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Linhas Críticas

Print version ISSN 1516-4896On-line version ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.27  Brasília  2021  Epub Apr 12, 2021

https://doi.org/10.26512/lc.v27.2021.34603 

Artigos

O papel do conselho de classe para organização do trabalho pedagógico

El papel del consejo de clase para la organización del trabajo pedagógico

The role of the class council for the organization of pedagogical work

Rhaíssa Sheri Freire de Souza Rocha1 
http://orcid.org/0000-0001-9403-126X

Edileuza Fernandes da Silva2 
http://orcid.org/0000-0002-9837-2958

1Graduada em Pedagogia pela Universidade de Brasília (2019). Mestranda em Educação pela Universidade de Brasília na linha de pesquisa Profissão Docente Currículo e Avaliação (PDCA). Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Trabalho Docente, Didática e Trabalho Pedagógico (PRODOCÊNCIA).

2Doutora em Educação pela Universidade de Brasília (2009). Professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília - FE/UnB. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa: Docência, Didática e Trabalho Pedagógico na Educação Básica e Superior (PRODOCÊNCIA).


Resumo

Partindo do pressuposto de que as discussões e processos vividos no conselho de classe interferem nas práticas pedagógicas do professor em sala de aula, este estudo tem como objetivo geral analisar as contribuições das reuniões do conselho de classe para a organização do trabalho pedagógico. A pesquisa de abordagem qualitativa foi desenvolvida por meio de Estudo de Caso. Para levantamento de dados foram utilizados análise documental, observação do conselho de classe e entrevista semiestruturada. Os achados apontam que a lógica de avaliação classificatória e excludente que orienta o conselho de classe influencia o trabalho pedagógico do professor em sala de aula.

Palavras-chave Conselho de classe; Organização do trabalho pedagógico; Avaliação formativa

Resumen

Teniendo en cuenta que las discusiones y procesos vividos en el consejo de clase interfieren con las prácticas pedagógicas del docente en el aula, este estudio tiene como objetivo analizar los aportes de las reuniones del consejo de clase a la organización del trabajo pedagógico. La investigación cualitativa se desarrolló a través de un estudio de caso. Para la recolección de datos se utilizó análisis documental, observación del consejo de clase y entrevista semiestructurada. Los hallazgos señalan que la lógica de evaluación clasificatoria y exclusiva que guía el consejo de clase influye en el trabajo pedagógico del docente en el aula.

Palabras clave Consejo de clase; Organización del trabajo pedagógico; Evaluación formativa

Abstract

Based on the assumption that the discussions and processes in the class council interfere with the teaching practices of the teacher in the classroom, this study has the general objective of analyzing the contributions of the class council meetings to the organization of the pedagogical work. The qualitative approach research was developed through a Case Study. For data collection documentary analysis was used, observation of the class council and semi-structured interview. The findings indicate that the logic of classificatory and excluding evaluation that guides the class council influences the pedagogical work of the teacher in the classroom.

Keywords Class council; Organization of pedagogical work; Formative evaluation

Introdução

O presente relatório, apresenta resultados de estudo desenvolvido a partir de pesquisa mais ampla, intitulada “Formação docente e trabalho pedagógico na educação básica: desafios e perspectivas atuais”, desenvolvida pelo Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Trabalho Docente, Didática e Organização do Trabalho Pedagógico – PRODOCÊNCIA, cadastrado no CNPq. A pesquisa foi desenvolvida no período de agosto de 2018 a julho de 2019, no âmbito do Programa de Iniciação Científica da Universidade de Brasília (PROIC), edital 2018/2019.

O conselho de classe tem sua origem na França e o processo de instituição desse colegiado no Brasil e no Distrito Federal durou cerca de 30 anos e sua forma e aplicabilidade é discutida até os dias atuais (Santos, 2006).

O Regimento Escolar da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal em seu artigo 29 dispõe que “O conselho de classe é órgão colegiado integrante da Gestão Democrática e se destina a acompanhar e avaliar o processo de educação, de ensino e das aprendizagens” (Distrito Federal, 2015[1], p. 24), contribuindo para reorganizar o trabalho pedagógico da escola como um todo e da sala de aula, com vistas às aprendizagens dos alunos.

Esse aspecto reveste-se de relevância considerando que conforme Censo 2017 da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF), o terceiro ano do Bloco Inicial de Alfabetização apresentou altos índices de reprovação, 15,90% perfazendo o total de 5.372 alunos e 105 alunos foram afastados por abandono à escola. Esses dados provocam a reflexão sobre o papel do conselho de classe como colegiado de caráter deliberativo que tem como função acompanhar e avaliar o processo de ensino e aprendizagem. O acompanhamento pressupõe a observação e a tomada de decisões e ações que contribuam para o processo de educação, de ensino e das aprendizagens. A avaliação permite o diagnóstico que gera subsídios para que esse acompanhamento seja eficaz, ou seja, promova mudanças e ressignificações que gerem mudanças e resultados positivos. (Villas Boas, 2017a).

A pesquisa foi realizada em uma escola classe, vinculada à Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) localizada na cidade do Gama, no intuito de discutir a contribuição que o conselho de classe pode trazer para a organização do trabalho pedagógico de uma professora atuante no Bloco Inicial de Alfabetização – 3º ano do BIA[2]. Diante do exposto apresenta-se como questão central de pesquisa -Qual é o papel do conselho de classe para a organização do trabalho pedagógico de uma docente dos anos iniciais do ensino fundamental de uma escola pública do Gama-DF?

Partindo da questão central foi estabelecido como objetivo geral: analisar as contribuições das reuniões do conselho de classe para a organização do trabalho pedagógico de uma docente dos anos iniciais do ensino fundamental de uma escola pública do Gama-DF.

Para melhor encaminhamento da pesquisa, os objetivos específicos foram: a) discutir os pressupostos teóricos que embasam o conselho de classe na escola em documentos da SEEDF e escola; b) discutir as concepções de conselho de classe expressas pela professora e gestor da escola; c) compreender as contribuições das discussões do conselho de classe para o trabalho pedagógico da professora.

Referencial Teórico

O conselho de classe tem sua fundamentação estabelecida muito antes de surgirem os documentos que atualmente regem o funcionamento desse colegiado no Distrito Federal. Dalben (1995) aborda a experiência francesa como referência no estabelecimento do conselho que tinha como objetivo principal observar os alunos continuamente para que, a partir de seus gostos e aptidões, houvesse um direcionamento classificatório que determinasse a vida futura de cada um na educação clássica ou técnica. Segundo Dalben (2004) essa experiência chegou ao Brasil, nas décadas de 60 e 70 através de educadores brasileiros que vivenciaram a implantação dos conselhos de classes na França, motivados pelo movimento da Escola Nova.

O Regimento Escolar da Rede Pública de ensino do DF (2015), define o conselho de classe como um órgão colegiado integrante da gestão democrática, ou seja, suas representações são diversas e suas decisões são tomadas em grupo (Distrito Federal, 2015). A Lei de Gestão Democrática do Sistema Público de Ensino do DF, Lei nº 4.751 de 2012, também contempla o conselho de classe como um colegiado que se destina a “avaliar o processo de educação, de ensino e de aprendizagem, havendo tantos conselhos de classe quantas forem as turmas existentes na escola” (Brasil, 2012, Art. 35). Visando o acompanhamento e a avaliação de desempenho dos processos educativos, ensino e aprendizagem, o conselho de classe é composto por professores dos diversos componentes curriculares, juntamente com coordenadores pedagógicos ou mesmo supervisores e orientadores educacionais que compõem o corpo docente de determinadas séries ou ciclos. (Distrito Federal, 2018a).

A dinâmica de organização do conselho é de autonomia da escola, com registros orientados por documentos que são enviados pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. As Diretrizes de Avaliação Educacional da Secretaria de Educação abordam que o conselho de classe serve para que haja um levantamento diagnóstico de dados que possibilitem uma autoavaliação da escola a fim de promover ações que reorientem o processo de ensino-aprendizagem dos alunos, atendendo às necessidades individuais de cada um deles (Distrito Federal, 2018b). O conselho não tem o objetivo de apresentar apenas o que é negativo ou frágil, mas também de abrir caminhos para novas perspectivas e ações que visam ao desenvolvimento de ações que repensem a prática pedagógica e possibilitem o alcance do sucesso no ensino e aprendizagem de todos os seus envolvidos (Villas Boas, 2017b).

A partir das competências do conselho de classe apresentadas pelo Regimento Escolar da Rede Pública do DF (Distrito Federal, 2015) percebe-se a preocupação em implementar e avaliar a execução do projeto político-pedagógico (PPP) na perspectiva formativa, bem como a análise ética de aspectos relativos à aprendizagem dos estudantes, considerando suas necessidades individuais, as intervenções realizadas, os avanços alcançados, as estratégias pedagógicas adotadas, os projetos interventivos e reagrupamentos. O conselho também delibera sobre os casos de aprovação e reprovação dos estudantes.

A organização do trabalho pedagógico é sistematizada no projeto político-pedagógico da escola que segundo Veiga (2011) é uma construção coletiva de realização futura, baseada nas possibilidades do presente, com intenções explícitas de direcionamento para o desenvolvimento de ações que contribuam para a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo que é a função da escola.

O trabalho pedagógico é aqui entendido como o trabalho realizado pela escola como um todo, desempenhado de maneira que não se restringe somente ao desenvolvimento do professor em sala de aula com os seus alunos, mas compreende uma estrutura que envolve toda a escola e seus ambientes de aprendizagem que, não necessariamente é a sala de aula convencional (Silva, 2017).

O percurso metodológico da pesquisa

A pesquisa de abordagem qualitativa considerou “o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento” (Ludke & André, 1986, p. 11) e por esse motivo os dados levantados possuem descrição fatídica dos acontecimentos e o processo se tornou mais importante do que o produto. Pesquisar qualitativamente o conselho de classe representa analisá-lo na prática a partir da perspectiva do sujeito pesquisador e dos participantes.

A opção pelo estudo de caso considerou o contexto específico e sua análise. Isso porque, mesmo que anteriormente aplicada em outro ambiente, o estudo sempre incorrerá em caráter específico e individual do caso estudado e suas características peculiares e singulares, no caso, o conselho de classe da escola classe do Gama-DF.

Para o levantamento dos dados foram adotados os procedimentos: a) análise documental do projeto político-pedagógico da escola (Distrito Federal, 2018a), do Regimento Escolar da Rede Pública de ensino do DF (Distrito Federal, 2015) e das Diretrizes de Avaliação Educacional da SEEDF (Distrito Federal, 2018b); b) observação de três reuniões de conselhos de classe, com um total de 24 horas; c) entrevista semiestruturada com uma professora atuante no 3º ano do BIA e com gestor escolar. A professora possui graduação em matemática e pedagogia, sendo especializada em psicopedagogia, é servidora da SEEDF há 15 anos e trabalha na escola pesquisada há mais de 6 anos. O integrante da equipe gestora da escola é formado em pedagogia e direito, trabalha na SEEDF há mais de 16 anos e atua na escola há 9 anos.

Discussões e Resultados

Nesta seção serão discutidos os pressupostos teórico-metodológicos que embasam os conselhos de classe na rede pública de ensino do DF para que se compreenda o proposto do ponto de vista institucional. Na sequência serão analisadas as narrativas dos participantes da pesquisa, o dito, com o objetivo de compreender suas concepções de conselho e sobre como ele tem influenciado o trabalho pedagógico de sala de aula da professora pesquisada. Para fechar a análise, serão discutidos os dados das observações dos conselhos, para compreender o seu desenvolvimento e encaminhamentos para a organização do trabalho pedagógico da professora, o feito.

Conselho de classe: o proposto

O conselho de classe é, segundo Veiga (2011, p. 13), “espaço de planejamento, organização, avaliação e retomada do projeto político-pedagógico da escola” e se faz político quando há prática intencional de “formação do cidadão para um tipo de sociedade”. A formação desse cidadão requer o cuidado de um olhar crítico para a prática pedagógica no sentido de autoavaliar e ressignificar, quando necessário, os elementos que conduzem à construção das aprendizagens de todos os estudantes.

Com esse intuito, as Diretrizes de Avaliação da SUBEB/SEEDF destacam que “o conselho de classe se torna formativo quando planejado e executado com a intencionalidade de acompanhar para intervir, didaticamente, a fim de garantir as aprendizagens de todos” (Distrito Federal, 2018b, p. 33). A proposta é que o conselho não tenha suas atividades voltadas para os “alunos-problema”, mas que seja um espaço de contribuição para a organização e reorganização, quando necessária, do trabalho pedagógico da escola e do professor.

Em consonância com as Diretrizes, o Regimento Escolar da Rede Pública de Ensino do DF em seu Art. 29 dispõe que “o conselho de classe é órgão colegiado integrante da gestão democrática e se destina a acompanhar e avaliar o processo de educação, de ensino e das aprendizagens” (Distrito Federal, 2015, p. 24). Avaliar o processo de ensino que engloba a organização do trabalho pedagógico como um todo, bem como avaliar as aprendizagens, os objetivos alcançados, o desempenho das plurais formas de aprender de cada indivíduo.

A escola adota o conselho de classe participativo, com caráter deliberativo, como momento de reflexão, avaliação, tomada de decisão e reavaliação do processo ensino-aprendizagem. No PPP, a escola indica como finalidades do Conselho:

a. Avaliar o desempenho escolar da turma e individualmente dos educandos, a relação professor/aluno, a relação entre os educandos e as questões referentes ao processo pedagógico, no decorrer de cada bimestre letivo;

b. Encaminhar ações pedagógicas a serem adotadas, buscando novas alternativas pedagógicas, que possibilitem melhoria no desempenho escolar do educando;

c. O Conselho Escolar tem autonomia de deliberar, em seu parecer final, não cabendo recurso em outra instância da escola.

O Conselho de Classe é realizado a cada final de bimestre, o mesmo é registrado em ata, resguardando seu caráter pedagógico. (Distrito Federal, 2018a, p. 38) [grifos das pesquisadoras]

Destaca-se do texto acima a preocupação da escola em garantir que o conselho de classe se constitua em espaço favorável à discussão do trabalho pedagógico com vistas à melhoria do desempenho escolar dos estudantes, avaliando não apenas o desempenho individual, mas também, o desempenho da turma como um coletivo.

Conselho de classe: o dito

As informações das entrevistas com a professora e o gestor da escola mostraram que, para o gestor, o conselho possibilita avaliar procedimentos, planejamento, rendimento e todo o arcabouço de dificuldades que o aluno encontrou no decorrer do bimestre, semestre e ano letivos. As principais potencialidades por ele indicadas foram: as oportunidades de debate coletivo a respeito de todas as ações que foram e serão implementadas, verificar falhas, perceber o que não foi aplicado adequadamente e ainda o que não obteve o resultado esperado. A visão do gestor sugeriu um conselho de classe com função formativa, pois retroalimenta o trabalho da escola e dos professores e gestores.

O gestor destacou a ênfase dada pelos professores ao rendimento e aos resultados dos alunos, por considerar que essa é uma lógica de avaliação ainda quantitativa e classificatória. Ao mesmo tempo destacou a preocupação dos professores em apresentar o desempenho individual dos estudantes, baseados em resultados dos “testes da psicogênese”[3] bimestralmente aplicados, na incessante busca pela justificação do “fracasso” além de responsabilizar as crianças e famílias pelos resultados.

A preocupação com o formato do conselho foi ressaltada como um aspecto que o desqualifica como espaço de avaliação do desempenho dos estudantes e do trabalho pedagógico da escola e da sala de aula. Para ele, a solução seria um conselho permanente[4] em que as ações fossem diluídas no decorrer do bimestre e não apenas uma reunião ao final de cada bimestre que avalia somente as dificuldades do aluno. A ideia de um conselho permanente é muito pertinente, principalmente quando se implementa uma proposta de organização escolar em ciclo que pressupõe assumir práticas de avaliação formativa em processo. Villas Boas (2017a) aponta a necessidade de implantação sistemática de encontros e reuniões para que professores avaliem, conjuntamente com coordenadores, o seu fazer pedagógico.

Por outro lado, para a professora participante da pesquisa, o conselho de classe é:

É um momento onde nós professores nos reunimos com toda a gestão da escola e temos a oportunidade de expandir a vida dos nossos alunos, quais são suas dificuldades, quais são suas fragilidades, visando atacar esses pontos para um melhor ensino. (Lúcia, 42 anos, professora regente)

Ao “expandir” a vida dos alunos para os participantes do conselho de classe, a professora tem a oportunidade de troca com os pares, de forma que contribua para sua análise e reorganização do trabalho pedagógico que não pode prescindir da autonomia pedagógica para planejar/replanejar. A autonomia no planejamento do docente pode, em algum momento, se tornar mecânica e sem intencionalidade, caso em sua autoavaliação da prática pedagógica não considere que seu trabalho compõe o projeto político-pedagógico. Nesse sentido, como alerta Silva (2017), o planejamento deve se constituir em um processo de reflexão crítica, contínua e intencional de todos os envolvidos no ato educativo, sendo as discussões e encaminhamentos do conselho de classe, orientadores.

A professora entrevistada destaca que essa influência do conselho de classe no trabalho pedagógico realizado em sala de aula se dá:

Avaliando os pontos colocados na mesa e interferências, principalmente na fala dos colegas, na troca de experiências, porque às vezes o que o colega me fala serve para eu aplicar em uma dificuldade que eu estou tendo em sala e eu não tive aquela ideia de fazer aquela ação e aí através da fala do colega surge essa ideia e eu consigo aplicar de acordo com a realidade da minha turma e surte efeito. (Lúcia, 42 anos, professora regente)

Para a professora, essa contribuição do conselho de classe afeta positivamente o seu replanejamento de ações. De acordo com Soares e Fernandes (2018) o trabalho pedagógico colaborativo não se trata apenas do planejamento em conjunto, mas o efeito de sua aplicação está diretamente relacionado à avaliação, replanejamento e discussão também coletiva. Dos ganhos para a organização do trabalho coletivo da escola, se destaca a inclusão social de professores e, consequentemente, dos estudantes do ensino fundamental. A interação entre os pares no trabalho colaborativo também é positiva na articulação com o PPP e possibilita o compromisso com as aprendizagens de todos.

A percepção da professora participante da pesquisa é de que se pode atacar os pontos necessários com objetividade sem que seja preciso expor a vida do aluno e ressalta a falta de foco dos pares ao abordar a situação de cada aluno individualmente, fugindo do cognitivo e abordando a sua vida pessoal:

A gente não consegue mudar a vida do aluno e o contexto social dele. Eu acho que a gente tem que bater mais no contexto escolar mesmo, no cognitivo do aluno, no que a gente pode fazer para ele alcançar os objetivos. Claro que a gente não pode deixar de considerar a estrutura social dele, mas também não precisa trazer tão abertamente essa situação que desgasta o momento né e às vezes não tem muita importância. (Lúcia, 42 anos, professora regente)

Partindo desse diagnóstico a respeito do conselho de classe, a professora apontou proposições que poderiam gerar mudanças benéficas ao conselho e ao seu trabalho pedagógico e retratou um direcionamento de maior especificidade por parte da equipe gestora para que a reunião flua de maneira produtiva, evitando a perda do foco e a divagação por comentários e exposições que ela julga desnecessários.

As competências do conselho de classe têm por objetivo a análise e o acompanhamento do desempenho dos alunos no processo de ensino-aprendizagem. Essa análise visa reorientar as práticas pedagógicas para que todos alcancem os objetivos e competências propostos para a educação, portanto, o conselho de classe é ambiente de reflexão das práticas pedagógicas como um todo e de ações que visem resultados positivos que possam contribuir para o ajuste das ações individuais e coletivas.

As discussões do conselho de classe que geraram encaminhamentos tiveram a coordenação pedagógica como espaço-tempo de aprofundamento e definições, favorecendo a construção do trabalho colaborativo. Nesse sentido, Soares e Fernandes (2018, p. 93) destacam que “a coordenação pedagógica pode representar o meio pelo qual os profissionais da educação possam consolidar suas aprendizagens, pois possibilita a construção coletiva, em contraposição a um trabalho fragmentado, individualizado [...]”. É no conselho de classe que, com a troca entre os pares e o trabalho colaborativo se percebe a necessidade de intervenções, bem como se discute com a equipe gestora e coordenadores pedagógicos quais ações podem contribuir para com o desenvolvimento do educando. O conselho de classe se articula com a coordenação pedagógica ao passo que todo o trabalho pedagógico está interligado. A coordenação pedagógica desenvolvida ao longo do bimestre visa o planejamento, o conselho de classe, como espaço de discussão dos resultados desse planejamento para que haja um replanejamento, formando assim um ciclo de construção e ressignificação no intuito de promover o ensino aprendizagem de professores e alunos.

Em síntese, as falas dos entrevistados convergiram ao mencionarem como potencialidade do conselho de classe as oportunidades de planejamento e oportunidades de identificação da necessidade de intervenção, bem como quando mencionaram o replanejamento a partir do trabalho coletivo desenvolvido no conselho. Porém, embora o gestor tenha apontado as estratégias utilizadas para incentivar a participação dos professores no conselho de classe, a professora apontou a necessidade de melhoria do direcionamento das reuniões, demonstrando uma dissonância entre as perspectivas de ambos acerca do conselho.

Conselho de classe: o feito

Foram observadas três reuniões de conselho de classe, perfazendo um total de 24 horas de conselho. De forma geral, o conselho de classe apresentou a seguinte dinâmica: entrega de uma pauta impressa juntamente com a mensagem reflexiva aos membros presentes com o objetivo do conselho e pontos a serem abordados. A rotina envolveu a leitura de informes iniciais e de uma mensagem motivadora afim de inspirar o cuidado com a avaliação do outro. A condução feita por um membro da equipe gestora que, nos conselhos observados foram a supervisora e o diretor da escola, com a presença de pelo menos um coordenador, equipe pedagógica (psicóloga e pedagoga), orientadora educacional e professoras das turmas discutidas no dia.

As professoras de cada umas das turmas participantes do conselho de classe do dia compuseram a reunião juntamente com o diretor, a supervisora, o coordenador pedagógico, a orientadora pedagógica e a equipe de apoio especializado (psicóloga e pedagoga). As professoras tiveram espaço de fala e expuseram suas colocações a respeito da turma informando nominalmente quem eram os alunos faltosos e com rendimentos comprometidos. Citaram os alunos que foram encaminhados à equipe de apoio pedagógico, expuseram o comparativo de evolução dos alunos de suas turmas comparados ao 2º bimestre de 2018 pontuando aqueles que permaneciam com dificuldades, os que haviam melhorado o desempenho, bem como os que tiveram avaliações negativas em relação ao bimestre anterior.

As turmas foram apresentadas individualmente, mas as outras professoras presentes no espaço do conselho também comentaram sobre eventuais evoluções ou dificuldades apresentadas por alunos nos quais elas tiveram contato direto em outro momento. Isso de certa forma contribuiu para os professores reorganizarem seu trabalho pedagógico em sala de aula, em um processo de discussão que apresenta características de trabalho colaborativo.

Considerações Finais

A partir da análise realizada e da fundamentação teórica acerca do conselho de classe e do trabalho pedagógico, foi possível compreender que a realidade vivenciada nos conselhos de classe necessita de uma atenção redobrada para que, de fato, transforme-se em um espaço de avaliação formativa.

A pesquisa possibilitou perceber que a construção de outra perspectiva de conselho de classe requer o planejamento de um trabalho pensado para estimular o desenvolvimento integral das crianças. O planejamento deve contemplar objetivos, métodos, recursos e avaliações, tendo em mente que se necessário será possível adaptá-lo de forma que acolha as necessidades dos estudantes e dos professores.

Foi possível apreender também que o conselho de classe, do ponto de vista do proposto no PPP da escola, articula-se aos pressupostos teóricos e metodológicos descritos nas Diretrizes de Avaliação da SEEDF (Distrito Federal, 2018a; 2018b).

A análise das Diretrizes, das entrevistas com a professora e com o gestor e das observações das aulas, demonstrou que a professora se preocupa com as fragilidades do conselho no que se refere ao uso equivocado da avaliação informal feita a respeito dos alunos. Ambos demonstraram ainda, conhecerem os documentos que regem o conselho de classe.

A professora reorganiza o trabalho pedagógico pelos resultados da avaliação e compartilhamento de experiências com os colegas. Portanto, o reagrupamento, estratégia do BIA para viabilizar as aprendizagens dos alunos, reuniões de conselho de classe, coordenações pedagógicas, bem como os gráficos de desempenho dos alunos, devem incentivar a cultura de responsabilização de todos pela organização do trabalho pedagógico, promovendo o trabalho colaborativo.

O gestor buscou alternativas para a ressignificação da metodologia do conselho de classe a fim de alcançar o interesse dos docentes em utilizá-lo para a reorganização do trabalho pedagógico. A professora apontou a necessidade de direcionamento mais específico para se alcançar os objetivos do conselho de classe.

Por fim, o reconhecimento por parte dos participantes da pesquisa de que há aspectos que precisam ser revistos no conselho de classe e, ao mesmo tempo, as tentativas para que o colegiado seja mais qualificado ao avaliar sugerem que é possível unir teoria e prática em busca do sucesso da aprendizagem dos alunos. O trabalho colaborativo dos professores no conselho de classe é condição para a reflexão e adoção de novas práticas que contribuam para o desenvolvimento do ensino e aprendizagem de todos.

Referências

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[1]Regimento vigente no período de realização da pesquisa.

[2]Bloco Inicial de Alfabetização - é uma organização escolar em ciclos para a aprendizagem que pressupõe mudanças nas concepções de ensino, aprendizagem e avaliação, e, consequentemente, na organização do trabalho pedagógico. A lógica do BIA é para as aprendizagens em um processo de progressão continuada. No terceiro ano do BIA admite-se a reprovação, no entanto o processo de avaliação proposto tem a função formativa.

[3]O teste da psicogênese possibilita compreender os processos de desenvolvimento da escrita da criança na alfabetização, que informa ao professor como ela constrói hipóteses de leitura e escrita. Se desenvolveu a partir dos estudos de Ferreiro e Teberosky (1986).

[4]O conselho de classe permanente possibilita sua convocação a qualquer momento para atender às demandas que requeiram análise e intervenção e é previsto no Regimento Escolar.

Recebido: 07 de Outubro de 2020; Aceito: 06 de Janeiro de 2021

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