O desenvolvimento científico tecnológico é decorrente de um conjunto de dimensões altamente interconectadas que delineiam o campo científico (Bourdieu, 1983). É necessário que se faça presente uma perspectiva internacional de apoio à pesquisa, uma perspectiva nacional fundamentada em políticas públicas subsidiadas em estratégias organizacionais e operacionais que fomentem o desenvolvimento da ciência, uma perspectiva institucional que, por sua vez, proporcione o arcabouço para que pesquisadores, com seus grupos e redes, possam produzir ciência. É a partir dessa concepção de produção científica que se busca compreender a consolidada trajetória do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) que, neste ano de 2022, comemora os seus 50 anos.
Neste contexto, é importante rememorar os seus primórdios. Uma figura que teve atuação marcante foi a professora doutora Maria Estela Dal Pai Franco, coordenadora do programa nos primeiros sete anos.3
Maria Estela Dal Pai Franco é doutora em Ciências Humanas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e mestre em Administração da Educação pela Temple University, nos Estados Unidos. Professora Titular, atuou na FACED/ PPGEdu/UFRGS como docente permanente, vice-diretora da Faculdade de Educação, pesquisadora e orientadora. Foi professora também na PUCRS. Participou da criação de grupos de pesquisa (Rede GEU, RIES, Universitas-Br), de conselhos, gestões, comitês, assessorias (PUCRS, UFRGS, CNPq, Capes, Inep e Fapergs) e de associações científicas nacionais e internacionais (Anpae, Anped, EAIR, AIR, LASA, FORGES), e da organização de eventos científicos pela RIES/Pronex.
A primeira palavra que eu gostaria de dizer, professora Maria Estela, é: seja muito bem-vinda e nós agradecemos muito a sua disponibilidade em conceder essa entrevista e fazer uma análise do período. Acreditamos que um programa, um curso não pode ser visto somente no interior da instituição em que está situado, mas é o resultado de um contexto internacional, nacional e regional. Então, gostaríamos que falasse um pouco sobre esses contextos.
Maria Estela, a palavra está contigo!
Boa tarde! É uma satisfação participar dessa entrevista por diversas razões. A primeira, porque falar da PUCRS significa falar da nossa própria trajetória pessoal e profissional. A PUCRS fez parte não só da nossa formação, mas de todo o movimento de socialização do conhecimento e, também, de relações institucionais e interinstitucionais, assim como de relações regionais, nacionais e internacionais, o que envolve todo o contexto da época, em mudança, especialmente no período em que assumimos a primeira coordenação do curso de pós em Educação – mestrado.
A segunda razão é porque estava nascendo não só a pós-graduação (PG) na área de Educação, mas em todas as áreas de conhecimento; a pós-graduação brasileira estava começando a se desenvolver, consolidar e se tornar adulta. Na PUC a PG em Educação foi criada com a orientação muito segura, da administração central da universidade e do irmão Faustino João, na época diretor da Faculdade de Educação, que acompanhou diversas reformas educacionais, a partir da LDB4 de 1961, até as que marcaram época, no movimento de reformas de 1968-1971.
Podemos afirmar que a PUCRS foi partícipe desses movimentos tão marcantes para a universidade brasileira, em especial, da década de 1970 e que culminaram com a consolidação da pós-graduação, ao mesmo tempo constituidora, constituinte e constituída nestes processos. Assim, é pertinente falarmos da pós-graduação sob a perspectiva institucional, mas, também, das políticas públicas e relações nacionais e internacionais, da agilidade da instituição em atender às demandas políticas, como a de formação de quadros de pessoal, do fortalecimento institucional por meio de relações interinstitucionais.
A perspectiva institucional…
Iniciaremos pelo institucional e perdoem se não estivermos sempre atentas à ordem cronológica. Ativar a nossa memória significa ir e voltar, algumas vezes trazendo diferentes leituras, a de ontem e a leitura de hoje porque o momento que nós estamos não deixa de influenciar a nossa visão do que aconteceu ontem. Um dos grandes destaques, naquela época, e certamente teve uma influência quando aluna de graduação da própria PUCRS (1965 a 1968), foi o movimento para a elaboração das reformas educacionais brasileiras. Éramos frequentemente solicitadas, nós, alunas de professoras como Délcia Enricone, Manuela Garcia Ramires e Lucinda Lorenzoni a dar opiniões, no transcurso das aulas, em questões específicas da educação brasileira, discutindo-as em grupos, e chegando ao “poderiam e deveriam” ser. É provável que nossas discussões colaborassem com as professoras que estariam participando de outros comitês, junto com docentes leigos e com os próprios irmãos maristas. Um dos reitores daqueles anos, que marcou época pela perspicácia em captar os momentos e transformá-los em estratégias para a consolidação da educação superior foi o irmão José Otão.
Passamos, assim, dentro da PUCRS por histórias marcantes. Foi mais de uma década de envolvimento com a instituição, lembrando que em 1968, no contexto nacional, começou a surgir de maneira forte a ideia da importância da pós-graduação brasileira. Dentro de ganhos e perdas do período este foi um ganho, no sentido de que a universidade começou a se dar conta da importância da PG e as leis de ensino começaram a delinear e a formalizar o aparato legal, necessário para que ela fosse criada. Antes de mais nada, as instituições precisam se preservar, consolidar e se desenvolver, formando a sua massa crítica, pois sem formá-la, para que viesse trabalhar na PG, os cursos não vingariam. Diante desse contexto a instituição captou a necessidade de conseguir formar seus quadros e obteve para tal finalidade bolsas de estudo de diversas fontes.
A PUCRS foi ágil levando em conta que a própria CAPES e o CNPq ainda estavam sendo revitalizados, no sentido de transformá-los em grandes agências promotoras da formação de quadros para as universidades e para a consolidação da PG.
Mas ainda havia poucas bolsas de estudo e aí, o que acontece é que um programa chamado Laspau-Latin American Scholarship Programs for American Universities, articulado com a Fulbright, disponibilizava bolsas. Era um programa especial para alunos que tinham dificuldade para cursar e pagar universidades nos Estados Unidos, que eram caríssimas. Isso seria inviável para muitos de nós brasileiros e a PUCRS selecionou a mim, pela Educação e uma outra professora pela área de Letras. A prof. Delcia Enricone foi quem nos convidou. É interessante contar os detalhe do convite: lembro de que uma manhã, recém-formada e trabalhando na Campanha Nacional de Educandários Gratuitos – CNEC, a professora Enricone nos procurou e perguntou: “Maria Estela, queremos saber se estás com namorado seríssimo, se está para casar?”. “Eu não estou para casar”, disse assustada, sem entender. E Delcia falou: “tem chance de uma bolsa nos Estados Unidos para um pós strito sensu, mestrado. Temos mais algumas candidatas da PUC, mas és a nossa candidata da Educação”. Nossa classificação no término do curso de Pedagogia, sempre estudiosa e cumpridora de compromissos, teve influência. A seleção foi com uma banca de examinadores de fora, com representantes da Laspau, da própria CAPES, e de um organismo internacional, talvez a OEA, Organização dos Estados Americanos, porque o examinador professor Benno Sander, foi vinculado, e um representante institucional da PUCRS (Sander, 2007).
Políticas nacionais e visão internacional…
Vejam bem, isto mostra bem a relação da PUCRS e a sua agilidade em relação às políticas nacionais e internacionais. Esse ponto é fundamental e assim, fomos para cursar o mestrado, na Temple University, Philadelphia, USA. O interessante desse programa é que falávamos um pouco de inglês, viemos de uma origem com múltiplas raízes, no nosso caso raiz polonesa, suíça e raiz italiana. Tivemos que aprender a lidar com línguas diversas. Quando soube que fui selecionada, ficamos alguns meses fazendo um curso intensivo de inglês. Ao chegar nos Estados Unidos, e isso foi muito interessante, o programa Laspau previa um período de alguns meses, nos quais os 30 e poucos alunos latino-americanos faziam um curso intensivo em inglês. Naquele período, o nome deles era submetido às universidades em busca do aceite nas áreas e campos específicos. Tínhamos que enfrentar, também, exames mais avançados de inglês, tais como o como o Toeffel e o Michigan, além de exames do tipo Graduated Record Examination, usualmente requerido para ingresso na PG das universidades. Sempre achamos adequado manter um certo nível de ingresso na PG da universidade. Um conhecimento, em aberto. Podemos ter ações que tornem mais democrática a educação superior, mas, temos que entender que a educação superior precisa de quesitos. A universidade, então, deve ter critérios, tem que estabelecê-los. É o que parece predominar, em universidades do hemisfério norte, até os dias de hoje (Altbach, 2016). Parece que, num certo sentido, o Brasil tem mantido alguns critérios, ao longo destes anos, para ingresso na universidade e, posteriormente, na pós-graduação (Franco & Longhi, 2021).
A agilidade da PUCRS na formação de quadros…
Essa agilidade da PUCRS para formar os seus quadros de pessoal é destacável. Isso continua anos adiante. Quando retornamos para o Brasil, com o mestrado, já tínhamos alguns créditos para o doutorado. Retornei porque a PUCRS queria abrir, em 1972, a PG em Educação. A ideia era que depois que ajudássemos na instalação, retornássemos para os EUA a fim de concluir o doutorado. Nesse meio tempo, e enquanto estivéssemos aqui, prepararíamos outras pessoas para irem ao exterior. Assim, foi selecionada no mesmo programa Laspau, outra graduada, a professora Maria Emília do Amaral Engers, que depois também coordenou a pós em Educação. Enquanto na PUCRS, a instituição sempre nos orientou para antever e preparar os quadros futuros de pessoal.
Isso posto, podemos dizer que nesta época se concretiza a construção da PG na PUC, com a inestimável colaboração do irmão Faustino, assim como do setor responsável pela pós-graduação. Foi então organizada uma Câmara, um conselho de Pós-graduação – isto é, um órgão colegiado formado pelos coordenadores que discutiam esse movimento, dentro das políticas nacionais. Trabalhamos e trocamos muitas ideias, especialmente, com a primeira coordenadora do Mestrado em Psicologia da PUCRS, Zaida Grinberg Lewin, jovem que havia projetado aquele curso, junto com o Irmão Pedro Finckler. Tais religiosos de diferentes ordens foram verdadeiros baluartes na universidade brasileira, como o irmão Faustino João, na educação, o irmão Elvo Clemente, nas letras, e o padre Urbano Zilles, na filosofia. A junção entre o conhecimento sólido dos mais antigos que forjaram a PUCRS, junto às ideias jovens de professores, fazem crescer a instituição. Inovação e experiência.
E as relações interinstitucionais – A PUCRS e a colaboração entre IES?
Uma das políticas que destacaríamos foi o relacionamento interinstitucional entre universidades. Com a UFRGS, a PUCRS colaborou e recebeu colaboração. Naquele dado momento, de um lado estava coordenando a pós em educação uma jovem de 25- 26 anos e do outro lado, na UFRGS, uma pessoa mais experiente, mas aberta para ouvir e deixar muito espaço para a jovem da PUCRS. Era a professora Juraci Cunegatto Marques. Trabalhamos juntas muitas vezes, inclusive, no levantamento de dados de toda a pós-graduação do Rio Grande do Sul, em meados da década de 1970.
E aí vem a regionalidade da PUCRS. As instituições universitárias mais avançadas no RS, na época, e suas administrações, eram ágeis, eu diria, estratégicas. É o caso da UFSM e seus cursos que recebiam financiamento externo e, por isto mesmo, predominavam pós-graduandos de países latino-americanos. Mas a PUCRS e a UFRGS também tinham profissionais, estudiosos e administradores com visão à frente de seu tempo, sabendo da urgência da pós-graduação, da interação entre a PUCRS e UFRGS na formação de quadros com a titulação requerida. Os candidatos excediam em muito as vagas oferecidas e eram quase na totalidade, professores de IES. No caso da PUCRS, professores de IES, de universidades e do RS, bem como professores da UFRGS, se candidataram, pois precisavam fazer a PG para sua atuação no ensino superior. Tivemos seleções muito rigorosas, professores de várias áreas de conhecimento que buscavam a Administração da Educação, Métodos e Técnicas de Ensino e o Aconselhamento Psicopedagógico.
Na época, era exigida a disciplina de Estrutura e Funcionamento do Ensino, nos cursos de licenciatura. Assim, o mestrado em Administração da Educação tornou-se uma opção atraente. Uma série de professoras desta área, já se reunia para discussões e buscaram a PUCRS para seu mestrado. Vieram fazer a PG conosco, por exemplo, professores da UFRGS, hoje já aposentadas, a professora Marlou Zanella Pellegrini, a Eliane Lopes da Silva Gswenther, a professora Teresa de Jesus Pilla Hofmeister. Algumas das professoras também trabalharam na PUCRS. Lembro de Golástica Angelica Comparsi, do Conselho Estadual de Educação. Um outro ponto destacável é que a PUCRS colaborou também com a Unisinos e com a formação de mestres em âmbito regional. Nesse aspecto regional um dos nomes que se destaca hoje, na educação Brasileira é a professora Flávia Obino Correa Werle, na época nossa aluna de mestrado. Isso a minha memória tem bem presente. Estou bem lembrada dessas colaborações interinstitucionais. A PUCRS com a Universidade Federal de Santa Maria, com universidades do interior do estado que estavam começando a formar seus quadros como, por exemplo, na Universidade de Passo Fundo, lembro da professora Solange Laus Bayer e outras que de lá vieram para fazer o mestrado.
Da UFRGS é importante resgatar uma das pessoas mais destacáveis não só pela competência técnica e conhecimento em microensino e em educação laboratório, mas pelo modo de ser. É a professora Flávia Maria Santana, que fez a sua PG em Educação na PUCRS. A professora dava uma contribuição muito grande nas discussões em sala de aula. Ela se nutria dos conhecimentos de todo o nosso corpo docente, mas ela também dava uma contribuição muito significativa.
Maria Estela, sabemos que a formação do estudante não ocorre somente por influência e sua participação na instituição educacional. No Brasil, por exemplo, a educação superior é regulada pelo governo central. A centralização na entrada e manutenção no sistema de educação superior do país, bem como os currículos dos cursos têm legislações determinantes. Na perspectiva do fomento da ciência e da tecnologia e da função de pesquisa, um dos marcos normativos é registrado em torno dos anos 1950, com a criação de agências brasileiras de fomento à investigação, como o CNPq e a CAPES. Poderias nos falar sobre a perspectiva nacional neste contexto para a criação e o desenvolvimento da pós-graduação?
Outro ponto nacional a colocar, e vejam bem, num momento de criação e crescimento da PG, já tínhamos, no Brasil, um curso de PG em Educação, talvez ainda a melhorar, mas competente, que estava funcionando na PUC do Rio de Janeiro e era muito colaborativo com outras universidades, além de competente em atrair candidatos de outras universidades. Tinha boa ligação com a Espanha, na pessoa da professora Vera Candau e da professora Eloisa, e reconhecimento de outros professores e da CAPES e CNPq. Estas agências organizavam reuniões na PUC do Rio de Janeiro que era a instituição mais experiente na PG em Educação, e que funcionava desde 1965, mas que foi se firmando e, só foi consolidada depois, se bem me lembro, já na década de 1970.
Aqui tem detalhes notificáveis porque essas reuniões eram de uma aprendizagem grande. Nós tivemos colaborações e, também, colaboramos muito. E, foi nestes anos, mas enquanto eu estava ainda na PUCRS, que numa das reuniões organizada pela CAPES, um professor de um programa de orientação crítica às políticas nacionais teve uma manifestação interessante. Ele participou de inúmeros grupos de trabalho que nós também participávamos, e tinha paciência e interesse de ouvir a opinião e pensamento de uma jovem. Perguntamos por que participava tão assiduamente, sendo tão contra e crítico às políticas e ele respondeu: invasão de estruturas. Lembro que nesse comitês, sempre houve a presença das coordenações de programas, especialmente, nas reuniões da PUC do Rio de Janeiro, mas articuladas pelo governo federal e, também, nas reuniões da CAPES, em Brasília
Nesse contexto foi que a professora Juracy e eu recebemos uma incumbência de maior porte, pois estava sendo organizado o primeiro Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o Brasil – 1974. Não era só para a educação, mas para todas as áreas de conhecimento. Seguidamente tínhamos reuniões de todos no auditório maior da CAPES e reuniões de pequenos grupos de áreas de conhecimento. Nessas reuniões dos grupos foi atribuída para a professora Juracy Marques e para nós, da PUCRS, a incumbência de coletar os dados da região Sul – Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul – para assentar em dados científicos a construção deste plano para a área da Educação. Foi essa uma das colaborações mais marcantes, tanto que no documento que publicou o plano para a educação, a PUCRS consta como participante na coleta de dados da região Sul-educação.
Maria Estela, em todo esse detalhamento analítico que estas construindo fica claro a liderança da PUCRS, no início da pós-graduação em Educação no país. Poderias nos dizer o número dos programas, a época, no Brasil?
É provável que em torno de oito a 10 programas. Hoje em dia, temos mais do que 200. Entre os poucos, o Rio Grande do Sul estava marcando presença. Tínhamos, se estou bem lembrada, da PG da PUC do Rio de Janeiro, da UFRJ, da UF Minas Gerais da Federal de Minas, da UFF. São Paulo teve um movimento distinto, um tanto separado do movimento federal. Era mais independente e – não se esqueçam que – era uma universidade estadual e o Conselho Estadual de Educação de lá é que rezava muitas de suas normas, o que não eximia seu vínculo com o sistema nacional. São Paulo sempre atuou um tanto separado deste outro grupo. Lógico que existia, em certos momentos uma articulação, mas ele tinha as suas orientações próprias.
Hoje, Maria Estela, considerando o contexto de uma forte globalização, a internacionalização se constitui uma dimensão necessária às instituições de educação superior avaliadas como de qualidade. A internacionalização da educação superior na era moderna estava relacionada às atividades de pesquisa e, consequentemente, à universidade e à construção da ciência. Hoje, além da função investigativa, a internacionalização se estende, de forma marcada, à função de ensino e abrange as instituiçoões de educação superior de uma forma geral. (Morosini & Dalla Corte, 2021). Assim, no momento da criação dos programas de pós-graduação, a internacionalização foi determinada de forma intencional pelo estado brasileiro. Poderias nos falar sobre essa questão nos primórdios do programa? Há essa relação da internacionalização com a formação dos quadros e a contribuição para o programa. Como é que tu analisas?
Tenho isso muito presente. Primeiro, na relação internacionalização e formação de quadros de pessoal. Daqui, já mencionei programas como o da Laspau e, ainda, com algumas articulações com a CAPES e o CNPq é lógico. O ponto que tenho que destacar é que nesse movimento de exigências – e toda exigência implica numa concessão e a concessão é um oferecimento de condições – então o que acontece é que dentro desses órgãos federais foi desenvolvido um programa conjunto para trazer professores estrangeiros, com o doutorado, para o país.
Na trajetória da internacionalização no país tua afirmação é muito clara. Inúmeras instituições de educação superior tiveram como apoio a vinda de professores de instituições do global norte, preferivelmente. É desta fase a criação dos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDE) e dos Planos Nacionais de desenvolvimento da pós-graduação (PNPG).
Neste contexto, a área de educação marcou porque a PUCRS foi ágil, como sempre. Aqui queremos retomar que o Irmão Faustino era ágil, a equipe da administração central que coordenava a pós-graduação também o era. Tínhamos reuniões com frequência, a coordenação central estava sempre a par das últimas políticas, tanto que consegui ingressar no programa de contratação de professores doutores, resultando na contratação de dois professores estrangeiros para um prazo de dois a três anos. Nós poderíamos selecioná-los dentro de currículos que os próprios órgãos federais – CAPES e CNPq – obtinham por meio da divulgação no exterior, aberta aos interessados. Depois de uma série de análises entramos em contato com alguns que se dispunham a vir para cá e foram contratados o doutor Robert Walker e a doutora Zlmarian Walker, profissionais que contribuíram com o curso.
Cabe uma notificação sobre outra estratégia ligada à internacionalização. É a busca de profissionais com doutorado no exterior, brasileiros ou não. Neste programa conseguimos também trazer para a pós-graduação em Educação, em conjunto com outro curso da PUC (psicologia) a professora da Ângela Biaggio, da área de Aconselhamento Psicopedagógico, nome internacional na área, com o doutorado nos Estados Unidos. Precisávamos formar o corpo de doutores, pois já tínhamos criado um curso no qual predominavam mestres e livre docentes.
A perspectiva da pós-graduação brasileira era diferente da perspectiva dos professores com livre docência. Em absoluto tiramos o valor de trabalhos de extremo destaque com grandes cunhos filosóficos, sociológicos e psicológicos, das raízes da história, do conhecimento humano que os livre docentes apresentavam. É inegável a contribuição dos livre docentes como os professores e irmãos Sebastião e José Campos, e o irmão Justo, mas estávamos entrando numa fase na qual precisávamos de dados concretos, de pesquisa e de estudantes que aprendessem a pesquisar dentro de uma linha de trabalho com dados, cálculos estatísticos e dali extrair conclusões para o planejamento do Brasil. Foi a marca da época. É necessário entender que nesta encruzilhada, o Brasil tinha que dar um pulo de desenvolvimento em face a todo o contexto. Lembro que em anos bem mais recentes, foi numa encruzilhada que a nossa geração, em sua maioria, retirou-se da PG.
Voltando à internacionalização, ela era baseada na mobilidade unilateral. Os nossos professores eram enviados ao exterior para fazer doutorado e, também, buscávamos trazer professores doutores, tanto brasileiros como estrangeiros, alguns já trabalhando no Brasil. Na área de Administração e Planejamento contratamos até um doutor especializado em planejamento do estado. Naquele momento o mais importante para o curso era formarmos a massa crítica para a orientação de teses. Não havia tempo suficiente para esperar a formação de futuros doutores que a PUCRS havia enviado para formação no exterior.
Maria Estela, ao analisarmos a internacionalização, no século atual, constatamos um campo tensionado entre uma perspectiva global e uma perspectiva regional. No nosso caso, a América Latina, tem sido proposto uma internacionalização para a integração solidária postulada pela Unesco, através da Conferência Regional de Educação Superior, realizada em Córdoba (CRES2018). Neste entender, a busca de interrelações com a América Latina, embora frágil, é fomentada, inclusive, com políticas públicas nacionais. Mas ainda, tais relações são frágeis e a atenção ao desenvolvimento do conhecimento em relação ao hemisfério norte, ao longo dos anos, tem pautado a universidade brasileira! Mas em relação às relações sul-sul, em especial a questão da América Latina, havia também alguma perspectiva?
Havia, sim, mas não era grande, depois foi ampliada. Tivemos professores num período posterior ao que estamos tratando. Foi contratado um professor chileno e outro argentino que foram trazidos dentro dos programas de internacionalização. Era uma internacionalização embrionária que depois se desenvolveu por meio de projetos e programas. Estou falando da primeira década da pós-graduação, da década de 1970
A mobilidade se deu, especialmente, por meio de estudantes de pós-graduação, que faziam seus estudos no exterior e depois retornavam para trabalhar na educação superior. Cabe lembrar que as mudanças educacionais na América Latina, suas situações e condições foram muito bem colocadas nos vários estudos da obra de Ramas (1983).
Mas não esqueci um dado importante, dos dias de hoje, Marília. Nos últimos anos você contribuiu para programas de articulação interinstitucional, regional, assim como de articulação internacional com a América Latina.
Voltando aos primeiros anos da PG em Educação, não havia pesquisas conjuntas com estrangeiros. Eles trabalhavam mais como docentes. Até desenvolviam alguma pesquisa, em geral com alguma publicação nas nossas revistas, talvez algum livro, inclusive um publicado, na época pela PUCRS. Mas o momento era outro. É importante entender a diferença entre os livre docentes, excelentes profissionais que colaboraram conosco, e os doutores egressos de programas formais de pós-graduação com doutorado ancorado na pesquisa, cuja formação era a prevista no aparato legal. Precisávamos destes doutores, para atender a pós-graduação que estava sendo criada no Brasil e em outros países, um doutorado assentado na pesquisa científica. Isto foi um dos marcos da época, na educação e em outras áreas.
E os grupos de pesquisa e redes?
Os grupos, com alguma característica de rede, eram mais ligados ao ensino e às discussões temáticas. O primeiro grupo da PUCRS que atuou como rede de pesquisa, foi organizado na PG em Educação, área de administração da educação superior. O grupo foi estabelecido no âmbito de uma disciplina, sob nossa responsabilidade, na temática de administração da educação. Teve como modelo organizativo nossa experiência em pesquisa num programa de pós-graduação que privilegiava os dados para extrair conclusões. Quem participou dessa primeira rede foram os nosso alunos de PG, oriundos de diversas universidades. É o caso da Flávia Werle (Unisinos), da Teresa Hoffmeister (UFRGS), da Marlou Pellegrini (UFRGS), de uma professora do São Judas Tadeu, que se movimentava para oferecer curso superior, entre outras, cada qual tomando uma das diversas áreas de ação administrativas para um estudo aprofundado e de coleta de dados. Lembro que a escolha de temas convergia para processos decisórios, tema no qual uma mestranda aprofundou, e para as chamadas áreas de ações administrativas: parte física das instituições, finanças e orçamento na Educação, relações entre a instituição e a comunidade, serviços de apoio a alunos e ao currículo e ensino, entre outras. Tínhamos reuniões sistemáticas e os participantes se especializavam e coletavam dados na temática escolhida e, nelas, a maior parte dos integrantes fazia as suas teses de mestrado, trabalhando os dados coletados. A teoria administrativo organizacional era referência, até porque, naquela época, predominava uma administração e uma gestão organizacional, sistêmica e situacional.
Parece ser uma tendência da academia assentar as novas construções no que é aceito e validado pelos pares. Neste sentido, não causa estranheza que ao assumirmos uma coordenação de um dos primeiros pós-graduações em educação do Brasil tenhamos nos ancorado em autores amplamente reconhecidos por seus estudos e reflexões sobre administração da educação. É o caso de autores cujos estudos foram centrais no programa de mestrado realizado nos EUA na década de 1970 (Campbell, R. F. et al., 1969; Getzels, J. et al., 1968; Halpin, 1969). Merecedores de um verdadeiro tributo, são obras clássicas da temática que até hoje honram a nossa biblioteca particular. Eles foram as referências para desenvolvermos o primeiro projeto interinstitucional e integrado, na PUCRS, na década de 1970, com autoras como as acima citadas da UFRGS, da Unisinos e outras IES. Tal projeto e relatórios são guardados como tributos às áreas de tarefas administrativas da gestão e administração da educação.
O curso de PG em Educação oferecia três áreas de concentração: a área de Administração da Educação na linha de bases teóricas administrativas, a de aconselhamento psicopedagógico, que a dona Manuela era a pessoa de maior qualificação, e a área de Métodos e Técnicas de Ensino, para a qual a PUCRS tinha todas as condições, mas precisamos procurarmos professores qualificados no Brasil e no exterior. Inicialmente veio a doutora Lady Lina Traldi de uma universidade de São Paulo. Registramos que a expertise na área estava com a professora Délcia Enricone, que se sujeitou a ser aluna, para obter a qualificação exigida. Foi também o caso de professora Lucinda Lorenzoni, que precisava da qualificação requerida.
As defesas das teses, naqueles primeiros anos, se constituíam em eventos acadêmicos de porte, para os quais tínhamos que delimitar, estabelecendo critérios para assistir. Além de ler sobre todos os quesitos pré-estabelecidos, havia uma apresentação e uma efetiva defesa. A PUCRS se encarregava de divulgar e, diversas vezes, saíram notícias em rádios/jornais. Na área de Aconselhamento Psicopedagógico ocorreu a primeira defesa de tese de mestrado, pela mestranda Berta Weill Ferreira. A professora Delcia Enricone também foi das primeiras, num trabalho considerado como avançado e de prospectivas educacionais.
Professora Maria Estela, a minha curiosidade é grande. Essas áreas, elas se replicavam, por exemplo, na UFRGS e no país? O que levaria os cursos a escolherem áreas mais do que linhas de pesquisa? Os cursos tinham que dar preferência às áreas mais do que linhas de pesquisa?
Falamos em áreas de concentração porque, nos anos iniciais, a legislação vigente, que normatizava a PG brasileira, as colocava como fundantes na estruturação dos cursos. Era o que se discutia no momento. Reiteramos a ideia de que a pós-graduação estava sendo estruturada. A PUCRS fez um estudo das possíveis demandas, pensando nos quadros de pessoal disponíveis e qualificados que trabalhariam no mestrado e, como tal, planejaram a sua estruturação. Estes foram os critérios iniciais de escolha, o que não deixou de ser um estudo de viabilidade. Novamente a PUCRS se antecipando e ancorando em dados as suas decisões.
A discussão sobre as linhas de pesquisa ocorreu com profundidade alguns anos mais tarde. Órgão federais como a CAPES e o CNPq, lembro que promoveram consultas, discussões em todas as áreas de conhecimento, pois era uma questão que afetava a todos. Alguns cursos de áreas básicas, que já haviam sido criados havia mais tempo, tinham áreas e linhas consolidadas. Não podemos afirmar, nestes cursos, qual foi introduzida em primeiro lugar. Talvez até a linha de pesquisa. Depois ficou claro que seria o mais estratégico. Mas estamos falando do início, quando a procura de quadros era enorme, e tínhamos que lidar da melhor maneira possível. Tal qual um patamar para alcançar outro. Vejam, mais uma sabedoria da PUCRS, pois deu um passo além, pois as linhas, neste caso, decorreriam das áreas. As linhas de pesquisa foram aos poucos sendo construídas, a partir das temáticas que os professores desenvolviam pesquisas. Mas as áreas é que direcionavam a formação básica com disciplinas que compunham um núcleo comum.
Dar um passo além, nas discussões travadas na década de 1970 era, antes de mais nada, ter a perspectiva de possibilidades, discussão que somente nos anos 2020 parece tomar forma maior (Franco, S. et al., 2018). Mas o que é isto? É saber olhar para o futuro e vislumbrar possíveis caminhos, transformando o que poderia entravar e o que poderia ser feito para mudar os entraves em alternativas promissoras. É a tentativa de se ancorar muito mais em proposições, mesmo que necessário fosse construí-las. Se não poderíamos trazer um Piaget, porque não aproveitarmos a força de recém-graduados, mestres e doutores? É construção de protagonismo. Num certo sentido estas ideias se aproximam das que subjazem os escritos de Hannah Arendt nas propostas de Homens em tempos sombrios (Arendt, 1987). Lembramos que a autora publicou este livro ainda na década de 1950 e suas ideias semearam as décadas subsequentes.
Mas tem alguns pontos que preciso falar, em relação a este tema. O primeiro é o chamado período preparatório, no qual, a partir da orientação de órgãos nacionais, os alunos frequentavam um período intensivo de disciplinas ligadas às políticas nacionais de educação – lembrem que é um momento de grandes mudanças, estatística e pesquisa, assim como uma disciplina introdutória à cada Área de Concentração. Todos poderiam ter acesso a informações e discussões. Após este período, em geral no mês que antecede o início do curso, os alunos eram alvo da seleção final e os que não conseguiam, recebiam um atestado de um Curso de Atualização. Vejo nesse ponto a colaboração da PUCRS com muitas IES, inserindo-as nas grandes discussões nacionais.
Um segundo ponto, num certo sentido ligado ao primeiro, é o espaço que a PUCRS dava para a AESUFOPE na promoção de discussões e análises sobre as políticas educacionais em ebulição. Acrescenta-se aqui que professores da PG PUCRS participaram conosco da criação de um departamento de pesquisa na AESUFOPE, como a Maria Emília do Amaral Engers, a Marta Luz Sisson de Castro e outros.
A Associação de Escolas Superiores que Formam Profissionais da Educação teve a ampla colaboração da PUCRS. Era uma instituição que reunia outras instituições e, com o apoio da PUCRS, fazia os eventos acontecerem. Todo o ensino superior do RS se beneficiou com as discussões travadas sobre a implantação da reforma universitária. Alguns pré-documentos foram promulgados a partir de meados da década de 1960, mas a primeira das leis maiores que gerou repercussão, inseguranças, receios e críticas ocorreu em 1968, fixando as normas de organização e funcionamento do ensino superior, seguida da Lei de 1971, que fixa diretrizes e bases para o ensino de primeiro e segundo graus e outras providencias, mas que se reflete diretamente por meio da formação de professores. A RU começou a ser implantada, de fato, nos anos iniciais da década de 1970. Este é o momento, então, dessa reforma universitária no contexto brasileiro, com críticas e custos enormes, mas estratégica para o Brasil em mudança num outro caminho de pesquisa.
E aqui se entra no terceiro ponto que marcou aquele momento. Foram os Centros Regionais de Pesquisa e Pós-graduação. Eles foram os grandes centros já que, digamos assim, eles articulavam os responsáveis pelos cursos e programas de PG nas várias áreas de conhecimento. Quem os organizou foi um experiente pesquisador do Rio Grande do Sul, com amplo reconhecimento no seu campo de pesquisa. Organizou os Centros Regionais nas cinco regiões brasileiras. O professor Darcy Closs. Lembro que em 1972 foi organizada uma reunião de todas as coordenações de programas e cursos de PG dos três estados da Região Sul, em Florianópolis. A PUCRS enviou uma comitiva, da qual participaram as coordenações de cursos de PG da instituição. Em Porto Alegre existiam escritórios do Centro Regional, que agregava as universidades. E a PUCRS também colaborava com o Centro Regional na medida em que oferecia espaço para reuniões e contribuiu na coleta de dados para conhecer a pós-graduação e desenvolvê-la. Na ótica de hoje poderíamos dizer que a PUCRS foi além de um modelo de gestão do bem-estar social, e além de um mero gerencialismo, pois a atividade de fundo, o valor máximo era o acesso ao conhecimento. Menos um tipo ideal e muito mais um serviço público, comprometido com padrões profissionais (Gewirtz & Ball, 2011; Sousa, 2016; Soares, 2016).
Talvez possas explicar, na perspectiva dessa época, a existência de disciplinas de metodologia de pesquisa com forte aporte na análise quantitativa de dados. Os programas das áreas das humanas, incialmente, tinham uma tradição metodológica, com dados quantitativos e cálculos estatísticos. Com a evolução e expansão dos programas a metodologia predominante foi a qualitativa e a análise de grandes números passou a se constituir em desafio muito pelo desconhecimento de como dar conta dessa perspectiva. Não temos o conhecimento porque ele não estava mais nos programas. Poderias falar sobre o currículo dos programas de pós-graduação?
Bom, o currículo do PG previa para cada área de concentração disciplinas básicas, algumas das quais todos cursavam. No período preparatório, eles iniciavam as disciplinas introdutórias já mencionadas, que vinham a ser aprofundadas por meio das disciplinas bissemestrais, parte de um conjunto comum no currículo aprovado. Compreensível a ênfase nas políticas nacionais pelo momento de reformas que se vivia e pela ânsia de todos tentarem dominar o contexto em mudança, até para a sobrevivência institucional. O predomínio de professores de ensino superior fortalecia a necessidade de conhecer as políticas para implantá-las nos seus cursos. PG implica boas bibliotecas. Dentro dos inúmeros projetos próprios do movimento de consolidação, conseguimos recursos para a aquisição de livros, além do espaço físico e das obras que a instituição disponibilizava, abrangendo temáticas específicas das áreas de concentração, mas também de metodologias e estatística.
É inegável a força das disciplinas de metodologia da pesquisa e de estatística – descritiva e inferencial, na época. Retomamos pontos aqui já falados, mas em duas perspectivas diferentes: o preparo para pesquisas assentadas em análise de dados, visando teses com abordagens metodológicas semelhantes as predominantes em países do hemisfério norte e, também, em dados estatísticos que pudessem contribuir para o planejamento educacional e desenvolvimento da pós-graduação.
Quanto ao conjunto disciplinar, além das disciplinas de metodologia da pesquisa e de estatística, havia as teóricas e outras de caráter metodológico próprios de cada área de concentração, como a metodologia do ensino, assim como havia as introdutórias e as disciplinas básicas de cada área. Tivemos colaboração de excelentes professores de estatística da própria PUCRS, que marcaram presença na rede antes mencionada. Tivemos disciplinas de metodologia e de estatística em diversos momentos. Diversos semestres na nossa graduação, depois na PG, o que mostra a PUCRS atenta com a formação e a decisão ancorada em dados, quase com força de um dos princípios básicos. Num dado momento, as disciplinas técnicas mudaram de obrigatoriedade e foram renovadas e/ou substituídas. Algumas passaram para a categoria de optativas e de eletivas.
Cabe uma reflexão. A verdade é que a técnica, do período, ficava oscilando em seu uso, entre o tecnicismo, a tendência de exclusão e o uso adequado. Nos cursos de PG, e aqui falando em Educação, as mudanças curriculares e as diretivas de programas, suas disciplinas, o caráter de obrigatórias, optativas, eletivas, os quesitos para a certificação, acompanham o avanço do conhecimento, mas como decisões políticas, seguem, também a tendência dos grupos que estão no poder, dos interlocutores que compõem os colegiados decisórios, no plano nacional, em cada instituição e nos próprios cursos. Tal colocação tangencia o capitalismo acadêmico (Slaughter & Roades, 2004).
Nos últimos anos, o desenvolvimento da comunicação e a força das tecnologias digitais aliadas à complexidade de fatores que interagem no contexto, tornam inequívoca a importância estratégica de decisões técnicas na análise das decisões políticas.
Para finalizar, e já agradecendo a tua generosidade em nos ajudar a compreender os primórdios não só do Programa de Pós-graduação da PUCRS, mas da pós-graduação no Brasil, Maria Estela, com um olhar de hoje, com a tua larga trajetória de muitos êxitos, marcada pela pesquisa e por uma significativa produção, conectada no internacional, e olhando para o contexto de 1972-1977, o que poderias nos dizer?
Digamos que a PUC foi inovadora e proativa, até porque ela se antecipou ao seu tempo, mesmo no que diz respeito às políticas públicas, buscando influenciá-las por meio de eventos com temáticas para discussão. Uma das vias foi a AESUFOPE, mas outra, de abrangência mais ampla, foi o dinamismo estratégico em participar de espaços, esferas, níveis que influenciavam as políticas, tais como associações – caso do Conselho de Reitores (CRUB) entre outros. E isto, numa época em que o Brasil ainda não havia amadurecido para a pesquisa, para as articulações internacionais na construção do conhecimento, várias instituições trabalhando conjuntamente e em pesquisa. Numa época em que lutávamos até para ligações internacionais – e que avanço quando chegou o fax. O avanço das comunicações impulsionou ainda mais a instituição. Não poupava esforços para facilitar contatos. Foi inovadora quando estimulou o domínio de língua estrangeira, especialmente do inglês. Foi inovadora ao participar das discussões sobre as grandes leis do ensino. Foi inovadora ao congregar e colaborar com outras IES.
Tinha apoio governamental, pela competência, não pelo favoritismo, mas no reconhecimento, pois ela sabia forjar o seu caminho. É destacável o acolhimento das opiniões de alunos e professores da PG, estimulando participações colegiadas. E isto foi num momento bastante pesado no Brasil e da política então prevalente. A PUCRS acolhia pensadores de várias áreas. O acolhimento, a busca estratégica de decisões assentadas em dados, a construção da internacionalização, os ambientes que promoviam associações e interações interinstitucionais mostra que a PUCRS queria a inovação, sim, mas ela queria especialmente os pensadores e a participação democrática. E, com isso, encerramos este momento de lembranças.