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Linhas Críticas

versión impresa ISSN 1516-4896versión On-line ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.27  Brasília  2021  Epub 18-Feb-2021

https://doi.org/10.26512/lc.v27.2021.34818 

Artigos

Gestão dos recursos financeiros da educação: um estudo em cinco municípios cearenses

Gestión de recursos financieros para la educación: un estudio en cinco condados de Ceará

Financial resources management for education: a study in five municipalities of Ceará

Iasmin da Costa Marinho1 
http://orcid.org/0000-0002-5575-1309

Esmeraldina Januário de Sousa2 
http://orcid.org/0000-0003-3349-0838

Cláudia Maria Sales Mendes3 
http://orcid.org/0000-0003-4170-6547

Eloisa Maia Vidal4 
http://orcid.org/0000-0003-0535-7394

Sofia Lerche Vieira5 
http://orcid.org/0000-0002-0271-6876

1Doutoranda em educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Professora Assistente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Membro do Grupo de Pesquisa Política Educacional, Gestão e Aprendizagem (GPPEGA/UECE).

2Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará (2020). Professora e Supervisora Escolar da Rede Pública Municipal de Fortaleza/CE. Membro do Grupo de Pesquisa Política Educacional, Gestão e Aprendizagem (GPPEGA/UECE).

3Doutoranda em Ciências da Educação na área de Política Educativa pela Universidade do Minho (UMinho-Portugal). Professora aposentada da Secretaria da Educação Básica do Ceará.

4Doutora em educação pela Universidade Federal do Ceará (2000). Professora Associada do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Vice-líder do Grupo de Pesquisa Política Educacional, Gestão e Aprendizagem (GPPEGA/UECE).

5Pós-doutora em educação pela Universidad Nacional de Educacion a Distancia, Espanha (2002). Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Líder do Grupo de Pesquisa Política Educacional, Gestão e Aprendizagem (GPPEGA/UECE). Bolsista de Produtividade do CNPq.


Resumo

O artigo analisa aspectos da gestão de recursos financeiros da educação em cinco municípios do Ceará – Canindé, Fortaleza, Limoeiro do Norte, Maracanaú e Sobral – por meio de um estudo de casos múltiplos e entrevistas semiestruturadas com secretários municipais de educação. Os resultados mostram que quatro municípios utilizam mais de 75% do valor do Fundeb para remuneração dos profissionais de educação, e Sobral aplica 60,13%. Todos recebem as transferências legais, definidas em legislação federal e executadas pelo FNDE, três possuem programas de transferência de recursos para as escolas de sua rede e os cinco afirmam que os recursos não são suficientes para prover suas demandas.

Palavras-chave Financiamento da educação; Gestão educacional; Redes municipais; Educação Pública; Ceará

Resumen

El artículo analiza aspectos de la gestión de recursos financieros para la educación en cinco condados de Ceará - Canindé, Fortaleza, Limoeiro do Norte, Maracanaú y Sobral - a través de un estudio de múltiples casos y entrevistas semiestructuradas con secretarias de educación municipales. Los resultados muestran que cuatro condados utilizan más del 75% del valor de Fundeb para la remuneración de los profesionales de la educación y Sobral aplica 60,13%. Todos reciben transferencias legales, definidas en la legislación federal y ejecutadas por el FNDE, tres tienen programas de transferencia de recursos a las escuelas de su red y los cinco dicen que los recursos no son suficientes para atender sus demandas.

Palabras clave Financiamiento de la educación; Gestión educativa; Redes municipales; Educación publica; Ceará

Abstract

The paper analyzes aspects of financial resources management for education in five municipalities in Ceará - Canindé, Fortaleza, Limoeiro do Norte, Maracanaú and Sobral - through a multiple case study and semi-structured interviews with municipal education secretaries. Results show that four municipalities use more than 75% of Fundeb's value for the payment of education professionals, and Sobral invests 60.13%. All of them receive legal transfers, defined in federal law and executed by the FNDE, three have programs for transferring resources to schools in their network and all five claim that the resources are not sufficient to supply their demands.

Keywords Education financing; Educational management; Municipal networks; Public education; Ceará

Introdução

O trabalho analisa a gestão dos recursos financeiros da educação em cinco municípios do Estado do Ceará: Canindé, Fortaleza, Limoeiro do Norte, Maracanaú e Sobral a partir de dados obtidos pelo Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação .SIOPE), do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação .FNDE). Esta análise é parte de uma pesquisa desenvolvida na disciplina Política Educacional, do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da Universidade Estadual do Ceará (UECE), oferecida no primeiro semestre de 2018, e os municípios foram selecionados tendo como referência a cidade de origem dos alunos matriculados. Os dados analisados se referem a 2017, por ser o último ano consolidado quando da oferta da disciplina.

A metodologia adotou a abordagem qualitativa (Bogdan & Biklen, 1994) que utiliza o estudo de casos múltiplos (Yin, 2015; Alves-Mazzotti, 2006), posto que tem interesse pelo contexto e pelas singularidades do caso como importantes da investigação. Utiliza como técnica principal a entrevista semiestruturada (Gil, 2008) aplicada aos secretários municipais de educação das cidades citadas.

Os dirigentes responderam às questões sobre financiamento, que envolviam: a) aplicação dos recursos do Fundeb; b) outras fontes de recursos financeiros no âmbito municipal; c) áreas da política educacional em que o município aplica mais recursos extra-Fundeb; d) gestão dos recursos financeiros da educação, sua descentralização, prestação de contas, transparência; e) mecanismos de acompanhamento e monitoramento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014 – 2024 (Brasil, 2014a) e do Plano Municipal de Educação, com relação à gestão dos recursos; f) organismos de controle social existentes no município e seu modus operandi. Recorreu-se, também, à pesquisa documental e a dados quantitativos do SIOPE, das Sinopses Estatísticas da Educação Básica do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

No Brasil, o financiamento da educação está amparado na Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1988), entre outras normas, no que refere às fontes orçamentárias e operacionais de crédito que podem ser realizadas pelos entes federados. Das normas que embasam a discussão, ressaltam-se a Emenda Constitucional (EC) n. 14/1996 (Brasil, 1996a), que deu nova forma de redistribuição de recursos da União para os estados e os municípios; a Lei n. 9.394/96 (Brasil, 1996b); a Lei n. 9.424/96 (Brasil, 1996c), que normatizam o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), a EC n. 53/2006 (Brasil, 2006d), que cria o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), e a EC n. 59/2009 (Brasil, 2009), que amplia o ensino obrigatório para a faixa etária de 4 a 17 anos.

Na atual conjuntura, a educação pública é afetada pela aprovação da EC n. 95/2016 (Brasil, 2016), que congela os gastos públicos por 20 anos e estabelece que reajustes do orçamento só podem ser feitos de acordo com o aumento da inflação do ano anterior medido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Após sua implementação, os investimentos na educação nacional tornaram-se cada vez mais limitados, e o futuro de políticas e programas que asseguram o funcionamento da educação básica é incerto.

O artigo está organizado em três seções, além desta introdução. Na primeira, são discutidos os aspectos históricos e normativos que embasam o financiamento da educação no Brasil. Na segunda, é apresentado o fluxo das contas municipais de educação, uma breve caracterização dos municípios, o financiamento nos Planos Municipais de Educação e as políticas e os programas de financiamento da educação nos municípios. A terceira seção trata da gestão dos recursos financeiros pelos Secretários Municipais de Educação. Nas considerações finais são apresentadas reflexões sobre as limitações das condições de financiamento e os desafios dos gestores municipais.

Financiamento da educação básica pública no Brasil

O financiamento da educação pública no Brasil situa-se na esfera dos desafios enfrentados pelo país ao longo de sua história. Nesse contexto, marcado por períodos autoritários, a temática de vinculação de recursos para educação foi oficializada, pela primeira vez, na Constituição Federal de 1934 (Pinto, 2000, p. 24). Por força dos movimentos entre católicos e liberais, os primeiros em defesa da escola privada e religiosa, e os segundos, da escola pública, gratuita, laica e obrigatória. Carta Magna incorporou reivindicações de ambos os lados. Assim, em seu artigo 156, estabelece que a “União e os municípios aplicarão nunca menos de 10%, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de 20%, da renda resultante dos impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos” (Brasil, 1934, s. p.).

As vinculações de recursos dos entes federados para a educação nacional sofreram alterações em seu curso, e, somente em 1983, com a aprovação da Emenda Calmon (Brasil, 1983), a aplicação das receitas de impostos da União passou a ser de, no mínimo, 13% e nunca menos de 20% para estados, Distrito Federal e municípios, o que inclui a manutenção e o desenvolvimento do ensino (Oliveira, 2007). Contudo, isso não foi suficiente para solucionar o problema do financiamento da educação, por causa das profundas diferenças entre os municípios brasileiros e do fato de ter aberto margem para que se aplicassem recursos em qualquer grau do ensino, embora prioritariamente, ao ensino obrigatório (Barreto & Arelaro, 1986; Mello, 1988).

Com o processo de redemocratização no país, a Constituição Federal [CF] (Brasil, 1988), em resposta aos movimentos municipalistas em defesa da valorização do poder local (Barreto & Arelaro, 1986), ratificada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n. 9.394/96 (Brasil, 1996b), ao definir a organização de ensino público em regime de colaboração (Art. 211), tratou dos recursos provenientes das receitas de impostos e de outras transferências aos entes federados de forma diferenciada, ao estabelecer que a União deveria aplicar, no mínimo, 18% e Estados, Distrito Federal e Municípios, 25% das receitas de impostos, o que inclui as transferências (Brasil, 1996b, s. p.).

A literatura tende a observar tal divisão de responsabilidades posta pela CF (Brasil, 1988) e pela LDB n. 9.394/96 (Brasil, 1996b) como um processo de descentralização. Conforme argumenta Moschen Nascente & Dias da Silva (2020) e Souza e Faria (2004), há descentralização quando os meios que reforçam a autonomia entre os entes federados são respeitados.

Diante disso, é possível afirmar que o Fundef contribuiu para a universalização do ensino fundamental com o estabelecimento de critérios para distribuição automática dos recursos aos entes federados e com a definição de um Valor Aluno-Ano (VAA). Isso possibilitou mais transparência no uso dos recursos.

O Fundef teve seu fim em 2006, e o Fundeb começou vigorar em 2007, com vigência de 14 anos. Este fundo introduziu alterações substantivas, como a distribuição de 20% dos recursos arrecadados de acordo com o número de alunos matriculados em toda a educação básica, a adição de novos impostos e a complementação da União.

Em 2020, é sancionado o novo Fundeb pela Lei n. 14.113/2020 (Brasil, 2020), e algumas conquistas podem ser observadas, como a aprovação de um fundo contábil permanente para a educação; o aumento de 10% para 23% de participação da União; a regulamentação do Valor Aluno-Ano (VAA) e do Valor Aluno-Ano Total (VAAT), que garante a melhor redistribuição dos recursos federais, de forma mais equânime para aquelas localidades mais pobres.

O Ceará é um dos poucos estados da federação que, no período pós-LDB, optou pela municipalização completa do ensino fundamental. Essa escolha contou com a adesão imediata dos municípios para os quais o valor aluno-ano estabelecido pelo Fundef era muito representativo para a educação municipal. Assim, já nos primeiros anos de vigência deste fundo, a oferta de matrículas do ensino fundamental pela rede estadual diminuiu expressivamente, enquanto as matrículas municipais se aceleram, num primeiro momento, pela inclusão dos que estavam fora da escola e, em seguida, pela transferência de matrículas da rede estadual para as redes municipais. Em 2007, ano de criação do Fundeb, a oferta do ensino fundamental na rede estadual representava 12% do total de matrículas públicas nessa etapa da educação básica (Inep, 2007). Em 2017, ano deste estudo, a rede estadual responde por 2,9% das matrículas públicas do ensino fundamental (Inep, 2017).

O fluxo das contas municipais de educação: agentes, provedores e atividades

A garantia de qualidade na educação está condicionada à disponibilidade de recursos materiais, humanos e infraestrutura escolar adequadas, o que só pode ser assegurado pelo aporte de recursos financeiros provenientes de receitas próprias dos entes federados ou de transferências constitucionais. De acordo com Vasconcelos (2003, p. 110), “os sistemas de ensino compõem-se do conjunto de elementos distintos que, reunidos em torno de objetivos comuns, formam um todo, administrado para um mesmo fim – nesse caso, a educação”. Parte dessa premissa, a dificuldade de gerir os interesses e os deveres para com o povo e sua educação, de respeitar os princípios da administração pública e de garantir o equilíbrio fiscal das contas locais. Compreende-se, portanto, que gerir os recursos financeiros da educação é tarefa onerosa, porém necessária a todos aqueles que compõem os sistemas de ensino e tem como objetivo a garantia de uma educação de qualidade para todos.

Documentos publicados pelo Banco Mundial (2017) e pelo Ministério da Fazenda (Brasil, 2018) apontam evidências de que a atual baixa da qualidade educacional no Brasil não se deve à insuficiência de recursos financeiros. Esta posição é contestada por estudiosos como Pinto (2011), Amaral (2012), Araújo (2012), uma vez que o país investe no ensino fundamental US$ 3,8 mil por aluno-ano, enquanto os países que compõem a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) investem cerca de US$ 8,6 mil (OCDE, 2019).

Importante assinalar que essas diferenças de investimentos na educação pública brasileira, tem acentuado as desigualdades entre o público e o privado no contexto pandêmico (Antunes, 2020) vivido atualmente. Observou-se um maior descompasso nas questões estruturais entre as instituições públicas e privadas, bem como nas medidas de adaptação, formação e planejamento, que estão intimamente associadas ao maior aporte e gestão dos recursos financeiros da educação. As dificuldades de gestão sanitária e tecnológica observadas nas escolas públicas aprofundam ainda mais o fosso das desigualdades educacionais do Brasil, e revelam a precarização do ensino público e ausência de maior financiamento (Dias & Pinto, 2020).

No Brasil, a discussão sobre financiamento da educação, além de contemplar a importância de políticas redistributivas como o Fundeb, precisa abordar as diversas formas de aplicação, seleção de prioridades e gestão, considerando a diversidade de contextos presentes nas 27 unidades subnacionais e 5.570 municipalidades. Na seção a seguir, será apresentada uma breve descrição do perfil dos municípios.

Breve caracterização dos municípios

A Tabela 1 apresenta dados populacionais e alguns indicadores econômicos dos cinco municípios pesquisados.

Tabela 1 Indicadores demográficos e econômicos dos municípios 

Município População [2017] Percentual das receitas oriundas de fontes externas [2015] Salário médio mensal dos trabalhadores formais [2018] Percentual da população ocupada [2018]
Canindé 77.514 85,1 1,8 9,4
Fortaleza 2.627.482 54,4 2,8 32,1
Limoeiro do Norte 58.915 82,5 1,8 13,5
Maracanaú 224.804 77,2 2,1 26,6
Sobral 205.529 82,9 2,1 24,9

Fonte: IBGE (2020).

As cidades se localizam em regiões administrativas distintas do estado do Ceará e possuem características socioeconômicas e demográficas variadas. Canindé e Limoeiro do Norte possuem população inferior a 100.000 habitantes e um salário mensal de trabalhadores formais de 1,8 salário-mínimo, com população ocupada de 9,4% e 13,5%. Maracanaú e Sobral são duas cidades com mais de 200.000 habitantes, e o salário médio de trabalhadores formais é de 2,1 salários-mínimos, com população ocupada na faixa de 25%. Fortaleza, a capital do estado, possui uma população de 2,6 milhões de habitantes, um salário médio mensal dos trabalhadores formais de 2,8 salários-mínimos e 32,1% da população ocupada.

Quando se observa o percentual de receitas oriundas de fontes externas em 2015, Canindé, Limoeiro do Norte e Sobral apresentam valores superiores a 80%, enquanto, em Maracanaú, o valor é de 77,2%, e, em Fortaleza, de 54,4%. A origem das receitas é informação importante para a política educacional, uma vez que a) as fontes externas dizem respeito às transferências constitucionalmente garantidas, como o Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Fundeb, cota-parte de ICMS, Salário-educação etc. e b) os quatro municípios, exceto a capital, apresentam baixa arrecadação de impostos, o que impacta diretamente nos 25% destinados à educação, conforme prevê a CF (Brasil, 1988).

Os dados da Tabela 2 mostram as matrículas da educação básica por dependência administrativa nos cinco municípios em 2017.

Tabela 2 Número de matrículas na educação básica por dependência administrativa, 2017 

Município Federal Estadual Municipal Privada
Canindé 79 3.957 13.028 2.167
Fortaleza 2.978 118.088 207.302 229.782
Limoeiro do Norte 288 2.887 6.915 3.394
Maracanaú 452 11.991 38.381 18.200
Sobral 795 11.701 33.547 11.896

Fonte: Inep (2017).

Os municípios possuem matrículas em todas as dependências administrativas, no entanto, quando se observam as matrículas públicas, em Canindé, Maracanaú e Sobral, elas são, respectivamente, 76,3%, 75,5% e 72,9% municipais; Limoeiro do Norte responde por 68,5%, e Fortaleza, por 63,1%.

A Tabela 3 apresenta a quantidade de docentes por dependência administrativa referente ao ano de 2017.

Tabela 3 Número de docentes na educação básica por dependência administrativa, 2017 

Município Federal Estadual Municipal Privada
Canindé 23 193 521 130
Fortaleza 290 4.703 8.708 10.643
Limoeiro do Norte 35 88 250 170
Maracanaú 35 466 1.483 761
Sobral 64 453 1.242 545

Fonte: Inep (2017).

Os dados mostram que os três municípios que concentram os maiores percentuais de matrículas públicas nas redes municipais são também os que apresentam maiores quantidades de docentes vinculados às redes municipais – Canindé (70,7%), Maracanaú (74,7%) e Sobral (70,6%) –, enquanto Limoeiro do Norte apresenta 67% dos docentes pertencentes à rede municipal, e Fortaleza, 63,6%. Em termos de média de alunos por docente, Fortaleza apresenta a menor média (23,8%) e Sobral, a maior (27%).

Os dados mostram municípios com contextos econômicos distintos. Evidencia-se, em quatro deles, a forte dependência de receitas oriundas de fontes externas, e, em dois deles, há baixos percentuais de população ocupada, além de salários médios mensais dos trabalhadores formais muito baixos. No que diz respeito às matrículas na educação básica, a oferta pública municipal é dominante em todos, assim como os percentuais de docentes vinculados às redes municipais. São redes de ensino de diferentes portes, com limitações e potencialidades que demandam cuidados na gestão dos recursos públicos para a educação. Eles são administrados a partir de modelos de gestão próprios a cada ente federado, a suas leis e a seus sistemas, e ainda a seus projetos de educação, que vão dar o tom e a medida do uso dos recursos e suas prioridades quanto à educação (Sander, 2005). Nesse sentido, buscou-se investigar como a gestão dos recursos financeiros se faz presente nos planos municipais de educação dos cinco municípios investigados.

O financiamento da educação nos Planos Municipais

O financiamento da educação brasileira tem sido objeto de estudos importantes como os elaborados por Pinto (2000; 2014; 2018), Martins (2011) e Amaral (2012), que realizaram avaliações sobre o impacto do texto constitucional e suas alterações sobre as políticas de financiamento. Embora a norma constitucional seja única, segundo Batista e Pereyra (2020, p. 8), “as políticas são elaboradas no bojo de um movimento global que produz profundos impactos em locais distantes de sua origem; ademais, elas estão altamente contextualizadas e sua implementação significativamente dependente do contexto local”.

A elaboração de um plano municipal de educação (PME) com duração de dez anos, equivalente ao PNE (Brasil, 2014a), está prevista nas orientações do Ministério da Educação (Brasil, 2014b), e, como advoga Silva (2018, p. 5), “as metas previstas no plano dispõem de responsabilidades nos âmbitos municipal, estadual e federal e, por sua vez, impactam diretamente no trabalho do Dirigente Municipal de Educação”, a quem cabe elaborar o PME articulado com o Plano Estadual de Educação e com o PNE. Essa necessária articulação com a legislação federal faz Werle e Barcellos (2008, p. 524) afirmarem que “[…] a estrutura e natureza do Plano Nacional definem o universo a partir do qual se circunscreve o PME […]”, ou seja, é o PNE que traça a “espinha dorsal” dos PMEs.

Os cinco municípios pesquisados possuem PMEs aprovados pelas respectivas Câmaras Municipais: PME Fortaleza 2015 – 2025 (Fortaleza, 2015), PME Limoeiro do Norte 2015 – 2025 (Limoeiro do Norte, 2015), PME Maracanaú 2012 – 2021 (Maracanaú, 2012), PME Sobral 2015 – 2025 (Sobral, 2015) e PME Canindé 2015 – 2025 (Canindé, 2015). Todos estão em consonância com o PNE (2014 – 2024) e, na análise da meta associada ao financiamento da educação básica nos municípios, destacam-se as proposições e os desafios nos documentos de Fortaleza e Sobral. O PME de Fortaleza (Fortaleza, 2015) propõe a regulamentação em legislação específica do Custo Aluno-Qualidade inicial (CAQi), com vistas à definição do investimento por estudante, anualmente, para que se efetive uma educação de qualidade. Quanto a Sobral, expressa-se preocupação na definição de um Custo Aluno-Qualidade Deficiência (CAQNEE) como parâmetro de investimento por escola. Nos outros três municípios, essa questão não é abordada.

Entre os PMEs, somente o de Fortaleza informa que deseja ampliar, gradativa e continuamente, o mínimo constitucional a que se refere o art. 212 da CF (Brasil, 1988), até atingir 30% da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE). Além disso, todos os planos colocam como condição imprescindível para o alcance das metas e estratégias previstas, a efetivação do regime de colaboração, por meio da ação redistributiva e supletiva pela União dos recursos destinados à educação pública. Outro ponto relevante é que eles se constituem em planejamento educacional determinante na elaboração das outras peças orçamentárias da gestão pública, como o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a Lei Orçamentária Anual (LOA) e os Planos de Trabalhos Anuais (PTA), em todos os níveis governamentais.

Em suma, os PMEs apresentam uma breve e rasa discussão acerca do financiamento da educação, não observando os programas municipais de transferência direta de recursos para as escolas, nem o uso dos recursos provenientes do Fundeb. A ausência de elementos mais sólidos na discussão da gestão dos recursos mostra a fragilidade quanto ao acompanhamento e ao monitoramento dos gastos e dos investimentos realizados pelos municípios. A falta de metas e de objetivos claros, afinados às especificidades das redes quanto ao seu orçamento, à gerência e às políticas educacionais municipais, pode ser vista como uma preocupação diante dos pressupostos da administração pública e da participação de todos nesse processo.

Quanto aos agentes envolvidos no acompanhamento dos gastos municipais de educação, exceto Canindé, os municípios possuem Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb (CACS-Fundeb) instituído por Lei Municipal, conforme se observa no Quadro 1.

Fonte: as autoras, 2020.

Quadro 1 Legislação de criação dos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb 

O CACS-Fundeb é um órgão colegiado que tem como função principal o acompanhamento e o controle social sobre a distribuição, a transferência, o planejamento e a aplicação dos recursos do fundo, no âmbito de todas as esferas administrativas: municipal, estadual e federal. A Lei n. 11.494 (Brasil, 2007), que regulamenta o Fundeb, dispõe, no art. 24, sobre a obrigatoriedade da instituição deste conselho, e, a partir de então, o município precisa estar preparado e informado sobre os principais aspectos que cercam essa implantação, suas responsabilidades e seus resultados.

Além disso, como esse conselho não é uma unidade administrativa do governo, deve agir de forma independente e, ao mesmo tempo, harmônica com os órgãos da administração pública local. Por sua vez, o Poder Executivo deve oferecer a ele o necessário apoio material e logístico, disponibilizando, se solicitado, local para reuniões, meio de transporte, materiais de escritório, cartilhas e demais publicações, entre outros recursos. Dessa forma, assegura a realização periódica das reuniões de trabalho e garante condições para que o colegiado desempenhe suas atividades e efetivamente exerça suas funções (Brasil, 2007).

Políticas e programas de financiamento da educação nos municípios

Segundo estudo feito pelo Tesouro Nacional (Brasil, 2017), grande parte dos municípios brasileiros têm elevada dependência financeira dos estados e do governo federal. As transferências estaduais e federais representam, aproximadamente, 60% do total de recursos disponíveis para as prefeituras. De acordo com esse mesmo estudo, em 2016, essas transferências corresponderam a mais de três quartos do orçamento dos municípios em 82% dos casos (Brasil, 2017). Os cinco municípios pesquisados contam com as transferências legais, definidas em legislação federal e executadas pelo FNDE, como: Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE), financiados com recursos da cota federal do Salário-Educação, e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), financiado com outros recursos do Tesouro Nacional.

No que se refere à descentralização de recursos financeiros para as escolas, constatou-se que somente três dos municípios possuem programas específicos que envolvem transferências dessa natureza, conforme a descrição a seguir:

· Fortaleza: as escolas recebem recursos municipais por meio do Programa Municipal de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (PMDE).

· Sobral: repassa recursos às escolas pelo Fundo de Desenvolvimento e Autonomia dos Centros de Referência em Educação Infantil (FUNDECREI) e Fundo de Desenvolvimento da Autonomia Escolar (FUNDAE); e

· Maracanaú: realiza repasse às escolas por meio do Programa de Autonomia Escolar (PAE).

O PMDE da rede pública municipal de Fortaleza foi criado pela Lei Complementar n. 169/2014, e dispõe, em seu art. 28:

consiste em um programa de transferência de recursos financeiros consignados no orçamento do Poder Executivo Municipal, com o objetivo de prestar assistência financeira, em caráter suplementar, às escolas da rede pública municipal que possuam alunos matriculados na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos, de acordo com dados extraídos do censo escolar realizado pelo Ministério da Educação (MEC), no ano imediatamente anterior ao do atendimento (Fortaleza, 2014, p. 04).

O município de Sobral apresenta uma proposta diferenciada de transferência de recursos diretos para as escolas. O modelo é implementado desde 2001 e delega ao estabelecimento de ensino a escolha da forma de gestão de seus recursos e a definição de suas próprias metas, que têm como parâmetro as metas definidas pela SME para a política municipal de educação. O FUNDAE e o FUNDECREI, constituídos por receitas próprias do orçamento municipal, foram criados com o objetivo de financiar as despesas cotidianas da escola. Eles são transferidos diretamente para as contas bancárias das unidades escolares, conforme os dados de matrícula, para custear despesas como contas de água, de energia, de gás e de telefone; material de limpeza e de expediente; contratação de pequenos serviços de reparos e de manutenção de material elétrico-eletrônico. Tais pagamentos seguem os princípios da Lei de Licitações (Brasil, 1993). Os Fundos foram criados, respectivamente, pela Lei Municipal n. 318/2001 (Sobral, 2001), que institui o FUNDAE, voltado para as escolas de ensino fundamental, e Lei Municipal n. 856/2008 (Sobral, 2008), que institui o FUNDECREI, voltado para as unidades de Educação Infantil.

Dos cinco municípios analisados, somente Sobral assegura a transferência direta de recursos municipais para as escolas por meio de Fundos e estabelece critérios para essa transferência, que estão associados à frequência dos estudantes, à sua permanência e aos resultados de aprendizagem. À época de sua criação, eles estavam associados aos dados de alfabetização dos alunos. Assim como o PDDE, o FUNDECREI e o FUNDAE são repasses feitos pelo município de acordo com o número de matrículas registrado no Censo Escolar do ano anterior e são publicados por escola no Diário Oficial do Município.

No caso de Maracanaú, os recursos financeiros relativos ao PAE são transferidos aos Conselhos Escolares, assegurando a autonomia de gestão financeira, conforme estabelece o art. 15 da LDB (Brasil, 1996b). O Programa foi criado pela Lei Municipal n. 1.096/2006 (Maracanaú, 2006) e tem como principal objetivo proporcionar condições que favoreçam o desenvolvimento do trabalho pedagógico em todas as instituições escolares. A Unidade Executora (UEx) de cada escola é responsável pela execução e prestação de contas das verbas recebidas.

Conforme o artigo 1º da lei que cria o PAE, ele está dividido em Programa Municipal de Recuperação de Escolas Municipais e Programa de Manutenção das Escolas Municipais, “com o objetivo de restabelecer as condições de estrutura física, inclusive adequação de espaço e de equipamentos das escolas da rede municipal de ensino, além de descentralizar as ações de manutenção das escolas” (Maracanaú, 2006). Moreira (2018, p. 148) destaca os desafios da introdução do PAE em Maracanaú, ao afirmar que “[…] mesmo com a vontade política para a iniciativa, materializada na aprovação da lei, naquele momento ainda não estavam prontas, na Secretaria de Educação do Município, as condições de implementação, o que foi se consolidando a partir de 2007”, cujo processo iniciou-se somente em 2008.

Compreende-se que, a presença desses programas de transferência de recursos diretos para as escolas, reforçam a autonomia financeira dessas instituições de forma que atendem às necessidades e às especificidades de cada escola, resguardam os princípios da publicidade e fortalecem a formação de uma gestão mais responsável e participativa. Esses aspectos serão abordados na próxima seção.

Gestão dos recursos financeiros na visão dos Secretários Municipais de Educação

No que se refere aos mecanismos e políticas de transferência de recursos federais para sistemas de ensino e escolas, torna-se relevante destacar como eles são utilizados no âmbito dessas instituições, seu gerenciamento e seu aplicação. Tais ações, por sua vez, visam à melhoria da qualidade do ensino e condições de funcionamento da educação básica.

A dimensão da gestão financeira pode ser entendida como a “caixa preta” dos sistemas e das unidades escolares. Os gestores enfrentam dificuldades em lidar com o tema, entre outros fatores, pela falta de formação inicial em princípios da administração pública, o que inclui processos de aquisição, de pagamento, de prestação de contas. No que tange à aplicação dos recursos do Fundeb, a Tabela 4 mostra valores e percentuais dos recursos investidos em educação nos cinco municípios, em 2017.

Tabela 4 Percentual e Total investido em Folha de pagamento e MDE do Fundeb por município, 2017 

Município Mínimo de 60% - Remuneração dos profissionais do magistério em efetivo exercício Percentual Máximo de 40% - Demais despesas com a manutenção e desenvolvimento do ensino Percentual
Canindé 37.487.506,07 74,69% 11.283.753,57 20,37%
Fortaleza 643.900.009,17 99,12% 0 0,00%
Limoeiro do Norte 18.150.317,69 77,17% 4.316.915,51 18,35%
Maracanaú 109.947.100,64 83,41% 21.079.587,31 15,52%
Sobral 63.382.509,24 60,13% 41.899.043,41 39,75%

Fonte: FNDE (2017).

Questionados sobre o uso do Fundeb, os secretários municipais reconhecem a importância deste Fundo e sua relevância para a manutenção dos salários dos professores, entre outros gastos necessários ao funcionamento das escolas. Os dados mostram que, exceto Sobral, os demais municípios aplicam valores superiores aos 60% previstos na remuneração dos profissionais do magistério. Fortaleza, de acordo com dados do SIOPE, utiliza 99,12% dos recursos para remuneração desses profissionais, dos quais não sobram recursos para MDE.

No município de Canindé, diferentemente dos dados obtidos no SIOPE, o Secretário destacou que 100% do Fundeb é utilizado para folha de pagamento dos professores. As demais despesas são supridas com recursos provenientes dos 25% das receitas municipais de impostos, conforme estabelece a CF (Brasil, 1988). Cita ainda o Plano de Cargos e Carreiras e o Piso Salarial como os grandes responsáveis pela aplicação dos recursos do Fundeb na folha de pagamento. Segundo o Secretário, as maiores despesas são transporte e alimentação escolar, o que provoca, inclusive, uma diferenciação na distribuição dos alimentos entre as escolas de zona rural e urbana, devido às dificuldades de enviar produtos frescos às escolas distantes dos polos.

Em Fortaleza, o município aplica o total dos recursos do Fundeb em pagamento de folha de pessoal, e isso inclui salário, gratificação e formação desses profissionais. O Secretário Adjunto informa que essa tendência vem ocorrendo em outros municípios. Relata também que, no caso da capital, outros recursos financeiros são aportados pelo município para além do Fundeb, os quais inclusive ultrapassam o percentual mínimo constitucional de 25%. Com relação à existência de um setor responsável na Secretaria por licitações e pagamentos, o Secretário Adjunto informa que existem um quadro de setores que trabalham de forma articulada: Coordenadoria Jurídica, Coordenadoria Administrativa, Coordenadoria de Provimento Escolar e Coordenadoria Financeira.

A Secretária de Educação de Limoeiro do Norte informou que os investimentos do Fundeb em MDE têm se reduzido ao longo dos anos, de modo que ficaram a cargo das receitas próprias do município. Ela ainda destaca os desafios no atendimento aos dispositivos legais quanto à transferência dos recursos e à disposição dos 25% da arrecadação municipal previstos constitucionalmente. A Secretária também ressalta que as áreas que mais necessitam de investimentos são transporte escolar e infraestrutura. Assim como o município de Canindé, Limoeiro não possui órgão nem setor responsável pela licitação e pelos pagamentos, de maneira que os serviços são realizados pelas Secretarias de Administração e Finanças da Prefeitura.

Por seu turno, o Secretário Executivo da Secretaria Municipal de Educação de Maracanaú destaca que os recursos do Fundeb não são suficientes para atender necessidades da rede e que a educação conta como os recursos provenientes dos impostos municipais e do Salário-Educação. No município, há adoção de formas de gerenciamento diferenciada, pela prática da autonomia escolar, utilizada desde 2007 na rede. A transferência de recursos é feita diretamente às escolas, mensalmente, e ainda são realizados o aperfeiçoamento e o acompanhamento das ações do programa. Na visão dos gestores educacionais de Maracanaú, a descentralização dos recursos financeiros contribui para fortalecer a autonomia escolar e empoderar os diretores para trabalhar a partir de suas reais necessidades.

O Secretário de Educação de Canindé também destaca a insuficiência dos recursos do Fundeb para a Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE). De acordo com seu depoimento, 100% do recurso é destinado a pagamento de folha dos profissionais da educação, o que contraria a informação obtida no SIOPE, segundo a qual corresponde a 74,79%.

O Secretário Municipal de Educação de Sobral destacou que os recursos provenientes do Fundeb são importantes para o desenvolvimento da educação municipal, uma vez que grande parte se destina ao pagamento dos profissionais da educação (65%), e outra parte, à manutenção das escolas, à aquisição de material didático, às obras e às transferências para escolas (35%). Ele foi o único a fazer menção às sobras no orçamento e identificou que os recursos do Fundeb possibilitam que o município inclua ações como bonificações de professores, premiações, entre outros benefícios. Tal realidade se diferencia daquela dos órgãos gestores que informaram utilizar 100% desses recursos para pagamento de pessoal.

Os Secretários de Sobral, Limoeiro do Norte e Canindé destacaram que suas maiores despesas são em transporte escolar. Sobral identifica que, além do transporte, a formação e a premiação dos professores demandam maiores recursos do município para educação. Limoeiro do Norte destacou a infraestrutura como elemento que onera os cofres públicos, identificando despesas com reforma, ampliação e manutenção de prédios públicos. No mesmo sentido, Maracanaú e Fortaleza reconhecem que a manutenção da infraestrutura exige permanentemente investimentos municipais. A alimentação escolar foi uma iniciativa destacada apenas pelo Secretário Adjunto de Fortaleza, enquanto Maracanaú destacou o PAE como sua maior demanda orçamentária.

Considerações finais

A partir da pesquisa em cinco municípios do Ceará, é possível compreender alguns aspectos da gestão financeira da educação e suas múltiplas possibilidades de implementação, como a criação de fundos de financiamento para permitir transferências diretas para as escolas e o reforço da autonomia escolar.

Chamam a atenção também as limitações do Fundeb na sua fase final de vigência, uma vez que, dos cinco municípios investigados, quatro deles utilizam entre 75% e 99% do valor para remuneração dos profissionais de educação. Por sua vez, Sobral aplica 60,13%, ficando nos limites do mínimo legal (60%) indicado pela lei do Fundo. Além disso, o fato de os secretários de Limoeiro do Norte e de Canindé fornecerem uma informação que contradiz as encontradas no SIOPE pode estar associado ao desconhecimento da forma como é realizada a prestação de contas de suas prefeituras com o Tesouro Nacional.

Os cinco municípios pesquisados contam com as transferências legais, definidas em legislação federal e executadas pelo FNDE: PDDE, PNATE e PNAE. Dos cinco municípios investigados, três possuem programas de transferência de recursos para as escolas de sua rede, e cada município os enumerou como maiores despesas: Fortaleza (alimentação e infraestrutura); Sobral (transporte e premiação); Maracanaú (PAE e manutenção das escolas); Limoeiro do Norte (transporte e infraestrutura); Canindé (transporte, infraestrutura e alimentação).

Os recursos para a educação, nos casos observados, não são suficientes para atender às suas demandas, o que contradiz afirmações como as do Banco Mundial. Observou-se que, em municípios com economia mais dinâmica, maior população e mais recursos provenientes de receitas próprias, há maior possibilidade de ampliação dos investimentos para a implementação de medidas que favoreçam a autonomia financeira das escolas, como em Maracanaú, Sobral e Fortaleza.

Os municípios possuem órgãos responsáveis e leis que normatizam a gestão e a expansão desses recursos para as redes de ensino. Limoeiro do Norte e Canindé registram preocupação com o repasse da União e evidenciam a forte dependência financeira dessas transferências. Tais questões elucidadas neste estudo podem vir a ser atenuadas com a aprovação do novo Fundeb e a maior complementação da União, o que ainda precisa ser estabelecido em legislação complementar.

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Recebido: 21 de Outubro de 2020; Aceito: 08 de Fevereiro de 2021

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