, o grau de independência, o grau de retenção ou de solidez e o caráter racional. Já Talízina (1988) diferencia essas características em dois grupos: as primárias e as secundárias. As primeiras (a forma da ação, o grau de generalização, o grau de independência, o caráter detalhado) podem ser pensadas com relativa independência entre elas. As secundárias são dependentes das primárias, pois são consequências da formação destas, ou seja, não se formam diretamente. São elas: o grau de consciência, o grau de solidez e o caráter racional. Esses indicadores são também usados para caracterizar a qualidade do controle interno formado, como uma habilidade.

A forma da ação caracteriza o nível de assimilação da ação e representa a medida de sua internalização. As formas podem ser: a material ou materializada, a da linguagem externa e a mental. O grau de generalização indica os limites de aplicação de uma ação. Segundo Talízina (2000), ele determina as propriedades essenciais e as não essenciais do objeto para a realização da ação. Dessa forma, estipula os limites subjetivamente possíveis do uso da ação, sendo determinado, segundo a autora, pelo tipo de base orientadora na qual se apoia o estudante durante a realização da ação.

O grau de detalhamento expressa as formas mais ou menos detalhadas das operações que entram na composição da ação. No trânsito pelas etapas de assimilação, há a redução das operações na medida em que estas vão sendo internalizadas como parte da ação.

O grau de independência, outra característica da ação, diz respeito à possibilidade de resolver as tarefas com ajuda ou de forma autônoma. Por meio dessa característica, é possível representar o problema, a tarefa cognoscitiva de caráter teórico ou prático segundo um plano, os métodos e as estratégias de solução nos processos mentais que permitem a busca criativa de solução e a comprovação da solução do problema com autonomia. Segundo Galperin (2001a), essa representação resulta de uma formação planejada, a qual, por sua vez, contribui para o estudante dirigir sua aprendizagem.

Já o grau de consciência refere-se à possibilidade de refletir, de argumentar e de explicar o que se faz e o porquê, dependendo da qualidade da assimilação durante a etapa de externalização verbal.

Talízina (2000) considera que a formação de atividade de estudo depende dos níveis de conscientização e de reflexão das regularidades desse processo. A formação do caráter consciente da atividade intelectual representa uma dimensão do desenvolvimento intelectual dos estudantes. Assim, o grau de consciência e a reflexão têm um papel essencial na atividade intelectual do estudante, em especial no processo de regulação da aprendizagem. A reflexão é uma qualidade do pensamento essencial também no processo de formação do controle interno.

A solidez se refere à estabilidade da ação formada e depende da quantidade de repetições, do grau de detalhamento e do trânsito pelas etapas, ou seja, da forma da ação. Já o caráter racional se relaciona com as condições essenciais nas quais o estudante se orienta quando realiza a ação determinada pelo conteúdo da base orientadora. Um elevado grau de racionalidade significa uma orientação do tipo III.

A formação do controle interno, com as características desejadas, se produz em estreita união com a formação das características da ação, objeto do controle. Dessa forma, por exemplo, para o controle interno ter um alto grau de generalização, a ação a qual ele se associa deve apresentar essa qualidade como produto de sua formação.

As etapas de assimilação e de formação do controle interno na teoria de P. Ya. Galperin

Galperin (2014) confere um importante papel à formação do controle interno considerado por ele como uma atividade de orientação e elemento da psique. No seu entendimento, faz-se necessário organizá-lo, primeiro, como uma ação material externa e, depois, como um controle mental, generalizado, abreviado e automatizado.

Embora a orientação da ação tenha um papel essencial no controle e nos processos de autorregulação da aprendizagem, uma adequada representação da ação, ou seja, uma adequada compreensão desta não é garantia do desenvolvimento desses processos. Dessa forma, é possível ter compreensão sem que a ação de controle tenha sido assimilada, sendo necessário, para isso, que a ação seja realizada em suas três partes funcionais seguindo um conjunto de etapas, as quais representam o processo de sua internalização. Esse processo se dá do plano externo, interpsicológico, para o plano mental, interpsicológico, segundo o que Vigotsky (1997) considerou como a Zona de Desenvolvimento Próximo.

De acordo com a teoria de Galperin, a aprendizagem do estudante se efetiva nessa zona, não só por meio da mediação da linguagem e de determinadas interações de colaboração, mas também de uma adequada orientação.

O processo de formação por etapas das ações mentais e seu aperfeiçoamento, segundo os parâmetros de qualidade determinados, possibilita a transformação da ação da forma material-objetal em mental-objetal e, posteriormente, sua abreviação e automatização. Nesse processo, a aprendizagem se concretiza, uma vez que a BOA propicia a assimilação de conhecimentos, conceitos e da própria ação, transformados em capacidade e hábito. (Galperin, Zaporózhets & Elkonin, 1987).

Com relação à formação das ações mentais e, especificamente, à de controle, de acordo com a teoria de Galperin, estabelecem-se as seguintes etapas ou níveis de formação da ação: a) a de elaboração da base orientadora da ação, ou seja, das condições; b) a do apoio da ação com sua representação gráfica (EBOCA); c) a ação baseada na linguagem externa, oral ou escrita, sem apoio externo e, por último, d) a ação mental, na qual a ação se institui em representação mental. Sendo assim, a formação de uma nova ação de controle interno (atenção voluntária) deve começar a partir de ações de controle externo, na forma material ou materializada, conscientes e detalhadas, sendo necessário organizar, de forma planejada, o processo de sua internalização.

As pesquisas de Galperin (1992) revelaram que a formação das novas ações mentais de ordem superior, ou seja, aquelas que expressam um alto nível de abstração, generalização, consciência, crítica, se efetiva quando as etapas da assimilação são seguidas de forma planejada. Talízina (1988) afirma ainda que deve ser agregada a motivação no momento inicial dessas etapas para que aprendizagem possa ocorrer.

Etapa de motivação

Essa etapa deve ser precedida de um diagnóstico inicial para determinar e caracterizar os níveis de desenvolvimento da ação de controle a ser formada, o que, por sua vez, pode contribuir com a motivação para a aprendizagem. O diagnóstico inicial dos níveis de desenvolvimento da ação deve ser um momento para o estudante reconhecer suas potencialidades e o que precisa aprender, permitindo definir suas metas em relação aos objetivos de aprendizagem.

Na primeira etapa, faz-se necessário motivar os estudantes para a atividade de estudo e, especificamente, para a importância de aprender a controlar suas ações. Sem motivação, não há atividade e, consequentemente, tampouco a formação das ações e dos conhecimentos que são assimilados a partir destas e que dependem também do desejo ou da necessidade que tem o estudante para aprender. Ela impulsiona o estudante para atingir as metas, os objetivos da aprendizagem. É importante destacar que essa motivação não deve estar relacionada apenas ao conteúdo da aprendizagem e ao desenvolvimento da atenção, mas também à significação dessa aprendizagem no desenvolvimento integral do estudante.

Galperin, apoiado nas ideias de Vigotsky (1997), considera que o afetivo não se separa do cognitivo, o que se constitui numa condição para a autorregulação da aprendizagem. Conforme o autor, a união entre o afetivo e o cognoscitivo é expressa na categoria vivência como um elemento psicológico que proporciona ao estudante a possibilidade de dar um sentido ao conteúdo a ser assimilado. Vale ressaltar que, embora o ciclo cognoscitivo (de formação da ação) se inicie com a motivação, esta deve ser mantida e fortalecida ao longo de todo o processo de aprendizagem.

Uma via para motivar os estudantes para a aprendizagem de um determinado objeto de estudo é o ensino baseado em situações-problema, as quais são geradoras da atividade intelectual, ou seja, capazes de desenvolver o pensamento do estudante.

Etapa de estabelecimento da base orientadora da ação

Nos estudos de Galperin, como atesta Talízina (1988), essa etapa teve várias denominações que atestam avanços no próprio entendimento da orientação da ação. Inicialmente, foi denominada de várias formas: “etapa de formação da representação prévia da tarefa”, “etapa de esclarecimento da base orientadora da ação” e “etapa do conhecimento das condições objetivas da ação e suas representações na forma de um plano escrito de maneira breve e compreensível num cartão”. Posteriormente, então, foi denominada de “etapa de elaboração do esquema da base orientadora da ação”. Essas diferentes denominações revelam um dos aspectos essenciais da etapa, que é elaborar uma representação da ação conforme ela é compreendida, incluindo as condições nas quais ela se realiza.

Galperin (2001a) destaca que o sujeito recorre à atividade orientadora quando, numa situação dada, ele não dispõe das condições que, automaticamente, garantem o êxito e se faz imprescindível obtê-lo. Na atividade orientadora, o sujeito realiza um exame da nova situação, valida ou não o significado racional ou funcional dos objetos e as provas como também modifica a ação e elabora um novo caminho. Além disso, durante o processo de sua realização, controla a ação de acordo com o modelo da ação elaborado. É uma etapa denominada por Galperin de “criação de algo” que se constitui como um projeto da ação, a base orientadora que guiará o sujeito durante a realização da ação.

Nessa etapa, devem-se criar representações adequadas da ação a ser realizada, que permitem a solução de uma classe de problemas. Essa representação inclui:

a) os objetivos e o produto da atividade; b) a estrutura das operações da ação e a sua definição conceitual; c) os critérios para o controle e a regulação da ação; d) os recursos necessários e disponíveis para a realização da ação; e e) as condições na qual será realizada a ação. Como se observa, a representação da ação de controle está incluída na representação da base orientadora de ação, pois o controle é inseparável da orientação e da execução.

Na etapa de elaboração da base orientadora da ação, é necessário estimular os estudantes a formular perguntas que possam organizar o pensamento deles, para que possam criar uma representação inicial da atividade necessária para a solução da situação-problema, característica de uma determinada classe de problemas. Dentre essas perguntas, podemos considerar: Por que se deve realizar a ação? O que me motiva? O que desejo? O que se quer como resultado? Quais operações devem ser realizadas e em qual ordem? Quais condições são necessárias e quais existem? De quais recursos preciso e de quais disponho? Como acompanhar e corrigir a realização da atividade? Nessa teoria, considera-se que a formulação de perguntas para o pensamento é de grande importância.

A elaboração da base orientadora da ação pelos estudantes se realiza num processo de negociação entre os sentidos que eles atribuem à ação, diagnosticado inicialmente, e o significado da ação estabelecido pelo professor no EBOCA, que se configura como o desejado na aprendizagem.

Dessa forma, a base orientadora da ação se estrutura na base de três modelos. O primeiro é o modelo do objeto (O que é o objeto da aprendizagem?), que constitui a dimensão conceitual. O segundo é o modelo da ação, no qual são estabelecidas as operações necessárias a se realizarem em função dos objetivos e do produto da atividade esperado, assim como a ordem dessas operações, a qual que permite a transformação do objeto da atividade. E o terceiro é o modelo do controle, no qual são definidos os critérios de avaliação e de acompanhamento da ação, os quais possibilitam, por sua vez, a regulação e a correção dos erros durante o processo.

A representação esquematizada da base orientadora, como foi apresentada, corresponde ao EBOCA necessário para a atividade na próxima etapa. Como se constata, o modelo do controle integra o modelo da BOA e é inseparável do modelo da ação sobre a qual se realiza o controle.

Etapa material ou materializada

Nessa etapa, o controle da ação em formação, como parte da orientação, se realiza de forma externa, segundo o modelo estabelecido e materializado no EBOCA. Galperin (1989) considera que, nas primeiras etapas de formação da nova ação, o controle deve ser realizado em cada operação, e não somente no produto final.

Talízina (1988) considera que a assimilação de conhecimentos e de ações é obtida com melhores resultados quando a forma materializada se organiza de tal modo a permitir o conhecimento das relações e conexões dos conteúdos assimilados. Esse conhecimento contribui para o desenvolvimento do pensamento, compreendido como um diálogo complexo entre ações e operações, as quais possibilitam elaborar, organizar, desenvolver, desenhar múltiplas e complexas relações e conexões na base da atividade externa.

Essa etapa deve garantir aos estudantes resolver um conjunto de tarefas de forma colaborativa usando o EBOCA. Na atividade de colaboração com os colegas, sob a direção do professor e mediado pela EBOCA, os estudantes aprendem a controlar e regular suas aprendizagens de forma consciente.

A utilização do controle em duplas permite não só garantir o controle do processo de assimilação como também solucionar outro problema importante: os estudantes, ao se controlarem uns aos outros, gradativamente, aprendem a controlar-se a si mesmos e se tornam mais atentos. Isso se explica pelo fato de ser a atenção um controle interno, que se forma na base do controle externo (Talízina, 2000, p. 71).

O controle na dupla, no qual um realiza o controle do colega e vice-versa, é importante no processo de formação do controle interno. Algumas pesquisas têm evidenciado que, no geral, resulta mais fácil para o estudante realizar uma análise crítica da atividade do colega do que da sua (Talízina, 2000). Esse momento possibilita análises objetivas da atividade na base do EBOCA, para, depois, fazer uma autoanálise.

O controle se desenvolve contrastando as operações que se realizam, de forma detalhada, segundo os critérios estabelecidos no EBOCA de cada um dos estudantes. A regulação da aprendizagem deve permitir aos estudantes a correção consciente dos possíveis erros, refletindo em relação a suas causas e considerando o modelo do EBOCA, no qual se explicitam também, de forma materializada, os critérios para o controle.

Nessa etapa, a ação materializada se combina com o uso da linguagem externa, ou seja, formula-se verbalmente o que se faz e o porquê, o que contribui com o trânsito para a próxima etapa. Uma vez que os estudantes aprendem a ação de controle sobre a ação que realizam, de forma materializada e em colaboração, podem passar à etapa da realização das ações de controle usando a linguagem externa, sem o apoio do EBOCA como materialização da BOA.

Etapa da linguagem externa

Segundo Talízina (1988), nos trabalhos de Galperin, inicialmente, essa etapa foi chamada de formação da ação na fala em voz alta, mas, em várias investigações, nessa etapa, foi usada também, com sucesso, a linguagem escrita, que é também um tipo de linguagem externa. Na opinião da autora, a fixação dos elementos da ação na linguagem escrita é um modo de materialização, uma variedade da forma verbal externa da ação. Tanto a linguagem oral como a escrita são formas de materialização e objetivação do pensamento. Diante disso, a ação verbal deve ser obrigatoriamente assimilada na forma detalhada: todas as operações que a integram não só devem adquirir a forma verbal como também ser assimiladas dessa forma.

Conforme se tem destacado, a linguagem tem uma importância especial para a orientação e regulação consciente da ação, no pensamento reflexivo, na passagem da ação materializada à forma representativa, ou seja, à orientação no plano ideal.

Nessa etapa, o objeto da ação se apresenta na forma verbal ou escrita, nesse caso, os elementos da BOA, porém sem apoio materializado. A transformação do objeto se realiza na forma verbal externa, com raciocínio escrito ou em voz alta, pelo qual, como explica Galperin (2001a), a linguagem é o portador de todo o processo, da tarefa e da ação. Na comunicação do sujeito, a palavra como meio de comunicação tem uma importância relevante, pois também influi na conduta dos outros e na sua própria conduta, na regulação dos próprios processos psíquicos e, dessa forma, possibilita o surgimento da atividade consciente. De acordo com Vigotsky (1997), o desenvolvimento do pensamento é também determinado pela linguagem, ou seja, pelas ferramentas linguísticas do pensamento e pela experiência sociocultural.

No percurso de formação do controle interno, é necessário criar um ambiente emocional positivo, no qual os estudantes podem expressar suas opiniões, seus pontos de vista, suas vivências, dialogar e aprender a se controlar com a ajuda dos outros, ou seja, deve-se favorecer a comunicação adequada para estabelecer relações que potencializem a cooperação, a ajuda mútua.

Nessa etapa, os processos de transformação para a ação mental se intensificam, propiciando transformações qualitativas do desenvolvimento do psiquismo, o que, segundo Galperin (2001a), estimula os estudantes a realizarem atividades de maior significação. A conscientização da atividade mental, determinada pelo caráter específico da correlação entre seus componentes práticos e lógico-verbais, é um componente essencial do controle e da regulação da aprendizagem na formação da autorregulação da mesma.

O controle continua no plano externo, de forma intersubjetiva, acessível à observação. Esse controle externo é evidente até o momento em que passa a ser menos detalhado, independente das interações com os outros e das formas da linguagem externa. Nesse momento, pode dar-se início à realização do controle como ação mental.

Etapa mental

Na etapa mental, o estudante já se apropriou de uma representação como orientação para a solução correta das tarefas dentro dos níveis de generalização estabelecidos, possibilitando-lhe sair dos limites da percepção, do concreto ou de sua representação materializada para regular e controlar a ação formada, o que se constitui em controle interno ou atenção. O controle se realiza mentalmente, de forma individual, sem apoio externo ou sem usar a linguagem externa. Dessa forma, o controle passa a ser uma ação mental, o que representa um controle interno ou atenção, que propicia a autorregulação da aprendizagem nas atividades, dentro dos limites de generalização, assim como a transferência da aprendizagem a novas situações.

Nessa etapa, conclui-se um ciclo cognoscitivo de formação de uma ação na qual se incluem a orientação, a execução e o controle e regulação. O estudante tem consciência de suas estratégias de aprendizagem, de suas possibilidades. E, por sua vez, constitui-se como um ponto de partida para a formação e o desenvolvimento de outro ciclo de aprendizagem ou de formação de outra ação mental que implica a transferência da aprendizagem com autonomia intelectual. Na opinião de Galperin e Talízina (1965), o conhecimento assimilado é utilizado para a solução de determinados problemas, e não apenas para aqueles em que a aprendizagem ocorreu. Dessa forma, evidencia-se que aprender requer a aplicação desse conhecimento em novas situações sob outras condições.

Conforme Galperin e Talízina (1965), a transição gradual da etapa materializada, completamente detalhada como forma de pensamento, para a etapa verbal e, posteriormente, para a etapa mental, permite a compreensão do conteúdo e da lógica do processo de pensamento, ocasionando a formação das ações de controle interno, base da autorregulação da atividade da aprendizagem.

Em relação às etapas da teoria, Galperin (2001a) avalia que nem toda ação deve passar por essas etapas. Elas se fazem necessárias quando se trata de uma nova ação. O trânsito pelas etapas formuladas não acontece de forma uniforme, no sentido de todos os estudantes estarem ao mesmo tempo, na mesma situação de aprendizagem. Embora possam ser consideradas as tendências gerais do grupo, é imprescindível respeitar (e impulsionar) os ritmos diferentes de aprendizagens, numa dialética entre o individual e a atividade do grupo.

Conclusões

A teoria de Galperin constitui uma referência para planejar e organizar, de forma criativa, a formação da autorregulação da aprendizagem, uma vez que, como produto da internalização da ação externa, o estudante dispõe de um modelo mental da ação que serve de orientação, com os critérios de controle da ação. A passagem da ação de controle (em união com as ações de orientação e de execução) do plano externo ao interno, como controle interno, pode garantir a formação de autorregulação da aprendizagem necessária para outras aprendizagens com autonomia intelectual.

Na Didática Desenvolvimentista, pautada nas ideias de Galperin, a formação planejada do controle interno potencializa o trânsito progressivo da dependência à independência e à autorregulação, assim como o desenvolvimento do estudante quanto à capacidade de aprender, de controlar, de se transformar criativamente e modificar o contexto social de sua convivência. Essas são formas que propiciam também o desenvolvimento do pensamento dos estudantes, com o qual a escola deve ter responsabilidade. A habilidade de controle interno, como forma de atenção, não se forma espontaneamente por mecanismos biológicos, sendo de natureza e origem social, razão pela qual deve ser ensinada. A atenção como controle interno é resultado da substituição paulatina do controle externo em interno. Assim, a passagem pelas etapas de formação da ação de controle deve garantir a elaboração/reelaboração das representações mentais que constituem as formas da base orientadora, como expressão da passagem do interpsicológico para o intrapsicológico, ou seja, do controle externo para o interno.

Os estudantes que aprendem a controlar e, consequentemente, a autorregular sua aprendizagem podem assumir uma postura de maior responsabilidade pelos resultados de sua atividade de aprender. Por sua vez, são capazes de avaliar o progresso da aprendizagem tendo em vista os objetivos propostos. Esses estudantes passam a ter consciência dos processos que utilizam e ainda conseguem distinguir os que são ou não adequados para aprender. Aprendem a partir de seus erros e também encontram neles uma oportunidade para aprender.

É importante destacar que, quando a aprendizagem dos estudantes é dirigida segundo as etapas da Teoria de Galperin, ela não limita a iniciativa e a independência, mas sim as favorece, propiciando as condições para a atividade criativa e o desenvolvimento intelectual deles, evidenciado pela autonomia intelectual, pela participação ativa e consciente na sua própria aprendizagem.

Referências

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