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Linhas Críticas

Print version ISSN 1516-4896On-line version ISSN 1981-0431

Linhas Críticas vol.27  Brasília  2021  Epub Sep 29, 2021

https://doi.org/10.26512/lc27202137594 

Artigos

Transição para o ensino fundamental II: o que dizem as pesquisas brasileiras

Transición a la escuela primaria II: lo que dice la investigación brasileña

Transition to elementary school II: what brazilian research says

Ludimila Maria da Silva Reis1 
http://orcid.org/0000-0002-6980-1899

Marlice de Oliveira e Nogueira2 
http://orcid.org/0000-0002-6295-5473

1Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) (2021). Mestranda em Educação pela UFOP Pesquisadora do Núcleo de Estudos Sociedade, Família e Escola (Nesfe).

2Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (2011). Professora Associada da Universidade Federal de Ouro Preto. Pesquisadora do Núcleo de Estudos Sociedade, Família e Escola (Nesfe).


Resumo

Este artigo apresenta uma pesquisa bibliográfica que analisou fatores escolares e sociais associados ao desempenho dos alunos na transição do 5º para o 6º ano. Os resultados indicam que são vários os fatores que afetam os alunos na transição escolar, como a entrada na adolescência, a adaptação a uma nova cultura escolar, a mudança da monodocência para a pluridocência, as exigências das disciplinas escolares, a fragmentação dos tempos e espaços, e as relações entre alunos e professores. Embora tais fatores estejam comumente presentes nos percursos de escolarização, eles afetam cada educando com maior ou menor intensidade, não sendo possível inferir um padrão de situação escolar vivenciado.

Palavras-chave Transição escolar; Ensino fundamental; Desempenho escolar; Educação

Resumen

Este artículo presenta una investigación bibliográfica que analizó los factores escolares y sociales asociados al desempeño de los estudiantes en la transición del quinto al sexto grado. Los resultados indican que son varios los factores que inciden en los estudiantes en la transición escolar, como el ingreso a la adolescencia, la adaptación a una nueva cultura escolar, el cambio de la monoenseñanza a la pluridocencia, las demandas de las asignaturas escolares, la fragmentación de tiempos y espacios, y las relaciones entre alumnos y profesores. Si bien estos factores suelen estar presentes en las trayectorias escolares, afectan a cada alumno con mayor o menor intensidad y no es posible inferir un patrón de situación escolar vivida.

Palabras clave Transición escolar; Enseñanza fundamental; Rendimiento escolar; Educación

Abstract

This paper presents a bibliographic research that analyzed school and social factors associated with student performance in the transition from 5th to 6th grade. The results indicate that there are several factors that affect students in school transition, such as entering adolescence, adapting to a new school culture, the change from monoteaching to pluridocency, the demands of school subjects, the fragmentation of times and spaces, and the relationships between students and teachers. Although such factors are commonly present in schooling pathways, they affect each student with greater or lesser intensity, and it is not possible to infer a pattern of experienced school situation.

Keywords School transition; Elementary School; School performance; Education

Introdução

O presente artigo apresenta os resultados de uma pesquisa bibliográfica sobre os fatores associados ao processo de transição escolar da primeira para a segunda etapa do ensino fundamental. No Brasil, há três grandes transições entre os ciclos da educação básica: a transição da educação infantil para o ensino fundamental 1 (EF1), a transição do 5º para o 6º ano (anos iniciais-anos finais) do ensino fundamental e, por último, a passagem dos anos finais do fundamental 2 (EF2) para o ensino médio. Uma das transições mais complexas do ensino fundamental é a passagem do 5º para o 6º ano, pois costuma ser um momento crítico neste percurso educacional. Segundo Couto (2017, p. 22), nesta etapa, ocorrem muitas reprovações e é crucial considerar que “diversos fatores se articulam simultaneamente formando um complexo contexto que pode influenciar ou não na sua ocorrência”.

Para entendermos a problemática e a complexidade dos fatores envolvidos na transição, é importante frisar a existência de estudos que têm apresentado alguns dos principais elementos que podem interferir diretamente e/ou indiretamente no desempenho dos alunos que passam por esse processo transitório (e.g. Santos, 2016b; Esteves, 2014; Borges, 2015). Além disso, podemos encontrar evidências nos dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) da ocorrência de altas taxas de insucesso escolar na transição entre as etapas do ensino fundamental, sendo que o 6º ano aparece como uma série/ano que apresenta alto índice de reprovação e de alunos fora da faixa etária esperada para esta série (distorção idade-série). No ano 2019, por exemplo, os dados nacionais divulgados pelo Inep indicaram que, no 5º ano, a taxa de reprovação foi 4,7%, enquanto o 6º ano apresentou índice 10,2%, o maior dentre todos os anos do ensino fundamental. No que diz respeito à distorção idade-série, no 5º ano verificou-se uma taxa de 17,4% que subiu, no 6º ano, para 24,3% dos alunos brasileiros em defasagem escolar (Inep, 2019).

Diante deste cenário de altas taxas de reprovação e distorção idade-série no 6º ano do ensino fundamental, percebeu-se a necessidade de compreender cuidadosamente as possíveis causas para o insucesso dos alunos nesse momento da escolarização e produzir um compilado dos fatores envolvidos no processo da transição escolar. Trata-se de uma pesquisa realizada por meio de um levantamento de estudos brasileiros desenvolvidos sobre o tema no período de dez anos, especificamente entre os anos 2009 e 2019. Com a coleta de dados, foi possível elaborar um mapeamento da produção acadêmica no período sobre a temática da transição escolar no ensino fundamental (teses e dissertações, artigos científicos, trabalhos completos em anais de eventos, trabalhos de conclusão de curso e/ou especialização) e apontar os principais resultados das investigações, identificando fatores extra e intraescolares que foram associados, pelos pesquisadores, ao processo de transição escolar. A pesquisa bibliográfica foi realizada em bases de dados científicos, como Scielo, Plataforma Capes (Teses, dissertações e periódicos) e Google Acadêmico, utilizando-se os seguintes descritores: transição do 5º para o 6º ano, transição quarta para a quinta série, transição escolar 5º + 6º, transição 5º AND 6º, transição anos iniciais e anos finais.

Ao finalizar a busca e o mapeamento dos estudos, foram identificadas 30 produções científicas que tratavam especificamente do processo de transição escolar no ensino fundamental. Para a seleção dos trabalhos, adotou-se a leitura completa dos textos, e como critério fundamental, a escolha de estudos que buscassem compreender em suas análises fatores presentes na transição dos anos iniciais para os finais do ensino fundamental e que pudessem ser associados às possíveis dificuldades vivenciadas pelos alunos além de, consequentemente, influenciar a queda de desempenho na passagem entre essas duas etapas de escolarização (5º e 6º ano).

Os 30 trabalhos identificados foram organizados observando-se as seguintes categorias: a) tipo de produção acadêmica dos trabalhos; b) área de concentração dos estudos; c) apresentação e quantificação dos estudos de acordo com as regiões do Brasil; d) temáticas centrais e/ou assuntos abordados; e) desenho metodológico das produções acadêmicas; f) referencial teórico dos trabalhos em análise; e g) principais resultados encontrados. Em seguida à organização dos estudos identificados, procedemos à análise dos fatores associados à transição escolar.

Neste artigo, apresentamos um recorte da pesquisa, focalizando estritamente os resultados encontrados pelos estudos mapeados, ou seja, os fatores que foram associados, pelos pesquisadores, à transição escolar. Estes fatores foram organizados segundo categorias estabelecidas a partir da análise do conteúdo dos textos compilados: a) adaptação escolar, passagem da unidocência para a pluridocência e a afetividade; b) adaptação e rotina escolar; c) mudança de cultura escolar; d) a transição, as disciplinas escolares e a articulação pedagógica; e) transição da infância para a adolescência; f) indisciplina e aspectos familiares; e serão apresentados neste trabalho.

Adaptação escolar, passagem da unidocência para a pluridocência e a afetividade

Compreender os impactos da transição nos processos de escolarização é de extrema importância, visto que vários fatores podem dificultar a permanência e o êxito dos estudantes em um novo ciclo educacional. Neste momento da transição do EF 1 para o EF 2, também ocorrem mudanças importantes na estrutura organizacional da nova etapa de ensino (6º ao 9º ano), que incluem o currículo, a diversificação das áreas de conhecimento, a distribuição das diversas disciplinas e dos seus respectivos professores (Brasil, 2018).

Na segunda etapa do ensino fundamental, as disciplinas curriculares passam a ser organizadas em uma estrutura temporal, sendo necessária a troca de professor a cada fim de tempo/aula. Sendo assim, no interior da estrutura organizacional do ensino fundamental, há comumente a transição de um modelo de unidocência prevalente nos cinco primeiros anos (1º ao 5º ano), para um modelo de pluridocência (vários professores e disciplinas) nos quatro últimos anos (do 6º ao 9º ano).

Diante disso, foi possível constatar que alguns pesquisadores (Andrade, 2011; Esteves, 2014; Francisco Júnior, 2014; Santos, 2016b) apontam a passagem da unidocência para a pluridocência como mais uma dificuldade vivenciada pelos alunos na transição, tornando-se ainda mais delicado o processo de adaptação nessa nova etapa de ensino.

Andrade (2011) afirma que uma das dificuldades de adaptação que os alunos enfrentam quando passam por esse momento de transição escolar está relacionada à relação com os professores ou ao aumento do número de docentes. Uma pergunta presente no questionário respondido pelos alunos em sua pesquisa foi referente às diferenças que eles perceberam entre as duas séries/anos e, dentre as respostas, destacam-se: “vários professores, a 5ª [6º ano, atualmente] é mais difícil, provas, mais matérias, horário de aula e os professores [...]” (Andrade, 2011, p. 26). Além disso, quando questionados sobre o que gostariam que fosse diferente na nova etapa de ensino, as respostas apresentadas foram similares: “[...] a dificuldade em relação às provas e, também, em relação a quantidade de matérias e professores, a fragmentação do horário, e que gostariam de ter um horário de recreio maior” (Andrade, 2011, p. 26). Em suma, as dificuldades sentidas pelos discentes estavam diretamente ligadas à forma de organização do sistema educacional e, principalmente, a um número maior de professores atuando na mesma turma.

Os resultados de Andrade (2011) evidenciaram que a passagem da unidocência para a pluridocência é um aspecto que pode se configurar como dificultador no processo de adaptação dos discentes, levando-os a um certo estranhamento no novo ciclo e apresentando-se como um dos fatores que pode interferir no desenvolvimento educacional e no comportamento dos estudantes.

Um outro elemento que pode ser relacionado à mudança da monodocência para a pluridocência é a afetividade. Essa relação entre afetividade e pluridocência pode ser constatada em alguns trabalhos que analisaram o papel da afetividade no momento da transição escolar. Esses estudos (e.g. Plácido, 2017; Santos, 2016b; Francisco Júnior, 2014) indicam que, no 6º ano, os alunos sentem falta de maior proximidade com os professores nos moldes dos anos iniciais, etapa em que os docentes permanecem durante um tempo maior com os alunos em sala de aula, possibilitando que as relações interpessoais fiquem mais intensas e próximas. Referente à importância da afetividade na relação pedagógica, Vargas e Castanha (2016) apontam a necessidade de se criar um ambiente educacional que favoreça o convívio e a aprendizagem, no qual os laços afetivos assumam um papel fundamental.

Os laços afetivos são destacados nas pesquisas de Andrade (2011) e Rosinski (2016). A primeira autora afirma que, ao ingressarem na segunda etapa do ensino fundamental, os estudantes não são mais vistos como crianças, e os professores cobram deles uma certa autonomia na realização das tarefas escolares. Essa mudança em relação às vivências nas séries iniciais, etapa em que os estudantes ainda apresentam muita dependência afetiva em relação ao professor, pode ser percebida quando Andrade aponta que “[...] o que se evidencia para o aluno da 5ª série [atual 6º ano] é que os laços afetivos ficaram em segundo plano, e o que importa agora é somente o seu desempenho intelectual” (Andrade, 2011, p. 28). Na mesma direção, Rosinski (2016, p. 18) afirma que “a falta de relações afetivas satisfatórias, na família ou na escola, pode acarretar dificuldades de aprendizagem e gerar indisciplina por conta da necessidade de que alguém lhe direcione a atenção”.

Na perspectiva dos estudos apresentados nessa seção, é válido inferir que uma boa interação entre professores e alunos se torna relevante para o sucesso escolar e que não bastam somente os saberes teóricos disponibilizados pelos docentes aos estudantes, mas também a criação de laços interpessoais na escola, possibilitando a humanização dos processos escolares.

Além disso, alguns dos estudos identificados (e.g. Andrade, 2011; Esteves, 2014) também indicam que aspectos derivados da passagem da unidocência para a pluridocência - como tipos diferentes e até mesmo opostos de práticas pedagógicas e de metodologias de ensino e/ou a dinâmica da organização do tempo/aula - também têm impacto na transição escolar.

Adaptação e Rotina: Organização do espaço/ambiente/tempo escolar

A nova rotina exigida no EF2 também é um aspecto evidenciado no processo de transição, conforme alguns dos estudos sobre o tema (e.g. Cunha, 2016; Santos & Gisi, 2017; Plácido, 2017). É presumível que a rotina escolar mude do 5º para o 6º ano, tendo em vista que cada ciclo do ensino fundamental apresenta uma estrutura organizacional diferente, e alterações na rotina exigem processos de adaptação com que os alunos precisam lidar ao longo do percurso educacional.

A alteração na rotina acontece devido às mudanças como, por exemplo, o aumento do número de professores, que ocasiona uma maior rotatividade em sala, os horários das aulas ficam mais fragmentados, havendo uma (re)organização das temporalidades. A partir do 6º ano, as aulas passam a ter 50 minutos de duração, e a cada fim de aula, há um sinal anunciando o término e a mudança de disciplina, aspectos bastante citados por pesquisadores (Cunha, 2016; Santos & Gisi, 2017; Plácido, 2017). Além da rotatividade de docentes e disciplinas, o processo de transição, em alguns casos, pode vir acompanhado de uma mudança para uma nova instituição de ensino.

De acordo com Cunha (2016), a transição para o EF 2 pode gerar expectativas nos alunos que, por sua vez, podem ocasionar medos e dificuldades de aprendizagem produzidos pelas mudanças na rotina. A autora acrescenta que um dos problemas está relacionado ao número de aulas por dia e ao tempo destinado para cada disciplina. Além disso, segundo a autora, desenvolver trabalhos e entregá-los nas datas propostas pelos diversos professores, organizar os materiais e os conteúdos são dificuldades apresentadas por alguns alunos quando ingressam no 6º ano.

As mudanças na rotina escolar e as dificuldades em lidar com as novidades também são enfatizadas no estudo desenvolvido por Santos e Gisi (2017). Ao ouvir professores que atuavam no 6º ano do ensino fundamental em escolas pertencentes à rede estadual do município de Curitiba, os pesquisadores ressaltam que, de acordo com as percepções dos docentes, uma parcela dos estudantes chegava ao 6º ano entusiasmada e curiosa em lidar com o novo, contudo, puderam ser notados sinais de insegurança devido às novidades e diferenças presentes no ambiente escolar do novo ciclo, ou seja, os estudantes eram “obrigados” a construir novos hábitos escolares para se adequarem a tal realidade. Quanto à insegurança, os autores apontam que “[...] esse sentimento é percebido pelos professores que constatam o impacto sentido pelos estudantes que frequentavam, na primeira fase do ensino fundamental, a mesma escola por vários anos e deparavam-se com ambiente e rotinas distintos” (Santos & Gisi, 2017, p. 52). Além disso, a intensidade da insegurança difere de um aluno para outro e esse sentimento também pode estar relacionado ao nível de conhecimento e de aprendizagem dos alunos, “[...] quanto menor o conhecimento, maior a insegurança e a dificuldade em acompanhar o processo no 6º ano” (Santos & Gisi, 2017, p. 53).

Plácido (2017), por sua vez, aponta a ausência de ludicidade como um outro fator associado à transição escolar e às mudanças na rotina. A autora discute a ludicidade como um componente da cultura infantil e defende que o ato de brincar não deve ser negligenciado pelos professores, independentemente de lecionarem em turmas de EF 1 ou EF 2. No estudo de Plácido (2017), a ausência do lúdico e do estímulo ao desenvolvimento de habilidades relacionadas à imaginação (o brincar) são aspectos que apareceram nos discursos das crianças participantes da pesquisa. Isso ficou evidente quando uma delas expressou que, “[...] no ano passado a professora contava sempre uma história para, depois, explicar uma matéria no quadro, ou pelo menos as pessoas tinham nomes nos probleminhas de matemática, entende? Agora não, é tudo muito sem graça” (Plácido, 2017, pp. 104-105). Parece, então, que aulas interativas, dinâmicas e não predominantemente expositivas e/ou conteudistas se tornam menos presentes no cotidiano das crianças/adolescentes na segunda etapa do ensino fundamental, e quando isso não acontece, as aulas podem tornar-se “menos interessantes” e não mais prazerosas para os estudantes.

No momento de transição, há também mudanças no espaço físico da escola que podem influenciar na rotina e no cotidiano das aulas, conforme apontam Plácido (2017) e Cunha (2016). As autoras acreditam que a forma com que o espaço escolar é organizado, nem sempre compatível com as demandas físicas e simbólicas dos alunos, pode dificultar o processo de ensino e aprendizagem, além de ser mais um obstáculo para a adaptação discente na segunda etapa do ensino fundamental. Plácido (2017) constatou que dificuldades de adaptação referentes ao tamanho e à organização do espaço físico são sentidas pelos alunos, isso porque as salas do EF 2 tendem a ser maiores e comportam, comumente, um número maior de alunos em relação aos anos anteriores.

Por fim, as pesquisas analisadas nesse tópico indicam que a entrada dos estudantes em um novo ciclo de ensino e as mudanças na rotina escolar podem causar impactos nos processos de adaptação e interferir em seus percursos educacionais (Cunha, 2016; Santos & Gisi, 2017; Plácido, 2017). Além disso, os estudos também indicam que um ambiente escolar mais bem preparado para receber os discentes poderia reduzir os impactos sentidos na transição escolar.

Mudança de cultura escolar

A mudança de cultura escolar é um outro aspecto presente na transição para o segundo ciclo do ensino fundamental e que influencia o desempenho acadêmico dos alunos no decorrer do 6º ano (Santos, 2016a; Azevedo, 2017).

As instituições escolares, de forma geral, apresentam uma “cultura escolar” similar, histórica e culturalmente construída, isto é, são organizadas mediante um “conjunto de aspectos, transversais, que caracterizam a escola como instituição” (Carvalho, 2006, p. 1). Contudo, cada unidade escolar reúne objetivos, regras e condutas especificas que levam em consideração o meio em que estão inseridas, bem como a necessidade de atuação e as práticas pedagógicas implementadas para atender a um determinado público. Nesta perspectiva, Carvalho (2006) indica que as escolas, embora inseridas em uma tradicional cultura escolar, também desenvolvem uma cultura interna própria. Assim, os alunos que precisam mudar de escola vão se deparar com um novo ambiente com regras, lógicas de funcionamento e normas particulares. Além disso, a cultura escolar também pode ser alterada no interior das etapas de ensino em uma mesma instituição; são mudanças que também fazem parte de uma cultura escolar e são provenientes de estruturas organizacionais distintas.

Os estudos de Santos (2016a) e Azevedo (2017) apontam o peso que a mudança de cultura escolar pode exercer em meio à adaptação e ao desempenho dos discentes ao ingressarem no 6º ano do ensino fundamental. Santos (2016a) acredita que, ao transitar do EF 1 para o EF 2, os estudantes da educação básica precisam lidar com dois tipos de práticas pedagógicas que possuem características distintas; além disso, nota-se uma desarticulação entre os anos iniciais e finais do ensino fundamental, que na visão deste autor, foi evidenciada, principalmente, a partir do processo de intensa municipalização dos anos iniciais do ensino fundamental no Brasil. Santos (2016a) aponta que a transição para a segunda etapa do ensino fundamental não é somente uma mudança da rede municipal para a estadual mas, também, uma mudança de cultura escolar. O autor considera a necessidade de se conhecer mais amplamente os elementos presentes na cultura das instituições que ofertam a segunda etapa do ensino fundamental para que a adaptação vivenciada pelos alunos seja rápida e favoreça o seu desempenho acadêmico.

Já Azevedo (2017, p. 46) argumenta que, quando o sujeito se encontra em um novo ambiente escolar, traz consigo vivências de outras experiências e, chegando em um novo espaço e/ou em uma situação diferente daquela com os qual estava acostumado, pode “não dar conta” das inúmeras novidades presentes. A autora salienta que essa vivência anterior “[...] servirá apenas de base para a geração de outros conhecimentos e para a construção de novas formas de agir no mundo, de entender e enfrentar a realidade”. Além disso, será preciso, segundo a autora, (re) ajustar algumas habilidades e/ou conhecimentos, aprender novas maneiras de ser e estar na escola exigidas pela cultura escolar.

A transição, as disciplinas escolares e a articulação pedagógica

Alguns estudos (Castanho, 2015; Freitas, 2016; Furtado, 2018; Dionizio et al., 2014; Silva & Ribeiro, 2014; Frazão, 2018; Cainelli, 2011; Brunoro, 2018) investigaram o desenvolvimento acadêmico e as dificuldades dos alunos que passaram pelo processo de transição a partir de algumas disciplinas e/ou conteúdos específicos.

Assim como a transição escolar do 5º para o 6º ano se configura como um momento marcado por mudanças significativas (estrutural, curricular, pedagógica), algumas disciplinas podem apresentar um grau de dificuldade maior para os alunos e ocasionar baixo rendimento escolar e/ou dificuldades de aprendizagem.

Dentre as disciplinas que pesquisadores buscaram investigar, a Matemática (presente em cinco estudos) foi a mais abordada pelos trabalhos encontrados. Provavelmente isso se deve ao baixo desempenho dos alunos da educação básica no que diz respeito ao processo de aprendizagem desta, conforme mostram os dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) de 2018, em que 68,1% dos estudantes brasileiros, com 15 anos de idade, não possuíam nível básico em Matemática (Inep, 2020).

Para muita(o)s crianças/adolescentes, a Matemática é considerada uma disciplina de caráter “muito difícil”, conforme afirma Silveira (2011). Essas impressões negativas apresentadas pelos estudantes sobre a disciplina, muitas vezes, se constituem por meio de um imaginário social composto por julgamentos negativos atribuídos à Matemática. Silveira (2011) acredita que isso resulta de ressignificações da Matemática atribuídas e decorridas pelo e do contexto histórico. A autora alega que “[...] o aluno reconhece este discurso que circula no senso comum e na comunidade escolar e, ao coabitar com os efeitos de sentido deste pré-construído, filia-se a ele; porém, ao interpretá-lo, acrescenta sentidos seus” (Silveira, 2011, p. 761).

Dentre os principais questionamentos apresentados pelos estudos acerca da relação entre Matemática e transição escolar (Castanho, 2015; Freitas, 2016; Furtado, 2018; Dionizio et al., 2014; Silva & Ribeiro, 2014), estão: a) se a transição do 5º para o 6º ano influencia a aprendizagem dessa disciplina; e b) quais são os principais problemas e/ou dificuldades acarretados em seu desenvolvimento no ambiente escolar, tanto referentes à pratica docente, quanto ao processo de aprendizagem, ao desempenho acadêmico e à assimilação dos conteúdos por parte dos alunos.

Nos estudos analisados (Castanho, 2015; Freitas, 2016; Furtado, 2018; Dionizio et al., 2014; Silva & Ribeiro, 2014), foi possível reconhecer que as tensões em relação à Matemática vêm acompanhando os alunos desde as séries iniciais da educação básica, e devido às inúmeras mudanças ocasionadas pelo processo de transição, algumas dificuldades ficam ainda mais evidentes, como aquelas decorrentes de lacunas nas aprendizagens previstas nos currículos dos anos anteriores.

A articulação pedagógica do ensino de História na transição do 5º para o 6º ano foi pesquisada por Frazão (2018) e Cainelli (2011). Frazão (2018) analisou os impactos da transição no ensino dessa disciplina atentando-se para os seguintes aspectos: a) autonomia dos alunos; b) relação professor-aluno; c) metodologia docente; e d) conteúdos ministrados. Os resultados da pesquisa de Frazão indicam que os alunos do 6º ano demonstravam ter dificuldades para a sistematização e apropriação dos conteúdos de História estudados. Além disso, para a autora, não havia uma articulação pedagógica entre as duas etapas do ensino fundamental, tendo em vista que, nas respostas dos alunos, não foram identificadas “[...] segurança, afinidade ou apropriação quando nos remetemos aos assuntos trabalhados, propostos e impostos” (Frazão, 2018, p. 77).

Na perspectiva de Frazão (2018), a mudança do professor polivalente para docentes especialistas se torna um fator dificultador para a articulação pedagógica no que tange à aprendizagem da disciplina História. Assim, a autora ressalta que, ao ingressarem no 6º ano, os alunos precisariam estar devidamente preparados para lidar com as mudanças e encarar o novo ciclo com uma certa autonomia, principalmente, na realização das atividades e/ou projetos propostos. Embora a autora identificasse problemas na articulação pedagógica entre o 5º e o 6º anos, os alunos pesquisados não demonstravam dificuldades referentes à adaptação aos novos professores. Além disso, foi possível notar que os alunos não eram intencionalmente preparados para o ingresso no segundo ciclo, aspecto importante para uma articulação pedagógica. Entretanto, a autora deduziu que, mesmo sem uma maior articulação entre as etapas de ensino, as práticas pedagógicas dos professores do 5º e do 6º ano não eram tão distantes ou antagônicas. Frazão (2018, p. 91) também indica que, quando os alunos saíam do 5º ano, observava-se algumas dificuldades, como “[...] carência de conteúdos, com dificuldades na leitura e na escrita, e inclusive com um uso ortográfico de termos comuns ao cotidiano expressamente comprometido e ingressam no 6º e o finalizam com as mesmas dificuldades já vindas de anos anteriores”. Esse dilema dos alunos ingressarem no 6º ano apresentando dificuldades em conteúdos provenientes de currículos de anos anteriores foi um aspecto também identificado quanto à disciplina Matemática.

Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Básica (DCNs) (Brasil, 2013) é bastante destacada a importância da articulação pedagógica no ensino fundamental para se promover uma continuidade na trajetória escolar dos alunos. No entanto, a partir dos estudos de Frazão (2018) e Cainelli (2011), pode-se supor que, na realidade, temos a existência de uma frágil articulação entre as diferentes etapas da educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio), especialmente entre os anos iniciais e finais do ensino fundamental. O problema ainda foi acentuado com o processo de descentralização e municipalização das primeiras etapas da educação básica, além da distância simbólica entre as etapas. Isso porque os ciclos da educação apresentam culturas escolares distintas, ocasionando inúmeras mudanças em sua forma de organização e/ou estruturação (Frazão, 2018; Cainelli, 2011).

Diante do que foi discutido, destaca-se que a ausência de uma adequada articulação pedagógica entre as etapas do ensino fundamental pode trazer consequências para o desempenho acadêmico dos alunos. É necessário enfatizar que “as articulações no interior do Ensino Fundamental, e deste com as etapas que o antecedem e o sucedem na Educação Básica, são, pois, elementos fundamentais para o bom desempenho dos estudantes e a continuidade dos seus estudos” (Brasil, 2013, p. 120).

A Língua Portuguesa também se apresenta como uma disciplina em que muitos alunos apresentam dificuldades no processo de escolarização. Pode-se dizer que a leitura e a interpretação de textos são as principais habilidades que, muitas vezes, ainda não estão suficientemente consolidadas pelos alunos no ensino fundamental. Os dados apresentados pelo Relatório Brasil no Pisa 2018 (Inep, 2020) também indicam a baixa proficiência dos estudantes brasileiros em leitura. Naquele ano, 50% dos estudantes brasileiros não possuíam nível básico em leitura, ou seja, não adquiriram o mínimo de habilidades esperadas até a conclusão do ensino médio. Diante disso, é importante apontar que consolidar habilidades para o domínio da Língua Portuguesa é necessário para um desempenho acadêmico satisfatório, não só na própria disciplina, mas também nas outras que fazem parte da grade curricular, isso porque, habilidades de leitura, escrita e interpretação de texto são essenciais para o processo de escolarização. Referente a essa disciplina, foi encontrado somente um trabalho (Brunoro, 2018) que buscou analisar minimamente alguns aspectos da Língua Portuguesa na transição entre os dois ciclos do ensino fundamental.

Tal estudo de Brunoro (2018) demonstrou que os professores por ela investigados tinham pouco conhecimento das diretrizes curriculares oficiais e, mais uma vez, se evidenciou uma desarticulação pedagógica em meio ao processo de transição, visto que os professores do 6º ano pareciam não conhecer os conteúdos de Língua Portuguesa ensinados na primeira etapa do ensino fundamental. A autora assinala a importância de os professores terem esse conhecimento, pois “[...] serve de apoio para pensar o que meu aluno traz de conteúdos ou que precisará ter como base, assim terá condições de fazer um diagnóstico” (Brunoro, 2018, p. 29).

Referente às dificuldades dos alunos quando chegam ao 6° ano, um pouco mais da metade dos professores participantes da pesquisa de Brunoro (2018) consideraram que dificuldades com leitura e interpretação de texto eram os problemas apresentados pela grande maioria dos estudantes. É pertinente frisar que os docentes têm um papel fundamental na articulação pedagógica na transição entre ciclos, já que terão de lidar diretamente com o processo de aprendizagem dos alunos. A autora também afirma que se essas dificuldades não forem vistas e/ou entendidas pelos docentes, elas tendem a se agravar, dificultando o processo de transição e resultando em um baixo desempenho acadêmico dos estudantes.

Por fim, pode-se notar o pequeno número de trabalhos identificados sobre a transição escolar do 5º para o 6º ano com foco em disciplinas escolares específicas, indicando que ainda há uma lacuna nesse tipo de investigação.

Transição da infância para a adolescência e a Imaturidade dos alunos

A passagem da infância para adolescência também aparece nos trabalhos como um aspecto associado às dificuldades encontradas pelos estudantes no momento da transição escolar (Maia et al., 2019; Cunha, 2016; Francisco Júnior, 2014).

Assim, além das mudanças na estrutura organizacional entre os dois ciclos de ensino, os alunos também terão que enfrentar a passagem da infância para a adolescência. Essa dupla transição envolve não somente uma mudança cronológica, mas também comportamental, construção de novas (re)significações sobre o seu papel na sociedade e, consequentemente, da identidade, ou seja, é uma fase em que se espera das crianças/adolescentes comportamentos mais maduros, exigindo-lhes mais responsabilidades e autonomia para a realização das tarefas e afazeres diários. Acredita-se que essa fase “[...] representa para o indivíduo o processo de distanciamento de formas de comportamento e privilégios típicos da infância, também, a aquisição de características e competências que o capacite a assumir os deveres e papéis sociais do adulto” (Francisco Júnior, 2014, p. 19).

Nesta perspectiva, Cunha (2016) aponta que os alunos egressos do 5º ano entram na nova série ainda imaturos, apresentando dificuldades em lidar com os novos hábitos, despreparados para tantos desafios e novidades da nova etapa escolar. Desse modo, uma certa imaturidade que alguns alunos apresentam pode estar relacionada às dificuldades de adaptação, tendo em vista que as mudanças entre os ciclos e o momento de novas descobertas coincidem com as mudanças corporais e cognitivas, concomitância que pode gerar conflitos e dificultar, de maneira expressiva, os processos escolares. Além disso, sabemos que cada aluno tem o seu próprio ritmo de amadurecimento, encarando as mudanças de modo particular.

Portanto, como indicado por Francisco Júnior (2014), é necessário que os agentes escolares tenham conhecimento sobre as principais barreiras e dificuldades ocasionadas por esses processos, tanto a transição da infância para a adolescência, quanto a passagem do 5º para o 6º ano, para que seja promovido um acompanhamento sistemático, auxiliando os alunos no enfrentamento das dificuldades escolares.

Indisciplina e aspectos familiares

Como foi possível observar por meio da multiplicidade de elementos associados à transição, trata-se de um fenômeno bastante complexo que se constitui por inúmeros fatores intra e extraescolares que podem afetar de maneira direta ou indireta o itinerário escolar dos alunos. Entretanto, dois outros fatores associados aos estudantes e às suas famílias também puderam ser identificados nos trabalhos (Francisco Júnior, 2014; Paula et al., 2018; Cunha, 2016; Andrade, 2011; Santos & Gisi, 2017; Raddi, 2015): 1) o papel da família na transição; e 2) o fenômeno da indisciplina, embora este último esteja também imbricado aos fatores internos do funcionamento escolar.

A sociologia da educação tem demonstrado que as famílias exercem um papel fundamental no acompanhamento do percurso de escolarização das crianças e adolescentes no contexto educacional contemporâneo (Nogueira, 2005). Esse trabalho de acompanhamento da vida escolar dos filhos é geralmente concebido pelas famílias de diferentes grupos sociais (em graus e modos diferentes) como um investimento necessário para o alongamento dos estudos. No entanto, Nogueira (2011) indica que esse acompanhamento é comumente reduzido na segunda etapa do ensino fundamental, com exceção no caso de filhos de professores, em que o acompanhamento familiar da escolarização é habitualmente mais intenso e prolongado. Assim, na esteira de Nogueira (2011), podemos pensar que, no momento da transição para a segunda etapa do ensino fundamental, pode ser comum que os pais e/ou responsáveis designem aos filhos adolescentes uma certa autonomia, ou seja, deduzam que eles são suficientemente capazes de assumir as responsabilidades escolares e não precisem, necessariamente, de um acompanhamento parental tão efetivo quanto o que era realizado nos anos iniciais da escolarização.

Entretanto, a pesquisa de Francisco Júnior (2014) alerta para a importância do acompanhamento familiar durante o processo de transição. Segundo o autor, os pais e as mães devem ficar atentos para reconhecer as dificuldades que crianças/adolescentes enfrentam nessa etapa do percurso escolar, e tais acompanhamento e atenção configuram-se como aspectos positivos no percurso educacional dos educandos.

Assim, o elo entre a escola e a família precisa estar bem estabelecido, pois o autor acredita que, dessa maneira, os impactos da transição no percurso educacional dos educandos podem ser minimizados. Além disso, quando a família tem conhecimento e entendimento sobre os principais problemas geradores das possíveis dificuldades que comprometem o desempenho acadêmico estará mais preparada para realizar um acompanhamento escolar efetivo (Paula et al., 2018; Cunha, 2016).

Por sua vez o fator indisciplina também foi apontado como um problema prejudicial para os alunos que ingressam no 6º ano devido às mudanças ocasionadas por esse processo. Os fatores apontados e discutidos nas categorias anteriores, principalmente os relativos aos processos de adaptação escolar, podem contribuir para produzir situações de indisciplina em sala de aula. Da mesma forma, Andrade (2011, p. 22) ressalta que a “falta de integração entre professores e alunos alia-se à falta de integração entre as disciplinas e programas escolares. Tal cenário contribui de certa forma para as situações de indisciplinas e conflitos em sala”.

Pensando no cenário do 6º ano em que os alunos precisam se adaptar à nova realidade de ensino e a uma nova rotina educacional, o interesse pelas disciplinas e atividades escolares pode ser reduzido levando-os a um sentimento de desmotivação. É possível que o desinteresse dos estudantes possa ocasionar reações e comportamentos inadequados que serão percebidos pelos professores e pela escola como problemas indisciplinares (Santos & Gisi, 2017; Raddi, 2015).

Na perspectiva desses autores (Andrade, 2011; Santos & Gisi, 2017; Raddi, 2015), a presença de comportamentos indisciplinados pode se configurar como um tipo de resposta para uma insatisfação dos alunos frente a tantas mudanças advindas da transição entre as duas etapas do ensino fundamental. Contudo, a indisciplina foi um fator pouco discutido no conjunto dos 30 trabalhos identificados.

Considerações finais

Buscamos identificar, nos trabalhos analisados, os fatores escolares e/ou sociais que poderiam ajudar a explicar a queda do rendimento dos alunos no período transitório do percurso escolar entre o 5° e 6º anos do ensino fundamental. A primeira constatação foi que as explicações para as dificuldades escolares apresentadas pelos estudantes no 6º ano não são simples e nem lineares. Ao contrário, há múltiplos e complexos elementos que se associam e influenciam o baixo rendimento dos discentes nessa etapa de ensino. Esses elementos aparecem associados e, em algumas vezes, imbricados na maioria dos estudos apresentados, embora cada pesquisa tenha focalizado com mais ênfase fatores específicos no âmbito do objeto investigado. Assim, ao término desse trabalho, concluímos que são várias as situações que dificultam o processo de transição no ensino fundamental, e é justamente a associação desses diferentes fatores no cotidiano da vida escolar que produz os maiores efeitos sobre o desempenho dos estudantes.

Os resultados indicam que o processo de transição escolar demanda tempo por parte dos alunos que precisam, além de vivenciar e superar as dificuldades de adaptação a uma nova realidade educacional, demonstrar suas aprendizagens em diferentes formas de avaliação. A partir da análise das pesquisas, pôde-se constatar que problemas derivados da adaptação dos estudantes ao 6º ano se configuram como potenciais influenciadores do baixo desempenho das crianças e/ou dos adolescentes devido a um conjunto de mudanças nessa passagem entre os dois ciclos do ensino fundamental. Elementos como a nova organização da rotina escolar, que inclui temporalidades diferentes das aulas em relação aos anos anteriores, a organização institucional, a quantidade de professores e disciplinas, as metodologias diversificadas, as relações interpessoais e os vínculos afetivos entre professores e alunos menos intensos daqueles experienciados nos anos iniciais, são as principais mudanças enfrentadas pelos discentes.

Concluímos, contudo, que o fenômeno da transição, especificamente do 5º para o 6º ano, consiste em um processo multifatorial, visto que são vários os elementos que influenciam os processos escolares e interferem nas experiências dos alunos em um novo ano escolar. Ressaltamos que os estudos analisados nesse artigo indicam que os fatores presentes no interior da escola (intraescolares) parecem ser mais determinantes para as dificuldades enfrentadas pelos estudantes no momento da transição escolar. Além disso, compreendemos que os elementos que foram discutidos, em sua maioria, são interdependentes, ou seja, atuam em conjunto, o que torna todo esse processo ainda mais complexo e, por vezes, prejudicial ao itinerário educacional. Portanto, evidencia-se a necessidade de que ações institucionais que tenham o intuito de minimizar os impactos causados pela transição nos percursos escolares sejam pensadas e planejadas cuidadosamente pelos agentes escolares nos vários níveis da gestão educacional, tanto no âmbito do poder público (federal, estadual e municipal), quanto da gestão administrativa e pedagógica das unidades escolares. Além disso, os professores, e também os alunos e suas famílias, precisam estar cientes das dificuldades e dos problemas dessa transição a fim de favorecer o desenvolvimento educacional, fazendo com que as taxas de reprovação e de distorção idade-série se tornem menos críticas em nosso país.

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Recebido: 19 de Abril de 2021; Aceito: 21 de Setembro de 2021

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