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Linhas Críticas

Print version ISSN 1516-4896On-line version ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.27  Brasília  2021  Epub May 11, 2021

https://doi.org/10.26512/lc.v27.2021.36058 

Artigos

Educação física e escolar e regime domiciliar de exercícios

Educación física escolar y régimen de ejercicio domiciliario

School physical education and homework activity system

1Doutora em Ciências da Atividade Física e do Esporte pela Universidade da Coruña (UDC) (2011). Professora de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico no Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), campus Primavera do Leste. Membro Núcleo de Estudos Afro-brasileiro, Indígena e de Fronteira Maria Dimpina Lobo Duarte – IFMT.


Resumo

Partindo de um relato de experiência, este artigo objetiva discutir as aulas de Educação Física do Ensino Médio desde o Regime de Exercício Domiciliar (RED) aos alunos de uma instituição federal de educação (.=638). Pesquisa-ação, a análise de dados se deu por leitura flutuante e análise de conteúdo. Foi bem-sucedido o estímulo a um estilo ativo de vida, promovendo ainda reflexões relacionadas com a cultura corporal de movimento. O RED não substitui as aulas presenciais, mas abre precedentes importantes para a inovação, transdisciplinaridade e os avanços educacionais. É uma mudança e expansão do modelo da Educação Física.

Palavras-chave Educação Física; Regime Domiciliar de Exercício; Transdisciplinaridade

Resumen

Con base en un relato de experiencia, este artículo tiene como objetivo discutir las clases de Educación Física de Bachillerato desde el Régimen de Ejercicios en Casa (RED), a estudiantes de una institución federal de educación (.=638). Investigación para la acción, el análisis de datos se realizó mediante lectura flotante y análisis de contenido. El estímulo a un estilo de vida activo fue exitoso, promoviendo nuevas reflexiones relacionadas con la cultura corporal del movimiento. El RED no sustituye a las clases presenciales, pero, sienta importantes precedentes de innovación, transdisciplinariedad y avances educativos. Señala un cambio y expansión del paradigma de la Educación Física.

Palabras clave Educación Física Escolar; Régimen de ejercicios en casa; Transdisciplinariedad

Abstract

From an experience report, this article aims to discuss the Physical Education classes in High School during the Homework Activity System (HAS), upon the students of one federal institution of education (.=638). Action research, the data analysis was done through fluctuating reading and content analysis. The stimulus to an active lifestyle was successful, promoting reflections in relation to a corporal culture of movement. The HAS cannot be a substitute for live classes but, it creates an important precedent for innovation, transdisciplinarity, and educational improvements. It is a change and an expansion of the model of the Physical Education.

Keywords Physical Education; Homework Activity System; Transdisciplinarity

Introdução

A pandemia causada pelo Corona vírus disease (COVID-19) afetou e tornou necessária uma rápida adaptação de diversos seguimentos, entre eles, o da educação. Com isso, tornou-se urgente discutir a Educação a Distância (EAD) e o Regime de Exercício Domiciliar (RED) em segmentos educacionais nos quais professores e alunos são escassamente ou não habituados a essas práticas.

Segundo o Ministério da Educação (MEC, 2020), EAD “[...] é a modalidade educacional na qual alunos e professores estão separados, física ou temporalmente e, por isso, faz-se necessária a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação”. Em decorrência da crise sanitária, em 17 de março de 2020, o Ministério da Educação emitiu portaria sobre a alternativa de substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais nas instituições de ensino superior integrantes do sistema federal enquanto durar o período pandêmico (MEC, 2020).

Por RED, especificamente no âmbito do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT), compreende-se “as atividades acadêmicas desenvolvidas pelo estudante em domicílio, em consequência da sua impossibilidade de frequentar as aulas e participar das demais atividades regulares previstas para o curso”. Para tanto, pode “ser executado mediado por tecnologias e ou por meio de materiais tradicionais, digitais ou impressos” (IFMT, 2020a, p. 1).

Sem consenso sobre a denominação (em função do período histórico, da tecnologia disponível e da dificuldade com a tradução de termos da língua inglesa), a educação realizada a distância tem sido definida na literatura nacional e internacional por diferentes e variados termos (Formiga, 2009; Joye et al., 2020). Ao proporem uma diferenciação entre educação a distância e ensino remoto, Senra e Silva (2020), Arruda (2020) e Hodges et al. (2020) colocam que a primeira está legislada, organizada por equipes qualificadas e destinada a adultos, enquanto a segunda tem sido adotada em caráter emergencial, a partir de uma adaptação dos encontros presenciais que agora são remotos, e, portanto, não possui a estrutura necessária, sendo retomando o método presencial assim que a situação sanitária permitir.

Todavia, Joye et al. (2020) colocam o sistema regime domiciliar de exercício como unidirecional, onde o aluno assiste aulas gravadas. Porém, na prática, durante o período pandêmico, estão presentes características comuns ao ensino à distância, como a interação entre professor e aluno e a planificação do desenvolvimento do trabalho, o que contribui para embaralhar e ampliar a definição do termo, ou, a firmar um conceito como o de “Regime Domiciliar Emergencial”, utilizado, por exemplo, por Mendes e Lima (2020).

Inclusive, a denominação “Regime Domiciliar de Exercício” adotada pela instituição onde se desenvolveu o trabalho costuma estar relacionada ao atendimento em domicílio de alunos impedidos de frequentar as aulas por motivo de enfermidade (Brasil, 1969). Entretanto, no momento em que o projeto pedagógico foi concebido, as terminologias relacionadas às ações educativas em condições de distanciamento social, em consequência da pandemia, ainda estavam sendo elaboradas.

Embora o RED contemple a utilização de material impresso, maioritariamente, o trabalho que se descreverá se desenvolveu por meio de mídias digitais, apesar do desafio gerado por fatores como: falta de estrutura (equipamentos, conexão à internet e plataformas digitais), débil conhecimento do alunado do conceito e dos meios utilizados, e ausência de formação aos professores para a utilização de tecnologias. Fatos também observados por Alves (2020). Médici et al. (2020) ressaltam ainda a necessidade que o aluno possui de interação em um mesmo espaço físico com o professor e com os colegas, a falta de espaço apropriado para estudos na residência dos alunos, e a falta de organização sem o estabelecimento de um horário fixo para os estudos. Ainda associadas ao regime domiciliar de exercício, e ao período de crise ocasionado pela pandemia, houve uma acentuação das dificuldades e diferenças socioeconômicas e aprofundamento do quadro de exclusão e segregação de parte significativa dos estudantes (Médici et al., 2020; Silva et al., 2020).

No IFMT, campus Primavera do Leste (IFMT/PVL), as aulas presenciais foram suspensas no dia 17 de março de 2020, optando a instituição pela realização do RED a partir do dia 04 de maio do mesmo ano. Essa decisão objetivou a reorganização do calendário e das atividades escolares, procurando minimizar os impactos negativos que o período de distanciamento social infligira no processo educativo dos alunos. Importante ainda salientar o caráter benéfico ao bem-estar mental dos alunos que essa ação possui, considerando o aumento de ansiedade e depressão causados pela interrupção das atividades habituais e rotineiras dos adolescentes. O início do RED também contemplou as solicitações dos pais e responsáveis, preocupados com o prejuízo que poderia derivar da ausência das aulas e interrupção do curso escolar.

Como mencionado anteriormente, o processo esteve permeado por algumas dificuldades, entre elas, a falta de acesso aos meios de comunicação e/ou equipamentos de informática. Dos 638 estudantes matriculados no Ensino Médio, 66 informaram não possuir acesso a computador, smartphone e/ou internet, sendo que 14 destes não possuíam computador/tablet (IFMT, 2020b). Esses 14 alunos foram atendidos com a cessão temporária de computadores. Depois desse primeiro levantamento, surgiram novas demandas, efetivando-se a cessão temporária de mais 64 computadores (totalizando 78). Com relação à internet, foram disponibilizados três Editais de Auxílio Emergencial para Acesso à Internet e foram atendidos 119 estudantes com um auxílio mensal em forma de pecúnia no valor de R$ 100,00 (cem reais) para custeio da internet. Essas ações pretenderam evitar marginalizar aqueles alunos que já passam por algum tipo de exclusão devido à condição econômica.

Dentro desse panorama, entre as opções metodológicas contempladas pelo RED-IFMT, está a Pedagogia de Projetos, fundamentada no artigo 24, alínea h da IN RED, e em consonância com os demais documentos normativos citados na Resolução 019, de 23 de abril de 2020 (IFMT, 2020c) e IN RED nº 003, de 22 de abril de 2020 (IFMT, 2020d).

Segundo Hernández e Ventura (1998, p. 61):

Um projeto pode organizar-se seguindo um determinado eixo: a definição de um conceito, um problema geral ou particular, um conjunto de perguntas interrelacionadas, uma temática que valha a pena ser tratada em si mesma. Normalmente, superam-se os limites de uma matéria. Para abordar esse eixo em sala, se procede dando ênfase na articulação da informação necessária para tratar o problema objeto de estudo e nos procedimentos requeridos pelos alunos para desenvolvê-lo, ordená-lo, compreendê-lo e assimilá-lo.

Assim, por ser professora de Educação Física, esta pesquisadora optou por desenvolver os conteúdos por meio de um Projeto Integrador de Ensino que seria desenvolvido no campus. Esse Projeto recebeu o título de “Como não Adiantar o Fim do Mundo” [1] ; trata-se de uma estratégia de ensino multi e interdisciplinar que, partindo da atual pandemia causada pelo COVID-19, aborda e promove reflexões de diferentes temas relacionados a esse assunto desde diversas perspectivas.

Todos os professores do campus foram convidados a fazer parte desse projeto. Ao final, contou com a participação de professores das seguintes áreas do saber e quantidade: Biologia (3); Educação Física (1); Filosofia (2); Geografia (2); Língua Estrangeira Moderna – Inglês (1); Língua Portuguesa (1); e Química (1); e das disciplinas técnicas Geração, Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica, e Qualidade e Eficiência Energética (1); e Gestão de Recursos Humanos e Gestão da Cadeia de Abastecimento e Logística Reversa (1); totalizando 11 disciplinas e 13 professores.

Dentro desse contexto, a Educação Física, utilizando como fio condutor o atual período pandêmico, e tendo como base a ementa dos três anos (1º, 2º e 3º), um mesmo conteúdo foi trabalhado com os três anos. Foram abordados temas relacionados à manutenção da qualidade de vida; à importância da prática de exercício físico; à concepção de corpo na Idade Média e agora; à cultura corporal de movimento; à importância de relações sociais éticas e à valorização da vida.

Assim, este artigo está organizado em seis seções e uma conclusão. Na introdução, é apresentado o cenário em que a Educação Física começou a atuar de maneira remota dentro do IFMT/PVL. Em “Projeto Integrador de Ensino: ‘Como não Adiantar o Fim do Mundo’” contextualiza-se o marco teórico sobre o qual foi construído o planejamento por meio da metodologia de ensino por projeto. Na terceira seção, é apresentado o panorama da “Educação Física em tempos de COVID-19”. Em “Metodologia”, são especificados as escolhas metodológicas e o procedimento de análise dos dados. Em “Montando a rede”, apresenta-se a amostra, os meios de interação utilizados (plataformas e aplicativos), as dificuldades para a aderência, a periodicidade de disponibilização de material e a opção avaliativa empregada. E em “E daí? Deu jogo?”, abordam-se os conteúdos desenvolvidos dentro da disciplina e como foi seu desdobramento. Por fim, em “Considerações Transitórias”, são discutidas as estratégias que foram utilizadas, suas possibilidades e limitações.

Projeto Integrador de Ensino: “Como não Adiantar o Fim do Mundo”

O método de projetos, para Dewey (1959), parte de uma situação problemática, que vincula a escola ao mundo exterior e oferece uma alternativa à fragmentação das matérias. Nesse contexto, o projeto integrador de ensino “Como não Adiantar o Fim do Mundo”, partindo da temática “Pandemia ocasionada pelo COVID-19”, procurou tecer as relações desta com o homem, com o meio-ambiente e com os avanços tecnológicos, oferecendo reflexões sobre como não contribuir para a extinção do ser humano no Planeta Terra. Aborda o homem como sujeito social, cultural, histórico e parte da natureza.

Sobre o comprometimento e a formação para a conjuntura atual, Silva et al. (2020, p. 67) refletem: “Pensar a educação nessa conjuntura social atual é se comprometer com o processo de formação humana revestida na discussão e reflexão dos novos modos de conduzir a apreensão de conhecimentos e que se materializa na sociedade contemporânea”. Posicionamento que corrobora a teoria de projeto de trabalho (ensino) de Hernández e Ventura (1998, p. 45), a qual dialoga com as constantes mudanças.

O Projeto Integrador de Ensino utilizou 4 eixos: “Introdução”, multidisciplinar, nessa fase, cada área de conhecimento apresentou, como pôde, desde sua perspectiva, uma forma de “não adiantar o fim do mundo”. Eixos temáticos (transdisciplinar): I “Cuidado, frágil – o ambiente ameaça o homem”, II “Do princípio ao precipício - o homem ameaça o ambiente”, e III “O homem é o lobo do homem”. Foram um total de 15 semanas, com material específico em cada uma delas.

Assim, o projeto integrador “Como não Adiantar o Fim do Mundo” pretendeu “[...] por meio da produção de conhecimento científico e tecnológico pautados na ética, nos direitos humanos e na compreensão holística da vida na Terra que poderemos responder às ameaças à vida correntes e as que podem surgir” (Ramos, 2020, s.p.).

Por meio de ações transdisciplinares, o projeto foi utilizado como forma de dar continuidade ao processo formativo dos alunos, e de promover reflexões sobre as causas e consequências dos danos ao meio ambiente e à vida, e à busca de soluções. Alves (2020, p. 360) coloca sobre a educação durante o período pandêmico: “As atividades devem desafiar os alunos para que possam criar, se autorizar, participar e interagir com seus professores e pares, pensando e discutindo o momento que estão vivendo, escutando-os”.

Para inovar no sistema educacional, adequando-se às novas demandas sociais (de uma sociedade democrática, porém desigual), é necessário variar, diferenciar e reformar metodologias, unindo as vantagens de cada uma e modificando os pontos que já não cumprem com o objetivo de transmitir saberes e de estimular sobre como se dá essa articulação com a vida e o entorno dos estudantes, e com os novos acontecimentos e avanços tecnológicos.

Para Araújo (2014, s.p.), para cumprir com esse objetivo,

[...] a escola depende, paradoxalmente, tanto da capacidade de conservar suas características de excelência e de produtora de conhecimentos como da capacidade de transformação para adaptar-se a novas tecnologias e exigências da sociedade, da cultura e da ciência.

O ensino multi e transdisciplinar se apresenta como opção para esse embate, por meio de uma abordagem integral, que não cause a fragmentação e a desconexão dos conteúdos.

Sobre o papel do professor dentro desse processo, para Hernández e Ventura (1998, p. 73):

Os projetos de trabalho e a visão educativa à qual se vinculam, convidam a repensar a natureza da Escola e do trabalho escolar, pois requerem uma organização da classe mais complexa, uma maior compreensão das matérias e dos temas em que os alunos trabalham, o que faz com que o docente atue mais como guia do que como autoridade.

De maneira que se evidencia a autonomia e a responsabilidade conferidas aos alunos nessa metodologia.

Educação Física em tempos de COVID-19

A necessidade de isolamento social imposta pelo COVID-19 fez com que a Educação Física Escolar fosse repensada e tivesse que ser rapidamente adaptada para sua aplicação desde o ensino remoto e/ou a distância.

Observou-se desde professores que se negaram a esta adaptação, recusando-se a integrar o sistema remoto de ensino, até aqueles que tentaram dar seguimento as suas aulas mantendo a mesma metodologia utilizada presencialmente, ainda que agora, intermediados pela tela do computador ou smartphone. Observou-se, também, aqueles comprometidos, buscando novas metodologias e, com muito esforço, aprendendo a fazer uso de tecnologias digitais e telemáticas, que não encontraram mais que escassa assistência de alunos, câmeras desligadas, ausência de interação nas lives e não entrega das tarefas propostas. Porém, nesse cenário inicial de incertezas e dificuldades, várias iniciativas obtiveram êxito, como é o caso da presente pesquisa. Desde o início, ou fazendo uso do conhecimento obtido de tentativas iniciais pouco satisfatórias e se remodelando, essas práticas configuram, hoje, uma mudança, ou ampliação, do paradigma da Educação Física. Essa disciplina se mostra apta para se adaptar às novas demandas sociais, culturais, políticas e econômicas, podendo, ainda nesse período, estabelecer diretrizes que incorporem definitivamente esses avanços, incluída sua relação com as mídias digitais.

Godoi et al. (2021), em estudo sobre os professores de Educação Física como experts adaptativos e buscadores de inovação, colocam que essas características são alcançadas pelos professores como resultado de comprometimento, empenho pessoal e proatividade, acima das condições encontradas para que se desenvolvam as aulas. Assim, se habitualmente, configura-se como algo positivo à criatividade e ao comprometimento do professor, nesse período, essas características serão acentuadas, mas pode-se considerar esse momento como uma oportunidade para repensar e reconfigurar a Educação Física, adaptando-a às novas demandas. Ademais, trazer a atual epidemia a contexto e instrumentalizar os alunos faz com que eles sejam colocados como interventores protagonistas no processo, desenvolvendo autonomia e reflexão crítica. E é necessário dizer que essas ações foram desenvolvidas dentro da ementa do curso e da disciplina.

Associado ao desafio de adaptação das práticas docentes, o período de isolamento modificou a rotina das pessoas, diminuindo a mobilidade física e interrompendo a prática de exercícios físicos. Devido às consequências do sedentarismo, tornou-se necessário incentivar a prática de maneira e em locais adaptados. Os estudantes também tiveram restringidas suas atividades físicas, inclusive pela suspensão das aulas de Educação Física que, para muitos adolescentes, é o único momento de movimentação corporal.

Nesse período, estimular a prática segura e ofertar possibilidades e opções não apenas mantêm o bom funcionamento das funções orgânicas, mas também é um importante meio de controle da ansiedade e depressão, relatados com frequência pelos estudantes no período pandêmico, observação corroborada por estudos como o de Pedrosa e Dietz (2020).

Para a atual condição sanitária, Vanz (2020, p. 73) sugere “atividades baseadas numa concepção didática de ensino que promove e apoia a autonomia e a autorresponsabilidade dos alunos com a prática de exercícios funcionais feitos em casa”.

Pedrosa e Dietz (2020) observaram de que maneira as aulas de Educação Física estão sendo ofertadas nesse período em que as aulas presenciais estão suspensas, encontrando que se desenvolvem por meio de aulas teóricas e práticas (dança e brincadeiras), considerando um avanço a oferta de dança, tratando-se este um conteúdo frequentemente marginalizado nas aulas de Educação Física Escolar.

Dessa maneira, com trabalho, reflexão e criatividade, a Educação Física está sabendo calçar o caminho por onde percorrer em época de pandemia.

Metodologia

Pesquisa quanti-qualitativa, descritiva, no formato pesquisa-ação, envolvendo levantamento bibliográfico e análise de respostas e relatos dos participantes, cujo objetivo foi observar uma experiência da Disciplina Educação Física no sistema RED.

A pesquisa-ação associa a pesquisa a uma ação que busca a resolução de um problema. Por meio dessa busca, o pesquisador intervém na realidade estudada (Prudêncio, 2014). Tripp (2005, p. 443) assegura que se trata de: “[...] toda tentativa continuada, sistemática e empiricamente fundamentada de aprimorar a prática”.

Foram inclusos, no Projeto Integrador de Ensino “Como não Adiantar o Fim do Mundo”, todos os alunos do ensino médio do IFMT – Primavera do Leste (n=638). Os dados derivam de uma ampla ação, proveniente da metodologia de ensino por projeto, ocorrida entre os meses de maio e outubro de 2020, na qual estavam involucrados um total de 13 professores, e se desenvolveu em 15 módulos (semanas).

Os dados numéricos foram inseridos e tabulados em uma planilha Excel, e os dados qualitativos foram analisados desde o Método Análise de Conteúdo, de Bardin (2010). Procedendo-se, assim, à decodificação das mensagens para alcançar o núcleo de compreensão do texto, para, por fim, proceder o tratamento interpretativo dos resultados, obtendo-se as categorias de análise, optou-se pela leitura flutuante que, segundo Bardin (2010, p. 71), se refere à “[...] leitura intuitiva, muito aberta a todas as ideias, reflexões, hipóteses [...]”. Ainda de acordo com essa autora, “a análise de conteúdo trata-se de um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das mensagens” (Bardin, 2010, p. 38).

Montando a rede

Um total de 638 alunos foi incluído no projeto. 3,70% (30 alunos) não acessaram o ambiente virtual. Destes, 4 alegaram não dispor de internet, 2 utilizaram material impresso disponibilizado pelo Centro de Atendimento ao Estudante, e o restante, não ofereceu justificativa.

Para os alunos que não acessaram o projeto, autores como Silva et al. (2020) conjeturam se tratar de dificuldade no acesso às tecnologias e/ou aos conhecimentos básicos técnicos; à desigualdade social e/ou tecnológica/digital; e à residência dos alunos se encontrar fora da área de cobertura digital. Na pesquisa de Silva et al. (2020), 71,45% não responderam às atividades remotas. Acredita-se que, na presente pesquisa, o empréstimo de computador, a subvenção de dados de rede e o acompanhamento constante dos alunos foi capaz de mitigar essas dificuldades. Vanz (2020), especificamente sobre a Disciplina de Educação Física, contou com uma participação de 85% dos alunos.

Uma pesquisa sobre o uso de redes sociais e aplicativos foi feita dentro do projeto, por meio de Formulário Google Docs. Segundo os respondentes (n=428), 91,8% utiliza Whats App; 81,8% Instagram e 81,8% YouTube (Gráfico 1).

Fonte: a autora.

Gráfico 1 Redes sociais utilizadas pelos alunos (n=428)*As redes sociais marcadas que entraram em “outras” e foram especificadas pelos alunos. 

Inicialmente, houve resistência por parte dos alunos, por fatores como associar o período em casa com férias (Alves, 2020); falta de letramento digital (Silva et al. 2020); desinteresse pela educação (Bauman, 2007); relação do ambiente virtual com atividades exclusivamente de lazer; famílias economicamente desfavorecidas para as quais a educação, no período pandêmico, não é uma prioridade, preferindo que os filhos se dediquem a trabalhar e a contribuir com o orçamento doméstico; pais que se sentem despreparados a respeito do conteúdo e impotentes para motivar e disciplinar seus filhos para as aulas, o que gerou, paradoxalmente, expressões de valorização e reconhecimento da tarefa, por vezes árdua, dos professores. Silva et al. (2020) encontraram entre alunos de escolas públicas de Ensino Fundamental e Médio que 66,8% dos alunos relataram dificuldades com as atividades remotas.

Conseguir a participação e a audiência dos alunos demandou muito tempo e esforço: busca de maneiras de relacionar o conteúdo com assuntos que resultassem de interesse, contato e atendimento constante pela plataforma utilizada (Google Classroom), por lives (momentos de interação síncrona) através do Google Meet, por e-mail, pela rede social Instagram e, especialmente, por Whats App. Resultou ser este aplicativo o principal meio de contato que, embora efetivo, ocasionou uma demanda constante aos professores. O Whats App também conseguiu melhor adesão dos alunos em Silva et al. (2020), comparado com a plataforma Google Classroom.

Embora houvesse a disponibilização semanal de material motivador, os relatos habitualmente eram feitos apenas para a data de entrega. Esse fato também foi constatado em Alves e Moreira (2017). Informações constantes de notas parciais obtidas pelos alunos resultavam um motivador para a entrega das tarefas, incluídas aquelas em atraso.

A avaliação aconteceu por meio dos relatos no Diário de Bordo, que permitiu evidenciar, acompanhar e direcionar o aprendizado dos alunos, proporcionando ainda meios de frequentes reorganizações do processo e do conteúdo. Solicitaram-se o registro das percepções sobre o material motivador e, em algumas ocasiões, a abordagem de temas específicos ou resposta a perguntas definidas no material. O relato podia ser feito escrito, por áudio (podcast) ou vídeo, estimulando ainda os alunos a utilizar as mais diversas formas de expressão, como a inclusão de imagens e desenhos.

Houve uma primeira reunião geral, via Google Meet, na qual apresentou-se o projeto e esclareceu que as atividades aconteceriam por meio do Google Classroom, com especificações de como utilizar essa plataforma.

E daí? Deu jogo?

Assim, sobre os conteúdos da Educação Física dentro do projeto, inicialmente foi promovida a manutenção de uma rotina ativa, por meio de exercícios já praticados pelos estudantes, como caminhada, corrida e ciclismo. Nas propostas de práticas específicas, limitou-se ao máximo a utilização de materiais, preferindo aqueles reciclados e/ou aproveitados por já estarem disponíveis na residência. Utilizou-se ainda, em algumas práticas, como em Vanz (2020), apenas o peso do próprio corpo.

Neste estudo, foram citados apenas os conteúdos relacionados com a disciplina Educação Física. Para conhecimento abrangente do Projeto, consultar Ramos (2020) e Ramos et al. (2020).

Entre o material motivador da Semana 1, houve um vídeo em que os professores se apresentaram, falando sobre sua formação e sua expectativa com o projeto. Pretendeu-se, além da apresentação do projeto, ocasionar a proximidade entre docentes e discentes.

Na Semana 2, foram abordados os conceitos sobre vida, morte e a distância relativa entre eles nas diversas disciplinas, falando sobre saúde física e mental. Nessa semana, a Educação Física contribuiu com uma videoaula sobre “Benefícios do exercício físico para o bem-estar”. Foi utilizada uma linguagem fácil, muito visual, compreendendo as dificuldades e inseguranças dos alunos nesse momento inicial da educação intermediada pelas TDIC´s. Por meio dos relatos, observou-se plena consciência pela maioria dos alunos sobre a importância da prática de exercício físico para a qualidade de vida, e assim, saúde física e mental.

Na Semana 3, foram disponibilizados três materiais motivadores, e sugerida a escrita de um texto dissertativo-argumentativo em norma-padrão da Língua Portuguesa, sobre o tema “Exercício Físico e COVID-19”, solicitando aos alunos que selecionassem, organizassem, e relacionassem, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para a defesa de seu ponto de vista. Com um mínimo de oito e um máximo de trinta linhas, objetivando associar a atividade com o desenvolvimento de um texto, segundo a normativa do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

Buscou-se utilizar materiais em plataformas conhecidas dos alunos. Os materiais foram: o texto “Corona vírus: afinal, pode ou não pode sair para correr e pedalar na rua?”, de Senechal (2020), publicado em uma revista de distribuição semanal no Brasil, que possui como fonte a Organização Mundial da Saúde e a consultoria de médicos atuantes no País; um vídeo do canal YouTube “Pra Quem Pedala” (2020), em que foi apresentada uma carta assinada por trinta e dois pesquisadores do Reino Unido na qual se sugere a governos que estimulem a caminhada e ciclismo durante a pandemia COVID-19; e um pequeno vídeo, a modo de paródia que circula pelo Whats App, com parte tendo sido gravada pelo aplicativo Tik Tok sobre uma experiência com a participação em lives de exercício físico, ou seja, aulas ao vivo, na qual o professor está em casa ou na academia, e o aluno acompanha a aula desde sua casa.

Nas redações apresentadas posteriormente por todos os alunos que participaram do projeto, pôde-se observar a compreensão deles sobre a importância da prática de exercício físico para a saúde física e mental, a maior exposição ao vírus àqueles que padecem de comorbidades (muitas relacionadas ao sedentarismo, como pressão alta e diabetes), com a consciência sobre a necessidade de medidas protetivas para a prática (realização na própria residência, praticar individualmente, utilizar máscara, fazer uso constante do álcool em gel, não compartilhar objetos etc.), e também, a consciência e o temor demonstrados por alguns alunos sobre romper o período de isolamento (estávamos no início na pandemia). Na sequência, são apresentados dois trechos constantes nas redações de dois diferentes alunos que são representativos da opinião expressada pela maioria deles.

Não é segredo pra ninguém que essa pandemia está deixando as pessoas desnorteadas e sem saber como será daqui pra frente, com isso vem a preocupação em fazer atividades físicas e manter o corpo em forma, mas… será uma boa ideia praticar exercícios físicos no meio de uma pandemia? [...] sim é bom fazer exercícios [...] se formos analisar o vírus e sua forma de transmissão, não tem o menor problema em praticar exercícios desde que sejam adequados alguns hábitos e regras, como por exemplo ficar 1 metro ou mais de distância das pessoas, é muito bom se exercitar ao ar livre, não só por questões de corpo, mas para manter a sua saúde mental [...] (Aluna A.L., 1º ano).

Para o bom funcionamento de nosso sistema imunológico, e nossa saúde como um todo, é fundamental a prática de exercícios físicos. Essa prática reduz o câncer, doenças cardiovasculares e diabetes, que se configuram como doenças preexistentes, e podem ser impulsionadoras do COVID-19 [...] (Aluno D.J.M., 2º ano).

A Semana 5, que contou com o conteúdo da disciplina Educação Física, teve como tema “Pandemias”. Foi disponibilizado o vídeo “A peste negra” do canal do YouTube Nerdologia (2020), e também, uma videoaula com o título “Peste Negra e concepção de corpo na Idade Média Europeia”, no qual ainda é abordada a história da Educação Física naquele período histórico. A linguagem é fácil, com muito estímulo visual, fazendo ainda referência à cultura adolescente. Solicitou uma reflexão sobre pandemia, corpo e cultura. Os alunos trouxeram referências às práticas de higiene, marcadores sociais, influência religiosa, Inquisição (e perseguição às mulheres), e demonização da homossexualidade. O trecho a seguir, parte do texto escrito no diário de bordo de uma aluna sobre o material motivador, condensa, ao menos em parte, as reflexões apresentadas pelos alunos.

A concepção de corpo e cultura estão altamente relacionados à Pandemia [...] conceitos que obviamente errados e que ignoram a ciência, estão bem presentes hoje na maioria, e o que isso implica na Pandemia que hoje estamos vivendo? É a falta de credibilidade nos fatos, e pensamentos como: é castigo de Deus, sempre na tentativa de ‘tirar as responsabilidades de nós seres humanos’, faz com que não seguimos as orientações de especialistas, colocando a sua vida em risco e a de outras pessoas (Aluna E.F., 2º ano).

Considerando a receptividade dos alunos e com o objetivo de, mais do que estimular a prática de exercício físico, instrumentalizar os alunos para essas práticas, no Módulo II, especificamente na Semana 9, iniciou-se o “Mexa-se!”, com a proposta de trazer uma prática física por semana (um total de quatro semanas), as quais deveriam ser experimentadas, realizadas, e posteriormente, feito o registro delas, escrito, por áudio ou por vídeo.

Levando-se em consideração a necessidade do cumprimento da ementa da disciplina, mesmo percebendo a necessidade de adaptação desse período educacional inusual, as atividades propostas no “Mexa-se!” se relacionavam com o conteúdo e com o período do Ensino Médio em que seriam abordadas, em conformidade com a ementa e divisão curricular utilizada pela professora.

Houve a decisão de envolver todos os professores do projeto no estímulo aos alunos, propondo que cada um enviasse um pequeno vídeo onde pudesse ser observado em práticas de atividade ou exercício físico. Foi excelente a acolhida demonstrada pelos alunos a esse material que pareceu cumprir com o objetivo, além de aproximar professores e alunos, conclusão esta obtida por meio dos relatos. Inclusive, animaram-se a enviar vídeos deles mesmos em diferentes práticas, como corrida, ciclismo, remo e equitação.

A primeira videoaula do “Mexa-se!” trouxe o alongamento, com a sugestão da prática de duas a três vezes por semana. A videoaula foi filmada no próprio Instituto, que disponibilizou o equipamento e um técnico para fazer a filmagem.

Com movimentos simples e ligeira progressão no grau de dificuldade, o alongamento foi relacionado com a prática de esportes coletivos individuais, presente nos três anos do ensino médio, com as ginásticas de conscientização corporal (conteúdo específico dos terceiros anos) e com o relaxamento promovido pela prática, extremamente benéfico ao corpo e à mente, especialmente nesse período de ansiedade ocasionada pelo COVID-19. Foram ainda feitas associações e relações com a anatomia, em função da musculatura ativada, empregando termos anatômicos e ilustrando aqueles citados.

Nos relatos escritos sobre a prática do alongamento, foi possível observar fragmentos como:

Ao assistir o vídeo onde a professora explicou como realizar tais alongamentos, achei super fácil, porém quando comecei a fazer tive uma imensa dificuldade, pois o meu corpo estava muito tempo sem realizar nenhuma atividade física [...] (Aluna T.L., 3º ano)

Foi habitual observar os alunos nos vídeos utilizando o uniforme escolar ou o específico da Educação Física, assim como também se tornou bastante frequente a inclusão de familiares (mãe, irmãos etc.).

Na Semana 10, a Educação Física entrou com dois diferentes materiais motivadores. O primeiro deles foi uma atividade na plataforma Edpuzzle, sobre obesidade, que incluiu um link para cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC), a imagem de uma pirâmide alimentar, e três perguntas para reflexão e fixação do conteúdo. A interação promovida pela plataforma agradou aos alunos, que relataram achar bom “não fica só assistindo”. A segunda atividade da Semana 10, dentro do “Mexa-se!”, foi uma aula de Pilates, curta, com os princípios básicos e com alguns exercícios mais desafiadores para motivar os alunos. Agradou muito a possibilidade de experimentar a atividade, sobre a qual já haviam ouvido falar, mas que desconheciam a prática. Entre outros, foi possível observar os seguintes relatos:

Nunca tinha feito Pilates antes em toda minha vida, então essa pouca experiência que tive foi incrível, senti meu corpo bastante relaxado e gostei de fazer os exercícios, muito bom, consegui realizar todos os exercícios propostos que a professora passou e com isso fiquei bem feliz (Aluna A.L.R., 2º ano).

Pilates é uma prática sustentável por assim dizer, muito divertida, são exercícios que nos trazem calma e muita concentração, é o exercício que mais gostei de fazer até agora. (Aluno J.O., 2º ano)

A Semana 11 trouxe como proposta, no “Mexa-se!”, o pular corda, associado aos jogos populares. Igualmente ao ocorrido nas outras atividades, foi solicitado o relato da prática, por vídeo, áudio ou texto, incluindo as percepções sobre a prática, e uma pesquisa com pais e familiares sobre canções tradicionais que eles conhecessem para a realização dessa prática corporal. Com frequência, apareceu nos relatos dos alunos a palavra “nostalgia”, e essas resenhas revelaram uma grande satisfação com a prática. O trecho a seguir trata de um recorte do texto apresentado por uma aluna, o qual se mostra representativo dos conceitos que os alunos associaram à atividade.

Achei muito interessante a história que ela [a tia] contou de na época eles pularem corda com cipó (e serem felizes) [...]. Enfim gostei muito da experiência [...] (Aluna L.M., 1º ano).

A última proposta do “Mexa-se!” aconteceu na Semana 12 por meio da Ginástica de Condicionamento Físico, empregando a denominação comercial de CrossFit, a fim de atrair o interesse dos alunos. O conteúdo também foi relacionado à preparação física, presente em todas as modalidades esportivas. Foi utilizado apenas o peso do próprio corpo na maioria dos exercícios propostos, e duas garrafas pet com água, em dois deles. De maior exigência física, a atividade resultou muito atrativa também aos meninos que, embora participassem do Pilates, fizeram-no de maneira mais discreta. Fato que pode alertar sobre a “atribuição de sexo” às atividades, embora se trate esta observação, de base empírica, apenas de uma hipótese a qual seria necessário aprofundar o olhar. Pôde-se, por meio dos vídeos enviados pelos alunos, observar diferentes níveis de consciência corporal e habilidade, porém, todos realizando com empenho os exercícios.

A Educação Física retornou na Semana 15, com a videoaula “Educação Antirracista e Jogos Africanos”, que objetivou: promover a criação de um espaço lúdico para a Educação das Relações Raciais por meio de uma proposta pedagógica; articular as indicações legais da Lei Nº 10.639/03 (Brasil, 2003) com o conteúdo escolar, considerando o patrimônio cultural, artístico, político e social; e utilizar os jogos como objeto de reflexão. Apresentaram-se os conceitos de racismo, discriminação racial e preconceito, abordando ainda os efeitos do racismo em adolescentes. Trouxeram, como atividades práticas, a dança realizada com a canção “Zimbole” e o jogo “Mancala”.

Solicitaram-se as seguintes tarefas: escrever uma palavra que expressasse a avaliação da aula; responder às seguintes perguntas: O que a escola pode fazer para diminuir os casos de racismo? O que você pode fazer para diminuir os casos de racismo?; um pequeno vídeo ou relato sobre a prática corporal proposta com a música Zimbole; e a confecção com material reciclável de um tabuleiro de Mancala, praticar o jogo, e compartilhar uma foto ou vídeo do material elaborado. Entre as palavras escolhidas para expressar a avaliação da aula, estiveram aquelas relacionadas a aspectos positivos, por exemplo, termos como “essencial”, “respeito” e “liberdade”. Ainda que também fossem observadas, mesmo que em escassos casos, palavras como “desnecessário”.

Os relatos trouxeram como possíveis ações da escola para combater o racismo, a educação, a conscientização, a aplicação de medidas disciplinares nos casos que atentem contra a liberdade e individualidade de qualquer pessoa, e a inclusão do tema de maneira mais constante na rotina escolar. Na sequência, são apresentados fragmentos de alguns relatos.

[...] casos de racismo dentro da escola por parte dos alunos é uma “herança” adquirida em casa (Aluna A.V. de S., 3º ano).

Não ficar quieto quando alguém está realizando o racismo (Aluno R.H. 1º ano).

Os trabalhos científicos que abordaram as diferenciações entre grupos humanos mostraram que, apesar das diversidades fenotípicas, e as diferenças genéticas que existem entre grupos de características físicas semelhantes eram quase as mesmas quando comparadas com as diferenças genéticas entre grupos de características físicas diferentes (Aluna A.P., 1º ano).

Não devemos ter um pensamento que uma pessoa é menos que você por ter uma cor diferente. (Aluno L.G., 3º ano)

Dessa maneira, é possível perceber que a Educação Física, durante o período de educação em RED, promoveu não só um estilo de vida ativo, mas também oportunizou momentos de resgate da cultura popular; e promoveu reflexão crítica sobre tema sociais emergentes.

Considerações Transitórias

O sistema RED não substitui as aulas presenciais, mas se configurou como um importante meio de manutenção do processo ensino-aprendizagem durante o período de isolamento social, podendo ainda ter suas práticas associadas às práticas tradicionais, sendo um recurso para aumentar o protagonismo dos estudantes.

Fazendo parte de um projeto multi e transdisciplinar, a Educação Física não só promoveu a reflexão sobre as intersecções da disciplina com outras áreas do saber, como reafirmou seu lugar dentro do escopo escolar. O deslocamento da zona de conforto para a zona de risco trouxe experiências únicas aos estudantes. A descompartimentação de disciplinas aprimora a transformação do aluno de receptor de informações a produtor de conhecimento.

Para tanto, embora com adaptações, foi possível desenvolver parte do conteúdo em consonância com a ementa. A participação dos alunos foi excelente, considerando-se exitosa a promoção de um estilo de vida ativo entre o alunado neste período pandêmico, assim como a promoção de reflexões críticas sobre assuntos emergentes.

Entre suas limitações, é necessário citar os alunos que possuem deficiência ou dificuldades cognitivas, visto que, se presencialmente já possuem restrições, de maneira remota, essas limitações se acentuaram, comprometendo o engajamento do aluno nas aulas. Da mesma forma, aqueles que tiveram problemas para acessar o ambiente virtual de ensino por desvantagem econômica podem ser afetados pela modalidade remota de ensino.

A formação de professores para aprenderem a se mover no ambiente virtual e a promoção de grupos de discussão como espaço onde debater formas de ministrar o conteúdo de maneira atraente aos alunos tornam-se necessárias.

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[1]Ao finalizar o projeto e o ano acadêmico, foi identificada na obra de Airtor Krenak (1ª edição 2019 e 2ª edição 2020 pela Companhia das Letras) similaridade com o título: “Ideias para adiar o fim do mundo”. Esclarece-se tratar de uma coincidência, estando o título do projeto integrador de ensino aqui parcialmente descrito, relacionado com o “Relógio do Juízo Final”.

Recebido: 13 de Janeiro de 2021; Aceito: 05 de Maio de 2021

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