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Jornal de Políticas Educacionais

versão On-line ISSN 1981-1969

J. Pol. Educ-s vol.13  Curitiba  2019  Epub 18-Jul-2022

https://doi.org/10.5380/jpe.v13i0.71776 

Artigos

Desigualdades educacionais: estruturas, processos e modelos de justiça. O debate ao longo dos últimos cinquenta anos na França

Educational inequalities: structures, processes, and models of justice. The debate in France over the last fifty years

1Sociólogo, professor, coordenador e orientador de pesquisas na Université Bordeaux II e na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS) de Paris, França. Pesquisador do Centre d’Analyse et d’Intervention Sociologiques (CADIS/ EHESS)


Resumo

Desde a criação da escola republicana francesa no fim do século XIX, o modo de produção das desigualdades educacionais foi profundamente transformado. Enquanto, na escola democrática de massas, as desigualdades educacionais eram consequência direta das desigualdades sociais, hoje elas são resultantes de uma produção contínua e de um efeito de agregação de pequenas desigualdades. Ao longo do século passado, a concepção de justiça escolar também foi profundamente transformada sob a influência do modelo de igualdade de oportunidades. Hoje, as contradições desse modelo de justiça conduzem os debates educacionais franceses.

Palavras-chave: educação; igualdade de oportunidades; desigualdades educacionais; desigualdades sociais; sociologia dos sistemas educacionais.

Abstract

Since the creation of the French Republican school at the end of the nineteenth century, the mode of production of educational inequalities has changed profoundly. While educational inequalities were at first a direct consequence of social inequalities, in the mass democratic school system they are continuously produced by an aggregation effect of small inequalities. Over the last century, the conception of educational justice has also been profoundly transformed under the influence of the equal opportunities model. Nowadays, the contradictions of this model of justice structure French debates on education.

Keywords: education; educational inequalities; equality of opportunities; social inequalities; sociology of the school system

Résumé

Depuis la création de l’école républicaine française à la fin du xixe siècle, le mode de production des inégalités scolaires s’est profondément transformé. Alors que les inégalités scolaires étaient la conséquence directe des inégalités sociales, dans l’école démocratique de masse, elles sont aujourd’hui une production continue et un effet d’agrégation de petites inégalités. Au cours du siècle passé, la conception de la justice scolaire s’est aussi profondément transformée sous l’influence du modèle de l’égalité des chances. Aujourd’hui, les contradictions de ce modèle de justice organisent les débats scolaires français.

Mots-clés: éducation; égalité; des chances; inégalités scolaires; inégalités sociales; sociologie de l’école.

Para a maior parte dos sociólogos, as desigualdades educacionais traduzem menos as desigualdades de resultados e trajetórias dos alunos, as desigualdades entre indivíduos, do que o fato de que essas desigualdades são fortemente determinadas pela origem social e cultural dos alunos. Esta “lei” da determinação mais ou menos rígida das desigualdades educacionais pelas desigualdades sociais é confirmada nas estatísticas de que dispomos (SHAVIT, BLOSSFELD, 1993). Apesar disso, não se pode dizer que nada mudou. Na maior parte dos países que conheceu várias décadas de abertura dos sistemas escolares e de massificação, o modo de produção das desigualdades escolares foi profundamente transformado. Numerosos países desenvolveram uma “democratização absoluta”: com a ampliação do tempo de duração dos estudos e crescimento considerável do número de diplomados e de estudantes da educação superior, um grande número de jovens tem acesso a bens escolares aos quais seus pais não tiveram. Mas a abertura da escola é também caracterizada por uma “democratização segregadora” definida como a manutenção das desigualdades escolares no interior do próprio sistema: desigualdades entre as profissões e os estabelecimentos, desigualdades de aprendizagem e de percursos dos estudantes em função das origens sociais. É importante, pois, compreender como se produzem essas desigualdades mesmo que a maior parte dos sistemas escolares, e a escola francesa ainda mais, não deixem de afirmar seu compromisso com a igualdade e a justiça social.

O objetivo deste artigo não é o de instruir, uma vez mais, o processo das desigualdades educacionais apresentando novas estatísticas. Ele tem a intenção de colocar em evidência as diversas maneiras de explicar essas desigualdades, articulando argumentos históricos e sociológicos. Com efeito, a sociologia das desigualdades educacionais se desenvolveu em circunstâncias escolares particulares, no curso do que se poderia desenhar como uma história dos sistemas de ensino e dos problemas públicos associados às desigualdades. Assim, a sociologia das desigualdades educacionais viu uma sucessão de paradigmas que são menos uma concorrência entre teorias do que maneiras de responder aos problemas educacionais que se apresentam no curso das transformações dos sistemas de ensino. Por exemplo, as explicações exógenas (extraescolares) que atribuem a causa essencial das desigualdades escolares apenas às desigualdades sociais foram substituídas por explicações mais endógenas (intraescolares), que tentam explicar as desigualdades pelo funcionamento da própria escola. Certos temas, como o da discriminação entre meninas e meninos ou entre minorias e maiorias, permaneceram praticamente invisíveis na França durante um longo período e acabaram por se impor como um problema sensível.

Os desdobramentos da sociologia das desigualdades educacionais não são apenas correlacionados à história da instituição escolar e seus problemas, eles são também fortemente associados a diversas concepções de justiça escolar. Desnecessário reafirmar que as desigualdades educacionais são sustentadas em postulados normativos tão evidentes que quase não precisam ser formulados e segundo os quais estas desigualdades são injustas. A injustiça das desigualdades escolares pode ser definida de múltiplas maneiras ao longo das transformações da escola. Os princípios de justiça que fundamentam a crítica sobre as desigualdades educacionais não são apenas os pilares da indignação e da crítica, eles são também uma dimensão cognitiva e prática, posto que posicionam os holofotes sobre certas desigualdades e deixam outras de lado. Não se “veem” e não se medem as mesmas desigualdades dependendo da concepção que sustenta a análise: se do ponto de vista da igualdade de oportunidades ou do ponto de vista da igualdade de resultados. E, em função dessas concepções de justiça, as soluções propostas não são as mesmas, e tampouco as políticas. Esta dimensão é ainda mais decisiva do que o papel das teorias implícitas de justiça escolar no engajamento da responsabilidade dos pesquisadores, que não podem ignorar os efeitos sociais de suas análises se não quiserem permanecer apenas nos prazeres da denúncia.

A escola de classe e o elitismo republicano

A cada um, segundo sua escola.

Ao considerar, pagando o preço da simplificação, que a Terceira República3 estabeleceu as bases da escola republicana, é preciso retomar esse momento fundador pelo seu peso sobre a memória e o imaginário escolares franceses; para muitos cidadãos e para numerosos intelectuais, esta escola encarna ainda um ideal e uma espécie de idade de ouro. “A escola de Jules Ferry” afirma o direito à educação de todos pela escolaridade obrigatória, o direito à mesma escola pelos programas nacionais, e uma pedagogia “nacional” colocada em prática por professores formados nas mesmas Escolas Normais. Esta escola foi unificada por um conjunto de valores e princípios visando produzir cidadãos esclarecidos, competentes, que partilhassem o mesmo imaginário social, as mesmas concepções de cultura, ciência e progresso.

Ao mesmo tempo que essa escola é orientada por um projeto universal, ela se mantém profundamente dividida em função do sexo e das classes sociais. É suficiente ler Durkheim para se dar conta: a questão das desigualdades é evocada na sua obra e, ainda mais, Durkheim desconfia das “ambições excessivas” e do que elas poderiam suscitar nas crianças das classes populares (DURKHEIM, 2012). Ao lado da escola popular, a escola da República se mantém como escola das elites sociais e escolares, aquelas dos pequenos liceus4, que preparam para estudos longos, e aquelas dos colégios5, ainda relativamente elitistas. A burguesia forma as futuras elites em escolas distintas e, para retomar ainda as análises de Durkheim, é conveniente distinguir a escola primária6, os liceus e as escolas “especiais”, quer dizer, as escolas profissionalizantes. No fundo, o projeto universalista de escola republicana se desenvolve numa sociedade de classes e convive com segmentações sociais. Essa escola adere também à segmentação de sexo, separando meninas e meninos. Os pais fundadores da escola republicana tratam pouco de igualdade social e menos ainda de igualdade de oportunidades.

O elitismo republicano

Essa representação é, contudo, demasiado rígida, porque a escola da República não quer apenas instruir a população e formar cidadãos, ela tem também por objetivo selecionar os “suboficiais” da República, os empregados, os funcionários e os profissionais que o Estado e a economia precisam. Com o elitismo republicano, o professor deve distinguir as crianças mais virtuosas entre as camadas populares, as mais dedicadas e as mais esforçadas, a fim de que elas possam ter acesso à Escola Normal7 e ao colégio onde, graças ao diploma elementar, tornar-se-ão funcionários da República. O elitismo republicano não trata de igualdade de oportunidades, ele repousa sobre a seleção precoce dos alunos que terão acesso às funções intermediárias que a nação precisa. Mesmo que alguns acabem por se juntar à elite da elite, permanece o fato de que o “elevador social” gerou ascensão de poucos alunos. Apesar dos professores passarem frequentemente por esse percurso, a crença em um largo elitismo republicano tornou-se uma evidência do imaginário escolar.

Esse modo de produção de desigualdades educacionais assombra muito a memória da escola francesa, evidentemente, por causa do ideal universalista e emancipador dessa escola, mas também porque ela parecia justa. A escola obrigatória exigia o princípio de uma igualdade de acesso que não tinha sido plenamente realizado. Mas, no seio desse acesso comum, as desigualdades eram dificilmente contestadas, porque a sociedade de classes impunha aos indivíduos a imagem dos destinos sociais aos quais eles estavam condenados pela rigidez da estrutura social e pela crença nos dons. Assim, apenas os alunos que pareciam extremamente talentosos poderiam escapar de seu destino, e sabe-se que os professores tiveram dificuldade de convencer os pais da necessidade de “impulsionar” certas crianças em direção a percursos escolares mais longos. Esta representação da vida social explica por que os sindicatos de trabalhadores também criticaram pouco a escola republicana e porque colocaram suas esperanças de justiça mais nas transformações da estrutura social do que nas transformações da escola. Quanto à separação entre meninos e meninas, isso fazia parte da ordem das coisas.

Por fim, a representação da justiça escolar em termos de igualdade de acesso, medida pelas taxas de escolarização elementar e pelas taxas de alfabetização, parecia perfeitamente compatível com uma sociedade de classes separada por barreiras, desde que houvesse abertura de um espaço de mobilidade por meio do qual os melhores pudessem ascender em nome do elitismo republicano (PROST, 1968). Junte-se a isso que a frágil influência dos diplomas sobre a maioria das trajetórias profissionais dos indivíduos em uma sociedade onde tornar-se-iam operários, campesinos ou empregados em “serviços gerais”, sem passar pelo sucesso escolar, reforçou esta combinação entre escola de todos, escola das elites e escola dos suboficiais da república, aquela dos bolsistas8.

A escola de massa meritocrática

A massificação escolar

Desde os anos sessenta, na França e na maior parte dos países industriais e democráticos, o modelo de ensino se transforma com a abertura do colégio, do liceu secundário e com a superação progressiva dos obstáculos econômicos aos estudos de longa duração. É nesse momento que a sociologia da educação se torna, essencialmente, uma sociologia das desigualdades de mobilidade social (CUIN, 1993).

A massificação progressiva do ensino secundário, do colégio, depois do liceu e do ensino superior, muda a natureza do sistema de ensino. O antigo sistema de ensino, que justapunha múltiplas escolas de acordo com as origens sociais e o nível escolar dos alunos, foi progressivamente substituído por uma escola homogênea, ou mais ou menos homogênea, na qual a seleção dos alunos não se opera mais pela escalada entre escolas. Evidentemente, a implementação desse sistema foi relativamente longa: começou na França em 1958, com a extinção dos exames de admissão para o sexto ano e terminou com a criação do colégio único, em 1975. O número de alunos que permanecem nos sistema de ensino não para de crescer, como indicam as taxas dos que concluem o ensino médio em cada período histórico: em torno de 2% em 1900, passou à ordem de 5% em 1945, de 20% em 1968, de 35% em 1985 e se aproxima de 80% atualmente. Contrariamente a uma ideia comum, essa massificação não respondeu a uma forte demanda social; foi principalmente a oferta escolar que precedeu a demanda (PROST, 1986) em um período de crescimento econômico, no qual a teoria do capital humano (BECKER, 1964) parecia se impor antes mesmo de ser incorporada pelas políticas europeias da “sociedade do conhecimento”, fundamentando o crescimento sobre o nível de qualificação da população.

A massificação do ensino médio também foi realizada por uma promessa implícita de justiça escolar e social. Na França, desde a Liberação9, o Plano Langevin-Wallon desejava que todos os alunos chegassem às séries finais do ensino fundamental e que o ensino médio e a educação profissional fossem mais amplamente abertos. Retirando os obstáculos econômicos aos estudos de longa duração, quando o trabalho dos jovens passou a ser menos indispensável, e flexibilizando a seleção de entrada no colégio, liceu e universidade, a massificação foi associada a uma promessa de justiça, pois os bens escolares, até então reservados aos herdeiros e a alguns bolsistas, a partir de então, pareciam mais amplamente acessíveis. Esta promessa de justiça era ainda mais aceitável pois durante os anos de forte crescimento, os diplomas não foram desvalorizados ao se multiplicarem em razão da forte demanda de mão de obra qualificada. (BAUDELOT, ESTABLET, 2000).

Os mecanismos de reprodução das desigualdades

É nesse contexto que a sociologia da educação se torna, essencialmente, uma sociologia das desigualdades educacionais e uma sociologia crítica, pois ela revela que se a massificação do sistema de ensino democratizou o acesso aos bens educacionais, ela não reduziu o impacto da origem social e cultural dos alunos sobre suas performances e suas carreiras escolares. Mais ainda, essa sociologia coloca em evidência um mecanismo social mais profundo, ao explicitar que não é somente o dinheiro que faz a diferença, mas sobretudo os recursos culturais das famílias e seus investimentos na educação escolar.

A sociologia da educação dos anos sessenta (1960) demonstra que a massificação do sistema de ensino engendra uma democratização “absoluta”, pois as taxas de escolarização secundária e superior aumentam, mas ela demonstra, sobretudo, que as desigualdades sociais determinam as carreiras escolares no interior mesmo da escola de massa (GIRARD, BASTIDE, 1963). Não apenas o nível escolar dos alunos parece determinado por suas origens socioprofissionais, mas o tipo de escolaridade realizada e a relação dos alunos com seus estudos, são também fortemente correlacionados às desigualdades iniciais. Na França, os trabalhos de Bourdieu e Passeron (1964) e de Boudon (1973), nos Estados Unidos, os estudos de Coleman (1966) e de Jencks (1972), na Grã-Bretanha, os de Bernstein (1975), chegam às mesmas constatações mesmo sustentados em paradigmas diferentes.

Na França, Os herdeiros10 foi recebido como um livro fundador, na medida em que coloca em evidência a função de produção de desigualdades dos recursos e das orientações culturais das famílias. Enquanto os herdeiros se beneficiam de uma proximidade e uma forma de cumplicidade cultural com o mundo escolar, os bolsistas devem superar a distância entre o mundo social e familiar e o mundo escolar. Também os bolsistas não chegam aos mesmos níveis do sistema de ensino, não fazem os mesmos cursos e não estudam da mesma maneira que os herdeiros, que mantêm seus “privilégios” e seu acesso às posições escolares mais prestigiosas e mais “rentáveis”. Ao fim, as desigualdades educacionais reproduzem as desigualdades sociais e, sobretudo, legitimam as desigualdades resultantes da competição educacional, pois uma escola de massa aberta a todos é a priori a mesma para todos. Inscrita em uma teoria geral do habitus, do capital cultural e do campo, a teoria da reprodução termina por se impor no mundo acadêmico francês e nenhum estudante de sociologia pode ignorá-la quase sessenta anos depois da publicação de Os Herdeiros. É importante também ressaltar que essas análises críticas foram bem aceitas pelo mundo da escola básica pois, ao insistir sobre o papel determinante das desigualdades sociais, elas “inocentam” a própria escola da responsabilidade pelas desigualdades.

As teorias de Bernstein, centradas sobre o papel dos códigos linguísticos no sucesso escolar, se aproximam das teorias de Bourdieu. Os trabalhos de Coleman, e depois de Jencks, que tiveram um peso decisivo nos Estados Unidos, ressaltam da mesma maneira o papel determinante da origem social dos alunos e das orientações culturais das famílias. Coleman afirmava que a maneira mais segura de reduzir as desigualdades educacionais seria a redução das desigualdades econômicas e sociais que produziam efeito sobre a escola. No entanto, nos anos sessenta, estes sociólogos insistem ainda mais do que Bourdieu e Passeron sobre o papel decisivo da concentração dos alunos em escolas social e “racialmente” homogêneas.

Nós construímos o hábito de opor frontalmente as análises de Boudon às de Bourdieu. É verdade que os dois sociólogos se apoiam sobre concepções de ação, até sobre antropologias, profundamente diferentes: o primeiro afirma que os atores fazem escolhas racionais, o segundo, que são “programados” por sua socialização e suas orientações culturais. No entanto, por caminhos diferentes, as duas famílias teóricas explicam os mesmos fatos, pois o ator racional de Boudon investe menos nos estudos porque possui menos recursos, considerando que os estudos apresentam um custo imediato e ganhos protelados, e ainda que os benefícios esperados dos estudos são indexados sobre a posição social inicial. Assim, para manter sua posição ou para ascender socialmente, os mais favorecidos devem investir mais ainda do que os menos favorecidos. Os mais favorecidos têm interesse em investir mais nos estudos e aumentar a distância social, afirma Boudon, mas na medida em que o habitus é também a cristalização cultural dos interesses, é uma maneira de negar os interesses ao realizá-los. Assim, não é tão correto que a teoria de Bourdieu se opõe frontalmente à de Boudon quanto supõem algumas décadas de retórica sociológica. Nos dois casos, as desigualdades socioeconômicas possuem um papel essencial e os sociólogos demonstram que a massificação dos sistemas de ensino não é o triunfo da igualdade.

Se os sociólogos concordam geralmente sobre a natureza dos mecanismos de produção das desigualdades educacionais, suas análises sobre o papel da escola diferem sensivelmente. Duas grandes concepções de escola se opõem, principalmente na França. Uma corrente se esforçou para demonstrar que a reprodução das desigualdades sociais por meio das desigualdades educacionais deveria ser compreendida como uma “função escondida” da escola, como sua natureza profunda. É a tese central de A reprodução (BOURDIEU, PASSERON, 1970), afirmando que a cultura e a forma escolar mantêm uma cumplicidade escondida com a cultura e os interesses das classes dominantes, e que a neutralidade escolar dos professores e dos instrumentos de avaliação não seriam nada além da máscara desse vínculo profundo, que permite à instituição reproduzir as desigualdades enquanto desenvolve a ilusão de sua autonomia, até mesmo desenvolvendo uma crítica às desigualdades sociais. Nesse caso, a escola democrática de massas não seria “vítima” das desigualdades sociais, pois todo o seu funcionamento concorre para reproduzi-las e legitimá-las. No início dos anos setenta, Baudelot e Establet (1971) desenvolvem uma análise vizinha retomando o conceito althusseriano de “aparelho ideológico de Estado”: o funcionamento da escola, seus currículos, pedagogias e suas avaliações organizam a reprodução e a legitimação da dominação de classe.

Inspirado em Coleman, Jencks e na sociologia americana da mobilidade social (SMELSER, LIPSET, 1966), Boudon considera que a escola funciona “como um mercado” no qual os atores buscam otimizar seus investimentos e utilidades. Essa concepção não atribui qualquer finalidade ou função escondida à escola, e Boudon coloca em evidência dois fenômenos essenciais. O primeiro é que a massificação provoca uma transformação contínua na estrutura das desigualdades educacionais, uma fuga para o alto, guiada pela busca de diplomas escassos e úteis. E, como a produção dos diplomas não é diretamente relacionada à produção dos empregos, a mobilidade escolar não gera necessariamente uma mobilidade social. O segundo mecanismo é o da agregação de pequenas desigualdades: mesmo frágeis, as desigualdades constantes reproduzidas a cada etapa seletiva das trajetórias escolares produzem grandes desigualdades no fim do percurso. Função escondida da escola ou mercado escolar, análise teleológica da instituição ou efeito perverso da massificação dos sistemas de ensino, há muito que os dois paradigmas pareciam irredutivelmente opostos e a academia insistia em comentar essa oposição.

Confiança na massificação e igualdade de oportunidades

Apesar das perspectivas críticas, os anos sessenta e uma parte dos anos setenta mantiveram a confiança na massificação dos sistemas de ensino. Esta confiança na escola era ainda mais forte pois a demanda por empregos qualificados excedia a produção de profissionais diplomados. Baudelot e Establet (2000) lembram que, nos anos sessenta, a utilidade social dos diplomas cresce e as novas gerações de estudantes do ensino médio e superior entram na vida profissional em condições particularmente favoráveis. Mobilidade escolar e mobilidade social estrutural pareciam associadas. Dito de outra forma, os jovens subiam ao mesmo tempo no elevador do sistema de ensino e no elevador social. Esta primeira onda de massificação do sistema de ensino se realiza em um período de crescimento e um momento de otimismo que poderia levar a imaginar que massificação e democratização do sistema de ensino estão necessariamente associadas. Essencialmente, quando a sociologia da educação critica as desigualdades educacionais, sustenta o movimento de massificação que se acentuará nas décadas seguintes.

A formação de uma escola de massa, que se esforça para selecionar os alunos em função de seu mérito e não mais de seu nascimento, como era o caso no período precedente, quando o elitismo republicano estava reservado a uma minoria, instala o princípio de igualdade de oportunidades meritocrática como a principal e única norma de justiça escolar. A análise da denúncia das desigualdades educacionais está fundamentada sobre um modelo ideal segundo o qual a escola deve neutralizar a influência das desigualdades sociais sobre as desigualdades educacionais, a distribuição das performances e trajetórias escolares deveria ser “aleatória” no nível dos indivíduos e representativa da estrutura das desigualdades sociais no nível coletivo. Na escola da igualdade de oportunidades meritocráticas, o percentual de alunos favorecidos e desfavorecidos nos diversos níveis do sistema de ensino deveria reproduzir o percentual desses grupos na sociedade. As desigualdades educacionais podem ser definidas como a distância entre a realidade e essa norma: não há muitos estudantes de origem pouco favorecida nos melhores cursos e nas formações de maior prestígio; eles são muito numerosos nas formações curtas e profissionalizantes. A adoção implícita do princípio de igualdade de oportunidades meritocrática pouco questiona a organização dos sistemas de ensino e considera como certo o sistema de hierarquias escolares e suas concepções de excelência. Nesse sentido, os sociólogos, mesmo os mais críticos, adotam implicitamente a promessa de justiça atrelada à massificação do sistema de ensino.

Os modos de produção das desigualdades

Às custas de uma certa simplificação, pode-se considerar que a sociologia das desigualdades educacionais dos anos sessenta e setenta foi dominada pelo tema da determinação das desigualdades educacionais pelas desigualdades sociais. Seja em razão da função latente da escola ou do mercado escolar, essa sociologia se interessou relativamente pouco pelo funcionamento da própria escola, sua organização e suas interações. Contudo, paulatinamente, a sociologia das desigualdades educacionais entra no interior da instituição a fim de atualizar o conhecimento sobre os mecanismos e processos de produção das desigualdades. A sociologia reorienta seu olhar sobre as desigualdades da “demanda” - as desigualdades socioeconômicas -, para as desigualdades de “oferta”, para a organização e as interações escolares. O modelo de igualdade de oportunidades se reorienta gradativamente para o modelo de equidade escolar.

A sociologia dos “efeitos”

A partir dos anos 1980, e especialmente da “Nova Sociologia” da Educação inglesa, as pesquisas colocam o foco sobre uma série de “efeitos” micro e meso, que contribuem para a produção das desigualdades.

No nível micro, numerosas pesquisas revelam o papel do currículo “oculto”, quer dizer, das dimensões sociais e culturais do trabalho pedagógico, questões implícitas que favorecem os alunos culturalmente favorecidos e desfavorecem os outros (FORQUIN, 2008). Estas pesquisas confirmam também a intuição de Bourdieu, Passeron e Bernstein sobre a “cumplicidade” entre a cultura escolar e a cultura das classes dominantes. No nível das interações, as pesquisas de Rosenthal e Jacobson (1972) deram início a uma série de estudos sobre o “efeito Pigmaleão” na escola. Eles se esforçam para demonstrar que as expectativas implícitas dos professores pesam sobre as performances de seus alunos: a crença nas fortes potencialidades dos alunos favorece sua progressão. Porque pensam que os alunos das classes médias e favorecidas devem ter mais sucesso na escola, os professores desenvolvem atitudes mais exigentes, confiantes e otimistas, que favorecem o sucesso desses alunos, ao mesmo tempo em que o seu pessimismo em direção aos alunos desfavorecidos é desfavorável ao seu sucesso. Da mesma maneira, estudos recentes demonstram que há expectativas diferentes entre meninas e meninos: geralmente, espera-se que as meninas sejam melhores alunas, mas que os meninos sejam melhores em matemática e ciências (CHABANON, STEINMETZ, 2018; DURU-BELLAT, 1990). Os trabalhos de Merle (2018), sobre a avaliação dos alunos, mostram que existem vieses sociais na maneira de avaliá-los, favoráveis aos alunos culturalmente próximos dos professores. Da mesma maneira, com competências iguais, a orientação escolar é mais favorável aos alunos já favorecidos, pois seus projetos são mais ambiciosos, os professores são mais otimistas em relação ao seu futuro escolar, eles acreditam que os pais os sustentarão mais eficazmente (DURU-BELLAT, 2002).

Dentre os “efeitos”, os modos de agrupamento dos alunos nas turmas parecem ter um papel essencial (DURU-BELLAT, MINGUAT, 1997). O agrupamento dos alunos segundo seu nível acadêmico nos mesmos estabelecimentos, mesmos cursos e mesmas turmas acentua as distâncias entre desempenho e progressão. Quando estão juntos, os melhores alunos progridem um pouco mais do que quando estão misturados com os demais: o clima de trabalho e estímulo é favorável à progressão, o efeito Pigmaleão é mais positivo e o nível de exigência é mais elevado. Se o agrupamento dos melhores alunos lhes é favorável, o agrupamento dos mais fracos é visivelmente mais desfavorável; eles perdem muito mais do que o ganho dos melhores agrupados na mesma turma. Nas escolas, cursos e turmas que reúnem os alunos fracos, o tempo dedicado à aprendizagem é mais curto, as exigências e o otimismo dos professores são mais fracos, a resistência dos alunos à cultura escola aumenta... Ou seja, a escola apenas reproduz as desigualdades iniciais, as acentua ou reduz, dependendo do seu modo de organização.

Quanto mais os sociólogos escolhem “pequenos objetos” e se distanciam dos dados estatísticos agregados ao nível dos sistemas de ensino e das sociedades nacionais, mais os dados estatísticos são também refinados, mais a pesquisa se interessa pelas distribuições e não apenas pelas médias. De fato, se, “em média”, os filhos dos profissionais que ocupam cargos superiores têm maior sucesso na escola do que os filhos dos operários, cada criança de família da classe média em particular não tem maior sucesso do que cada criança de família operária, e não é raro que alguns fracassem mais do que o esperado, enquanto outros tenham mais sucesso do que o esperado pelas médias. Como não se pode tratar desses casos apenas afirmando que as exceções existem para confirmar a regra, os pesquisadores têm se interessado por essas trajetórias “desviantes” mas não totalmente raras (ZÉROULOU, 1988; LAHIRE, 1995). Seus trabalhos mostram que as atitudes educativas das famílias podem se distanciar das médias de seu grupo social, que as circunstâncias podem ser decisivas, e que a própria escola pode se mobilizar em favor dos alunos de origem modesta quando apresentam resultados distintos da norma padrão.

É preciso compreender que nenhum desses efeitos, de forma isolada, é decisivo ou explica sozinho as desigualdades educacionais. Mas é razoável pensar que o acúmulo desses pequenos efeitos acaba por produzir grandes consequências quando agem no mesmo sentido e se repetem ao longo dos anos. Não apenas um aluno de origem pouco favorecida sofre de uma “deficiência”11 social, cultural e de investimentos familiares nos estudos, mas esta “deficiência” é acentuada por um complexo jogo de interações escolares: esse aluno tem menos oportunidade de se beneficiar de um efeito Pigmaleão positivo, ele é avaliado e orientado de maneira menos favorável, ele tem acesso menos espontâneo aos códigos escolares implícitos, ele tem mais chance de estar num estabelecimento ou em turmas onde essas “deficiências” se acumulam. Cada um desses efeitos reforça as desigualdades iniciais. A mensuração dos “efeitos” não se reduz a uma simples evolução das técnicas e objetos de pesquisa, pois em um modelo de determinação direta e mecânica das desigualdades educacionais pelas desigualdades sociais, em uma escola que não pode fugir disso, substitui a ideia de que as próprias práticas escolares aceitam ou acentuam essas desigualdades. Uma vez que a igualdade de oportunidades meritocrática pressuporia uma escola neutra e objetiva, esses efeitos diversos mostram que esta perspectiva está muito equivocada.

Lições das comparações

Ao mesmo tempo em que a sociologia das desigualdades educacionais se voltou para o estudo dos micro efeitos, progressivamente se expandiu para as comparações internacionais. Obviamente, essas comparações existem há várias décadas, mas elas tornaram-se familiares graças ao PISA. Comparando os desempenhos dos jovens com 15 anos de idade, o PISA mensura o nível de eficácia dos sistemas de ensino em termos de aprendizagem, amplitude das desigualdades educacionais e qualidade do clima escolar, em diversos países. Mesmo que em todos os lugares as desigualdades socioeconômicas determinem as desigualdades educacionais, a relação entre os dois tipos de desigualdade não é mecânica. Assim, certos sistemas de ensino são menos desiguais do que a amplitude das desigualdades sociais poderia sugerir, enquanto outros são mais desiguais do que “deveriam” ser. Como a França está nesse último caso, é importante explicar essa distorção, muito distante do ideal de igualdade ao qual a escola francesa é fiel.

As comparações permitiram colocar em evidência um conjunto de características suscetíveis de explicar as diferenças nas desigualdades escolares entre os países, uma vez “controladas” as desigualdades sociais. Nathalie Mons (2007), e a maior parte dos pesquisadores internacionais, parecem concordar a respeito de um certo número de características favoráveis à igualdade: a existência de uma escolaridade comum até os 16 anos de idade, um sistema conduzido pela administração central mas com autonomia para as equipes educativas, uma formação profissional eficaz para os professores, uma pequena taxa de reprovação, uma fraca segregação social e educacional entre os estabelecimentos de ensino... Como demonstram Baudelot e Establet (2009), não existe contradição entre a eficácia e a igualdade. Em outras palavras, a opinião segundo a qual o fim das classes homogêneas e de orientação precoce faria baixar o nível de qualidade não se confirma pelas comparações internacionais. Devemos acrescentar que os desequilíbrios do financiamento das escolas acentuam as desigualdades. Assim, o sistema escolar francês financiaria “demais” o ensino médio e não suficientemente a escola elementar, em comparação com os países da OCDE que podem ser comparados. E sabe-se que as políticas de apoio aos estabelecimentos mais “difíceis” estão longe de compensar as vantagens dos estabelecimentos mais “chiques” (MERLE, 2012). Geralmente, dá-se mais aos que já possuem mais.

A escola francesa é desigual “demais” por razões históricas e culturais. É importante lembrar o peso de uma tradição revolucionária e sobretudo imperial, confiando à escola o dever de selecionar as elites da cultura e da inteligência, que deveriam substituir os antigos aristocratas de nascimento. Este foi o papel das Grandes Escolas, das classes preparatórias e das competições. Ainda que seja desnecessário afirmar que todos os sistemas de ensino pretendem gerar uma elite, a escola francesa se distingue pelo fato de que a produção da elite determina todo o sistema: programas ambiciosos, pontuação de 0 a 20 que classifica mais do que avalia, justaposição das Grandes Escolas e universidades, paixão pela competição, orientação negativa para a educação professional... Paradoxalmente, todos teriam o direito de ascender à elite e o modelo de elite se impõe a todos como norma central (DUBET 1991, CAHUC ET al, 2011). A essa característica, é conveniente acrescentar a grande influência dos diplomas sobre o acesso ao emprego e aos diferentes níveis de remuneração (DUBET, DURU, VÉRÉTOUT, 2010). Quanto mais os diplomas desempenham um papel decisivo no destino profissional dos indivíduos, mais os indivíduos manifestam interesse em procurar diplomas mais raros e seletivos. Mesmo quando a competição escolar parece mais justa do que a competição econômica, quanto maior a influência dos diplomas, mais a concorrência escolar cresce e mais forte se tornam as desigualdades educacionais.

Escolhas que produzem desigualdades

Na concepção tradicional da reprodução escolar, os atores se deixam levar pelo capital cultural e pelo habitus, que serão suficientes para fazer a diferença. Contudo, com a massificação da escola e o crescimento da concorrência que ela produz para a obtenção dos diplomas de maior prestígio e mais lucrativos, a confiança nas condições de nascimento e no funcionamento “normal” da escola deixou de ser suficiente para as famílias favorecidas. É preciso agir e se mobilizar para aumentar as chances de sucesso dos filhos. Desse ponto de vista, a “demanda” escolar de uma parte das famílias é desigual e ela se torna tão mais desigual quanto mais a massificação do sistema de ensino acentua a concorrência dentro da escola.

As escolhas escolares das famílias francesas são bastante conhecidas. O mapa escolar12 não só recobra amplamente as desigualdades sociais, mas também as escolhas residenciais das famílias muitas vezes levam em consideração a suposta “qualidade” das escolas do setor residencial. Desde os anos 1980, numerosos pesquisadores (BALLION, 1982; OBERTI, 2007, VAN ZANTEN, 2009; VISIER, ZOÏA, 2009) estudam as escolhas e as estratégias das famílias. Quando a escola do bairro não é conveniente, os pais tentam matricular seus filhos em outro estabelecimento público, procurando cursos “raros” ou com alguma particularidade, às vezes graças a endereços de conveniência, ou então eles buscam o ensino privado, socialmente mais privilegiado do que o ensino público (MERLE, 2012). Parece que, cada vez mais, as famílias circulam entre as escolas públicas e privadas. Enquanto em torno de 20% dos alunos estão matriculados em escolas privadas a partir do colégio, 40% do total passa pelo privado. Então, as famílias que podem, circulam entre as escolas públicas e privadas ou entre escolas no interior do sistema público.

As escolhas das famílias, relativas à qualidade dos estabelecimentos escolares, repousam menos sobre indicadores objetivos de “qualidade” das escolas oferecidos pela instituição do que sobre elementos de reputação: cursos “raros”, mas sobretudo as origens sociais dos alunos, número de imigrantes... A reputação está relacionada também ao “efeito escola” real ou suposto: dinâmica e estabilidade da equipe docente, violência escolar... Mas, na maioria dos casos, a vontade de se afastar das escolas menos favorecidas tem mais peso do que o desejo de se aproximar das escolas de excelência. Com tudo isso, nas grandes cidades francesas, mesmo as famílias de classes médias e superiores que decidem viver em bairros populares, que consideram charmosos, são refratárias à mistura escolar que comprometeria, a seus olhos, o futuro escolar de seus filhos.

Ao fim e ao cabo, as escolhas das famílias acentuam as desigualdades escolares, pois as melhores escolas atraem os melhores alunos, que são frequentemente os mais favorecidos, o que gera como consequência a concentração dos alunos mais fracos e mais desfavorecidos nas escolas mais frágeis. Mas, na medida em que o mapa escolar não garante a igualdade ou pode ser percebido como uma injustiça suplementar pelas famílias populares que se sentem prisioneiras da política, é difícil de resistir a uma demanda desigual. Os estabelecimentos privados dificilmente resistem a essa demanda desigual, mas não é incomum que os estabelecimentos públicos também procurem atrair os melhores alunos por meio da oferta de opções raras e seletivas.

Parece que essa demanda desigual não para de crescer. Ela não é mais monopólio das classes sociais mais bem posicionadas e dos “iniciados”, que se orientam facilmente pelos labirintos da escola. Quanto mais essa demanda se expande, mais os grupos sociais “prisioneiros” do sistema veem sua posição escolar se degradar de maneira relativa (VAN ZANTEN, 2001). As políticas educacionais igualitaristas parecem encontrar uma oposição opaca daqueles que se beneficiam pelo sistema de desigualdades e que ameaçam escolher a saída em direção à escola privada e escolas alternativas explicitamente elitistas, segundo um mecanismo que Breen e Goldthorpe (1997) tinham antecipado como uma consequência “perversa” da democratização do ensino.

Com a sociologia dos processos, a norma geral da igualdade de oportunidades leva a questionar a equidade das práticas e dos modos de organização escolares. Essa mudança impulsiona a posição crítica a se aproximar da experiência, sugerindo transformações nas práticas escolares. Interroga-se a equidade dos procedimentos de orientação, os vieses sociais das pedagogias e dos modelos de avaliação, as formas de agrupamento dos alunos nas turmas, enfim, um conjunto de práticas sobre as quais seria possível agir, enquanto as análises dos anos sessenta e setenta transbordavam a própria vida escolas de tal forma a impossibilitar que a sociologia assumisse o papel de conselheiro do príncipe. A sociologia dos efeitos e dos processos entra mais no debate e na construção das políticas educacionais, pois, depois dos “choques do PISA”, essas políticas se apresentam como baseadas na ciência, na avaliação e nas medidas. A equidade deixa de ser apenas um critério de justiça e se torna um conjunto de dispositivos.

Desigualdades e discriminações

Em que medida as desigualdades escolares são produto da discriminação? Quanto mais nós aderimos à igualdade de oportunidades, mais essa questão se impõe (DUBET, 2010). Contudo, a definição de discriminação não é tão simples quanto parece, pois é importante distingui-las das desigualdades. As desigualdades sociais resultam de recursos e condições de vida dos indivíduos, as discriminações se enraízam sobre as identidades reais ou supostas dos indivíduos, mesmo quando eles são socialmente iguais em outros aspectos. As discriminações se assentam sobre um tratamento a priori desigual dos indivíduos em função de características identitárias tidas como “naturais”, especialmente o sexo e a cultura, sobre o que a sociologia americana definiu como uma atribuição. Evidentemente, é bastante difícil distinguir empiricamente as desigualdades sociais e as discriminações, pois um grande número de indivíduos é, ao mesmo tempo, socialmente desigual e discriminado. Todavia, é possível procurar saber o que são as discriminações na escola, examinando o caso das meninas e das crianças de origem imigrante. Eles são vítimas de estereótipos negativos que produzem desigualdades específicas na escola?

A situação paradoxal das meninas

No curso do longo processo de massificação dos sistemas de ensino, as meninas ganharam mais do que os meninos (BAUDELOT, ESTABLET, 1992; DURU-BELLAT, 1990). As meninas permanecem mais tempo na escola do que os meninos, elas têm acesso aos cursos nos quais elas eram minoria e, às vezes, como em medicina e direito, elas se tornaram maioria. De maneira geral, as meninas têm resultados melhores do que os meninos, com exceção das matérias científicas (Education et formation, 2018). As meninas também parecem ser melhor acolhidas na escola do que os meninos. No último meio século, graças à escola, a taxa de mulheres assalariadas aumentou, especialmente em empregos qualificados e frequentemente em setores até então reservados aos meninos. A priori, as meninas não parecem ser discriminadas na escola, as turmas são misturadas e o corpo docente é largamente feminizado.

Contudo, a questão da discriminação se coloca pois, como escreveram Baudelot e Establet (2009), a escola se caracteriza pela “superioridade das meninas e a dominação dos meninos”. A análise dos percursos escolares e das orientações mostra que se as meninas são iguais aos meninos, às vezes “mais iguais”, os dois sexos não escolhem as mesmas formações na educação profissional, no ensino médio e na educação superior. Nesse sentido, a igualdade entre os sexos não impede a manutenção das diferenças de gênero entre as formações. Tudo se passa como se houvesse formações e percursos femininos e masculinos. De maneira geral, as formações femininas conduzem para empregos com menor remuneração, orientados para pessoas e serviços, ao contrário dos empregos masculinos, orientados para a ciência e a tecnologia. Mesmo com desempenhos escolares superiores, as meninas escolhem as formações menos “rentáveis” do que os meninos.

A questão passa a ser conhecer qual é o papel da escola nas escolhas das meninas e dos meninos. Pode-se pensar que as escolhas de meninas e meninos são definidas pela imagem que eles possuem das atividades profissionais às quais eles se destinam: ofícios de mulheres e ofícios de homens. Lembremos que 20% das atividades profissionais podem ser tomadas como mistas, quer dizer, ocupadas pelos percentuais de 40% a 60% de mulheres ou homens. Os ofícios de mulheres parecem mais compatíveis com responsabilidades familiares que lhes aguardam, pois elas sabem bem que o cuidado com a educação dos filhos será mais de sua responsabilidade do que dos homens (MOLLER OKIN, 2008). Nesse caso, as discriminações escolares pesam menos do que as expectativas das desigualdades dos papeis familiares previstos pelos indivíduos. É possível, contudo, perguntar se a própria escola não participa dessa discriminação latente, reforçando as clivagens e os estereótipos de gênero. Várias pesquisas evidenciam a força dessas representações: escolha de jogos, expectativas contrastantes de desempenho segundo as disciplinas e os sexos, conselhos de orientação distintos... Vários dispositivos são colocados em prática para lutar contra esses estereótipos, mas o fato é que nos países que mais investem nesse campo, as clivagens de gênero que estruturam o mundo do trabalho e a organização da vida familiar parecem pesar mais do que as discriminações escolares propriamente ditas.

O caso das minorias

Quando há forte concentração de crianças de origem imigrante e diversas minorias nos estabelecimentos escolares, as discriminações são vividas como uma evidência por muitos alunos. Frequentemente agrupados nas mesmas escolas, nos mesmos cursos e nas mesmas turmas, eles pensam que são discriminados de maneira intencional por uma escola que é ainda mais “racista” a seus olhos, pois seus professores não moram no mesmo bairro e não têm a mesma origem que eles (DUBET ET AL, 2013 ; GALLAND, MUXEL, 2018). Nas escolas que reúnem os alunos das minorias e dos bairros “difíceis”, que conhecem frequentes tensões entre alunos e escola, o tema da discriminação se impõe como uma evidência.

Não há dúvida de que esses alunos são segregados, mas a questão é saber se essa situação é decorrente de uma discriminação intencional, que os alunos experimentam como racismo, ou se ela resulta da agregação de processos desiguais. Esses mecanismos de desigualdade explicam a concentração dos estudantes de mesma origem. Primeiro, eles já são super-representados nos mesmos bairros e, portanto, nas mesmas escolas. A isso, acrescente-se que os alunos que podem buscam outras escolas, o que acentua a concentração desses alunos nas mesmas escolas; as escolas são mais segregadas do que os bairros onde foram implementadas (FELOUZIS, LIOT, PERROTON, 2005). Em seguida, esses alunos enfrentam mais dificuldades escolares, por razões socioeconômicas e às vezes por razões relacionadas a dificuldades inerentes aos percursos migratórios, eles se encontram em turmas e formações reservadas aos estudantes mais fracos e sabemos que essas turmas acentuam o nível de fragilidade e as atitudes anti-escolares. A segregação resulta, portanto, de um processo de “destilação fracionada”. Notemos que, ao contrário, as origens estrangeiras não têm papel decisivo quando os alunos se beneficiam de boas condições de vida e frequentam escolas das classes médias (VALLET, CAILLE, 1996).

No entanto, a esses mecanismos desiguais “clássicos” somam-se fatores que podem ser atribuídos sem dúvida às discriminações propriamente ditas (DHUME, 2011). Um efeito Pigmaleão negativo joga contra as crianças das minorias, a quem se destinam as expectativas de dificuldades escolares. Da mesma maneira como para as meninas, os alunos podem ser orientados em direção às formações que abrangem profissões consideradas mais adequadas aos filhos das minorias, que sabem que enfrentarão uma forte discriminação no emprego, como mostram as estatísticas de desemprego e pesquisa de opinião. Sabe-se, também, que os filhos de imigrantes e das minorias têm muita dificuldade para conseguir estágios e contratos como aprendizes, e que eles podem passar esses obstáculos buscando profissões pouco qualificadas, mais abertas para eles. Associadas aos mecanismos de segregação, essas atitudes explicam a força do sentimento de discriminação experienciado pelos alunos: quando nós nos encontramos todos juntos nos mesmos estabelecimentos escolares e nos mesmos cursos de formação, imagina-se facilmente que um “desejo” de discriminação explica essa situação.

Conclusão

A produção das desigualdades educacionais pode ser descrita como o cruzamento de duas grandes lógicas. A primeira é um efeito de estrutura, segundo o qual as desigualdades educacionais reproduzem mais ou menos exatamente as desigualdades socioeconômicas. Esse mecanismo estrutural se desdobra em duas grandes perspectivas, aquela dos capitais culturais e aquela das estratégias dos atores; perspectivas menos antagônicas do que crê habitualmente. A segunda lógica é a dos efeitos escolares, quer dizer, da maneira como a organização e as interações escolares produzem as desigualdades. Aqui, a sociologia entra nos estabelecimentos, nas turmas e nas relações escolares.

Em todo caso, a sociologia das desigualdades escolares se construiu em torno da norma da igualdade de oportunidades meritocrática, que aparece como um princípio de justiça incontestável nas sociedades que postulam a igualdade fundamental dos indivíduos. No entanto, as decepções associadas ao longo movimento da massificação dos sistemas de ensino deveriam nos conduzir a questionar esse princípio de justiça, não para contestar os fundamentos, mas para ressaltar os paradoxos e as dificuldades.

É importante lembrar que a igualdade de oportunidades meritocrática busca menos a igualdade escolar do que o estabelecimento de desigualdades justas, de desigualdades incontestáveis, porque fundadas apenas sobre o mérito. Esse princípio de justiça exige da escola uma qualidade para a qual ela é incapaz, porque ela se insere em uma sociedade e porque os atores “preferem” as desigualdades. Esse princípio é também “cruel” na medida em que ele legitima o sucesso dos vencedores na competição escolar e assim como justifica o fracasso dos vencidos, que são percebidos e se percebem como responsáveis pelos seus fracassos. Isso não se realiza sem efeitos sobre a autoestima dos alunos envolvidos e, às vezes, sobre a hostilidade frente à escola que, a seus olhos, tem o direito de lhes anular. Enfim, a igualdade de oportunidades meritocrática é sempre guiada por uma força elitista: como todos têm o direito, e até a obrigação, de reivindicar acesso à elite, somos sempre tentados a medir as desigualdades pela taxa de acesso dos mais desfavorecidos às formações elitistas, mesmo que isso signifique esquecer a concentração desses estudantes nos cursos de formação menos rentáveis e menos prestigiosos.

Ao final de meio século de massificação dos sistemas de ensino, embalada pelo ideal de igualdade de oportunidades, a sociologia deveria ser sensível a outros princípios de justiça. O primeiro é aquele da igualdade de resultados, considerando que a escola justa é também aquela que oferece a todos os alunos as competências e conhecimentos comuns (DUBET, 2004). Não se trata somente de um ponto de vista, mas também de uma orientação política, que conduza a consagrar mais recursos para a escola comum do que para a que distingue e classifica. O segundo princípio, derivado da teoria das esferas de justiça de Walzer, chama-se igualdade de utilidade. De fato, a igualdade de oportunidades é levada a considerar que as desigualdades sociais seriam justas porque têm origem nas desigualdades escolares também tomadas como justas. Nada é mais certo de que certos diplomas funcionam como renda, enquanto outros não são úteis (BEAUD, 2002; DELÈS, 2018; DURU-BELLAT, 2008). Se a justiça consiste em separar as esferas de atividade para que as desigualdades não se agreguem, não se pode apenas questionar os efeitos escolares das desigualdades sociais, mas é preciso também analisar as consequências sociais das desigualdades educacionais, o que os economistas têm feito atualmente mais do que os sociólogos.

François Dubet

Université de Bordeaux, EHESS

Centre Émile Durkheim (UMR 5116)

3Nota da tradutora: A Terceira República (1870-1940) francesa foi instaurada com o fim do Império de Napoleão III. Iniciou em meio ao final da Guerra contra a Prússia e se estabeleceu como o período mais longo de governo desde a Revolução Francesa (1789). As duas primeiras repúblicas tiveram curta duração, o que faz da Terceira República o período mais relevante para a consolidação dos ideais republicanos e do Estado Moderno na França. O fim da Terceira República se dá com a invasão da França pela Alemanha nazista, que perdurou até 1944.

4Nota da tradutora: Liceus são escolas que correspondem ao nível de ensino médio.

5Nota da tradutora: Colégios são escolas que oferecem a etapa correspondente aos anos finais do ensino fundamental.

6Nota da tradutora: a escola primária corresponde aos anos iniciais do ensino fundamental.

7Nota da tradutora: Instituição de Educação Superior de caráter elitista, reconhecida pela qualidade da formação e pelas rígidas estratégias de seleção para o ingresso.

8Nota da tradutora: “Bolsistas” são os estudantes das classes populares que apresentam desempenho escolar excelente e são selecionados para frequentar as escolas com grande reputação, tradicionalmente reservadas às elites.

9Nota da tradutora: A “Liberação” é o período de retomada da França pelas forças aliadas, com o fim da ocupação de parte do território pela Alemanha nazista e a Itália fascista durante a II Guerra Mundial.

10Nota da tradutora: A obra “Os herdeiros, os estudantes e a cultura”, de Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron (1964), é considerada um clássico na discussão sobre desigualdades educacionais. O título da obra passou a ser amplamente utilizado na literatura educacional para definir uma categoria de estudantes das elites, privilegiados, com longa escolaridade, experiências de sucesso escolar e acesso aos níveis mais elevados do sistema de ensino.

11Nota da tradutora: O termo “deficiência” é utilizado em textos acadêmicos franceses para designar uma desvantagem em algum aspecto social, cultural, individual, mesmo quando não se trata de uma deficiência física ou intelectual. Portanto, o termo é utilizado entre aspas.

12Nota da tradutora: “Carte Scolaire”, traduzido como mapa escolar, é a política de alocação dos estudantes nas escolas de acordo com a localização de suas residências, priorizando a matrícula na escola do bairro mais próxima da casa da família.

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Recebido: Novembro de 2019; Aceito: Novembro de 2019; Publicado: Dezembro de 2019

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Artigo originalmente publicado em Revue européenne des sciences sociales [Online], 57-2 | 2019, Online. Tradução: Ana Lorena de Oliveira Bruel (NuPE/UFPR). François Dubet, «Inégalités scolaires : structures, processus et modèles de justice », Revue européenne des sciences sociales [En ligne], 57-2 | 2019, mis en ligne le 01 janvier 2020, consulté le 06 janvier 2020. URL : http://journals.openedition.org/ress/5736 ; DOI : 10.4000/ress.5736.

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