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Linhas Críticas

versión impresa ISSN 1516-4896versión On-line ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.25  Brasília ene./dic 2019  Epub 11-Feb-2019

https://doi.org/10.26512/lc.v24i0.21587 

Dossiê: Ciência, Educação e Sociedade

Indicadores de alfabetização científica de professores em serviço: a bioquímica como contexto formativo

Giovanni Scataglia Botelho Paz1 
http://orcid.org/0000-0002-7269-9135

Paulo de Avila Junior2 
http://orcid.org/0000-0002-0202-516X

Sérgio Henrique Bezerra de Sousa Leal3 
http://orcid.org/0000-0001-8723-4202

1Bacharel em Ciência e Tecnologia, Licenciado em Química e Mestre em Ensino e História das Ciências e da Matemática pela Universidade Federal do ABC. Atualmente é professor de Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental na Prefeitura Municipal de São Paulo.

2Doutor em Ciências (área Bioquímica), Bacharel e Licenciado em Química pelo Instituto de Química da Universidade de São Paulo. Atualmente é Professor na Universidade Federal do ABC.

3Licenciado em Química, Bacharel em Química com Atribuições Tecnológicas pela Universidade Federal do Piauí, Doutor em Química pela Universidade Federal de São Carlos e realizou estágio de pós-doutorado na área de Ensino de Química no Instituto de Química da Universidade de São Paulo. Atualmente é Professor Associado II na Universidade Federal do ABC.


Resumo

No presente artigo foram investigados os conhecimentos de educação científica de um grupo de professores de química, biologia e ciências, com especial atenção aos indicadores de alfabetização científica. A partir do oferecimento de um curso de extensão de formação continuada para esse grupo de professores, foram coletados os dados de pesquisa por intermédio do registro audiovisual das aulas e posterior transcrição das mesmas. Esses dados foram analisados de acordo com os indicadores de alfabetização científica, resultando na manifestação da maioria dos indicadores esperados em cada um dos episódios analisados, sendo que o curso oferecido auxiliou no processo de alfabetização científica destes profissionais. Assim, a principal contribuição desse trabalho consistiu na identificação e análise de indicadores de alfabetização científica, a fim de corporificar o quadro teórico das pesquisas em formação continuada de professores.

Palavras-chave Alfabetização científica; Formação continuada; Bioquímica

Resumen

En el presente artículo se investigaron los conocimientos de educación científica de un grupo de profesores de química, biología y ciencias, con especial atención a los indicadores de alfabetización científica. A partir del ofrecimiento de un curso de extensión de formación continuada para ese grupo de profesores, fueron recolectados los datos de investigación por intermedio del registro audiovisual de las clases y posterior transcripción de las mismas. Estos datos fueron analizados de acuerdo con los indicadores de alfabetización científica, resultando en la manifestación de la mayoría de los indicadores esperados en cada uno de los episodios analizados, siendo que el curso ofrecido ayudó en el proceso de alfabetización científica de estos profesionales. Así, la principal contribución de ese trabajo consistió en la identificación y análisis de indicadores de alfabetización científica, a fin de corporificar el marco teórico de las investigaciones en formación continuada de profesores.

Palabras clave alfabetización científica; formación continuada; bioquímica.

Abstract

In this article, the scientific education knowledge of a group of teachers of chemistry, biology and science was investigated, with special attention to the indicators of scientific literacy. From the offering of a continuing education extension course for this group of teachers, the research data were collected through the audiovisual recording of the classes and subsequent transcription of the same. These data were analyzed according to the indicators of scientific literacy, resulting in the manifestation of most of the expected indicators in each of the analyzed episodes, and the course offered helped in the process of scientific literacy of these professionals. Thus, the main contribution of this work was the identification and analysis of indicators of scientific literacy, in order to incorporate the theoretical framework of research in continuing teacher education.

Keywords Scientific literacy; In service education; Biochemistry

Résumé

Dans le présent article, les connaissances en éducation scientifique d'un groupe de professeurs de chimie, de biologie et de sciences ont été étudiées, en accordant une attention particulière aux indicateurs de la culture scientifique. De l'offre d'un cours de formation continue pour ce groupe d'enseignants, les données de recherche ont été recueillies grâce à l'enregistrement audiovisuel des classes et la transcription subséquente de la même. Ces données ont été analysées en fonction des indicateurs de la culture scientifique, ce qui a entraîné la manifestation de la plupart des indicateurs attendus dans chacun des épisodes analysés, et le cours offert a aidé dans le processus d'alphabétisation scientifique de ces professionnels. Ainsi, la contribution principale de ce travail a été l'identification et l'analyse des indicateurs de la culture scientifique, afin d'intégrer le cadre théorique de la recherche dans la formation continue des enseignants.

Mots clés culture scientifique; formation continue; biochimie.

Introdução

O ensino de ciências pode ter como objetivo formar cidadãos capazes de realizar novas leituras do mundo a partir de seus conhecimentos científicos e assim serem capazes de posicionarem-se em relação ao grande número de informações que são veiculadas na mídia diariamente e que impactam em suas vidas diariamente, podendo assim, por exemplo, ter conhecimento de como selecionar em seus hábitos de consumo um carro menos poluente, um eletrodoméstico mais econômico ou até mesmo uma dieta mais adequada em termos energéticos e nutricionais (Chassot, 2010). Para tanto, as aulas de ciências deveriam buscar uma valorização da educação científica.

Contudo, o ensino científico, tanto nas esferas da educação básica como do ensino superior, muitas vezes é restringido à apresentação de uma coleção de conhecimentos concebidos como acabados, rígidos e algorítmicos, não oportunizando a reflexão dos educandos acerca das atividades e características científicas, bem como a forma como os conceitos científicos se constroem ao longo do tempo (Gil-Pérez et al., 1999). Esse perfil de ensino de ciências, que pode acabar sendo reproduzindo nos cursos de formação inicial de professores, contribui para a não superação de uma visão da existência de um método científico único e infalível, bem como visões epistemológicas inadequadas, tornando-se um grande obstáculo para a promoção de uma educação científica plena (Lorenzetti & Delizoicov, 2001).

Cachapuz et al. (2011) apresentam algumas visões distorcidas acerca do conhecimento sobre ciência e do trabalho científico que um grupo de professores de ciências da educação básica apresentaram: visão descontextualizada, concepção individual, elitista, empírico-indutivista, ateórica, aproblemática e ahistórica da ciência, e visão analítica, que podem ser reproduzidas em seus alunos quando não desconstruídas ao longo dos processos de formação inicial e continuada.

Outros trabalhos também discutem as consequências que lacunas formativas podem acarretar em professores em serviço. Por exemplo, Maldaner (2003) aponta que uma parcela considerável dos professores de química do ensino médio apresenta os conteúdos químicos da mesma forma rígida e cristalizada com que foram trabalhados em seus cursos de graduação. Assim, não refletem sobre a seleção dos conteúdos que ministram em suas aulas, o que acaba por sugerir a hipótese de que não elaboram e ministram suas aulas a fim de valorizar os diferentes públicos que compõem seu alunado, apresentando a ciência química como uma série de leis e fórmulas sem significado no cotidiano dos discentes. Uma das hipóteses levantadas pelo autor é que esses docentes não foram alfabetizados cientificamente durante seus cursos de formação inicial e continuada, contribuindo para a apresentação da ciência com uma visão positivista.

Sutton (1997) discute que a influência das concepções prévias de professores acerca dos fenômenos naturais dificulta a aprendizagem de conceitos científicos. Essas concepções são expressas por meio da linguagem, sendo que a linguagem científica pode ser aprendida a partir do cotidiano, assim como a partir da interpretação da natureza da ciência. Nesse sentido, o ensino deste sistema interpretativo (linguagem científica) ocorre na educação formal, compreendendo as ciências como uma cultura a ser apropriada pelos alunos.

Vale ressaltar que as demandas formativas de professores de ciências e de química são muito abrangentes, de forma que tentar abarcá-las somente durante a formação inicial tornaria o processo longo ou superficial e, portanto, a formação continuada surge como uma alternativa às carências e lacunas oriundas da formação inicial. Além disso, como discutido por Carvalho e Gil-Pérez (2001), muitas questões que permeiam a sala de aula e o cenário escolar só ganham significado a partir do momento em que o licenciando começa a atuar como docente. Nesse sentido, identifica-se a Alfabetização Científica como um importante aspecto a ser promovido não apenas na educação básica, mas também na formação inicial e continuada de professores, uma vez que a mesma constitui um potencial instrumento de desconstrução da visão conteudista do ensino e aprendizagem de ciências, ressaltando os processos de construção e natureza da ciência, assim como promove uma aproximação do que é ensinado para os alunos de seu próprio cotidiano.

A alfabetização científica e seus indicadores

Embora existam autores que utilizem a expressão “Letramento Científico”, “Alfabetização Científica” ou “Enculturação Científica” para definirem um ensino de ciências que busca a formação do estudante como um cidadão capaz de concatenar os conhecimentos científicos com as mais diversas situações de sua vida prática, nesse trabalho adotamos o termo Alfabetização Científica (AC), pois concordamos com Chassot (2003, p. 91) que “ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que está escrita a natureza. É um analfabeto científico aquele incapaz de uma leitura do universo”.

Miller (1998) define a AC como a “capacidade de ler e escrever sobre ciência e tecnologia”. Entretanto, o próprio autor faz uma ressalva acerca da sua definição, uma vez que essa se mostra ampla, englobando desde a leitura de rótulos de alimentos até a de relatórios científicos mais complexos. Hazen e Trefil (1991) apontam que a AC deve propiciar para a sociedade noções básicas de como atividade científica se desenvolve e se retroalimenta, assim como os avanços e consequências que esses novos conhecimentos acarretam para a vida em sociedade.

Bybee (1995) considera que os processos de aprendizagem do conhecimento científico podem ser categorizados em quatro dimensões: funcional, conceitual, procedimental e multidimensional. Para o autor, a AC funcional considera os termos próprios e o vocabulário das ciências, ou seja, é importante valorizar atividades de leitura e produção de textos nos quais os termos próprios dessa área sejam empregados. Já a AC conceitual e procedimental almejam que os estudantes, além de conhecerem o vocabulário específico, compreendam como a ciência se constrói e investiga os fenômenos naturais, para que sejam capazes de reconhecer em suas vidas cotidianas tanto o papel da ciência quanto da tecnologia. A partir do momento que essas três dimensões são alcançadas e estabelecem relações entre si ocorre o que o autor chama de AC multidimensional.

Laugksch (2000) apresenta uma revisão de literatura publicada em língua inglesa sobre AC, concluindo que um indivíduo alfabetizado cientificamente precisa conhecer as relações entre ciência e sociedade, saber acerca da ética que permeia o fazer do cientista, conhecer a natureza da ciência, diferenciar ciência de tecnologia, possuir conhecimento sobre conceitos básicos das ciências e, finalmente, perceber e compreender as relações entre as ciências e a humanidade.

Assim, buscando uma definição de AC, subsidiada nos autores citados, propomos que um indivíduo alfabetizado cientificamente seja capaz de atribuir sentido ao mundo que vive a partir das novas leituras que a linguagem das ciências pode propiciar, reconhecer conceitos científicos em sua vida cotidiana e aplicá-los em novas situações, e possuir ciência das variáveis envolvidas no processo de construção de uma pesquisa científica e seu desenvolvimento.

Desse modo, objetivando desenvolver aulas de ciências que valorizem a educação científica, e que por consequência promovam o desenvolvimento dessas habilidades, consideramos três eixos estruturantes que constituem a base para uma prática educativa que vise a AC (Sasseron & Carvalho, 2008). O primeiro eixo, a compreensão dos termos, conhecimentos e conceitos científicos fundamentais, está relacionado à construção de conhecimentos científicos necessários à extrapolação apropriada para os diferentes desafios cotidianos. O segundo eixo, compreensão da natureza da ciência e dos fatores éticos e políticos que circundam sua prática, consiste na compreensão das variáveis envolvidas na produção do conhecimento num determinado contexto. O terceiro eixo compreende o entendimento das relações existentes entre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente (CTSA), envolvendo o entendimento da relação entre esses elementos. Nesse sentido, esse eixo busca valorizar uma AC na qual os conceitos e práticas trabalhados durante as aulas de ciências sejam incorporados na vida prática do aluno, fazendo com que este os aplique em seu contexto.

Os eixos estruturantes expressam aquilo que o professor, no planejamento de suas aulas de ciências, deve levar em conta a fim de alfabetizar cientificamente o aluno. Deve-se ressaltar que o processo de AC não é algo somente realizado durante as aulas de ciências, mas se estabelece nas mais diversas situações da vida do indivíduo como um processo contínuo e sujeito a alterações. Sendo assim, a busca por indícios da AC ao longo das aulas de ciências acaba por se tornar uma das vertentes de pesquisa dentro do âmbito do ensino de ciências.

Márquez e seus colaboradores (2003) valorizam a comunicação estabelecida nas aulas de ciências, descrevendo as ações dos alunos que seriam consideradas como indicadores de AC, por exemplo, raciocinar, levantar hipóteses e defender pontos de vista. Driver e Newton (1997), indicando que a argumentação é um mecanismo que confere qualidade aos discursos da comunidade científica, postulam como indicadores de AC que os alunos saibam resolver problemas utilizando diversas ferramentas científicas, que estabeleçam explicações e que relacionem as hipóteses levantadas com os testes executados e com os resultados encontrados.

Sasseron e Carvalho (2008) estabelecem indicadores visando fornecer evidências acerca dos processos de AC e seu desenvolvimento nos estudantes. Os indicadores propostos pelas autoras possibilitam identificar se e como essas habilidades estão sendo trabalhadas em aulas de ciências, sendo eles: a seriação, organização e classificação de informações, o raciocínio lógico e proporcional, o levantamento e teste de hipóteses, a justificativa, previsão e explicação e construção de modelos explicativos.

Os indicadores justificativa, previsão e explicação estão fortemente imbricados entre si e a completude da análise de um problema se dá pela construção de afirmações que mostram relações entre eles, pois têm-se elaborada uma ideia capaz de explicitar um padrão de comportamento que pode ser estendido para outras situações. Além disso, quando esta ideia é bem estruturada permite a percepção de relações entre os fenômenos do mundo natural e as ações humanas sobre ele. Caso isso ocorra, estamos defronte a outra habilidade importante para o desenvolvimento da AC: a construção do modelo explicativo capaz de tornar claro a compreensão de um problema e as relações que se pode construir entre este conhecimento e outras esferas da ação humana (Sasseron, 2008).

A partir das proposições da autora, os indicadores de AC começaram a ser investigados na comunidade científica de ensino de ciências. Del-Corso, Rezende e Trivelato (2014) investigaram os indicadores de AC em relatórios produzidos por alunos dentro de uma Sequência Didática Investigativa (SDI) aplicada na disciplina de biologia no Ensino Médio. Além da identificação da manifestação dos indicadores propostos por Sasseron (2008), os autores ainda propuseram o indicador inscrições literárias, que pode ser explicado como “[…] desenhos, mapas, diagramas, textos, registros feitos por instrumentos (fotos, vídeos, gravações), formulações matemáticas e modelos físicos” (Del-Corso, Rezende & Trivelato, 2014, p. 7255). Assim, como uma ferramenta inerente à linguagem das ciências, as inscrições literárias podem apresentar-se como um importante instrumento de análise do processo de AC nos estudantes.

Del-Corso (2014), também propõe outros dois indicadores: listagem de materiais, que aparece quando uma lista de materiais a serem utilizados durante a resolução de um problema são apresentados, aparecendo na forma de lista ou descrição; e argumento, encontrado quando uma afirmação é feita baseada em dados, empíricos ou não, que culminam em uma conclusão. O autor pontua que a necessidade da proposição desses novos indicadores advém da necessidade metodológica da análise de materiais elaborados por alunos do Ensino Médio, de forma que os indicadores originalmente propostos Sasseron e Carvalho (2008) foram utilizados para analisar uma sequência didática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Ramos e Sá (2013) investigaram, por meio de atividades investigativas de alunos do Ensino Médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) os indicadores de AC. Esses pesquisadores avaliaram as transcrições dos registros audiovisuais das discussões decorrentes dos experimentos e identificaram que a manifestação dos indicadores de AC está fortemente relacionada com a complexidade conceitual dos experimentos que foram o mote da discussão. Quanto maior a quantidade de conceitos envolvidos, e mais complexos estes são, menos indicadores foram empregados pelos alunos. Outro aspecto ressaltado pelos autores é que os indicadores relacionados ao trabalho com informações (seriação, organização e classificação de informações) são mais frequentemente manifestados nos registros escritos em relação às discussões.

Assim, é perceptível que ainda existem desafios a serem considerados nos cursos de formação inicial e continuada de professores de ciências, sendo um deles alfabetizar cientificamente tanto os futuros professores quanto aqueles em serviço. É sabido que não basta ter ciência da alfabetização científica para que estes profissionais a valorizem e a promovam em suas aulas de ciências, porém esta é uma condição sine qua non, daí advém a importância de estudos que avaliem os processos de alfabetização científica, especialmente em professores que já se encontram atuando em sala de aula.

Procedimentos Metodológicos

Esse trabalho teve uma abordagem qualitativa, sendo constituído como um estudo de caso no qual foram investigados 21 professores em serviço: 16 professores de química, 2 professoras de biologia, 1 professora de ciências e 2 professores que lecionavam concomitantemente química e ciências. Considerando os aspectos éticos da pesquisa, os professores participantes são apresentados com nomes fictícios.

Os dados foram coletados a partir do acompanhamento desse grupo de professores durante a participação no curso de extensão “Bioquímica nos alimentos e introdução à educação alimentar” ofertado numa universidade pública paulista, com dez encontros presenciais de 3,5 h cada, totalizando uma carga horária de 35 horas.

O objetivo do curso foi aprimorar os conhecimentos de química dos professores participantes por intermédio do estímulo à reflexão sobre a alimentação, utilizando-se de aulas expositivas e dialogadas, atividades relacionadas à prática científica, a revisão de conceitos químicos, valorizando-se relações entre os níveis de representação simbólico, submicroscópico e macroscópico, com a utilização de trechos de documentários e leitura de informações nutricionais presentes em diferentes rótulos e embalagens alimentícias. Dentre os conteúdos explorados, destacam-se a identificação de evidências de transformações da matéria, o estudo das biomoléculas (carboidratos, proteínas e lipídeos), conservação da matéria, introdução ao metabolismo, reações químicas, polaridade e interações intermoleculares.

No curso foram valorizadas as aprendizagens relacionadas à diferenciação entre conhecimento científico e de senso comum, com foco na linguagem, identificação e seleção de materiais de divulgação científica (categorias de publicações científicas e análise crítica das diferentes publicações).

Foram realizados registros audiovisuais de todos os encontros, sendo que as interações entre professores participantes e o professor formador, e entre os próprios professores participantes ao longo das atividades propostas, foram integralmente registradas e transcritas. É importante ressaltar que foram considerados os princípios éticos da pesquisa envolvendo seres humanos, conforme preconiza a resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) (BRASIL, 2012), sendo que os professores participantes voluntários foram convidados a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) previamente aprovado sob o número de Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 60640116.8.0000.5594.

Nesse trabalho, foram analisados dois episódios. O primeiro enfatizou os conceitos de divulgação científica, a partir da análise de textos jornalísticos e artigos científicos, no qual o professor formador definiu com os professores participantes as características de um texto de divulgação científica e os diferentes públicos que esses materiais atendem. Além de explorar diferenças entre as categorias de publicações científicas, foram analisadas a estrutura, referências, linguagem, existência de resultados primários, identificação dos autores e se o texto foi escrito por quem participou da realização do trabalho.

O segundo episódio ocorreu no último encontro da formação e considerou as discussões e apresentações dos trabalhos de divulgação científica dos professores participantes acerca dos conceitos trabalhados ao longo do curso, sendo esses trabalhos pôsteres que retratavam um alimento escolhido por cada professor. As discussões dos professores paraticipantes nessa etapa foram categorizadas e analisadas considerando os indicadores de AC propostos por Sasseron (2008).

Resultados e Discussão

No primeiro episódio os professores participantes discutem sobre materiais de divulgação científica. O cerne dessa etapa do curso é o levantamento das concepções prévias dos professores acerca dos materiais de divulgação científica e como selecioná-los para as suas aulas na educação básica. O exercício para essa habilidade de seleção ocorreu a partir da entrega de um breve texto sobre as categorias de publicações científicas e de cinco materiais: (1) “A função da cafeína na natureza” [1] ; (2) “Feromônios: o cheiro do amor” [2] ; (3) “Extração de DNA vegetal: o que estamos realmente ensinando em sala de aula?” (FURLAN et al., 2011); (4) “Extração caseira de DNA morango” [3] ; e (5) “DNA vegetal na sala de aula” [4] .

Em seguida, solicitou-se que os materiais fornecidos fossem analisados segundo sua estrutura, referências, linguagem, existência de resultados primários, identificação dos autores e, finalmente, se o texto foi escrito por quem participou da realização do trabalho.

Cada professor participante realizou a leitura e discussão desses fatores nos textos em pequenos grupos (até quatro pessoas) e em seguida discutiu com todos os participantes dos demais grupos, a fim de responder as questões: “Todos os trabalhos podem ser considerados uma publicação científica? E divulgação científica? Quais critérios poderiam ser utilizados para classificar um trabalho como divulgação científica?”. Durante a discussão foram apresentados exemplos de divulgação da ciência presentes no site do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Os primeiros turnos de fala correspondem às perguntas do professor formador no processo de iniciação da discussão. Essas indagações são respondidas em grupo por todos os participantes sendo que apenas no último turno desse episódio há uma consideração maior da professora Berílio, na qual é possível identificar alguns indicadores de AC em sua fala.

Fonte: Dados da pesquisa.

Quadro 1 Transcrição dos turnos de falas dos professores. 

Os turnos 8 e 24 exemplificam a elaboração de uma explicação com justificativas esperadas pelo professor formador a partir das perguntas de estímulo à participação dos professores participantes. Nesse sentido, a Professora Berílio apresenta o indicador de AC justificativa por subsidiar a sua explicação para o professor formador com elementos encontrados nos textos lidos. Especificamente no turno 24 podemos salientar a presença do indicar organização de informações, pois verifica-se que a referida professora organiza os dados apresentados nos textos, indicando um erro do autor ao extrapolar as informações de um estudo para outros tipos de plantas.

Os próximos turnos de fala ilustram um exemplo da condução da discussão dos professores participantes no momento de classificação dos textos como divulgação científica. Nesse sentido, há uma convergência de ideias acerca dos critérios necessários ou relevantes para que um texto seja considerado uma divulgação científica.

Fonte: Dados da pesquisa.

Quadro 2 Transcrição dos turnos de fala dos professores. 

Os turnos 25 até 33 mostram que os professores identificam nos materiais lidos quais seriam os critérios para considerar o texto como uma divulgação científica. Assim, o indicador organização de informações aparece com bastante frequência quando esses professores indicam os dados necessários, por exemplo, as características quantitativas, como indicado pela Professora Carbono no turno 32. Além disso, é interessante observar que em todos os turnos de fala em que há o indicador explicação também é manifestada a justificativa, o que subsidia o discurso daquele indivíduo, tornando-o mais consistente com o uso de argumentos científicos.

Outro fator relevante nesse episódio é a fala da Professora Sódio (turno 33), na qual complementa o argumento da Professora Carbono e mostra correlação com o uso da divulgação científica em suas aulas ministradas na Educação Básica. Nessa perspectiva, há uma mobilização de indicadores de AC, incentivando a criticidade desses profissionais quanto ao tipo de material que pode ser utilizado durante suas práticas docentes.

Finalmente, o desfecho desse episódio mostra a seleção de critérios para julgar uma publicação como sendo uma divulgação científica, sendo esse aspecto novamente estimulado pela pergunta do professor formador durante o episódio considerado e o grupo demonstrou consenso acerca dos critérios para classificação de um texto como sendo uma divulgação científica.

Fonte: Dados da pesquisa.

Quadro 3 Turnos de fala dos professores referente aos critérios de consideração de uma divulgação científica. 

No Quadro 3 é possível observar que os professores elencam critérios para a definição de um texto como sendo de divulgação científica, trazendo em suas falas argumentos que sugerem o indicador explicação e justificativa, como exemplificado no turno 39 (Professor Fósforo). Além disso, é importante ressaltar a retomada da Professora Alumínio (turno 40) buscando organizar e classificar as informações a fim de sintetizar a discussão protagonizada pelos professores participantes. Assim, acredita-se que houve a mobilização dos indicadores de AC, seriação, organização e classificação de informação, levantamento de hipóteses, justificativa, previsão e explicação, o que pode apontar que este processo está em construção nesses docentes ao final da sua participação no curso de formação continuada. No Quadro 4 podemos observar que a discussão tem como foco os autores das divulgações científicas.

Fonte: Dados da pesquisa.

Quadro 4 Turnos de fala dos professores referente aos critérios de quem pode realizar divulgação científica. 

A discussão desse tema junto aos professores participantes foi importante no que se refere à tomada de consciência desses profissionais numa perspectiva mais ativa enquanto agentes transformadores do contexto de sala de aula. Em seguida, o professor formador retoma os critérios estabelecidos na aula anterior para classificar um material como divulgação científica.

Fonte: Dados da pesquisa.

Quadro 5 Turnos de fala dos professores referente aos critérios para uma reportagem ser científica. 

Nesse excerto apresentado no turno 46 (Quadro 5), o professor formador reforça a leitura crítica, bem como os critérios identificados e ainda adiciona que a modalidade da divulgação científica contém a entrevista com pesquisadores como um elemento positivo para o material, de forma que esses profissionais podem atuar nesse âmbito (Turno 59). A Professora Alumínio reforça o critério dos dados de pesquisa, definido na aula anterior do curso, como um critério, pois esses dados devem estar atrelados a um rigor científico, como por exemplo a apresentação de dados quantitativos. Nesses turnos de fala podemos destacar o exercício da criticidade por parte dos professores participantes.

A Professora Neônio (Turno 49) indica que apenas o respaldo de referência como pesquisador na área pode não se apresentar como informação suficiente para a confiabilidade de um material. Além disso, aponta certos problemas que entrevistas e a manipulação das transcrições dessas entrevistas podem gerar, ilustrado em sua fala no turno 53. Esse exercício de criticidade e reflexão também é evidenciado nas falas da professora Alumínio (Turno 58), que indica caminhos de verificação e contraposição de informações veiculadas nos materiais de divulgação científica.

De acordo com Laugksch (2000), o desenvolvimento dessa criticidade por parte dos professores está relacionado com a dimensão de reconhecimento dos impactos da ciência na sociedade. O professor, enquanto agente formador, deverá selecionar os materiais a serem utilizados em suas aulas de modo a abordar os diferentes aspectos das relações CTSA. Mesmo tendo ciência de que nem todos seus alunos irão prosseguir em carreiras científicas, é necessário esse preparo dos educandos, pois conhecer os processos da ciência que promovam o seu posicionamento perante questões problemáticas de sua vida cotidiana corresponde a uma das competências dos indivíduos alfabetizados cientificamente (Norris & Philips, 2003).

O segundo episódio consiste na apresentação do infográfico elaborado pelos professores participantes foi apresentado individualmente ou em dupla, sendo que desde a primeira aula do curso os professores participantes tinham ciência dessa tarefa ao final do curso e que deveriam incorporar os conceitos trabalhados ao longo do mesmo.

Na apresentação das professoras Flúor e Alumínio, que escolheram o macarrão instantâneo como produto, nos chama atenção a fala da Professora Alumínio:

Todas as informações retiradas foram desse talharim, porque mesmo sendo do mesmo fabricante, a composição muda um pouco, o valor energético, as calorias, de acordo com o tempero, o sabor do macarrão instantâneo. Então eu escolhi esse com base nos cálculos foram feitos na base desse sabor calabresa. E foi o resultado mais gritante foi a quantidade de sal que contém o macarrão instantâneo. Eu verifiquei que 1,4% de 99g de macarrão instantâneo é só sal, eu fiz a conversão dessa massa para sachês de sal, aqueles que dão em restaurante, e isso equivale a seis sachês de sal em 99g de macarrão instantâneo. Para atingir o valor diário de 200 kcal eu teria que comer em torno de quatro pacotes e meio de macarrão instantâneo por dia. Isso iria ultrapassar a recomendação diária de ingestão de sal por dia e iria faltar a ingestão mínima necessária de proteínas e carboidratos, mesmo o macarrão instantâneo sendo um macarrão, uma massa. Então, o macarrão instantâneo se localizaria no topo da pirâmide alimentar, com recomendação moderada. O principal ingrediente do macarrão instantâneo é a farinha de trigo enriquecida com ferro e ácido fólico. Aqui a gente colocou a fórmula estrutural do ácido fólico, e a importância dele no organismo que é a síntese de DNA (Professora Alumínio).

Nesse excerto podemos verificar a manifestação de alguns indicadores de AC. Inicialmente, as professoras tiveram a seriação, organização e classificação de informações, a fim de levantar quais as informações acerca do macarrão instantâneo seriam relevantes para compor o infográfico. Outro indicador que não havia sido manifestado anteriormente foi o indicador de raciocínio lógico e proporcional, uma vez que as professoras utilizaram as quantidades calóricas do macarrão instantâneo e compararam com a quantidade de quilocalorias diárias necessárias para um adulto, como se apenas ingerindo esse tipo de alimento bastaria para suprir a quantidade diária de carboidratos e proteínas.

Contudo, o mais relevante foi a possibilidade de manifestação do indicador construção de modelos explicativos, que ainda não havia sido observado em outras atividades ao longo do curso. Atribuímos esse indicador durante a fala da Professora Alumínio quando esta utiliza outras maneiras de ilustrar a quantidade bastante expressiva de sal presente em um macarrão instantâneo: “Eu verifiquei que 1,4% de 99 g de macarrão instantâneo é só sal, eu fiz a conversão dessa massa para sachês de sal, aqueles que dão em restaurante, e isso equivale a seis sachês de sal em 99 g de macarrão instantâneo”. Nesse sentido, a professora utilizou de uma analogia com um elemento presente em sua vida cotidiana, o sachê de sal, para representar a quantidade que gostaria de ilustrar. Assim, podemos verificar a mobilização de indicadores de AC nas falas dessa professora no processo de construção e explicação de seu infográfico.

Também destacamos a fala da Professora Silício por apresentar indicadores de AC:

Eu escolhi o salgadinho de milho porque eu comia. Falei comia porque depois disso eu não como mais. Desde quando começou e eu decidi fazer sobre o salgadinho de milho eu fui atrás das informações. Eu comia umas cinco vezes por semana. Eu adorava. Ele se encaixaria na pirâmide alimentar no topo, com os alimentos extra energéticos. A questão de adquirir apenas por esse alimento as quantidades energéticas diárias de 2000 kcal eu teria que consumir 30 pacotes desse salgadinho, ou seja, três quilos de salgadinho. E isso equivale a quase 80 pães franceses, e no tocante do sal, quase 20 sachês de 1 g, e óleo é essa quantidade equivale a 7 L. Chegou a me dar vertigem, sabe? Eu não me conformo que eu adorava isso, e eu fui influenciada pela embalagem, pois vem escrito “lanchinho saudável, é assado, não é frito”. (Professora Silício).

Sua fala apresenta os indicadores de AC que se referem ao trabalho com informações, ou seja, seriar, organizar e classificar informações, pelo mesmo motivo apresentado para o trabalho anterior, uma vez que a Professora Silício teve de fazer seleções de quais informações iria apresentar desse material. Além disso, o raciocínio lógico e proporcional também foi manifestado no momento em que existiram indicações de proporções desse alimento na quantidade de 200 kcal e de quanto seria necessário ingerir apenas dele diariamente para atingi-la. Essa professora também manifestou a construção de modelos explicativos, já que também fez várias correlações com objetos mais concretos da vida cotidiana, como, por exemplo, o volume de óleo ou a quantidade de pães franceses.

O aspecto que mais chama atenção no excerto dessa professora foi a mudança que a realização dessa atividade causou em termos de conteúdos atitudinais. No trecho: “Eu escolhi o salgadinho de milho porque eu comia. Falei comia porque depois disso eu não como mais” denota um aspecto relevante da AC, a utilização dos conhecimentos teóricos relacionados à vida cotidiana. Nesse sentido, apesar de não existir um indicador específico para esse excerto dentre os elencados por Sasseron (2008), é importante destacar esse trecho, pois o mesmo é uma indicação de que a AC está em processo na Professora Silício.

Também foi possível estabelecer uma relação dos dados obtidos nesse trabalho e os indicadores de AC propostos por Del-Corso, Rezende e Trivelato (2014), as inscrições literárias. A reelaboração das informações levantadas pelos professores participantes de uma forma diferente, com o estabelecimento de comparações, bem como a apresentação de tabelas e gráficos evidencia a manifestação desse indicador. Além disso, a construção de outros modelos explicativos evidencia certo grau de domínio da linguagem científica, ou seja, a compreensão dos termos e conceitos chaves, preconizado como uma das dimensões da AC (Laugksch, 2000).

A elaboração e apresentação do infográfico demonstrou ser uma etapa de caráter integrador, pois promoveu a mobilização dos conceitos discutidos ao longo do curso de extensão para o estudo de um produto alimentar específico. Os professores apresentaram a seriação, organização e classificação de informações, a fim de levantar quais informações acerca do alimento escolhido seriam relevantes para compor o infográfico. Outros indicadores que se destacaram foram os indicadores de raciocínio lógico e proporcional, no sentido de os professores terem utilizado as quantidades calóricas dos alimentos e comparado com a quantidade de quilocalorias diárias necessárias a um adulto, assim como a consideração mais crítica de que a ingestão desse tipo de alimento seria suficiente para suprir a quantidade diária de carboidratos e proteínas.

A partir dessa análise dos episódios destacados, observamos que o único indicador de AC que não foi manifestado por esse grupo de professores nas atividades analisadas foi o teste de hipóteses. Uma possível justificativa que pode ser atribuída para esse fato pode estar relacionada à carga horária do curso de extensão oferecido, bem como o número insuficiente de atividades voltadas especificamente a esse objetivo. Ressaltamos ainda que a frequência de manifestação dos indicadores aumentou durante a evolução do curso deformação continuada, o que pode ser um indicativo de que o mesmo tenha contribuído para o auxílio na promoção de processos de AC nos indivíduos investigados. O Quadro 6 resume os indicadores de AC encontrados em cada uma das atividades realizadas pelos professores participantes.

Fonte: Dados da pesquisa.

Quadro 6 Relação dos indicadores de AC manifestados pelos professores participantes. 

Outro aspecto relevante foi que o curso de formação continuada permitiu o contato dos professores com novas aprendizagens, sendo que os mesmos retomaram o contato com conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais durante o processo, bem como a experimentação de metodologias diferenciadas do ensino tradicional, o que pode auxiliá-los em práticas de ensino diferenciadas na educação básica (Marques & Araújo, 2010).

Os dados suscitam a hipótese de que deficiência da promoção de processos de AC nesses professores, durante suas formações iniciais, acaba por fazer com que esses, em sua prática docente, possivelmente apresentem a ciência como uma coleção de conhecimentos, fórmulas e leis, e não como um resultado de entendimentos, explorações e reflexões, equacionando uma ausência de significância para a vida real e cotidiana dos alunos da educação básica (Negrete & Lartigue, 2004). Essa visão distorcida da ciência que é geralmente apresentada na educação básica é um dos motivos para o afastamento dos estudantes das carreiras vinculadas às ciências naturais (Aguilar, Oliveira & Botero, 2016). Os motivos alegados pelos estudantes do Ensino Médio são que geralmente os conceitos são apresentados como uma coleção de fórmulas e conceitos, tornando essa ciência confusa e superficial, bem como a quantidade excessiva de assuntos a serem discutidos, gerando o desinteresse pelo seu estudo (Cardoso & Colinvaux, 2000).

Assim, acreditamos que os cursos de formação inicial e continuada devem promover oportunidades para que esses indicadores e os pressupostos da AC se desenvolvam, tanto na escrita quanto na oralidade, a fim de que os futuros professores e professores em serviço utilizem dessa AC tanto para si, quanto para promoverem um ensino pautado nessa perspectiva. Logo, é necessário oferecer para os professores em formação inicial e continuada situações nas quais eles precisem se posicionar e se sentir responsáveis pelos conhecimentos que produzem e que levarão para a sala de aula, a fim de não reproduzir as visões distorcidas acerca das ciências nas classes de Educação Básica.

É importante ressaltar também que estudos envolvendo a AC com professores em serviço ainda são relativamente escassos na literatura, entre os quais a maioria se destina à educação básica. Assim, partindo dessa perspectiva consideramos de suma importância desenvolver um estudo buscando a identificação desse processo nesse contexto de ensino, em especial aqueles referentes à formação continuada de professores. Dessa maneira, buscando uma formação de alunos críticos reflexivos e capazes de realizar essa leitura do mundo na educação básica, a pesquisa em formação continuada de professores destaca-se como de suma importância para que o objetivo da formação cidadã do ensino de ciências possa ser alcançada, afastando então de nossos educandos as visões distorcidas acerca da ciência e do trabalho dos cientistas (Cachapuz et al., 2011).

Considerações Finais

A partir dos resultados obtidos nessa investigação pudemos vislumbrar, à luz do referencial teórico, o processo da construção e manifestação da AC de professores de ciências, química e biologia em serviço. Assim, o grupo investigado, por meio das atividades propostas ao longo do curso de formação continuada, apresentou os indicadores de seriação, organização e classificação de informações, raciocínio lógico e proporcional, levantamento de hipóteses, justificativa, previsão e explicação. Um aspecto a ser destacado foi a possibilidade de manifestação da construção de modelos explicativos, que se dá quando os indicadores justificativa, previsão e explicação são manifestados de forma consistente.

Além disso, assinalamos também a relevância do curso de formação continuada ministrado para o auxílio no desenvolvimento da AC nos professores participantes. A possibilidade de exercer a criticidade sobre materiais que usualmente chegam nas salas de aula como prontos, promove a oportunidade para que esses profissionais os selecionem de forma mais autônoma e com um crivo mais apurado durante a etapa de planejamentos de suas aulas. Essa habilidade se fez presente no momento da escolha e seleção de informações a serem discutidas no trabalho do infográfico, onde já se verificou a manifestação dos indicadores de alfabetização científica.

Dessa maneira, sugerimos que atividades que envolvam argumentações coletivas se mostram potenciais para a promoção do processo de AC, uma vez que as habilidades atreladas ao desenvolvimento desse tipo de estratégia são aquelas previstas pelos próprios indicadores de AC.

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