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Linhas Críticas

versión impresa ISSN 1516-4896versión On-line ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.26  Brasília ene./dic 2020  Epub 14-Oct-2020

https://doi.org/10.26512/lc.v26.2020.32073 

Artigos

Autorregulação de aprendizagens e o desempenho acadêmico no ensino superior

Autorregulación del aprendizaje y el desempeño académico en la educación superior

Self-regulation of learning and academic performance in higher education

Autorégulation de l'apprentissage et des performances académiques dans l'enseignement supérieur

Juana de Carvalho Ramos Silva1 
http://orcid.org/0000-0001-6387-0503

Carolina Fernandes de Carvalho2 
http://orcid.org/0000-0003-1793-2288

1Mestre em Educação pelo Instituto Politécnico de Santarém, doutoranda em Psicologia da Educação pela Universidade de Lisboa, bolsista da Fundação para Ciência e Tecnologia, investigadora de temáticas referentes a Psicologia da Educação, especificamente quanto a autorregulação das aprendizagens e feedback no âmbito do Ensino Superior.

2Doutorada em Educação na especialidade de Psicologia da Educação pela Universidade de Lisboa, professora no Instituto de Educação desta Universidade e membro integrado da Unidade de Investigação e Desenvolvimento em Educação e Formação. Investigadora em diferentes projetos nacionais e internacionais com vários artigos e capítulos publicados na área da Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento.


Resumo

Na educação, a autorregulação envolve diferentes aspectos de monitorização, volição e ações direcionadas à realização de objetivos. Pretende-se verificar a fiabilidade e a validade de um instrumento de autorregulação da aprendizagem para estudantes do ensino superior e identificar como esta se relaciona com o desempenho acadêmico. Participaram 516 estudantes de Institutos Federais do Brasil que responderam a um questionário on-line. O questionário revelou índices adequados de ajustamento psicométrico e a autorregulação explica significativamente o desempenho acadêmico dos estudantes [1] .

Palavras-chave Ensino superior; Estudantes do ensino superior; Autorregulação das aprendizagens; Desempenho acadêmico

Resumen

En educación, la autorregulación involucra diferentes aspectos de monitoreo, volición y acciones dirigidas a lograr objetivos. Lo objetivo es verificar la confiabilidad y validez de un instrumento de autorregulación del aprendizaje para estudiantes de educación superior e identificar cómo se relaciona con el rendimiento académico. 516 estudiantes de los Institutos Federales de Brasil participaron y respondieron un cuestionario en línea. El cuestionario reveló niveles adecuados de ajuste psicométrico y la autorregulación explica el rendimiento académico de los estudiantes.

Palabras clave Educación superior; Estudiantes de educación superior; Autorregulación del aprendizaje; Rendimiento académico

Abstract

In education, self-regulation involves different aspects of monitoring, volition and actions aimed at achieving goals. The study intended to verify the reliability and validity of an instrument of self-regulation of learning for students of higher education, and to identify how it relates to academic performance. 516 students from Federal Institutes of Brazil participated and answered an online questionnaire. The questionnaire revealed adequate levels of psychometric adjustment and self-regulation explains students' academic performance.

Keywords Higher education; Students; Self-regulation; Academic achievement

Résumé

Dans l'éducation, l'autorégulation implique différents aspects du suivi, de la volonté et des actions visant à atteindre les objectifs. L'étude vise à vérifier la fiabilité et la validité d'un instrument d'autorégulation de l'apprentissage pour les étudiants de l'enseignement supérieur et à identifier son lien avec les résultats scolaires. 516 étudiants des Instituts fédéraux du Brésil ont participé et répondu à un questionnaire en ligne. Le questionnaire a révélé des niveaux adéquats d'ajustement psychométrique et d'autorégulation explique de manière significative les résultats scolaires des élèves.

Mots clés Enseignement supérieur; Étudiants de l'enseignement supérieur; Autorégulation de l'apprentissage; Performance scolaire

Introdução

No Brasil, existem diferentes instituições ofertantes de ensino superior: as Universidades e Faculdades públicas e privadas e os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Os Institutos Federais enquadram-se como uma instituição pública de ensino superior e integram a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica. A Rede surge da transformação dos antigos Centros Federais de Educação Tecnológica, das Escolas Técnicas e Agrotécnicas Federais e das Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais e está enquadrada na Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Atualmente, existem 38 Institutos Federais distribuídos por todas as regiões do país (Silva et al., 2017).

Historicamente, a educação brasileira apresenta uma dualidade estrutural caracterizada pela existência de tipos diferentes de escola em função das classes sociais dos estudantes (Kuenzer, 2005). No ensino superior, os Institutos Federais surgem como uma opção de inclusão do público marginalizado do sistema educacional. Além dessa inserção de um público mais vulnerável no sistema educacional superior, atrela-se o viés da inclusão no universo profissional mais qualificado. Desta forma, criam-se condições para a emancipação e a transformação social destes cidadãos por meio de uma educação profissional e tecnológica de nível superior, considerando os arranjos produtivos e os aspectos sociais e culturais locais. Assim, segundo Turmena e Azevedo (2017), os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia surgiram na perspectiva de contribuição para o processo de modernização e desenvolvimento do Brasil, e deste modo, contribuir para uma maior equidade dos cidadãos no acesso e na frequência ao ensino superior.

No entanto, como alertam Almeida e Soares (2004), na generalidade dos países, a abertura progressiva do ensino superior a camadas mais heterogêneas da sociedade, passando-se de um ensino destinado às elites para um ensino destinado às massas, não significa uma democratização do sucesso dos estudantes que frequentam as instituições de ensino superior, uma vez que essas instituições ainda não se adaptaram para a nova realidade. Para os autores, tratou-se de uma democratização de acesso, faltando a democratização do sucesso.

O presente estudo faz parte de uma investigação mais ampla sobre estudantes do ensino superior brasileiro. Concretamente, as principais questões de estudo agora apresentado são. Como se comporta psicometricamente o instrumento destinado a avaliar a autorregulação em termos de sua adaptabilidade e fiabilidade para estudantes de cursos de licenciatura de Institutos Federais?; Como a autorregulação das aprendizagens dos estudantes explica a variância do desempenho acadêmico?; Como se diferencia a autorregulação dos estudantes de licenciatura dos Institutos em função do gênero e da idade e como afeta o desempenho acadêmico?

O sucesso dos estudantes do ensino superior não se traduz apenas no seu desempenho acadêmico, mas este pode comprometer o seu envolvimento nas atividades acadêmicas e explicar muito do abandono encontrado nos anos iniciais. O termo desempenho acadêmico tem diferentes significados, estando, um dos mais frequentes, associado aos resultados obtidos com a realização das atividades acadêmicas. Por exemplo, no contexto anglo-saxônico, Good e Kappa (1959, p. 7) consideram o desempenho acadêmico [academic achievement] como “knowledge attained or skills developed in the school subjects, usually designated by test scores or by marks assigned by teachers, or by both.” No mesmo sentido, encontramos a perspetiva da Encyclopedia of Positive Psychology (Lopez, 2009, p. 4), que considera “academic achievement refers to any measure of a student’s progress in a scholastic setting or in an academically related subject area.”

Segundo Oliveira et al. (2009), o desempenho acadêmico pode ser representado por um escore final em escalas numéricas de zero a cem, das letras E a A, ou ainda, com classificações como Péssimo, Regular, Bom e Ótimo na sequência da avaliação de tarefas acadêmicas realizadas pelos estudantes. Entendendo o desempenho acadêmico como rendimento e comportamento escolares, Sousa (1997) afirma que o desempenho acadêmico se concretiza quando o que o estudante aprendeu em sala de aula se incorpora a outros conhecimentos e competências prévias e se manifesta em avaliações. Assim, os estudantes são capazes de usar o que foi trabalhado e aprendido em novas situações, obtendo um resultado tido como satisfatório em relação ao seu desempenho acadêmico anterior.

O termo desempenho acadêmico associa-se a diversos fatores que se correlacionam e influenciam as realizações do estudante. Para Araújo (2002), o desempenho acadêmico depende de fatores da instituição – questões físicas (e.g. laboratórios, bibliotecas), pedagógicas (e.g. currículos, formas de avaliação) do professor (e.g. interação com os estudantes); fatores relacionados à família (e.g. o nível de escolaridade dos pais, a presença na trajetória escolar dos filhos); e fatores associados ao próprio estudante (e.g. como motivação, autoeficácia e autorregulação).

Para Almeida et al. (2001), o sucesso acadêmico – concretizado muitas vezes no elevado desempenho acadêmico traduzido por notas elevadas – deve ser considerado a partir de toda a experiência vivida pelo estudante no contexto educativo do ensino superior, incluindo não somente o seu desempenho cognitivo, mas também o afetivo e o social. Assim, o desempenho acadêmico é um constructo complexo que envolve diversas variáveis. Para Deci e Ryan (2008), o desempenho acadêmico pode ser promovido pelo professor que incentiva a autonomia, o envolvimento e o bem estar dos estudantes, concluindo “[…] experiences of autonomy, as well as of competence and relatedness, are important for effective performance and psychological health and well-being.” (Deci & Ryan, 2008, p.21).

Segundo Borkowski (1992), um bom desempenho acadêmico é aquele que promove a aprendizagem através da realização de tarefas e atividades escolares de forma eficaz.

Because the focus of instruction should be on each student's learning process, the teacher becomes adept at hypothesizing about how a student is processing information at any moment and modifies the teaching strategy to alter not only the course of learning but also cognitive development itself. (Borkowski, 1992, p. 256)

Na opinião de Freire (2009), numa sociedade onde a informação é diversificada, os estudantes devem estar capacitados a abstraí-la. Assim, a instituição de ensino deve não somente transmitir conhecimentos, mas principalmente, proporcionar aos estudantes uma aprendizagem baseada na compreensão, suscitando a independência, a autonomia, a criatividade e uma postura ativa. Compreendendo, dessa forma, a informação e atribuindo-lhe sentido pessoal, possibilitando a sua apropriação e aplicação futura. Dessa forma, o estudante também se transforma, conhecendo-se e tornando-se responsável por sua aprendizagem, inclusive, suscetível aos seus desdobramentos, sejam comportamentais, cognitivos ou afetivos.

Nesse sentido, Freire (2009) afirma que é salutar questionar as práticas de ensino adotadas para que se possa aprimorar a qualidade da aprendizagem e proporcionar a autorregulação aos estudantes. O ensino superior tem uma dinâmica diferenciada em comparação aos demais níveis de ensino, ou seja, é esperado do estudante, enquanto jovem adulto escolarizado por níveis anteriores, um comportamento autônomo e responsável por sua própria aprendizagem, por exemplo, no que tange à gestão do tempo, a leituras e a outras atividades de pesquisa propostas pelos professores (Maciel & Alliprandini, 2018). Nesse sentido, o estudante do ensino superior necessita desenvolver competências que facilitem a concretização do seu papel enquanto estudante autônomo, e posteriormente, enquanto profissional que é capaz de gerir eficazmente a sua necessidade de aprendizagem ao longo da vida.

Ser um estudante autônomo pressupõe conseguir autorregular as suas aprendizagens. O termo autorregulação [self-regulation], com origem na Teoria Social Cognitiva – TSC – de Albert Bandura (1986), refere-se a um conceito multifacetado e abrangente, utilizado em diversos contextos e áreas de conhecimento. Para Bandura (2008), o indivíduo é único e não há divisão entre mente e corpo, pode sofrer influências do meio em que vive, mas pode também influenciá-lo. A TSC assume um modelo interacional, no qual fatores pessoais, ambientais e comportamentais contribuem como fatores interdependentes que podem interagir uns aos outros, reciprocamente, de forma que o indivíduo contribua para a transformação do meio em que vive e dele receber influências, auxiliando seu processo de autodirecionamento – proporcionando controle em suas ações, pensamentos e vida (Bandura, 1986).

A partir da ideia de que fatores internos e externos contribuem para mudanças no comportamento, por intermédio do exercício do autodirecionamento, entende-se que o indivíduo exerce algum controle sobre seus pensamentos, sentimentos e ações, podendo, assim, regular as interações da reciprocidade entre influências externas e internas (Bandura, 1986). Desta forma, a autorregulação é considerada um construto fundamental para auxiliar no desenvolvimento e desempenho acadêmicos, salientando que o sucesso acadêmico está ligado ao comportamento do estudante, sem, contudo, abster-se de influências pessoais e ambientais (Bandura, 1991; Zimmerman, 2008).

A autorregulação é, portanto, um processo consciente e voluntário em que o sujeito desenvolve a gestão do próprio comportamento, dos sentimentos e pensamentos, utilizando-se de um modelo cíclico voltado para a obtenção de metas pessoais e padrões gerais de conduta (Bandura, 1991). No âmbito educacional, a autorregulação de aprendizagens aborda pensamentos, ações e sentimentos planejados e sistematicamente adaptados, quando necessário, para incrementar a motivação e a aprendizagem (Zimmerman, 2000). Segundo Rosário (2004), é um processo ativo no qual os estudantes estabelecem objetivos que buscam atingir por suas aprendizagens que são, por sua vez, monitorizadas, reguladas e controladas por suas próprias cognições, motivações e comportamentos.

Para Zimmerman (1989), a autorregulação das aprendizagens está relacionada ao grau de participação dos estudantes, de forma ativa na sua aprendizagem, nas dimensões metacognitiva, motivacional e comportamental. Um meta-processo que depende da participação ativa dos estudantes no desenvolvimento de competências acadêmicas e na seleção de estratégias de aprendizagem para realizar determinada atividade acadêmica (Pintrich, 2004; Zimmerman, 2000). Segundo Panadero e Alonso-Tapia (2014, p. 450), “Self-regulation is the control that students have over their cognition, behaviour, emotions and motivation through the use of personal strategies to achieve the goals they have established.”

Para que os estudantes desenvolvam uma aprendizagem autorregulada, é necessário proporcionar um espaço para reflexão sobre as suas dificuldades e seus progressos. O professor deverá realizar comentários que orientem os estudantes e que os levem a melhorar os seus desempenhos e as suas aprendizagens. “Contrary to conventional wisdom, self-regulation is not defined as an individualized form of learning because it also includes self-initiated forms of social learning, such as seeking help from peers, coaches and teachers.” (Zimmerman & Schunk, 2011, p.1).

A interação entre o compromisso, o autocontrole, a autonomia e a autodisciplina dos estudantes possibilitam regular ações visando alcançar seus objetivos de aprendizagem (Hattie, & Timperley, 2007). Assim, a autorregulação das aprendizagens exige persistência, esforço e tempo para que se consiga realizar as tarefas da melhor maneira possível, sendo que a componente motivacional é determinante nesse processo (Zimmerman & Moylan, 2009).

No ensino superior, a autorregulação das aprendizagens é um elemento essencial para o sucesso, pois permite que os estudantes sejam sujeitos ativos na gestão da sua própria aprendizagem e no desenvolvimento de competências para a vida (Fernández et al. 2013). A aplicação de estratégias de autorregulação das aprendizagens antecede um bom desempenho acadêmico (Broadbent & Poon, 2015). Pesquisas como a de Frison e Veiga Simão (2011) sobre a autorregulação da aprendizagem de estudantes do ensino superior ressaltam a necessidade de entender e de aprofundar os conhecimentos a respeito do estudante e das suas capacidades quanto à autorregulação da aprendizagem; à autonomia e à responsabilização pela sua formação acadêmica. Estudantes autorregulados tendem a ser mais organizados, esforçados, interessados e críticos, sendo capazes de estabelecer metas de estudo, analisar seu desempenho, persistir diante das dificuldades e identificar comportamentos que afetam a sua aprendizagem (Schunk & Zimmerman, 2008).

Método

O presente estudo tem como participantes estudantes de cursos de licenciatura de Institutos Federais de Educação do Brasil, voluntários que aceitaram participar dando o seu consentimento esclarecido. No total, responderam ao questionário 773 estudantes. Destes, foram excluídos da pesquisa: 206 estudantes (26,9%) por não cursar mais a licenciatura, seja por conclusão 136 (66%), seja por evasão 70 (34%); 2 por serem menores de idade; e 49 por responderem a menos de 90% dos itens do instrumento, reduzindo o número final para 516 sujeitos. Assim, a amostra final tem 516 participantes distribuídos por diversas regiões do Brasil conforme a Tabela 1.

Tabela 1 Distribuição de sujeitos por Instituto Federal 

Região Respostas Percentual
Centro-Oeste 297 57,5
Sul 131 25,5
Norte 63 12,2
Sudeste 25 4,8
Total 516 100

Fonte: autoras.

O maior número de participantes encontrava-se na região Centro-Oeste, sendo a distribuição dos estudantes por curso observada na Tabela 2. Conforme a tabela, o curso com maior número de participantes é Ciências da Natureza.

Tabela 2 Distribuição dos participantes por curso 

Curso

f

%

Ciências Agrárias

3

0,6

Ciências da Natureza/Biológicas

111

21,5

Computação

5

1,0

Dança

43

8,3

Educação do Campo

2

0,4

Física

23

4,5

Geografia

8

1,6

Informática

5

1,0

Letras

16

3,1

Letras Língua Estrangeira

63

12,2

Letras Língua Portuguesa

51

9,9

Licenciatura para Educação Profissional e Tecnológica

31

6,0

Matemática

41

7,9

Pedagogia

26

5,0

Programação Especial de Formação Pedagógica de Docentes

7

1,4

Química

81

15,7

Total

516

100,0

Fonte: autoras.

Quanto à idade dos estudantes, verificamos que varia entre os 18 e os 57 anos. Este intervalo explica a média de idade igual a 26,83 anos e o elevado valor do desvio padrão (DP = 8,97). Dos participantes, 68,4% são do sexo feminino.

No presente estudo foi utilizado como instrumento um questionário eletrônico autodeclarado, hospedado na plataforma on-line Survio. O instrumento era composto por três partes: 1) caracterização dos participantes: região, curso, idade, gênero; 2) informações do desempenho acadêmico – média obtida no semestre anterior, o número de reprovações e o número de matérias cursadas (para cálculo de índice de repetência pelo coeficiente entre eles); e 3) Escala de Avaliação de Estratégias de Aprendizagem EAEA-U de Boruchovitch e Santos (2015), numa versão de 22 itens onde se retiraram treze itens com semelhanças semânticas e de conteúdo a outros itens do instrumento global do questionário eletrônico. Esta opção surge para evitar que a extensão do questionário pudesse comprometer o seu preenchimento completo e obrigasse a uma anulação de respostas. Apesar deste cuidado, como foi referido, houve 49 sujeitos que não completaram a totalidade do questionário.

Para a realização da pesquisa, iniciou-se o procedimento solicitando a autorização às autoras para a utilização da Escala de Avaliação de Estratégias de Aprendizagem EAEA-U. No momento seguinte, protocolou-se a pesquisa na Plataforma Brasil para obtenção da autorização ética da Comissão Nacional de Ética em Pesquisas (CONEP), que forneceu parecer positivo. Na fase seguinte, foram convidados a participar os 38 Institutos Federais brasileiros. Destes, aceitaram participar institutos das regiões Norte, Sul, Centro-Oeste e Sudeste, consentindo a participação de seus estudantes por meio da liberação e utilização dos endereços eletrônicos dos graduandos para a coleta de dados no primeiro semestre letivo de 2019.

No total, foram enviados e-mails a 10.000 estudantes com o link do questionário on-line, conforme listagem de correios eletrônicos emitida pelas próprias Instituições. Todos os participantes deram o seu consentimento informado para participar no estudo. O instrumento foi enviado e disponibilizado para os estudantes durante o mês de julho de 2019, fim do primeiro semestre letivo brasileiro. Esse período de recolha dos dados foi escolhido de forma que os estudantes já tivessem ultrapassado o período de provas finais e tivessem obtido acesso às menções acadêmicas. Assim, os estudantes de todos os semestres, incluindo os do primeiro, puderam participar do estudo.

Resultados

Iniciou-se a análise dos dados com o estudo da estrutura fatorial do instrumento utilizado para avaliar a autorregulação da aprendizagem, começando-se por uma Análise Fatorial Exploratória (AFE). Os missing values foram imputados pelo método de Hot-Deck Multiple Imputation, como sugerido por Lorenzo-Seva e Van Ginkel (2016). Para avaliar a validade da realização de uma AFE nos 22 itens que conformam o instrumento, foi observado se as variáveis eram homogêneas e se existiam correlações entre os itens. Na avaliação da homogeneidade das variáveis, utilizou-se o critério KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) com a classificação definida em Howard (2016): valores inferiores a 0.5 são considerados inaceitáveis; valores entre 0.5 e 0.6 são considerados pobres; entre 0.6 e 0.7, medíocres, mas aceitáveis; entre 0.7 e 0.8, intermédios; entre 0.8 e 0.9, bons; e entre 0.9 e 1, excelentes. Assim, valores próximos de 1 indicam que existem correlações parciais entre os itens e é possível fazer uma AFE. Também se utilizou o teste de esfericidade de Bartlett para avaliar se existem correlações entre os itens. Tendo-se observado um KMO = 0.89 e um teste de Bartlett de X2 (231) = 4568,4, . < .001, ou seja, uma fatorabilidade da matriz de correlações excelente, procedeu-se à AFE com os dados da amostra.

Para as análises, utilizou-se o programa FACTOR 10.10.03 (Ferrando & Lorenzo-Seva, 2017) visando estabelecer a estrutura fatorial pelo método RobustUnweighted Least Squaares (RULS), com uma matriz de correlações policóricas indicada para esta análise das escalas com itens ordinais de tipo Likert (Asún et al. 2015). Pressupondo encontrar correlações entre as dimensões investigadas, utilizou-se o método de rotação oblíqua Promin (Lorenzo-Seva & Ferrando, 2013).

Para reter o mínimo de fatores, utilizou-se inicialmente o critério Kaiser-Guttman, isto é, fatores com autovalores (eigenvalues) superiores a 1. Entretanto, sabendo que este critério tende a superestimar os fatores retidos, utilizou-se, adicionalmente, para confirmar os resultados, o método de Análises Paralelas (APs). Neste último método, os autovalores oriundos a partir do critério de Kaiser-Guttman são comparados com o percentil 95 de autovalores aleatórios do conjunto hipotético de 500 matrizes de correlação de variáveis. Dessa forma, fatores com autovalores superiores a 1 e inferiores aos calculados nas APs são descartados, conforme sugere Damásio (2012).

Por fim, visando verificar a fidedignidade dos modelos fatoriais obtidos, calculou-se os valores de ajustamento (utilizando Bootstrap para análises mais robustas), os quais apresentam valores de corte sugeridos por Schreiber et al. (2006), que também foram apresentados: rácio do qui-quadrado pelos graus de liberdade (X2/df ≤ 2 ou 3); comparative fit index (CFI ≥ ,95); Tucker-Lewis index (TLI ≥ ,96) e root mean square error of approximation (RMSEA < ,06 a ,08 com intervalo de confiança).

Foram ainda avaliados a consistência interna dos fatores retidos utilizando o alfa de Cronbach (α) e o Composite Reliability (CR) – sendo valores superiores a 0.7 adequados, entre 0.8 e 0.9 bons e superiores a 0.9 excelentes; calculados os scores de cada fator do modelo adotado pela média dos itens que o conformam; calculadas as estatísticas descritivas (Média e Desvio Padrão); calculados os coeficientes de correlação de Pearson (r) entre as variáveis em estudo; para identificar as diferenças entre grupos, foram utilizados o teste T-Student e a Análise de Variância (ANOVA, F); e calculou-se um índice de repetência, sendo o coeficiente oriundo entre o número de matérias que o estudante reprovou e o número total de disciplinas já cursadas pelo mesmo.

Para avaliar a validade de critério, foi analisada a qualidade de ajustamento de um modelo causal, elaborado no software AMOS (vs. 25), das percepções de autorregulação do estudante sobre o seu desempenho acadêmico, utilizando os índices de ajustamento previamente mencionados (X2/df; CFI; TLI; e RMSEA).

Conforme o critério de Kaiser-Guttman, os resultados da AFE obtidos nos 22 itens do instrumento para avaliar a autorregulação dos estudantes sugeriram a extração de quatro fatores explicando 57,4% da variância. Entretanto, somente três fatores apresentaram autovalores acima da média dos autovalores encontrados em análise paralela com 500 matrizes correlacionais aleatórias, indicando a retenção de três fatores, explicando 51.9% da variância. Todavia, foram identificados itens que apresentavam baixas comunalidades, assim como itens que carregavam em mais de um fator, que Howard (2016) recomenda retirar. Assim, sucessivas análises levaram à remoção dos itens 1, 5, 16, e 18 que apresentavam comunalidades inferiores a .30, e dos itens 13 e 22, que apresentavam pesos fatoriais superiores a .32 em dois fatores, com uma diferença menor a .20 entre os pesos de ambos fatores. O modelo fatorial final, com 16 itens, apresenta autovalores que sugerem a retenção de três fatores, os quais foram confirmados pela análise paralela (Tabela 3). Estes fatores explicam 57,8% da variância em relação à autorregulação dos estudantes.

Tabela 3 Cargas Fatoriais, Comunalidades do Instrumento para Avaliar a Autorregulação das Aprendizagens dos Estudantes (16 itens) 

Itens Fatores Comunalidades
1 2 3
4. Resumo os textos indicados para estudo. ,814 -,143 -,075 ,484
3. Leio os textos indicados pelos professores. ,769 -,221 ,073 ,514
6. Leio textos complementares, além dos indicados pelos professores. ,728 -,248 ,064 ,440
10. Revejo as anotações feitas em sala de aula nos momentos de estudo. ,666 ,200 -,110 ,532
20. Faço algum esquema no papel (esboço, gráfico / desenho) para entender melhor as relações entre ideias. ,551 ,172 -,146 ,334
2. Identifico minhas dificuldades para aprender determinados tópicos ou assuntos. ,498 ,120 ,139 ,457
14. Organizo meu ambiente de estudo. ,476 ,076 ,230 ,486
11. Pesquiso o significado de palavras/conceitos desconhecidos. ,396 ,257 ,039 ,369
21. Discuto a matéria com colegas para ver se entendi. -,095 ,847 ,051 ,667
12. Peço ajuda aos colegas em caso de dúvidas. -,045 ,806 ,035 ,634
19. Estudo em grupo. ,076 ,472 -,066 ,242
17. Mantenho a calma diante de tarefas difíceis. -,223 -,071 1,023 ,756
07. Controlo possível ansiedade em situações de avaliação. -,249 -,097 ,949 ,610
15. Consigo ir até o final de uma tarefa mesmo quando ela é difícil / tediosa. ,314 ,025 ,459 ,520
8. Identifico o quanto eu estou aprendendo. ,094 ,204 ,450 ,406
9. Peço auxílio aos professores sobre dúvidas na matéria. ,139 ,269 ,383 ,436

Nota. Método de Extração: Robust Unweighted Least Squares (RULS); Método de Rotação: Promin; a = baseado no minium rank factor analyses; b = calculados com base em uma matriz hipotética aleatória faturada 500 vezes, para 16 itens e n = 516.

Fonte: autoras.

Na Tabela 4, encontra-se a consistência interna da escala de autorregulação com 16 itens, avaliada pelo alfa de Cronbach.

Tabela 4 Comunalidades do Instrumento para Avaliar a Autorregulação das Aprendizagens dos Estudantes 

Autovalor empírico 6,166 1,712 1,375
Percentil 95 dos autovalores aleatórios 1,395 1,312 1,248
% Variância explicada 38,54 10,70 8,60
Alfa ,81 ,69 ,77
Composite Reliability ,80 ,76 ,81
Correlações (r)
Fator 2 .568 - -
Fator 3 .665 .410 -

Fonte: autoras.

Conforme a Tabela 4, no fator 1, que explica 38,54% da variância, saturaram oito itens (4, 3, 6, 10, 20, 2, 14 e 11) relacionados com o Fator 1 original de Autorregulação Cognitiva e Metacognitiva, referentes a estratégias cognitivas de autorregulação das aprendizagens (e.g., item 4 - “Resumo os textos indicados para estudo”, item 3 – “Leio os textos indicados pelos professores”). Valores mais elevados nestes fatores (perto de 6) indicam uma maior utilização pelos estudantes deste tipo de estratégias. De acordo com o valor do Alfa de Cronbach, a consistência interna do fator é boa, conforme os valores da Tabela 4.

O segundo fator, absolutamente coincidente com o Fator 3 da escala original, inclui três itens (21, 12 e 19) que recolhem as práticas de autorregulação social dos estudantes (e.g., item 21 – “Discuto a matéria com colegas para ver se entendi”, item 12 – “Peço ajuda aos colegas em caso de dúvidas”), explicando 10,70% da variância. O item 19 apresenta uma comunalidade baixa (<.30), no entanto, este item foi mantido na estrutura para o fator apresentar o número mínimo de itens (três, de acordo com Damásio, 2012). A remoção deste item também não aumenta significativamente a fiabilidade do fator, que se pode considerar adequada. Valores mais altos neste fator (perto de 6) indicam uma maior utilização pelos estudantes de estratégias sociais na autorregulação das suas aprendizagens.

Finalmente, o terceiro fator inclui cinco itens (17, 7, 8, 15 e 9), dos quais três estão contidos no Fator 2 original, o de Autorregulação dos Recursos Internos e Contextuais que avaliam as estratégias de regulação interna utilizadas pelos estudantes (e.g., item 17 – “Mantenho a calma diante de tarefas difíceis”, item 7 – “Controlo possível ansiedade em situações de avaliação”). O fator apresenta níveis de consistência interna adequados. Valores mais elevados neste fator indicam uma maior utilização por parte dos estudantes de estratégias de regulação interna na autorregulação das suas aprendizagens.

Na Tabela 5, apresenta-se a estatística descritiva dos escores de cada um dos fatores através da média dos itens que o conformam.

Tabela 5 Descritivas do Instrumento para Avaliar a Autorregulação das Aprendizagens dos Estudantes (16 itens) 

Variáveis Min. Max. M DP Sk Ku
Autorregulação cognitiva 1,25 6,00 4,38 0,85 -0,20 -0,19
Autorregulação social 1,00 6,00 4,26 1,11 -0,47 -0,03
Autorregulação dos recursos internos 1,00 6,00 4,12 1,03 -0,22 -0,47

Fonte: autoras.

Observa-se que os valores abrangem quase o intervalo total da escala (entre 1 e 6), com médias superiores ao ponto médio da escala (3,5), indicando que os estudantes percebem que utilizam com alguma frequência estratégias de autorregulação cognitivas, sociais e de regulação dos recursos internos. Os valores de curtose (ku) e de assimetria (sk), cerca a zero, indicam que a distribuição dos escores de cada fator apresenta uma distribuição semelhante à normal. De acordo com a Tabela 5, observa-se uma maior utilização das estratégias de autorregulação das aprendizagens de tipo cognitivo, seguida das estratégias sociais, sendo as estratégias de regulação interna as menos utilizadas pelos estudantes que participaram no estudo.

No presente estudo, analisamos se haveria diferenças em função do sexo dos estudantes. De acordo com os resultados do teste T de Student realizado, existem diferenças significativas entre o sexo masculino e feminino apenas na utilização de estratégias de autorregulação dos recursos internos (cf. Tabela 6).

Tabela 6 Diferenças na autorregulação das aprendizagens em função do sexo dos participantes 

Fatores/dimensões

Sexo

N

M

DP

T

df

p

Autorregulação cognitiva

Feminino

353

4,42

,83

1,77

514

,077

Masculino

163

4,28

,87

Autorregulação social

Feminino

353

4,27

1,11

0,35

514

,723

Masculino

163

4,23

1,12

Autorregulação dos recursos internos

Feminino

353

4,04

1,03

-2,82

514

,005

Masculino

163

4,31

1,00

Fonte: autoras.

Os estudantes do sexo masculino indicam utilizar mais estas estratégias que as estudantes do sexo feminino.

Para compreender se existem diferenças nas percepções dos estudantes sobre a sua autorregulação das aprendizagens em função da sua idade, foi realizada uma análise de variância (ANOVA). Os resultados encontram-se na Tabela 7.

Tabela 7 Diferenças na autorregulação das aprendizagens em função da idade dos participantes 

Fatores/dimensões Idade

N

M

DP

F

df

p

Autorregulação cognitiva

20 ou menos

154

4,28

,81

3,92

5,508

,002

21-25 anos

153

4,30

,77

26-30 anos

70

4,27

,89

31-35 anos

54

4,48

,92

36- 40 anos

32

4,71

,77

Mais de 41

51

4,73

,93

Autorregulação social

20 ou menos

154

4,27

1,12

0,91

5,508

,476

21-25 anos

153

4,25

1,11

26-30 anos

70

4,14

1,13

31-35 anos

54

4,30

1,18

36- 40 anos

32

4,60

,94

Mais de 41

51

4,13

1,10

Autorregulação dos recursos internos

20 ou menos

154

3,93

1,08

3,88

5,508

,002

21-25 anos

153

4,01

1,01

26-30 anos

70

4,23

1,01

31-35 anos

54

4,40

1,04

36- 40 anos

32

4,35

,88

Mais de 41

51

4,46

,86

Fonte: autoras.

Os resultados, apresentados na Tabela 7, indicam que existem diferenças ao nível da utilização das estratégias de autorregulação cognitiva e de autorregulação dos recursos internos. Uma vez que os grupos apresentam variâncias homogêneas, foi utilizado o teste Post-Hoc de Tukey para identificar entre que grupos se encontravam as diferenças. Os resultados indicam que os participantes com mais de 41 anos utilizam com maior frequência as estratégias cognitivas comparativamente com os estudantes com 20 ou menos (p = ,011), com idades entre os 21 e os 25 (p = ,017), com idades entre os 26 e os 30 (p = ,036). Os estudantes com mais de 41 anos também utilizam mais estratégias de autorregulação dos recursos internos comparativamente com os estudantes com 20 ou menos anos (p = ,007) e com idades entre os 21 e 25 (p = ,029).

Foram ainda comparadas estratégias de autorregulação dos estudantes em função do Instituto Federal que frequentam, sendo apenas comparados aqueles Institutos em que pelo menos 30 estudantes responderam ao questionário. Conforme se observa na Tabela 8 encontram-se diferenças significativas ao nível das estratégias de autorregulação social.

Tabela 8 Diferenças na autorregulação das aprendizagens em função do Instituto Federal dos participantes 

Fatores Instituto Federal

N

M

DP

F

df

p

Autorregulação cognitiva

IF Centro Oeste

297

4,33

0,83

1,24

3,484

,293

IF Sul A

72

4,50

0,87

IF Norte

63

4,50

0,92

IF Sul B

56

4,35

0,83

Autorregulação social

IF Centro Oeste

297

4,14

1,16

3,49

3,484

,016

IF Sul A

72

4,34

0,88

IF Norte

63

4,62

1,04

IF Sul B

56

4,27

1,15

Autorregulação dos recursos internos

IF Centro Oeste

297

4,06

1,09

1,02

3,484

,384

IF Sul A

72

4,22

0,94

IF Norte

63

4,27

0,96

IF Sul B

56

4,14

0,87

Fonte: autoras.

Considerando o teste Post-Hoc de Tukey, os participantes do Instituto Federal do Norte indicam utilizar mais estratégias de autorregulação social das aprendizagens que os estudantes do Instituto Federal do Centro-Oeste (p = .010).

Por fim, analisou-se a relação entre a autorregulação das aprendizagens e o desempenho acadêmico dos estudantes. Assim, utilizando os fatores identificados como variáveis manifestas, foi ainda estimado um modelo causal da variável latente “Autorregulação” sobre a variável latente “Desempenho acadêmico”, estimado por meio das variáveis manifestas “Índice de reprovação” (proporção de disciplinas reprovadas) e “Média das notas dos estudantes”. Para tal, utilizou-se o software AMOS (vs. 25). Podemos observar o modelo na Figura 1.

Fonte: autoras.

Figura 1 Modelo causal da autorregulação do estudante sobre o desempenho acadêmicoNota: (X2(4) = 3,68 com p = ,451; CFI = 1,00; TLI = 1,00; RMSEA = ,000, IC95% [,000; ,064]). 

Todas as variáveis manifestas contribuem significativamente na sua variável latente. A trajetória “Autorregulação” – “Desempenho acadêmico” foi significativa (b = 0,56; β = 0,33; p < .001), sendo que a utilização de estratégias de autorregulação dos estudantes explicou 11% do desempenho acadêmico. O modelo revelou uma qualidade de ajustamento excelente.

Discussão

O presente estudo corrobora com a literatura, uma vez que foi encontrada uma relação significativa positiva entre a utilização de estratégias autorregulatórias e o desempenho acadêmico. Os estudantes autorregulados tendem a organizam-se, esforçam-se e interessam-se mais, a ponto de estabelecer metas de estudo realistas, de analisar e aprimorar seu desempenho acadêmico (Schunk & Zimmerman, 2008). Dessa forma, capacidades autorregulatórias no ensino superior não só ajudam a compreender os desempenhos dos estudantes como fornecem pistas para promover a (re)construção de estratégias de autorregulação de aprendizagens mais eficazes (Fernández et al. 2013). Segundo Núñez et al. (2019), estudantes que aprendem a autorregular sua aprendizagem podem assumir maior responsabilidade pelos resultados. Nesse sentido, são capazes de avaliar seu progresso de aprendizagem tendo em vista os objetivos estabelecidos, aprendem a partir de seus erros e encontram neles uma oportunidade para aprender.

Segundo os resultados, as estratégias de autorregulação não são iguais para ambos os sexos. Encontraram-se diferenças significativas entre o sexo masculino e o feminino quanto à utilização de estratégias de autorregulação dos recursos internos, verificando-se que os estudantes do sexo masculino indicam utilizar mais estas estratégias, comparativamente às estudantes do sexo feminino. O monitoramento e o controle de aspectos cognitivos, afetivos, ambientais, pessoais e comportamentais estão mais presentes nos estudantes masculinos.

Do mesmo modo, foram encontradas diferenças no nível da utilização das estratégias de autorregulação cognitiva e de autorregulação dos recursos internos relacionados à idade dos estudantes. Participantes com 41 anos de idade ou mais utilizam com maior frequência as estratégias cognitivas e a autorregulação dos recursos internos se comparados com os estudantes mais novos. Evidenciou-se, portanto, que quanto mais velhos os estudantes, mais estratégias de autorregulação apresentam.

O Instituto Federal que os estudantes frequentavam permitiu também encontrar diferenças significativas no nível das estratégias de autorregulação social, relacionadas a formas de aprendizagens que envolvem a interação com o outro. Os participantes do Instituto Federal do Norte demonstraram utilizar mais estratégias de autorregulação social das aprendizagens comparativamente aos estudantes do Instituto Federal do Centro-Oeste. Notadamente, o Brasil, um país de dimensões continentais, apresenta características distintas dentre a sua população, mesmo quando geograficamente tão distantes.

Essa discussão se faz relevante, principalmente, quando sabe-se que o contexto educacional, que exige cada vez mais que os estudantes tenham a capacidade de tomar decisões rápidas, eficientes e conscientes, além de regular seu próprio processo de aprendizagem (Boruchovitch & Santos, 2015).

Considerações finais

Esse estudo constatou que os 16 itens finais utilizados a partir do EEA-U, agrupados em três fatores, revelam uma congruência da escala com os constructos teóricos da escala construída para a avaliação das estratégias de aprendizagem de estudantes universitários brasileiros. Percebe-se a importância de compreender e incentivar a autorregulação dos estudantes do ensino superior, vendo o impacto positivo no desempenho acadêmico. Não eximindo, no entanto, a necessidade de mais estudos no âmbito de outros fatores que impactam o desempenho acadêmico no ensino superior. Vê-se, por exemplo, que dadas as dimensões do território brasileiro, precisa-se realizar investigações territoriais nas quais se analise como esta diversidade também está presente nos seus estudantes. Também é necessário realizar estudos relacionadas a outros constructos relativos à aprendizagem, como autoeficácia, ansiedade e motivação, para que evidências de outros tipos de correlação e validade possam ser estimadas. Assim, e considerando o modelo teórico comprovadamente de ajustamento excelente, incentiva-se a propagação da utilização do referido instrumento em sua versão de 16 itens aos estudantes de ensino superior brasileiros em estudos futuros.

Espera-se que esse estudo possa contribuir para uma melhor compreensão das estratégias de aprendizagem, no âmbito da aprendizagem autorregulada no ensino superior brasileiro, ampliando a discussão de problemas relacionados à sua mensuração e revelando a complexidade de uma importante discussão neste nível de ensino.

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[1]Este artigo insere-se no âmbito de doutoramento em curso da primeira autora, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), por meio de bolsa individual com a referência SFRH/BD/143275/2019.

Recebido: 18 de Junho de 2020; Aceito: 09 de Outubro de 2020

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