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Linhas Críticas

versión impresa ISSN 1516-4896versión On-line ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.25  Brasília ene./dic 2019  Epub 10-Jul-2019

https://doi.org/10.26512/lc.v25.2019.23798 

Dossiê: Currículo e Avaliação da Aprendizagem

Avaliar para aprender em inglês e matemática no ensino secundário

Assessment for learning in English and Mathematics in secondary education

1University of Lisbon - Institute of Education - Escola Secundária da Ramada.

2Instituto de Educação da Universidade de Lisboa – Portugal.


Resumo

O presente estudo procurou compreender como duas professoras, Leonor, de inglês e Ilda, de matemática, implementam práticas avaliativas capazes de apoiar a aprendizagem dos seus alunos. Seguindo uma metodologia de natureza interpretativa, optamos pelo design de estudo de caso. A recolha de dados recorreu à observação de aulas e a entrevistas às professoras e a grupos focais de alunos, com registro áudio. A análise de dados seguiu a análise de conteúdo. Embora em disciplinas muito distintas, ambas as professoras apoiam os seus alunos com uma prática de avaliação formativa, assente numa abordagem positiva do erro que constitui uma fonte promissora para a atribuição de feedback.

Palavras-chave Práticas avaliativas; Avaliar para aprender; Abordagem positiva do erro; Feedback; Ensino secundário

Abstract

The present study looks to understand how two teachers, Leonor in English and Ilda in Mathematics, implement assessment practices to support students’ learning. Following a methodology of interpretative nature, we have chosen the case study design. The collection of data occurred through the observation of classes, interviews with the teachers and focus group with students, supported by audio recording. The data analysis was followed by an analysis of content. Although the two subjects are very different, both teachers support their students through formative assessment practices supported by a positive approach to error. This approach provides a rich source for informed feedback.

Keywords Assessment practices; Assessment to learn; Positive approach to error; Feedback; Secondary Education

Resumen

El presente estudio trata de comprender cómo dos profesoras, Leonor de inglés e Ilda de matemáticas, implementan prácticas de evaluación que pretenden apoyar el aprendizaje de sus alumnos. Siguiendo una metodología de naturaleza interpretativa, optamos por el diseño de estudio de caso. La recogida de datos se realiza a través de la observación de aula y las entrevistas a las profesoras y a los grupos focales de alumnos, y se registran en audio. Se utiliza el análisis de contenido para analizar los datos. A pesar de tratarse de disciplinas muy diferentes, ambas profesoras apoyan a sus alumnos a través de una práctica de evaluación formativa sobre la base de un abordaje positivo del error. Esto constituye una fuente rica para la asignación de una retroalimentación informada.

Palabras clave Prácticas evaluativas; Evaluar para aprender; Abordaje positivo del error; Retroalimentación; Enseñanza secundaria

Résumé

La présente étude visait à comprendre comment deux enseignantes, Leonor d'anglais et Ilda de Mathématiques, mettent en œuvre des pratiques d'évaluation capables de soutenir l'apprentissage de leurs élèves. Suivant une méthodologie d'interprétation, nous avons choisi l'étude de cas. Le processus de recherche et d'interprétation des informations ont été faits à partir d'observation de cours et des entretiens aux enseignantes et aux étudiants, en utilisant l'enregistrement audio. L'analyse des informations a suivi l'analyse du contenu. Bien que leurs matières soient très différentes, les deux enseignantes soutiennent leurs étudiants à travers d’une pratique d'évaluation formative où l'erreur a un abordage positif et un retour formatif très important sur l'apprentissage.

Mots clés Pratiques d’évaluation; Évaluer pour apprendre; Abordage positif de l’erreur; Feedback; Enseignement secondaire

Introdução

Ao invés de ser vista como uma ferramenta ou um instrumento de trabalho, avaliar para aprender é, acima de tudo, uma forma diferente de pensar a avaliação e, consequentemente, de ser implementada para facilitar a aprendizagem (Chappuis & Stiggins, 2002). Não basta seguir procedimentos característicos de uma avaliação formativa, é necessário captar o espírito de um processo avaliativo que não visa encontrar uma letra ou um número para catalogar cada aluno, mas pretende, recorrendo ao feedback efetivo, ajudar o aluno a identificar os seus erros de modo a conseguir corrigi-los, ajudando-o a assumir o controlo da construção da sua aprendizagem (Assessment Reform Group, 2002).

É tão mais importante esta perspetiva de avaliação quando se reconhece que os papéis dos professores e das escolas estão a mudar e também aquilo que se espera deles. É pedido aos professores que ensinem em salas de aula cada vez mais multiculturais, que integram alunos com necessidades educativas especiais, que recorram à utilização das tecnologias da informação e comunicação nas suas práticas de ensino, e que estejam envolvidos nos processos de avaliação e de prestação de contas ao mesmo tempo que incentivam os pais a participar na vida da escola (OCDE, 2014).

Para que o aluno aprenda é necessário que se comprometa com a construção da sua própria aprendizagem, isto é, que em vez de ficar passivamente à espera do conhecimento transmitido pelo professor deverá ser ele a construir o conhecimento e, sobretudo, ser capaz de o aplicar. Mas para termos alunos ativamente envolvidos na construção das suas aprendizagens é necessário termos um professor que dê esse espaço de autorregulação. Mais do que preparar para dar respostas “certas”, o professor deve apoiar os seus alunos para que sejam capazes de colocar questões que lhes permitam refletir e perceber qual a melhor resposta, que poderá variar em função dos enquadramentos ou das circunstâncias em que se coloca (Vieira, 2019).

A avaliação pode e deve ter um papel ativo no apoio à construção da aprendizagem (Popham, 2011). A avaliação realizada no dia-a-dia da sala de aula, que não visa obter uma classificação, mas antes encontrar as evidências que identificam as dificuldades reveladas pelo aluno ou que confirmam as aprendizagens construídas (Fernandes, 2011; Santos, 2009), proporciona informações que serão determinantes para orientar o trabalho a desenvolver pelo aluno e pelo professor (Hattie, 2012). A sala de aula é um excelente laboratório para perceber como os processos de ensino e de aprendizagem se cruzam e interagem e de que forma a avaliação apoia ambos (Fernandes, 2011). Vários autores têm referido a carência de conhecimento sobre o que acontece na sala de aula em geral (Hattie, 2012; Heritage, 2010) e sobre a avaliação formativa em particular (Fernandes, 2011; Popham, 2011; Santos, 2009).

O presente artigo baseia-se numa investigação que pretendeu compreender como duas professoras, uma de inglês e outra de matemática, implementam estratégias avaliativas, de que forma usam o erro e qual a importância e características do feedback formativo. Procurámos também perceber como são usadas pelos alunos de duas turmas de 12.º ano que lecionam, as estratégias avaliativas implementadas.

A avaliação com propósito formativo

Não faz qualquer sentido ver a avaliação como uma mera questão técnica, sustentada por um conjunto de instrumentos que se traduzem num número que valida ou não o trabalho desenvolvido ao longo do ano pelo aluno (Taras, 2005). Também não faz qualquer sentido continuar a ouvir os professores dizerem que a avaliação é a componente “odiada” da sua atividade profissional. Não só é imperativo que a avaliação deixe de ser vista de uma forma isolada e apenas com o objetivo de classificar e seriar os alunos, como é também necessário que os professores não se comportem como meros técnicos do ensino (Fernandes, 2011), que cumprem um currículo emanado superiormente e o desenvolvem de acordo com um planeamento decorrente da forma como o manual está organizado, medindo os conhecimentos e as capacidades dos alunos com instrumentos, poucos, produzidos a nível de escola e iguais para todos (Popham, 2011).

Muita da investigação realizada internacionalmente (por ex. Black & Wiliam, 1998; Hattie, 2012; Marzano & Pickering, 2011) tem realçado o importante e útil papel que a avaliação pode desempenhar na melhoria do processo de aprendizagem e de ensino. Ao informar sobre as dificuldades e progressos dos alunos é possível corrigir os erros, inverter os processos, reforçar estímulos, isto é, adequar estratégias às necessidades dos alunos no sentido de os levar a alcançar as metas traçadas, fechando o fosso entre o ponto de partida, variável entre os diferentes alunos, e o ponto de chegada, igual para todos, sem impedir que alguns consigam mesmo ultrapassar essas mesmas metas.

A utilização generalizada, a nível mundial, do termo avaliação formativa, muitas vezes com diferentes significados, levou ao aparecimento, no final dos anos 90, do termo “assessment for learning”. Acabaram por ser Stobart e Gipps (1997) que desenvolveram as duas expressões “assessment for learning” e “assessment of learning”. Estamos perante uma “avaliação para a aprendizagem” quando o objetivo da avaliação é promover as aprendizagens do aluno, dando informação sobre as que já foram adquiridas e aquelas que ainda não se concretizaram. Esta avaliação também informa o professor dando-lhe feedback sobre o seu ensino, o que está a dar resultado e o que tem que ser corrigido. Assim, enquanto na avaliação das aprendizagens o professor confirma e verifica o que os seus alunos aprenderam, no final de uma determinada unidade ou bloco, na avaliação para as aprendizagens pretende-se, à medida que esta decorre, identificar o que está aprendido permitindo avançar para novos desafios, e o que ainda não está e precisa de ser trabalhado pelo aluno, com a ajuda das estratégias que melhor se adequam à superação das dificuldades identificadas (Santos, 2016).

A avaliação formativa é comprovadamente apontada como um dos aspetos críticos do sucesso da escola e mais concretamente da sala de aula (Hattie, Masters & Birch, 2016; Wiliam, 2016). Muitas vezes, os professores não a realizam ou valorizam-na pouco por falta de conhecimentos, razão porque é fundamental trabalhar a chamada literacia avaliativa (Stiggins, 2017). Sendo uma das mais nobres funções da avaliação recolher evidências da aprendizagem dos alunos, não só para os orientar na condução da sua própria aprendizagem, mas também para ajudar a tomar decisões educativas, quer por parte do professor, quer mesmo a nível da escola, a avaliação formativa que se realiza no dia-a-dia da sala de aula não pode ser minimamente descurada porque dela depende o sucesso das aprendizagens dos alunos (Earl, 2013).

Apesar da enorme variedade de abordagens e da evolução do seu significado ou sentido, a avaliação formativa tem mantido, segundo Santos (2008, p. 16), uma função pedagógica, que não se limita à observação, mas ao desencadear de uma intervenção pedagógica (regulação) sobre o ensino e/ou aprendizagem, e destina-se a ajudar o aluno, e também o próprio professor, dando pistas de retorno através de informações múltiplas.

A par da sua intencionalidade de compreender e apoiar o aluno regulando a forma como decorre a aprendizagem, será de realçar a presença de uma avaliação com intenção reguladora no quotidiano da sala de aula e não apenas em determinados momentos formais de avaliação durante o ano letivo (Santos, 2016). Ocupando um papel de relevo no processo de aprendizagem e ensino, a avaliação formativa acompanha a evolução qualitativa do aluno fornecendo-lhe o feedback que informa sobre as aprendizagens alcançadas e apoiando a ação do professor na seleção de outras práticas de ensino que permitam ao aluno ultrapassar as dificuldades diagnosticadas. Mas para além da melhoria das aprendizagens, Black e Wiliam (1998) constataram também a melhor prestação em provas externas, exames, quando os alunos convivem de forma sistemática com a avaliação formativa na sala de aula.

A evolução da avaliação tem sido acompanhada de uma alteração da forma como o professor se posiciona, face aos erros dos seus alunos – erro para punir ou erro para diagnosticar? (Pinto, 2000). Não basta apontarmos o erro, é preciso identificar a sua causa pois só assim é possível ao professor adequar o seu ensino às necessidades de aprendizagem do aluno e a este tomar consciência dos seus erros de modo a poder corrigi-los (Luckesi, 2011). O erro assume uma grande valia no processo de aprendizagem e ensino, muito para além da simples classificação da prestação do aluno, ao promover a reflexão e, com ela, a reconstrução da própria aprendizagem. Os erros detetados durante a recolha de informações devem ser encarados como parte integrante da aprendizagem e ser aproveitados para revelar a natureza das representações lógicas e estratégias elaboradas pelo aluno (Wiliam, 2011). Atualmente muitos autores defendem que é melhor cometer erros durante a aprendizagem do que não os cometer (Wiliam, 2016).

Quando o aluno erra, deve ser orientado no sentido de chegar à resposta certa. Mas para que tal ocorra, a sala de aula tem que ser um espaço de pesquisa e de exploração e não um “pronto a consumir” onde o aluno recebe a resposta certa porque é aquela que é aceita pelo professor. Ao invés de se concentrarem em exercícios de repetição ou de memorização, os professores devem orientar os seus alunos para que eles próprios desbravem o caminho que os levará à resposta pretendida, obtida a partir da discussão das várias possibilidades apresentadas pelos alunos. A este, Sadler et al. (2013) chamam o “método socrático” de ensinar. Ao contrário de fazer um julgamento ou um aconselhamento, o professor deve fornecer uma informação objetiva e rigorosa sobre a forma como foi desempenhada uma tarefa que visava a cumprir um determinado objetivo.

O feedback gerado no diálogo entre professor e alunos é um elemento essencial na avaliação formativa, e o seu efeito depende, em grande parte, da forma como os alunos o usam e do contexto em que ele ocorre, pois o feedback, só por si, não tem qualquer efeito (Black & Wiliam, 1998). Dar feedback vai muito além de fornecer informação sobre o que já foi aprendido em relação aos objetivos previamente delineados. Visa também a que os alunos entendam como ultrapassar as dificuldades ou atrasos identificados (Hattie & Timperley, 2007).

Sadler (1989) identificou três condições que considerou indispensáveis para que os alunos possam se beneficiar do feedback: compreender claramente o objetivo que devem atingir; perceber onde se posicionam face ao objetivo a atingir – para que essa perceção ocorra deve estar documentada em evidências; entender as orientações, que devem ser claras e objetivas, sobre a forma de ultrapassar a décalage entre “onde está” e “onde deve chegar”. Este autor defendeu ainda a associação da qualidade do feedback à capacidade de autoavaliação dos alunos. Santos (2008) reforça a importância de um feedback com funções reguladoras, alertando para algumas características desejáveis no feedback ou escrita avaliativa:

- ser clara, para que autonomamente possa ser compreendida pelo aluno;

- apontar pistas de ação futura, de forma que a partir dela o aluno saiba como prosseguir;

- incentivar o aluno a reanalisar a sua resposta;

- não incluir a correção do erro, no sentido de dar ao próprio a possibilidade de ser ele mesmo a identificar o erro e a alterá-lo de forma a permitir que aconteça uma aprendizagem mais duradoura ao longo do tempo;

- identificar o que já está bem feito, no sentido não só de dar autoconfiança, como igualmente permitir que aquele saber seja conscientemente reconhecido. (p. 18)

Metodologia

Desenvolvemos uma investigação de natureza qualitativa, com design de estudo de caso. Integrado no paradigma construtivista-interpretativo, o estudo de caso é um tipo de investigação etnográfica que tem como objetivo chegar a uma descrição pormenorizada que nos permita compreender uma determinada entidade ou acontecimento (Aires, 2011).

Participaram deste estudo duas professoras de uma mesma escola secundária do 3.º ciclo do ensino básico dos arredores de Lisboa, Leonor e Ilda. Uma vez que conhecer em profundidade práticas avaliativas voltadas para o aprender era o objetivo desta investigação, estas professoras foram selecionadas pelo trabalho que têm realizado na sua sala de aula, reconhecido por alunos e pares como um ensino inovador e de qualidade.

Foram selecionadas por conveniência duas turmas de 12.º ano do agrupamento de ciências e tecnologias. A turma de inglês, lecionada por Leonor, contava com 17 alunos, 8 raparigas e 9 rapazes. Sendo a disciplina de inglês optativa, foi escolhida por estes alunos pela facilidade que diziam sentir na sua aprendizagem. A média da turma de catorze valores, tanto no 10.º, como no 11.º ano, levou os alunos a acreditar numa boa classificação e, consequentemente, na melhoria da média final de curso, facilitando, deste modo, a sua candidatura ao ensino superior.

A turma de matemática, lecionada por Ilda, contava com 29 alunos inscritos, 19 raparigas e 10 rapazes, sendo esta disciplina específica e de frequência obrigatória, nesta área de estudos, sujeita a um exame realizado a nível nacional e com um peso muito elevado na seriação dos alunos no acesso ao ensino superior.

A coleta de dados realizou-se, durante todo o ano letivo de 2015/16, a partir da observação, com registro áudio de duas aulas semanais de cada disciplina, completada com um diário de campo. Foram ainda recolhidos dados a partir de entrevistas, com registro áudio, aos alunos com três grupos focais de inglês e cinco grupos focais de matemática, realizadas no final do ano letivo e de duas entrevistas semiestruturadas a cada professora, uma no início e outra no final do ano letivo. Os dados referidos foram complementados com outros documentos e diversos tipos de materiais usados pelas professoras. Esta longa permanência na sala de aula, realizada com a devida autorização e com respeito pelos princípios éticos que regem uma investigação desta natureza, em um contacto próximo com o trabalho desenvolvido por alunos e professora, permitindo e ouvindo a expressão livre dos participantes, possibilitou-nos a compreensão, sistemática e profunda do que lá se passava (Aires, 2011). Ao longo da investigação, a partir da triangulação dos dados recolhidos, colocamo-nos numa atitude não só de observar e de ouvir, mas também de interpretar, na linha do defendido por Stake (2005), mantendo sempre a postura ética que se exige, em respeito pelos vários participantes (Gibbs, 2012) e pela qualidade da investigação.

Depois de realizada a transcrição das entrevistas e de partes das aulas observadas e organizados os diários de campo, foi dividido o texto em segmentos de modo a facilitar a sua análise e associação à respetiva categoria, a abordagem do erro ou o feedback. Para este processo, recorremos ao software informático de análise e tratamento de dados qualitativos NVivo11.

Leonor, uma professora de inglês

Breve apresentação. Com um exercício de 33 anos de atividade docente, a maior parte a lecionar a disciplina de inglês, no 3.º ciclo do ensino básico e no ensino secundário, a professora Leonor exerceu também vários cargos de liderança, nomeadamente o de presidente de comissão instaladora e de conselho diretivo. Exerceu ainda lideranças intermédias em nível de projetos e clubes escolares que a levaram a desenvolver intercâmbios nacionais e internacionais. De realçar ainda o exercício do cargo de diretora de turma numerosas vezes e o de coordenadora de departamento de línguas estrangeiras, que se encontrava a desempenhar à data da investigação. Apesar de várias funções e tarefas que desenvolveu, elegeu os alunos como sendo o que mais a motivam no exercício da sua atividade profissional:

O mais importante são os alunos. As pessoas costumam dizer que uma escola sem alunos é uma escola vazia, mas eu acho que se os alunos estão na sala de aula sossegadinhos na sua cadeira, quase só mexendo os olhinhos para acompanhar o professor e a mão para escrever também torna uma escola vazia. (Leonor, entrevista inicial)

Esta perspetiva de Leonor é bem traduzida pelos seus alunos. Senão vejamos. No início do ano letivo os alunos esperavam, nesta disciplina, obter bons resultados, sem necessidade de muito trabalho:

A minha escolha de inglês aconteceu porque já era boa aluna em inglês. À partida estaria garantida uma boa nota, muito importante para aumentar a média de acesso, sem necessidade de estudar ou estudando apenas um pouco na véspera dos testes. (Júlia, Entrevista I1)

Mas, na verdade, os alunos concluíram que trabalharam muito, fruto de um forte envolvimento nas tarefas que lhes eram propostas, essencialmente pelas características dessas mesmas tarefas:

Os meus níveis de confiança e motivação foram crescendo ao longo do ano à medida que me ia envolvendo em novos projetos, culminando num projeto final que me deu uma enorme satisfação por tudo o que consegui realizar. (Berta, aula 25 maio)

[…] este ano investi muito mais tempo e esforço na disciplina porque os trabalhos davam-me motivação para esse investimento. (Raquel, aula 25 maio)

A organização dos alunos em grupos flexíveis, onde a interação e a negociação foram permanentes, resultou numa sala de aula onde os alunos mudavam de lugar em função do grupo de trabalho onde estavam inseridos, revelando-se uma estratégia importante implementada por Leonor:

As aprendizagens não foram só ao nível da língua porque tivemos que aprender a trabalhar em equipe e ainda por cima com a equipe sempre a variar. (Rodolfo, entrevista I3)

Abordagem do erro. A forma como Leonor abordou os erros dos seus alunos foi um aspecto muito marcante da sua sala de aula. Fez questão de esclarecer os seus alunos quanto à forma como encarava o erro. Ao não entender os erros como fracassos, incentivou-os a participar porque só dessa forma estariam a aprender:

Nesta sala de aula, os erros que cometerem não vão ser usados para vos penalizar. Pelo contrário, é mais importante que participem e cometam erros, do que não participem de todo. (Leonor, aula 23 setembro)

Esta sua mensagem parece ter sido compreendida pelos alunos:

[…] em relação aos possíveis erros, a professora deixou-nos muito à vontade logo desde o início do ano e isso ajudou muito a soltar mesmo os alunos mais tímidos. (Palmira, entrevista I2)

Assim, na aula de Leonor era importante que os alunos tentassem identificar os seus erros, muitas vezes apoiados pela própria professora ou por um colega. Mas a autocorreção acontecia igualmente:

Muitas vezes nem são os colegas nem a professora que fazem as correções, somos mesmo nós que corrigimos os erros que cometemos porque nos apercebemos deles ou porque reparamos em alguma reação que nos alertou para o erro que cometemos. (Berta, aula 25 maio)

O feedback. Leonor atribuiu uma grande importância à identificação das dificuldades ou dos erros cometidos pelos alunos, não para os penalizar, mas antes para lhes proporcionar pistas que lhes permitissem ultrapassar os erros. Essa informação fornecida ao aluno, que se apresenta como um componente fundamental da avaliação formativa, é o feedback formativo:

Depois de realizarem o brainstorming em grupo, com o objetivo de procurarem em conjunto algumas respostas para as dúvidas sobre como desenvolver a tarefa, vou circular pelos grupos para que me coloquem as questões que entenderem. (Leonor, aula 21 outubro)

A professora deu uma grande atenção à forma como fomos desenvolvendo o trabalho e não apenas ao produto final e essa postura obrigou-nos a ser mais cuidadosos nos passos que íamos seguindo. (Efigénio, entrevista I1)

Só por si o feedback usado de forma isolada, ou apenas para confirmar que o aluno está a seguir o caminho correto, tem pouco efeito, mas na aula de inglês, onde a cultura avaliativa instalada tinha uma função essencialmente formativa, o feedback foi muito entendido como a crítica construtiva para apoiar a aprendizagem dos alunos:

Para todos os grupos, a professora realçou a importância de elaborarem resumos claros e sucintos para que o grupo encarregue da análise crítica pudesse captar o caminho percorrido na produção do trabalho e elaborar um critical thinking correto e útil. (Diário de Campo, 17 fevereiro)

[…] ajuda o fato de recebermos críticas construtivas, tanto por parte da professora, como dos colegas, pois isso também nos ajuda a melhorar. (Cristiano, entrevista I1)

O feedback pode ser fornecido recorrendo a diferentes estratégias. Na aula de inglês, Leonor utilizou a plataforma Moodle e o email como recursos para orientar os alunos:

A única forma de entregarem os vossos trabalhos, sempre, é colocando-os na plataforma Moodle. Eu vou lá, vejo os trabalhos e dou feedback sobre os mesmos no fórum respectivo. Será através da plataforma, onde eu própria lançarei as várias tarefas e projetos, que vocês vão receber feedback em todas as atividades e trabalhos da disciplina. (Leonor, aula 23 setembro)

[…] as comunicações feitas através de e-mail, com a professora ou com os colegas, tanto para esclarecer dúvidas como para acordar procedimentos, foram sempre feitas em inglês. (Diário de Campo, 17 fevereiro)

Com uma forte aposta no desenvolvimento das competências de comunicação oral, houve, por parte de Leonor, um incremento do feedback formativo, dado oralmente e de imediato, acompanhando todas as realizações dos alunos:

Um grupo abordava as questões do self em Fernando Pessoa só que eles chamavam-lhe mind. Com a minha intervenção eles conseguiram perceber a diferença entre ambas e perceber porque, neste caso, se tratava do self. (Leonor, entrevista inicial)

Uma característica importante do feedback fornecido por Leonor foi a preocupação em não dar ao aluno a solução, mas antes proporcionar-lhe pistas que o ajudasse a corrigir erros ou a encontrar novos caminhos para ultrapassar dificuldades:

Quando identifico algo que o aluno fez mal, devo dar-lhe as pistas para que ele progrida corrigindo o que fez mal. […] Quando os alunos me disseram que queriam reformular, eu imediatamente senti que tinha que lhes dar pistas para que eles conseguissem arrancar. (Leonor, entrevista final)

Na sua sala de aula, Leonor não foi a única a proporcionar feedback. Muito do feedback que os alunos receberam, relativo às suas prestações, foi fornecido pelos seus pares:

[…] este ano estavamos constantemente a interagir e às vezes também por escrito, por e-mail ou pela plataforma Moodle, mas na sala de aula a comunicação oral era permanente, tanto com os colegas, como com a professora. (Henriqueta, entrevista I3)

O próprio feedback dado pelos nossos colegas também foi muito importante e de uma grande ajuda para melhorar a qualidade dos nossos trabalhos. (Efigénio, entrevista I1)

Segundo Leonor, a forma como os alunos reagiram ao feedback da professora forneceu-lhe informação importante para o desenvolvimento do processo de aprendizagem e ensino: “Para mim, o feedback [reação] que recebo dos alunos é fundamental, para que possa delinear as minhas estratégias de intervenção” (Leonor, entrevista final).

Leonor conseguiu, na sua sala de aula, ultrapassar o papel tradicional de usar o erro para penalizar a classificação do aluno, para ser a comentadora do trabalho dos seus alunos, numa perspetiva formativa, permitindo-lhes avançar na construção da sua aprendizagem e, dessa forma, encontrar o verdadeiro sentido para a sua ação como professora educadora.

Ilda, uma professora de matemática

Breve apresentação. Professora de matemática há 17 anos, Ilda tem lecionado o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário na escola onde se mantém há mais de uma década. Fez questão de salientar na entrevista inicial que participar desta investigação seria uma mais-valia para si por lhe permitir realizar uma importante reflexão sobre o seu percurso, as suas práticas e a evolução que foi acontecendo desde que iniciou a profissão. Apesar de ter exercido vários cargos, nomeadamente coordenadora do departamento de matemática e coordenadora do Projeto “Mais Sucesso”, aquele que mais lhe agradou foi o de diretora de turma. A sua prioridade tem sido o trabalho com os seus alunos, que emergiu como claro no seu discurso, desde o início:

A minha prioridade é a minha sala de aula apesar de aquilo que faço fora da sala, nomeadamente em termos de formação, tenha uma grande influência no trabalho que desenvolvo na sala de aula. (Ilda, entrevista inicial)

Um aspecto muito marcante desta disciplina foi o fato de os alunos terem que realizar um exame nacional no final do ano letivo, cujo resultado para muitos será determinante na hora de se candidatarem ao ensino superior, como é reconhecido quer por Ilda, quer pelos alunos:

A minha grande preocupação em preparar os alunos para o exame deve-se única e simplesmente ao fato de o exame existir (risos) e ser determinante para o curso onde vão ingressar. (Ilda, entrevista final)

Não tenho dúvidas que os testes são importantes para a professora porque é importante que nós consigamos reagir em momentos de pressão porque também estamos a ser preparados para um momento com muita pressão e que vai ser determinante para nós que é o exame. (Sónia, entrevista M2)

Importante realçar o envolvimento dos alunos nas tarefas matemáticas, quer as realizadas nas aulas onde trabalhavam majoritariamente em pares, quer autonomamente fora das aulas:

Responder a uma ficha em pares é muito mais favorável a uma melhor aprendizagem porque obriga a que vamos discutindo e argumentando cada resposta e também vamos aprendendo com o colega. (Isaías, entrevista M1)

A professora não anda atrás de nós a ver se fizemos o trabalho de casa nem isso faria sentido porque ela diz que não obriga ninguém a trabalhar em casa mas, na verdade, é a única disciplina em que trabalhamos todos os dias em casa porque isso nos dá prazer. (Cátia, entrevista M5)

Este envolvimento dos alunos foi fruto das estratégias intencionais implementadas por Ilda:

[…] gosto muito, deixar os alunos à vontade para explicarem o seu raciocínio, mostrarem como pensam, mostrando o seu envolvimento na tarefa que estão a realizar. (Ilda, entrevista inicial)

A professora de matemática estimula e incentiva a nossa procura do caminho certo. (Bárbara, entrevista M3)

Abordagem do erro. Houve uma clara preocupação de Ilda em mostrar aos alunos o importante papel do erro na construção das suas aprendizagens. Em todos os momentos em que ocorria avaliação formativa, uns mais formais, “[…] gosto de fazer uma avaliação diagnóstica no início da unidade, curta mas focada nos aspectos que considero fundamentais” (Ilda, entrevista inicial), outros mais informais, “a professora foi avaliando formativamente os conhecimentos prévios dos alunos e a forma como acompanhavam e processavam os novos conceitos introduzidos nesta aula, o que permitiu fazer um bom diagnóstico da turma” (Diário de campo, aula 26 novembro), o erro era tratado como algo que não deveria ser escondido nem temido, dado dar informações muito úteis tanto para os alunos como para a professora:

Às vezes até percebo antecipadamente que vai sair disparate, mas até é bom que isso aconteça para que percebam que há espaço para todos na aula e serve para os obrigar a refletir sobre os disparates e a procurarem a sua resolução. (Ilda, entrevista inicial)

A maior parte dos professores só identifica o certo e o errado e não percebe que mesmo aquilo que parece errado pode envolver raciocínios ou conceitos que estão corretos. Na aula de matemática os erros foram importantes para a nossa aprendizagem. (Vanessa, entrevista M2)

A professora Ilda recorreu ao erro como uma estratégia intencional para superar dificuldades dos alunos, tendo-o usado como fonte de informação para o trabalho a ser realizado com eles:

Como a professora foi circulando enquanto os alunos trabalhavam, foi-se apercebendo de erros, imprecisões, desatenções, que sistematizou e corrigiu depois para todos. (Diário de campo, aula 28 abril)

A professora Ilda deixa-nos muito à vontade para errar. Por acaso nunca tive um professor que lidasse tão bem com os nossos erros e que os usasse para identificar as dificuldades que deveríamos ultrapassar e não para nos penalizar. (Camila, entrevista M1)

Por vezes, o erro, identificado pela professora, originava o feedback que orientava o aluno para a correção desse erro. Noutras ocasiões, eram os colegas, principalmente nas situações de trabalho em pares, que identificavam o erro:

Desde o 10.º ano com a professora Ilda, mesmo que não tenha a certeza se está bem, não me importo de ir ao quadro porque, se não estiver bem, a própria professora ou os colegas assinalam o que não está bem. (Sandra, entrevista M4)

[…] quando dizemos algo errado na aula de matemática a professora, ou às vezes até mesmo os colegas, vão dando pistas para ver se chegamos à resposta certa. (Heitor, entrevista M1)

O erro, depois de trabalhado, segundo Ilda, deveria levar o aluno a não voltar a cometê-lo em tarefas avaliativas agora com um propósito somativo, porque aí o erro já seria usado para penalizar:

Na próxima questão de aula, se voltarem a cometer esse erro, que já está assinalado e para o qual já devem estar alerta, serão penalizados em termos de classificação. (Ilda, aula 15 outubro)

O feedback. Na sua aula, Ilda procurou sempre a interação com os alunos para lhes proporcionar uma orientação que os ajudasse a realizar tarefas que colocam novas exigências. Muito mais importante do que dizer como fazer, foi ajudar os alunos a descobrir o caminho e, muitas vezes, os vários caminhos possíveis:

Todos os passos foram acompanhados pelos alunos com propostas de resolução ou dúvidas pelo caminho seguido e, em simultâneo, iam respondendo às pequenas questões constantemente lançadas pela professora. (Diário de campo, aula 10 dezembro)

Os percursos seguidos pelos alunos eram muito importantes para Ilda perceber o seu raciocínio e, a partir daí, fornecer o feedback mais apropriado para aquele aluno, de modo a que ele conseguisse avançar para um melhor desempenho futuro partindo de onde estava:

Já tive professores que resolviam no quadro o exercício e diziam-nos “isto é assim que se resolve, agora passem para o caderno” e já está! Com a professora Ilda não é assim. Somos nós que vamos descobrindo o caminho para resolver o exercício e ela está sempre a recordar o que já foi dado nos 10.º e 11.º anos e que está na base do que vamos aprendendo de novo. (Joana, aula 5 abril)

A interação de Ilda com os seus alunos, na aula, fora da aula ou mesmo a distância, foi constante ao longo do ano letivo. Apesar disso, Ilda continua a sentir dificuldades em gerir o tempo necessário para fornecer aos alunos o feedback que ela própria considera muito importante:

Eu, com quatro turmas, vejo-me aflita. Agora imagino colegas com sete e nove turmas! Como é possível acompanhar tantos alunos, nem conhecê-los, quanto mais identificar o que aprendem ou não. (Ilda, entrevista inicial)

Apesar de a professora Ilda referir o elevado número de turmas como um considerável obstáculo para proporcionar o feedback indispensável a um percurso de sucesso na construção da aprendizagem, os alunos não deixaram de realçar a quantidade e qualidade do feedback que receberam em matemática como um aspecto muito positivo e diferenciador desta professora, contrastando com o que tiveram ao longo da sua escolaridade:

Recebi muito feedback e de forma muito variada, verbalmente na aula, no final da aula, na aula de apoio, ou por escrito, na ficha, no teste, por email, por mensagem, no facebook. De fato, se há estratégia usada às carradas pela professora, é claramente o feedback (risos). (Jacinta, entrevista M2)

A professora está sempre disponível para se encontrar com alguém para esclarecer uma dúvida e isso acontece com muita frequência principalmente através do email ou do facebook. A resposta da professora a uma dúvida através do facebook acaba por ser útil a outros alunos. (Álvaro, entrevista M4)

Em matemática, olhar para o resultado final do trabalho do aluno apenas informa se ele está certo ou está errado e, neste caso, é necessário corrigi-lo, mas nestas aulas eram solicitadas aos alunos tarefas onde eles mostravam o seu raciocínio, o que dá trabalho e consome tempo a analisar, mas só o percebendo era possível a Ilda proporcionar-lhes um feedback adequado.

Discussão

Leonor e Ilda procuraram transmitir sempre aos seus alunos que o erro ajuda a identificar o que já está aprendido e o que necessita ainda de ser trabalhado. Os alunos de ambas as turmas não deixaram de realçar esta ideia como sendo algo novo para eles, porque estavam muito habituados a serem penalizados quando cometiam erros, o que foi um importante fator de motivação para um maior envolvimento nas tarefas (Earl, 2013).

Na aula de Leonor, os alunos sentiram os erros como algo natural, muitas vezes identificados em primeiro lugar pelos pares e só quando lhes escapava seriam identificados pela professora. Ilda incentivou os alunos a partilharem com a turma os seus erros e dificuldades (Sadler et al., 2013), não só na sala de aula, mas também nas redes sociais, através de grupos privados. Esta atitude positiva de ambas as professoras, face aos erros cometidos pelos seus alunos (Lorenzet, Salas & Tannenbaum, 2005), levou-os a entender os seus próprios erros e os dos pares como algo natural no processo de construção da aprendizagem e não como um estigma ou algo de que tivessem vergonha.

O feedback formativo fornecido aos alunos, usado muitas vezes para facilitar a correção dos erros, ocupou muito do tempo destas duas professoras, tanto do tempo útil de aula, como do tempo de trabalho individual, tornando-se determinante para o sucesso dos seus alunos, na linha do que tem sido defendido por muitos investigadores (Black & Wiliam, 1998; Dias & Santos, 2010; Hattie & Timperley, 2007), que consideram o feedback como um dos aspectos com maior influência na construção da aprendizagem.

As interações constantes e um apoio aos alunos para que corrijam os próprios erros foram características comuns a estas duas salas de aula. O feedback oral, dado de imediato, permitiu a ambas as professoras chegarem aos seus alunos rapidamente (Santos, 2008). Na disciplina de inglês, Leonor proporcionou um grande apoio no desenvolvimento das competências de oralidade, indispensáveis numa segunda língua. Na disciplina de matemática, Ilda recorreu frequentemente ao feedback oral para apoiar os alunos quando realizavam trabalho em pares dentro da sala de aula, mas também recorreu muito ao feedback escrito, principalmente a distância através de email ou das redes sociais, permitindo responder às muitas solicitações dos alunos quando realizavam trabalho autônomo fora da sala de aula.

Fundamental para a construção de tanto e tão variado feedback foi sem dúvida o grande conhecimento que Leonor e Ilda tinham dos seus alunos, não só das competências acadêmicas, mas também dos interesses, motivações e necessidades (Hattie, 2012). Esse conhecimento foi sendo construído pelas professoras com estratégias muito intencionais, permitindo-lhes perceber como conseguiriam chegar mais facilmente aos seus alunos. Outra estratégia comum a ambas foi terem levado os seus alunos a serem importantes recursos para os pares, embora a organização da sala de aula tenha sido completamente distinta. Na aula de inglês, à exceção da primeira tarefa onde fizeram a sua apresentação individual, os alunos trabalharam sempre em grupos flexíveis com estes a variar constantemente, tanto no número de alunos como na sua constituição (Brulles & Brown, 2018), organizando-se em redor dos computadores. Na aula de matemática, distribuídos por quatro filas, os alunos trabalharam essencialmente a pares, mantendo essas parcerias e esses lugares, escolhidos por eles, ao longo de todo o ano.

Por último, é de fazer notar que o recurso de entrevistas com grupos focais a que os alunos aderiram massiva e entusiasticamente, que identificamos como um aspecto que consideramos determinante para o sucesso desta investigação, permitiu recolher informação relevante sobre as suas vivências ao longo do ano letivo, que eles próprios acabaram muitas vezes por comparar com outras vivências ao longo da sua escolaridade. Os alunos puderam exprimir o que sentiam e narrar as perspectivas do que vivenciaram enquanto participantes ativos na construção da sua própria aprendizagem. A importância destas entrevistas também foi realçada pelos alunos quando muitos deles manifestaram a sua satisfação por terem sido ouvidos numa reflexão organizada e orientada, o que nunca tinha acontecido antes. Uma das dificuldades sentidas no início da investigação foi a falta de treino dos alunos na construção de uma aprendizagem onde a avaliação formativa acontecesse para orientar o processo de aprendizagem e ensino. À medida que os alunos se foram familiarizando com os conceitos chave da avaliação formativa, foi-se tornando mais fácil a sua abordagem.

Considerações finais

A sala de aula é um excelente contexto para perceber como os processos de ensino e de aprendizagem se cruzam e interagem e de que forma a avaliação apoia ambos (Fernandes, 2011), informando o aluno sobre a evolução da sua aprendizagem, dandolhe as ferramentas para que assuma o comando dessa construção (Vieira, 2019), mas também informando o professor sobre a evolução da aprendizagem de cada um dos seus alunos para que, a partir daí, possa introduzir na sua prática de ensino as adaptações que se mostrem necessárias e oportunas (Stiggins, 2017). Foi esta ideia que nos levou a observar a sala de aula de forma sistemática, em duas aulas semanais de cada disciplina, do início até ao final do ano letivo.

A investigação que realizamos sustentou conclusões de vários investigadores que têm procurado um maior conhecimento empírico do que é o avaliar para aprender:

• a avaliação formativa pode ser concretizada em qualquer sala de aula, independentemente do currículo ou das características das matérias e de estarem ou não sujeitas a exame nacional (Fernandes, 2011; Popham, 2011);

• a avaliação formativa faz parte integrante do processo de aprendizagem e ensino e deve acompanhar a sua evolução, ao contrário da ideia de que é algo mais que se vai acrescentar ao que já se faz (Gipps & Stobart, 2003; Santos et al., 2010; Wiliam, 2016);

• por fazer parte integrante do processo de aprendizagem e ensino, a avaliação formativa influencia a forma como e quanto os alunos aprendem, razão pela qual mudar a forma de avaliar implica mudar toda a prática pedagógica (Earl, 2013; Stiggins, 2017).

As conclusões deste estudo apontam para duas professoras, Leonor e Ilda, que, muito embora estejam a lecionar o 12.º ano, apoiam os seus alunos com uma prática de avaliação formativa continuada, orientada para o apoio à aprendizagem. Esta prática é tão mais importante se tivermos em conta que os conhecimentos que se adquirem na escola podem já estar obsoletos quando os alunos chegam ao mercado de trabalho, razão pela qual a mais importante competência a ser trabalhada, bem patente nas aulas observadas, é o aprender a aprender, acompanhada de uma constante postura de questionamento que permita ao aluno procurar caminhos e respostas diferentes para problemas diversos. É essa necessidade de encontrar novas respostas para situações diferentes que dá à educação características muito distintas do treino. Não basta trabalhar para desenvolver capacidades, é necessário proporcionar a cada aluno as condições para que desenvolva novas competências, que lhe permita dar resposta a novas exigências. O que o professor faz na sala de aula é o principal fator que determina a aprendizagem e o sucesso dos alunos (Hattie, 2012).

Quando o professor consegue, na sua sala de aula, ultrapassar o papel tradicional de “caçador de erros”, passando a comentador do trabalho dos alunos, numa perspetiva formativa, porque permite chegar sempre mais à frente, encontra o verdadeiro sentido para a sua ação como educador: levar os seus alunos a serem os construtores da aprendizagem.

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Aceito: 10 de Julho de 2019

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