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Educação

Print version ISSN 0101-465XOn-line version ISSN 1981-2582

Educação. Porto Alegre vol.44 no.2 Porto Alegre May/Aug 2021  Epub Apr 25, 2022

https://doi.org/10.15448/1981-2582.2021.2.32188 

Outros Temas

Metodologias ativas no curso de direito: possibilidades de aplicação do Arco de Maguerez

Methodologies active in the course of law: possibilities of application of Arch of Maguerez

Helio Miguel Schauren Júnior1 

Helio Miguel Schauren Júnior

Mestre em Ambiente e Desenvolvimento pela Universidade do Vale do Taquari (Univates). Graduação em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC); graduação no Curso Superior de Polícia Militar (Bacharel em Ciências Militares — área de Defesa Social) pela Academia Polícia Militar do Rio Grande do Sul. Especialização em Segurança Pública pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra/Renaesp); especialização em Administração Policial Militar pela Academia de Polícia Militar do Rio Grande do Sul e especialização em Docência na Educação Superior, pela Univates.


http://orcid.org/0000-0003-4404-8455

Cláudia Inês Horn1 

Cláudia Inês Horn

Doutora em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Docente no Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da Universidade do Vale do Taquari (Univates).


http://orcid.org/0000-0002-1612-2067

1Universidade do Vale do Taquari, Lajeado, RS, Brasil.


Resumo:

Este artigo tem como objetivo analisar as possíveis contribuições da metodologia da problematização, com a utilização do Arco de Maguerez, nas aulas de Direito. Para tanto, identificam-se as características do ensino jurídico tradicional, fundado em metodologias expositivas, arraigadas em raízes pedagógicas rígidas. Destaca-se o uso das metodologias ativas, especificamente do Arco de Maguerez, como instrumento hábil à problematização, estudo e busca de alternativas no processo de ensinagem jurídica. Utilizou-se o método dedutivo, com a técnica bibliográfica e documental, por meio do estudo da doutrina em artigos científicos, bem como se analisou a legislação correlata ao ensino jurídico, contando, ainda, com uma pesquisa quantitativa, por descritores, no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Concluiu-se que as metodologias ativas se adequam aos objetivos da ciência do Direito, podendo contribuir efetivamente à formação, razão pela qual suas possibilidades de adoção merecem ser trazidas à reflexão e discussão. O arco apresenta características adaptáveis à discussão de problemas jurídicos reais, promovendo a participação do discente, num protagonismo adequado e qualificado aos desafios da educação no ensino do Direito.

Palavras-chave: direito; ensinagem; metodologias ativas; Arco de Maguerez

Abstract:

The article aims to analyze the possible contributions of the methodology of problematization, with the use of the Arch of Maguerez, in Law classes. For this, the characteristics of traditional legal education, based on expository methodologies, rooted in rigid pedagogical roots, are identified. We highlight the use of active methodologies, specifically the Arch of Maguerez, as a skillful tool for problem-solving, study and search for alternatives in the legal teaching process. The deductive method is used, using the bibliographical and documentary technique, through the study of the doctrine in scientific articles, as well as analyzing the legislation related to legal education, also counting on a quantitative research, by descriptors, in the Portal of Periodicals of Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. It is concluded that the active methodologies are adequate to the objectives of the science of Law, and can effectively contribute to the formation, which is why their possibilities of adoption deserve to be brought to reflection and discussion. The arch presents characteristics that are adaptable to the discussion of real legal problems, promoting the participation of the student, in an adequate and qualified role to the challenges of education in the teaching of Law.

Keywords: law; teaching; active methodologies; Arch of Maguerez

Introdução

Apesar da dinâmica educacional experimentada atualmente, que se traduz em profundas e constantes transformações alicerçadas pelas modernas correntes doutrinárias do processo e aprendizagem, que impacta diretamente nos saberes e fazeres didático-pedagógicos, o ensino do Direito ainda carrega alta carga tradicional em sala de aula. Tal característica tem nas nascentes históricas o seu desenvolvimento e reprodução na reiteração das práticas pedagógicas.

Nesse sentido, percebe-se um anseio, materializado na normativa das diretrizes do ensino jurídico, por parte de autoridades educacionais do país, pela adoção e disseminação das modernas tendências, no sentido de capacitar o docente e sensibilizá-lo a preocupar-se e agir, no sentido de objetivar a formação de um profissional dotado de competências e habilidades, que lhe permitam um pensar e um atuar crítico e reflexivo em sua área. Busca-se formar um profissional que, em última análise, tenha capacidade, conhecimentos e ferramentas para intervir, impactar e modificar o contexto da realidade social que o envolve.

Esse reconhecimento da necessidade de se buscar novas metodologias, com foco prévio e ajustes adequados ao despertar do interesse e participação dos alunos, é fundamento indissociável da priorização de aulas, através de instrumentos que façam sentido aos alunos, trazendo-os à participação crítica e construtiva do saber.

O curso de Direito, como se verá a seguir, por suas características históricas, ainda reserva forte carga do ensino tradicional, através de metodologias voltadas a transmissão de conhecimento, caracterizado pela verticalidade na relação entre docentes e discentes.

Ademais, resta evidente, a partir de pesquisa feita através do Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)2, que há rara produção científica acerca da aplicação de metodologias ativas na área do Direito, principalmente se comparada a outras áreas do conhecimento, como, por exemplo, a da saúde, a qual apresenta um número significativo de publicações, inclusive referentes a relatos de experiências pedagógicas.

Assim, entende-se que as metodologias ativas assumem papel de relevância dentre as novas tendências do pensamento pedagógico e práticas de ensinagem3. O professor atuando como mediador, coautor e condutor de um processo crítico e reflexivo, que exige uma postura participativa do discente na construção do conhecimento, fundamentado na observação da realidade e compreensão dos saberes necessários ao profissional de Direito atuante e transformador, que hoje se almeja.

O presente artigo tem como objetivo analisar as contribuições da metodologia da problematização, com a utilização do Arco de Maguerez, no ensino jurídico, com fundamento no perfil do discente e do egresso do curso de Direito, por meio da revisão da bibliografia acerca dos temas. Para tanto, adotou-se como metodologia o estudo qualitativo, utilizando-se o método dedutivo, com a técnica bibliográfica e documental, através do estudo da doutrina em artigos de periódicos especializados, bem como análise da legislação correlata ao sistema de ensino jurídico, conforme explicitado adiante.

Assim, este artigo traz uma breve contextualização do processo de ensinagem jurídica vigente nas instituições de nível superior, seu desenvolvimento histórico e o papel de seus atores. Em seguida, faz uma abordagem teórica acerca das metodologias ativas e seus fundamentos pedagógicos. Este trabalho debruça-se sobre a metodologia de problematização, baseada no Arco de Maguerez, identificando e analisando as possibilidades em relação ao ensino paradigmático e positivista ordinariamente experimentado, aproximando-se, assim, do perfil do discente jurídico traçado pelo Conselho Nacional de Educação, quando da instituição das diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Direito.

Procedimentos metodológicos

Para identificar a possibilidade de aplicação da metodologia da problematização, com a utilização do Arco de Maguerez, no ensino jurídico, adotou-se o caminho metodológico descrito a seguir.

Seguiu-se uma abordagem de pesquisa quanti-qualitativa, visando à identificação da natureza e do alcance do tema a ser investigado (Mezzaroba & Monteiro, 2009). Em relação ao enfoque qualitativo, este artigo baseou-se na coleta de dados informações, através de descrições e observações, para a qualificação e produção do conhecimento delineado pelo problema (Sampieri, Collado, & Lucio, 2006). Desse modo, do ponto de vista da forma de abordagem, é qualitativa, considerando a relação dinâmica entre a realidade e o sujeito, na qual a interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados sedimentam sua base.

Já sobre o enfoque quantitativo, acessou-se, em março de 2018, o portal virtual de periódicos da Capes, pesquisando em seu banco de dados científicos pelos seguintes descritores (sem qualquer filtragem, senão a exatidão dos termos): “metodologia ativa” e “ensino jurídico”; “metodologia ativa” e “Direito”; “ensino jurídico” e “Arco de Maguerez”; “Direito” e “Arco de Maguerez”. O objetivo foi verificar o volume (quantitativo) da produção científica bibliográfica em referência aos temas, sendo os resultados apresentados conforme Quadro 1.

Quadro 1 Pesquisa Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. 

Termos pesquisados Resultados
Metodologia ativa 91 publicações, mas nenhuma específica do Direito.
Ensino jurídico 814 publicações.
Ensino de direito 3.084 publicações.
Ensino do direito 3.766 publicações.
Arco de Maguerez 27 publicações, nenhum na área de Direito e 21 na área de saúde.
Metodologia ativa; ensino jurídico Não foram encontradas publicações.
Metodologia ativa; Direito 16 publicações, mas nenhuma específica de Direito.
Ensino jurídico; Arco de Maguerez Não foram encontradas publicações.
Direito5; Arco de Maguerez duas publicações, mas nenhuma específica do Direito.

Fonte: Do autor (2018).

O método utilizado para a confecção do artigo foi o dedutivo, que, de acordo com Mezzaroba e Monteiro (2009), parte de fundamentação genérica para chegar à dedução particular, o que faz com que as conclusões do estudo específico geralmente valham para os casos em particular, sem generalizações de seus resultados. Ainda, foi utilizado, como métodos auxiliares, o histórico, abordando-se o objeto em relação ao seu contexto atual e em relação ao pretérito e o método comparativo, confrontando-se institutos e conceitos referentes à temática enfrentada (Mezzaroba & Monteiro, 2009).

Como instrumentais, adotou-se a técnica bibliográfica, com a finalidade de atingir os objetivos propostos, procurando responder efetivamente o problema. Já em relação à técnica documental, examinou-se a Resolução do Conselho Nacional de Educação e da Câmara de Educação Superior n° 9, de 29 de setembro de 2004, que trata das diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Direito. É importante que se tenha clareza que a metodologia ativa selecionada neste trabalho, como o Arco de Maguerez, não foi aplicada nos processos de ensinagem do Direito, pelos pesquisadores. Entretanto, trata-se de uma pesquisa de cunho bibliográfico, que mostra as possibilidades de aplicação em aula do curso de Direito.

Por outro lado, do ponto de vista dos seus objetivos, a pesquisa é exploratório-explicativa. Exploratória, pelo escopo de proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. É explicativa, pois tem como principal preocupação identificar os fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos (Silva & Menezes, 2005), no sentido de buscar fundamentos acerca da viabilidade de adoção de metodologias ativas, no caso o Arco de Maguerez, no processo de ensinagem do Direito, apontando-se, de certa forma e mesmo que incipiente, para as possibilidades de mudança e quebra do paradigma tradicional da ciência jurídica, em face de seus saberes e fazeres pedagógicos.

Nas próximas seções, tais questões metodológicas serão evidenciadas.

Por que o ensino do Direito é assim o que se quer?

Quando se discute o ensino, muitas vezes olvida-se em se lançar uma visão histórica acerca do tema. Ao se projetar luzes sobre o nosso ensino superior, observa-se o quão tardio foi o desenvolvimento das graduações no país, em relação à realidade europeia e à própria história do continente americano.

As raízes institucionais do ensino superior europeu, conforme Barreto e Figueiras (2007), remontam ao ano de 1088, com a criação da Universidade de Bolonha, na Itália, seguida pela Universidade de Paris, na França, em 1100. Nas Américas, a primeira universidade criada foi a de São Domingos, na atual República Dominicana, em 1538. Após, tem-se a criação da Universidade de San Marcos, no Peru, em 1551, no México em 1553, em Bogotá no ano de1662, seguidas por Cuzco, 1692, Havana, 1728 e Santiago do Chile, em 1738. Já nos Estados Unidos: Harvard (1636), Yale (1701) e Filadélfia (1755).

O Brasil teve seu primeiro curso superior reconhecido tão somente em 1808, a então Escola de Cirurgia da Bahia, com a chegada da coroa portuguesa (Barreto & Figueiras, 2007; Gomes, 2002). Em 1828, Dom Pedro I decretou a criação das faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, em Pernambuco (Mota, 2014). Mas a primeira universidade brasileira só foi instituída em 1920, no Rio de Janeiro (Barreto & Figueiras, 2007).

Todavia, desde a criação das primeiras escolas de Direito e apesar de todo o desenvolvimento experimentado nas mais variadas áreas do conhecimento humano, tem-se em Rodrigues (2005) que a práxis do ensino jurídico brasileiro parece não ter tido a mesma identidade evolutiva, apesar do número recorde de faculdades instaladas atualmente no país4:

(…) o ensino do Direito continua adotando a mesma metodologia da época de sua criação: a aula-conferência. É ela a técnica preferencial do ensino tradicional. Em sua grande parte, seus professores possuem uma formação pedagógica insuficiente (ou mesmo nenhuma preparação didático-pedagógica) e se restringem em sala de aula a expor o ponto do dia, comentar os artigos dos códigos e contar casos de sua vida profissional, adotando um ou mais livros textos que serão cobrados nas verificações. (Rodrigues, 2005, p. 53).

Nesse sentido, nota-se que as tendências tradicionais do ensino jurídico geralmente terminam por centrar as ações de ensinagem na transmissão de informações entre professor e aluno, sintetizando o conhecimento na capacidade e apreensão e aplicação mecânica de tais informações. Ainda, caracteriza-se pela sedimentação de uma relação vertical e hierarquizada entre o docente e o discente, sendo aquele a autoridade da qual emergem as práticas pedagógicas necessárias à transmissão do saber.

Situação que resta clara quando se verifica a ampla adoção de metodologias expositivas, que se destacam pela falta/falha de capacitação didático-pedagógica por parte do docente, do qual sempre mais se valorizou o currículo profissional extra academia. Tal como aponta Adeodato (1995, p. 625), “no campo do Direito criou-se a falácia de que exercer atividades forenses e/ou burocráticas fora da Universidade seja fundamental para o trabalho acadêmico. (…) O bom professor não é, necessariamente, aquele advogado que tem sucesso defendendo interesses de clientes”.

Tais matizes, profundamente arraigadas nas práticas pedagógicas do Direito, foram nutridas e se sustentam em sólidas raízes históricas, conforme destacado por Martinez (2006), quando afirma que a “ausência de exigências qualitativas para a profissão de professor de Direito favoreceu a lei do mercado do ‘ensino livre’, permitindo a fácil expansão quantitativa do ensino jurídico no aspecto da oferta de mão-de-obra docente”. O autor corrobora afirmando que “a escolha […] tendo por critério seu sucesso profissional como operador jurídico, resultou no modelo de ‘nivelamento pedagógico’, baseado em levar para salas de aula os melhores práticos” (Martinez, 2006, p. 01).

Assim, necessária se apresenta a adoção de instrumentos que desenvolvam as possibilidades de ultrapassar tais modelos tradicionais, aproximando-se do perfil do discente traçado pela Resolução do Conselho Nacional de Educação e da Câmara de Educação Superior n° 9, de 29 de setembro de 2004, que trata das diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Direito, que prevê:

Art. 3°. O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando, sólida formação geral, humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica que fomente a capacidade e a aptidão para a aprendizagem autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício da Ciência do Direito, da prestação da justiça e do desenvolvimento da cidadania.

Art. 4°. O curso de graduação em Direito deverá possibilitar a formação profissional que revele, pelo menos, as seguintes habilidades e competências: I – leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos ou normativos, com a devida utilização das normas técnico-jurídicas; II – interpretação e aplicação do Direito; III – pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e de outras fontes do Direito; IV – adequada atuação técnico-jurídica, em diferentes instâncias, administrativas ou judiciais, com a devida utilização de processos, atos e procedimentos; V – correta utilização da terminologia jurídica ou da Ciência do Direito; VI – utilização de raciocínio jurídico, de argumentação, de persuasão e de reflexão crítica; VII – julgamento e tomada de decisões; e, VIII – domínio de tecnologias e métodos para permanente compreensão e aplicação do Direito (Brasil, 2004, p. 01-02).

Todavia, a moderna doutrina, apesar do dever/ser, anteriormente referido no tocante à normatização, reconhece que há um distanciamento evidente, em relação ao ensino do Direito, entre: “as diretrizes propostas e as práticas realizadas e realizáveis no cotidiano docente (…) cuja essência já encerra enorme contradição (entre o declarado e o efetivo)” (Britto & Duarte, 2016, p. 73). Concluindo que: “As ações, práticas, estratégias e gestões das Instituições de Ensino Superior não se perfilham ao que deveria ser, sequer do ponto de vista de adequação formal aos desideratos” (Britto & Duarte, 2016, p. 80).

Em justa contraposição às características da pedagogia jurídica tradicional, Silva (2000) apresenta o seguinte perfil esperado do profissional do Direito, a partir do desenvolvimento de habilidades e competências específicas exigidas pela profissão: “profissional do Direito deve reunir um conjunto de características que são da maior importância para o seu trabalho: facilidade no uso da linguagem tanto escrita como oral e na análise de objetivos e planos […]”. O mesmo autor acrescenta que, no que diz respeito ao profissional de Direito, as capacidades de “argumentação e de transmissão de ideias, sociabilidade, desembaraço e iniciativa. A assertividade na defesa de suas teses é também importante” (Silva, 2000, p. 311).

Tais características foram moldadas desde o nascimento da ciência jurídica, tendo como prática pedagógica tradicional a verticalidade na relação de ensinagem, o que hoje, justamente, busca-se superar, adequando-se o processo ao objeto de estudo e ao profissional que se busca formar, lançando olhares, então, ao papel dos atores (docentes e discentes) e às práticas pedagógicas à disposição, elementos essenciais à adequada e necessária evolução. Nesse sentido, o autor deixa assente que:

Cada uma dessas habilidades tem sido objeto de pesquisas e estudos a partir de tempos remotos. Desde contribuições da Antiguidade clássica, como, por exemplo, as dos sofistas, de Quintiliano, Cícero e outros, o desenvolvimento desses e de outros componentes essenciais para o exercício das atividades que caracterizam as profissões de natureza jurídica constituiu tema de análises, prescrições e discussões. A literatura jurídica produzida no século atual tem abundantes referências a esse respeito, geralmente englobadas nos conceitos de persuasão, eloquência, retórica, arte oratória etc. (Silva, 2000, p. 311).

Nessa lógica, a busca por novas formas de abordagens metodológicas exige do docente a aplicação de instrumentos diferentes dos tradicionais. Novéis pedagogias adequadas ao objeto do ensino jurídico. In casu, o “Direito”, como estudo das normas jurídicas, sua formação, estrutura e aplicação sistêmica, bem como “direito” como a proteção de bens juridicamente tutelados e a busca pela Justiça e o bem viver:

O ensino jurídico deve compreender — como desde sempre deveria — o trato de todas estas múltiplas dimensões ou acepções. Um dos fins colimados com a pesquisa é a constatação de efetividade disso, ou seja, em qual medida as Instituições de Ensino Superior conseguem desempenhar as funções legalmente exigidas. (Brito & Duarte, 2016, p. 67-68).

Conforme o levantamento de dados, em pesquisa realizada no Portal de Periódicos da Capes, do Ministério da Educação, feita no mês de março de 2018, conforme metodologia informada adiante, se obteve os seguintes resultados:

Da análise, é possível verificar a incipiência das publicações científicas registradas na base de dados pesquisada, referentes à adoção de metodologias diversificadas, amoldadas ao perfil de profissional que o Direito almeja formar. Ao mesmo tempo, se observa que outras áreas do saber, como a saúde, já se mostram avançadas nas práticas pedagógicas ativas, bem como na produção de conhecimento em relação a tais processos de ensinagem.

Nesse sentido, procura-se identificar e destacar fundamentos para a adoção das metodologias ativas no ensino do Direito, especificamente do Arco de Maguerez, como instrumento didático de problematização na discussão de casos jurídicos reais pelos discentes, instrumentalizando os docentes e diversificando e qualificando as práticas didático-pedagógicas das ciências jurídicas.

Vamos falar sobre metodologias ativas no Direito?

Conforme visto anteriormente, o Direito carrega, ainda, uma carga pedagógica tradicional, traduzida na metodologia de aulas eminentemente expositivas, tendo no professor a figura central e dominadora do processo de ensinagem.

Porém, ao mesmo tempo em que se experimenta tal realidade de sala de aula, impõe-se, por perfil, a formação de profissional que supere a qualificação, somando a isso o pensamento crítico e reflexivo, além da capacidade de difundir o conhecimento e solucionar problemas jurídicos dos mais variados.

A complexidade crescente nos mais diversos setores da vida no âmbito mundial, nacional e local tem demandado o desenvolvimento de capacidades humanas de pensar, sentir e agir de modo cada vez mais amplo e profundo, comprometido com as questões do entorno em que se vive. (Berbel, 2011, p. 25-26).

Neste sentido, compreende-se o espaço acadêmico como o ambiente em que o estudante desenvolve as competências e habilidades necessárias à autonomia profissional, a partir de novas formas de ensinar, pesquisar e aplicar o conhecimento aos fatos da vida. Nos dizeres de Darius e Stange Lopes:

As salas de aula, no Ensino Superior, devem superar a proposição dos conteúdos em uma abordagem mais diretiva e preocupar-se com uma proposta metodológica que contemple a formação plena do ser humano. Há necessidade de valorizar o saber fazer e o aprender, que é possível por meio das metodologias ativas. (Darius& Stange, 2017, p. 997).

Assim, observa-se uma evidente reciprocidade de adequação entre diferentes tipos de aulas e métodos de ensino, destacando-se, em tal contexto: as características gerais da aula; a sua estruturação didática; os tipos e métodos de ensino.

Todavia, advertem Ostermann e Cavalcanti (2011, p. 53), que não só de instrumentos metodológicos se contempla o processo: “a qualidade do ensino em sala de aula está intimamente relacionada ao conhecimento de referenciais teóricos que orientem o planejamento, a implementação e a avaliação de práticas educacionais”.

Libâneo (1994), caricaturando o conceito de aula expositiva e a relação vertical e de submissão entre professor e alunos, aponta os objetivos e a importância da organização prévia das atividades:

Devemos entender a aula como o conjunto dos meios e condições pelos quais o professor dirige e estimula o processo de ensino em função da atividade própria do aluno no processo de aprendizagem escolar, ou seja, a assimilação consciente e ativa dos conteúdos. Em outras palavras, o processo de ensino, através das aulas, possibilita o encontro entre os alunos e a matéria de ensino, preparada didaticamente no plano de ensino e nos planos de aulas. (Libâneo, 1994, p. 177-178).

Para tanto, os docentes precisam efetivar, através de estruturação e organização, que suas aulas alcancem as seguintes exigências:

  • ampliação do nível cultural e científico dos alunos, assegurando profundidade e solidez aos conhecimentos assimilados;

  • seleção e organização das atividades dos alunos que possibilitem desenvolver sua independência de pensamento, a criatividade e o gosto pelo estudo;

  • empenho permanente na formação de métodos e hábitos de estudo;

  • formação de habilidades e hábitos, atitudes e convicções, que permitam a aplicação de conhecimentos na solução de problemas em situações da vida prática;

  • desenvolvimento das possibilidades de aproveitamento escolar de todos os alunos, diferenciando e individualizando o ensino para atingir níveis relativamente iguais de assimilação da matéria;

  • valorização da sala de aula como meio educativo, para formar as qualidades positivas de personalidades dos alunos;

  • condução do trabalho docente na classe, tendo em vista a formação do espírito de coletividade, solidariedade e ajuda mútua, sem prejuízo da atenção às peculiaridades de cada aluno. (Libâneo, 1994, p. 179).

Por fim, o autor deixa claro que não se trata de um processo rígido e inflexível, pelo contrário: “a estruturação da aula é um processo que implica criatividade e flexibilidade do professor, isto é, perspicácia de saber o que fazer frente a situações didáticas específicas, cujo rumo nem sempre é previsível” (Libâneo, 1994, p. 179). Já o aluno, conforme Berbel (2011), tem papel fundamental no aprender por meio da problematização, protagonizando seu processo de aprendizagem, engajando-se nos objetivos das aulas, atuando com liberdade e autonomia em vistas a preparar-se para o seu futuro profissional.

É justamente nesse viés de flexibilidade e criatividade que as metodologias ativas servem ao professor como instrumentos didáticos efetivos, qualificadores das práticas em sala de aula, como suporte em busca da autonomia, favorecendo a motivação autônoma (Berbel, 2011), como um dos personagens principais do processo de ensinagem, não apenas mais um mero expectador passivo da transmissão vertical de informações. Bastos (2006) entende as metodologias ativas como:

(…) processos interativos de conhecimento, análise, estudos, pesquisas e decisões individuais ou coletivas, com a finalidade de encontrar soluções para um problema. É o processo de ensino em que a aprendizagem depende do próprio aluno. O professor atua como facilitar e orientador para que o estudante faça pesquisas e decida por ele mesmo, o que fazer para atingir determinado objetivo. (…) estimula a autoaprendizagem e facilita a educação continuada porque desperta a curiosidade do aluno e, ao mesmo tempo, oferece meios para que possa desenvolver capacidade de análise de situações com ênfase nas condições loco-regionais e apresentar soluções em consonância com o perfil psicossocial da comunidade na qual está inerido. (Bastos, 2006).

Em uma breve contextualização histórica, cabe destacar que as metodologias ativas, em sua essência, não se constituem em algo novo, pois, segundo Abreu (2009), a primeira evidência de métodos ativos encontra-se na obra Emílio, ou da Educação do filósofo iluminista Jean Jacques Rosseau (1712–1778), “tido como o primeiro tratado sobre filosofia e educação do mundo ocidental e na qual a experiência assume destaque em detrimento da teoria” (Abreu, p. 272).

Também se encontram raízes embrionárias fundamentais no conceito de aprendizagem significativa desenvolvida por Ausubel (1918–2008), alicerçada na bagagem prévia de conhecimentos trazida pelo aluno para a construção de novos saberes que lhe fizessem sentido:

A essência do processo de aprendizagem significativa é que as ideias expressas simbolicamente são relacionadas às informações previamente adquiridas pelos alunos através de uma relação não arbitrária e substantiva (não literal). Uma relação não arbitrária e substantiva significa que as ideias são relacionadas a algum aspecto relevante existente na estrutura cognitiva do aluno, como, por exemplo, uma imagem, um símbolo, um conceito ou uma proposição. (Ausubel, Novak & Hanesian, 1980, p. 34).

Todos os elementos, pontuados anteriormente, podem contribuir para o processo de ensinagem no Direito baseado em metodologias ativas, em razão da motivação do aluno e da sua empatia, afinidade, com a matéria, problemas e temas a serem estudados.

Berbel (2011) destaca as contribuições de John Dewey (1859–1952) e as bases pedagógicas da Escola Nova, ao aprender fazendo, com destaque à aprendizagem pela ação através da iniciativa, originalidade e cooperação, visando contribuir para a resolução dos problemas da vida. Também, sublinha o legado de Paulo Freire (1921–1997) e a sua pedagogia problematizadora, como outra teoria de sustentação para as metodologias ativas, consagrando uma aprendizagem fomentada pela superação de desafios, a resolução de problemas e a construção de novos conhecimentos: pensar a prática e retornar para transformá-la.

Por fim, baseada nos ensinamentos do professor americano Johnmarshall Reeve, que estudou as relações entre ensino e motivação, Berbel (2011) explica que o papel do professor contribuiria para a promoção da autonomia do discente quando:

a) nutre os recursos motivacionais internos (interesses pessoais); b) oferece explicações racionais para o estudo de determinado conteúdo ou para a realização de determinada atividade; c) usa de linguagem informacional, não controladora; d) é paciente com o ritmo de aprendizagem dos alunos; e) reconhece e aceitas as expressões de sentimentos negativos dos alunos. (Berbel, 2011, p. 28)

É justamente na busca por um perfil inovador de profissional do Direito, capaz de reconhecer os problemas reais e buscar as soluções adequadas, que o discente pode ter sua formação facilitada, em um processo cooperativo, levando-se em conta que: “As metodologias ativas têm o potencial de despertar a curiosidade, à medida que os alunos se inserem na teorização e trazem elementos novos, ainda não considerados nas aulas ou na própria perspectiva do professor” (Berbel, 2011, p. 28).

Todavia, não há como olvidar-se das dificuldades que podem surgir da adoção, devendo os docentes e gestores estar atentos e preparados às situações e desafios advindos da adoção de novas metodologias. Nesse sentido:

A realidade da maioria dos estudantes que precisa conciliar o estudo com o trabalho e, portanto, não dispõe de tempo suficiente para se prepararem adequadamente para as aulas baseadas em métodos ativos de aprendizagem. O risco da resistência docente e discente à proposta de incorporação dos métodos ativos de aprendizagem, vez que esta demanda uma importante mudança no papel de professor e de aluno, transformando-os em facilitador e estudante; portanto, deslocando o eixo do processo educacional do ensino para a aprendizagem e do professor para o aluno. A necessidade de uma revisão dos currículos para se alinhar ao visado perfil dos egressos, de maneira mais adequada, conteúdos, objetivos de aprendizagem, metodologias de ensino e, sobretudo, um sistema avaliativo mais coerente com a proposta pedagógica das metodologias ativas de aprendizagem. (Araújo & Oliveira, 2015, p. 12).

Assim, em face de tais metodologias, cujas bases histórico-pedagógicas foram há muito concebidas e construídas, acredita-se dispor de sólido amparo doutrinário e empírico para a discussão da metodologia ativa aqui referenciada, o Arco de Maguerez, compreendida como de efetiva valia para a ensinagem jurídica, como um instrumento de discussão de casos jurídicos reais, nas mais variadas áreas da ciência do Direito, com problematização e participação autônoma e ativa do estudante.

Arco de Maguerez no Direito: possibilidades de adoção

Dentre as metodologias ativas, escolheu-se apresentar e tecer comentários acerca da possibilidade de utilização do Arco de Maguerez, desenvolvido por Charles Maguerez na década de 1970 e apresentado aos educadores brasileiros, em 1977, por Bordenave e Pereira (2004), em sua obra Ensino e Aprendizagem, no processo de ensinagem jurídica.

O Arco de Charles Maguerez consiste em uma estratégia pedagógica para o desenvolvimento da problematização, que, entende-se, pode ser aplicada aos mais diversos casos jurídicos, transferidos da realidade para a discussão em sala de aula, com ampla participação dos alunos, pois parte da realidade e a ela retorna com possíveis soluções. Logo, baseia-se na ação/reflexão/ação ou prática/teoria/prática (Berbel, 2012). De acordo com Althaus:

Na Metodologia da Problematização, os problemas são identificados pelos alunos, pela observação da realidade, na qual as questões de estudo estão acontecendo. Observada de diferentes ângulos, a realidade manifesta-se para alunos e professores com suas características e contradições, nos fatos concretos e daí são extraídos os problemas. A realidade é problematizada pelos alunos. Não há restrições quanto aos aspectos incluídos na formulação dos problemas, já que são extraídos da realidade social, dinâmica e complexa. (Althaus, 2017).

O que resta claro com Darius e Stange Lopes (2017, p. 988) é que: “a Metodologia de Problematização não é uma proposta fechada em si mesma, mas cujos desdobramentos possibilitam sempre outros estudos e novos olhares para um mesmo problema”.

Assim, o Arco se compõe de cinco etapas, a saber: a observação da realidade, os pontos-chave, a teorização, as hipóteses de solução e aplicação à realidade (Bordenave & Ferreira, 2004), definindo-se pelo seguinte diagrama:

Fonte: (Berbel, 2012, p. 19).

Figura 1 Arco de Maguerez. 

Baseando-se em estudos pedagógicos empíricos nas áreas da pedagogia e da saúde, Berbel (2011) destaca os passos para aplicação da metodologia em sala de aula, a partir do que se comenta a sua possibilidade de adequação ao ensino do Direito.

Como primeiro momento, os alunos problematizam a parcela da realidade associada ao conteúdo, selecionando um problema real, que pode ser um caso de repercussão, ou uma situação apresentada nos atendimentos durante o estágio supervisionado. Tal situação, então, será o objeto de estudo, partindo-se da realidade, para com ela aprender a buscar e criar soluções efetivas e adequadas. Para Darius e Stange Lopes (2017, p. 987) é “fundamental que os alunos sejam ensinados a problematizar”.

O passo seguinte está em estabelecer os pontos-chave, ou seja: “pontos essenciais que deverão ser estudados sobre o problema, para compreendê-lo mais profundamente e encontrar formas de interferir na realidade para solucioná-la” (Berbel, 1998, p. 143). Nesse ponto se esclarece, sob a supervisão do docente, o que de fato é importante estudar e pesquisar para responder ao problema. No caso do Direito, estabelecer a normatização típica e as linhas doutrinárias e jurisprudenciais adequadas ao problema em análise.

Após a teorização dos pontos-chave, o processo completa-se com a intervenção na aplicação ou disseminação das possibilidades de soluções e alternativas encontradas, visando uma ação prática e concreta na realidade. Ou seja, a análise das respostas encontradas ao problema e sua efetiva aplicação em casos de situações de atendimentos ao público, com a propositura de ações, recursos, pareceres, encaminhamentos ou outra peça e/ou promoção jurídica adequada ao caso.

Verifica-se que o ciclo do processo tende a tornar os alunos corresponsáveis pela construção do conhecimento, reforçando, assim, a sua autonomia e autocrítica, por meio da consciência das complexidades que envolvem fenômenos da realidade confrontados com as teorias.

As experiências com tal instrumento já foram documentadas e destacadas em diversos estudos científicos, conforme se observa, principalmente, na área da saúde (Quadro 1), que já conta com discussões de casos relacionados a práticas pedagógicas em sala de aula, relatando resultados adequados e satisfatórios:

Durante a aplicação do Arco de Charles Maguerez, percebemos que esta experiência estimulou a curiosidade e a manutenção do interesse, dos alunos do mestrado, no alcance dos objetivos do processo de ensino-aprendizagem. A atividade conduziu os alunos ao aprender a aprender, um repensar e reconstruir a educação fundada na prática cotidiana do trabalho, com futuras repercussões na qualificação e valorização profissional. (Prado et al, 2012, p. 176).

Conforme Soares, Becher e Barin (2016), a utilização arco tem como objetivo aproximar os estudantes e docentes a um exercício de ação/reflexão/ação, em etapas, a partir de um problema importado da realidade, viabilizando o desenvolvimento de conteúdos e temáticas de forma crítica e reflexiva. Esses autores destacam que:

Como metodologia de ensino, deve ser entendida como uma facilitadora e qualificadora de processos, adaptável às diferentes realidades, e não como um modelo estático e irrefletido. Ao partir de uma realidade concreta, refleti-la e tentar se reportar a ela novamente, a metodologia aqui abordada representa uma vasta possibilidade para a demonstração de que os mais diferentes processos realizados pelo homem relacionam a determinados saberes por ele produzidos e que, portanto, saberes e fazeres são inseparáveis. (Soares, Becher & Barin, 2016, p. 10-11).

Por todo o exposto, verifica-se que as características do arco adequam-se às necessidades do ensino jurídico, figurando-se como um instrumento adequado para o desenvolvimento de um pensar complexo e transversal, atraindo o discente para um atuar ativo e protagonista, partindo-se de problemas reais, visando respostas efetivas.

Por fim, a complexidade do objeto da ciência jurídica mostra-se, além de compatível, oportuna à recepção e utilização do instrumento metodológico, nos mais diversos ramos da ciência, podendo ser aplicado ao estudo e discussão de questões práticas e casos jurídicos reais. Permite, pois, a construção do conhecimento a partir da observação, teorização, discussão e aplicação, com participação ativa do discente no processo de ensinagem, flexibilizando e evolucionando a tradicional pedagogia do Direito, por meio de estímulos didáticos diferenciais, fundamentando-se na análise e perspectivas de mudanças da realidade frente aos modernos problemas jurídicos.

Conclusão

A busca pelo aperfeiçoamento da educação passa pelo reconhecimento de suas viabilidades e variáveis impostas a esse processo, de saberes e fazeres, interdependentes e transversais. No tocante ao universo do ensino do Direito, face às suas raízes históricas, este mantém-se fortemente arraigado ao tradicionalismo das metodologias verticais e expositivas. De outra banda, o desenvolvimento e a adoção de instrumentos pedagógicos diferenciados, que permitam desenvolver o espírito crítico e a autonomia dos alunos, contemplam o que há de mais moderno em termos pedagógicos. Apesar das diretrizes do ensino do Direito deixarem claro o perfil do profissional almejado, o que está em consonância com as possibilidades do processo de ensinagem baseado em metodologias ativas, a produção científica, nesse sentido, se mostra inexistente. Frente a tal realidade, entende-se que é preciso fomentar a discussão e trazer luzes a tais doutrinas pedagógicas, aclarando-se as possibilidades de utilização e, principalmente, fomentando o debate acerca da necessidade de se evoluir na quebra de paradigmas face ao processo de ensinagem tradicional, o que outras áreas, como a saúde, já fazem com naturalidade.

Por tal razão e pelos argumentos expostos nesta pesquisa, entende-se que o Arco de Maguerez se constitui em efetiva ferramenta para a condução do processo de ensinagem nas mais diversas áreas do Direito. Isso se dá a partir da problematização de casos reais e/ou de repercussão jurídica e social, atraindo o interesse e estimulando a participação do discente a atuar de maneira ativa na sua formação profissional.

Ressalta-se, também, que a utilização do Arco de Maguerez não se resume apenas ao ensino, mas, também, fomenta a pesquisa, visando ações resolutivas em assuntos do mundo real, tanto para os discentes como aos docentes. Espera-se dos professores que, assim, possam superar a mera atividade de expor/apresentar a informação de forma verticalizada, assumindo a sua responsabilidade cidadã ao contribuir socialmente na formação de uma massa crítica, autonomamente capacitada e preocupada com os problemas que permeiam o contexto em que vivem e atuam. Ou seja, dotar os estudantes de Direito com habilidades e competências que os instrumentalizem para observar a realidade, identificar problemas e agir em direção a soluções efetivas: construindo, nesse processo ativo, o seu conhecimento.

Por fim, é consabido que resultados diferentes somente são alcançados a partir de condutas e práticas diferentes. Por tal razão, acredita-se que trazer a lume possibilidades de metodologias ativas factíveis e congruentes às mudanças esperadas no processo de ensinagem jurídica, como no caso o Arco de Maguerez, contempla parcela significativa, mesmo que seja apenas como um primeiro passo, mas sem olvidar que se trata de um movimento corajoso e imprescindível à reflexão, evolução e superação das práticas pedagógicas tradicionais. Frente a isso, apresentam-se possibilidades diferenciadoras à ensinagem do Direito, objetivando delinear novos instrumentos de metodologias ativas, no caso o Arco de Maguerez, emponderando o docente e alcançando idêntico protagonismo ao discente, de forma adequada e qualificada, frente aos objetivos e desafios da educação nos cursos de Direito.

2Uma biblioteca virtual que reúne e disponibiliza as instituições de ensino e pesquisa no Brasil com o melhor da produção científica internacional. Conta com um acervo de mais de 38 mil títulos com texto completo, 134 bases referenciais, 11 bases dedicadas exclusivamente à patentes, além de livros, enciclopédias e obras de referência, normas técnicas, estatísticas e conteúdo audiovisual. Disponível em: https://www.periodicos.capes.gov.br/. Acesso em 20 mar. 2018.

3A expressão “ensinagem” foi inicialmente explicitada no texto de Lea das Graças Camargos Anastasiou, na tese: Metodologia do Ensino Superior: da prática docente a uma possível teoria pedagógica. Curitiba: IBPEX, 1998. A autora utilizou o termo para definir uma situação de ensino decorrente da aprendizagem, sendo a parceria entre professor e alunos considerada como condição fundamental para o enfrentamento do conhecimento, necessária à formação do aluno durante o cursar da graduação.

4Conforme o Guia do Estudante, o Brasil, em 2017, contabilizava 1.240 cursos de Direito, quantidade maior do que a soma de todos os demais cursos do mundo (1.100). Disponível em: https://guiadoestudante.abril.com.br/universidades/brasil-tem-mais-cursos-de-direito-do-que-todos-os-outros-paises-do-mundo-juntos/. Acesso em 20 mar. 2018.

5Nessa busca, utilizou-se o descritor “direito” no sentido geral da palavra e, por esse motivo, diferenciamos do descritor “ensino do direito”, que, por sua vez, objetivava encontrar publicações específicas no campo da educação e do ensino.

Os textos deste artigo foram revisados por Zeppelini Publishers e submetidos para validação do(s) autor(es) antes da publicação.

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Recebido: 09 de Outubro de 2018; Aceito: 27 de Maio de 2021; Publicado: 16 de Setembro de 2021

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Endereço para correspondência Cláudia Inês Horn, Universidade do Vale do Taquari Av. Avelino Talini, 171 Universitário – 95914-014 Lajeado, RS, Brasil, clauhorn@yahoo.com.br

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