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Educação

Print version ISSN 0101-465XOn-line version ISSN 1981-2582

Educação. Porto Alegre vol.46 no.1 Porto Alegre Jan./Dec 2023  Epub Nov 10, 2023

https://doi.org/10.15448/1981-2582.2023.1.44772 

Outros Temas

PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO: TENDÊNCIAS DAS PESQUISAS NA ANPED NORDESTE (2016/2022)

EDUCATIONAL PSYCHOLOGY: RESEARCH TRENDS IN ANPED NORTHEAST (2016/2022)

PSICOLOGÍA DE LA EDUCACIÓN: TENDENCIAS DE LAS INVESTIGACIONES EN ANPED NORDESTE (2016/2022)

Eliana de Sousa Alencar Marques1 

Mestre e doutora em Educação pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). É professora do Programa de Pós-graduação em Educação da UFPI, com atuação na linha de pesquisa Formação humana e processos educativos. É professora associada do curso de Pedagogia da UFPI. Pesquisadora do Núcleo de Estudos e pesquisas histórico críticas em educação e formação humana (NEPSH).


http://orcid.org/0000-0002-4990-4487

Maria Vilani Cosme de Carvalho1 

Mestre, doutora e pós-doutora em Educação, com área de concentração em Psicologia da Educação, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). É professora-pesquisadora da Universidade Federal do Piauí (UFPI), atuando na área da Educação. Líder do grupo de pesquisa NEPSH (Núcleo de Estudos e Pesquisa Histórico-Críticas em Educação e Formação Humana).


http://orcid.org/0000-0002-1675-1808

Júlio Ribeiro Soares2 

Doutor em Educação (Psicologia da Educação) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (FE/UERN). Atuando na graduação e na pós-graduação, desenvolve atividades de ensino, pesquisa e extensão com enfoque em temáticas relacionadas a formação docente, processo de escolarização e prática pedagógica.


http://orcid.org/0000-0002-3288-7756

Giovana Maria Belém Falcão3 

Doutora em Educação (UECE). Mestre em Educação Brasileira (UFC). Graduada em Psicologia (UFC). Professora Adjunta da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UECE). Coordena projeto de extensão, grupo de estudo e iniciação científica voltados para formação de professores numa perspectiva inclusiva. Áreas de interesse: Formação de professores, Identidade docente, Educação Especial Inclusiva.


http://orcid.org/0000-0003-0995-1614

1Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI, Brasil.

2Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Mossoró, RN, Brasil.

3Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.


Resumo:

Este artigo tem como objetivo analisar as tendências da produção intelectual do GT 20 – Psicologia da Educação da ANPEd Nordeste dos trabalhos apresentados e publicados em anais do evento nas edições de 2016, 2018, 2020 e 2022. A metodologia empregada tomou por base os resumos e os textos completos publicado nos anais de cada reunião, destacando neles o objetivo, a fundamentação teórica e os procedimentos metodológicos empregados nas pesquisas com o olhar atento para o tema em discussão e a contribuição na explicação de aspectos psicológicos envolvidos nos diferentes processos educacionais que foram investigados. Os resultados foram organizados em torno das categorias identificadas como tendências teórico-metodológicas e contribuições para o campo da pesquisa em educação. As análises empreendidas evidenciam como resultado que a psicologia da educação se consolida como campo de investigação caracterizado pela profunda diversidade teórica e metodológica, viabilizando a integração de muitos olhares sobre os processos educativos e as mediações que impactam na formação e desenvolvimento humano, seja na escola, seja em outros espaços de relações sociais.

Palavras-chave: Psicologia da Educação; pesquisa em educação; produção de conhecimento

Abstract:

This article aims to analyze the trends in intellectual production of GT 20 – Educational Psychology of ANPEd Northeast, focusing on the works that have been presented and published in the event proceedings of the 2016, 2018, 2020, and 2022 editions. The methodology employed was based on the abstracts and full texts published in the Proceedings of each meeting, highlighting the objectives, theoretical foundations, and methodological procedures employed in the research, with a keen focus on the topic under discussion and the contribution to the explanation of psychological aspects involved in the different educational processes that were investigated. The results were organized around the categories identified as theoretical-methodological trends and contributions to the field of education research. The conducted analyses show that educational Psychology consolidates itself as a field of investigation characterized by deep theoretical and methodological diversity, enabling the integration of multiple perspectives on educational processes and the mediations that impact the formation and development human, whether in school or in other spaces of social relations.

Keywords: Educational Psychology; education research; knowledge production

Resumen:

Este artículo tiene como objetivo analizar las tendencias en la producción intelectual del GT 20 – Psicología de la Educación de la Anped Nordeste, cuyos trabajos han sido presentados y publicados en los anales del evento en las ediciones de 2016, 2018, 2020 y 2022. La metodología empleada se basó en los resúmenes y textos completos publicados en los Anales de cada encuentro, destacándose en ellos el objetivo, la fundamentación teórica y los procedimientos metodológicos utilizados en las investigaciones con atención al tema en discusión y el aporte en la explicación de aspectos psicológicos involucrados en los diferentes procesos educacionales que fueron investigados. Los resultados se organizaron en torno a categorías identificadas como tendencias teórico-metodológicas y aportes al campo de la investigación en educación. Los análisis realizados muestran, como resultado, que la Psicología de la Educación se consolida como un campo de investigación caracterizado por una profunda diversidad teórica y metodológica, posibilitando la integración de múltiples perspectivas sobre los procesos educativos y las mediaciones que inciden en la formación y desarrollo humano, ya sea en la escuela, o en otros espacios de relaciones sociales.

Palabras-clave: Psicología de la Educación; investigación en educación; producción de conocimiento

Introdução

Produzir e difundir conhecimento favorável à expansão da área de conhecimento psicologia da educação têm sido uma das missões a que se propõe o Grupo de Trabalho (GT) 20 da ANPEd desde a sua criação em 1999. Por intermédio desse GT, tem sido possível agregar pesquisadores vinculados à programas de pós-graduação no Brasil, de diferentes regiões e núcleos de pesquisa, que estudam a psicologia como campo teórico e metodológico capaz de explicar as relações entre educação, desenvolvimento e aprendizagem humana, em suas mais diversas interfaces, como previsto na descrição do GT na página da ANPEd:

Nessa perspectiva, quase vinte anos de atuação, o GT de Psicologia da Educação tem privilegiado estudos e pesquisas que enfoquem a relação entre essas duas áreas, com ênfase nos fundamentos históricos, epistemológicos e metodológicos da pesquisa educacional; nas concepções psicológicas e práticas no campo da educação e suas contribuições nos espaços educativos; nos processos educativos e de socialização implicados na constituição do sujeito.4

Isso tem se confirmado ao considerarmos que, ao longo da sua história, o GT 20 tem se consolidado como espaço de produção de conhecimento, sobretudo dos fenômenos contemporâneos que impactam a relação entre a aprendizagem e desenvolvimento dos seres humanos na relação com os processos educativos, o que serve para confirmar que a psicologia da educação tem possibilidades de contribuições imensas e cada vez mais expressivas se levarmos em conta a diversidade de abordagens por meio das quais pesquisas são desenvolvidas e teorizações são propostas (Carvalho & Bataglia, 2012).

É nesse cenário de profunda diversidade teórica e metodológica que as pesquisas na área da psicologia da educação do GT 20 têm se configurado, viabilizando a integração de muitos olhares sobre os processos educativos e as mediações que impactam na formação humana, confirmando que “a Psicologia da Educação é um desses campos científicos em que a divergência teórica e metodológica é a sina da sua existência e história, pois ela tem como objetivo, justamente, explicar a complexidade da ação humana” (Carvalho & Bataglia, 2012, p. 15).

Para dar visibilidade a estas contribuições, este artigo objetiva analisar as tendências da produção intelectual do GT 20 – Psicologia da Educação da ANPEd Nordeste dos trabalhos apresentados e publicados nos anais das edições de 2016, 2018, 2020 e 2022 do evento.

Este artigo está organizado em cinco seções. Além desta introdução, apresentamos breve considerações sobre a área psicologia da educação na segunda seção; na terceira, explicitamos a metodologia adotada na análise dos trabalhados que constam nos anais publicados e relativos às quatro edições anunciadas. Na quarta seção, discutimos as tendências investigativas presentes nos respectivos trabalhos; e, para finalizar, na quinta seção, tecemos considerações acerca da relevância da área psicologia da educação para a expansão do arcabouço teórico e metodológico necessário à consolidação da pesquisa educacional em nosso país.

Considerações sobre a área psicologia da educação

Para analisar as tendências da produção científica sobre as questões educacionais que têm por fundamentação teórica predominante as abordagens da psicologia, revisitamos a literatura sobre as relações entre psicologia e educação, bem como sobre a singularidade da área de conhecimento denominada psicologia da educação.

Carvalho (2002) e Gatti (1997, 2006), ao analisarem as relações entre psicologia e educação, explicam que estas duas áreas de conhecimento e seus campos de práticas sociais têm mantido relações tensas e marcadas por aproximações e afastamentos. Carvalho (2002) deixa claro que, historicamente, a psicologia tem direcionado as teorias e práticas educativas, seja por meio das ideias psicológicas do seu período filosófico, seja pelas teorias psicológicas do período científico. No entanto, a despeito do psicologismo que predominou a partir da década de 1970 até os anos de 1990, a psicologia passou a ser considerada um dos fundamentos da educação e configurou o que tem sido denominado psicologia da educação.

Conforme Gatti (2006), essa área de conhecimento se caracteriza pela heterogeneidade e instabilidade, pois as teorias que a compõem são diversas, bem como as contribuições na explicação dos processos educativos, em especial da subjetividade dos alunos e da sua aprendizagem. Ao explicar essa heterogeneidade e instabilidade que caracteriza essa área de conhecimento, a autora analisa as vertentes de estudos que a compõem e esclarece:

A Psicologia da Educação constitui vasto campo de conhecimento, não homogêneo, mas instável, como qualquer campo científico, com contribuições diferenciadas em teorias e contribuições díspares. É espaço de conhecimento que tem um objeto – o ser humano em desenvolvimento, em uma perspectiva característica, cujo eixo são as subjetividades em construção, em e para uma dada cultura, a partir das ações intencionais de outras subjetividades. É espaço que é também constituído pela interlocução com muitos outros campos, como a linguística, a sociologia, a antropologia, a história, a biologia, a neurologia, etc. Vários tipos de teorizações convivem nesse campo, em suas variadas temáticas, desde os diferentes cognitivismos, comportamentalismos, experimentalismos, culturalismos, até as psicanálises, neuropsicologias, fenomenologias do ser, psicopedagogias etc. (Gatti, 2006, p. 65).

Em suma, os estudiosos da psicologia da educação, como Coll, Palacios e Marchesi (1996), deixam claro que esta área de conhecimento é ampla e, no diálogo com outras áreas, tem sido formada pelas teorias psicológicas, educacionais e pedagógicas, em especial as “tradicionais” teorias que explicam os processos de desenvolvimento e/ou aprendizagem humana. Isso porque são esses processos que estão na base das práticas educativas e que têm criado as condições de explicação do processo de formação e transformação do indivíduo no contexto educacional.

Metodologia

Para compreender os nexos que compõem as tendências teóricas e metodológicas dos trabalhos apresentados no GT 20 – Psicologia da Educação, bem como destacar as principais contribuições ao campo de estudo, procedemos a análise dos trabalhos apresentados nas reuniões do Encontro de Pesquisa Educacional do Nordeste (EPEN) referentes aos anos de 2016, 2018, 2020 e 2022.

Na análise, tomamos por base os resumos e os textos completos publicado nos anais de cada reunião, destacando neles o objetivo, a fundamentação teórica e os procedimentos metodológicos empregados, com o olhar atento para o tema em discussão e a contribuição na explicação de aspectos psicológicos envolvidos nos diferentes processos educacionais que foram investigados.

Considerando que cada reunião científica foi organizada, planejada e realizada por diferentes grupos de pesquisadores da região Nordeste, cada evento teve suas particularidades, de modo que, embora não tenha sido possível identificar as mesmas categorias em todos os trabalhos, fizemos um esforço em organizar o texto da seção seguinte nas mesmas categorias.

Psicologia da educação do EPEN: tendências teórico-metodológicas e contribuições para o campo de pesquisa

Para darmos conta do objetivo proposto, isto é, analisar as tendências investigativas presentes nos trabalhos, discutimos os resultados encontrados levando em conta o processo analítico que sistematizou tendências teórico-metodológicas e tendências relativas às contribuições para o avanço do conhecimento na área psicologia da educação.

Analisando as tendências investigativas nos trabalhos do EPEN 2016

Considerando as especificidades da psicologia da educação, isto é, que a heterogeneidade e a instabilidade são aspectos que têm formado e transformado sua identidade ao longo das décadas de sua existência, analisamos os 15 trabalhos, objetivando apreender as tendências teóricas e metodológicas, bem como os processos educativos contemplados e as contribuições para a evolução dessa área de conhecimento.

Tendências teórico-metodológicas

Na categoria tendências teórico-metodológicas, aglutinamos os trabalhos em duas subcategorias, as tendências teóricas e as tendências metodológicas, a despeito de ambas estarem relacionadas.

Os trabalhos que compõem a subcategoria tendências teóricas estão organizados em dois grupos: aqueles baseados nas teorias que tradicionalmente constituíram a área psicologia da educação para investigar processos educacionais; e aqueles com respaldo na filosofia, na sociologia, dentre outras áreas de conhecimento que, historicamente, têm mantido interlocução com a psicologia da educação.

No primeiro grupo, aglutinamos os nove trabalhos que são fundamentados nas teorias que compuseram a área psicologia da educação para investigar processos educacionais, sendo dois deles de natureza teórica e sete empírica. Dos nove trabalhos, a tendência teórica que predomina é a psicologia sócio-histórica5 de Vigotski e Leontiev, a exceção é de apenas um trabalho, em que é utilizada a psicogenética de Wallon para discutir as emoções negativas de docentes.

Nos trabalhos que estão fundamentados na psicologia sócio-histórica, a argumentação é que esse aporte teórico-metodológico, ao explicar o processo histórico-social de constituição do humano, em especial dos educandos e educadores, dá condições ao pesquisador de investigar as múltiplas determinações dos processos educativos que estão sendo investigados. Como a psicologia sócio-histórica tem sua base epistemológica no Materialismo Histórico-Dialético, esses trabalhos, alguns com mais ênfase e outros com menos, recorrem aos seus princípios, leis e categorias para estudar histórico e socialmente os processos educativos, o que significa levar em conta o movimento dialético que os constituem. Dentre esses trabalhos, em três é utilizada também a concepção psicossocial de identidade de Ciampa para explicar que a identidade é o processo que se forma na história individual e social e, assim, é metamorfose que tende à emancipação humana. Em síntese, os autores que se apoiam nesses aportes teóricos argumentam que eles subsidiam reflexão crítica para a área psicologia da educação.

No trabalho baseado na psicogênese da pessoa completa de Wallon, justifica-se essa escolha porque essa teoria, ao explicar a afetividade que está na base do desenvolvimento da pessoa, orienta compreensão sobre as emoções negativas que são produzidas em contextos educacionais.

Os trabalhos em que os autores recorrem a outras áreas de conhecimento que, historicamente, mantém interlocução com a psicologia são cinco, sendo dois de natureza teórica e três empírica. Nos cinco trabalhos, as tendências teóricas utilizada são a Teoria das Representações Sociais de Moscovici, em dois deles; a pedagogia institucional, em um; a Teoria do Reconhecimento Social de Honnet, em outro; e várias perspectivas filosóficas para discutir alteridade em apenas um trabalho. Na argumentação que os autores fazem para justificar a opção pela Teoria das Representações Sociais está o fato dela se tratar de um conjunto organizado de conhecimentos sobre crenças, opiniões e atitudes que orientam as condutas e as práticas das pessoas. Já o autor que se baseou na pedagogia institucional explica que esse referencial teórico-pedagógico é marcado pelas dimensões do psíquico e do social, dando condições ao pesquisador de reconhecer, valorizar o que há de subjetivo nas relações interpessoais. A opção pela Teoria do Reconhecimento Social de Honnet está justificada na explicação que o processo de tomada de consciência de si ocorre com base no outro. No último trabalho desta subcategoria, ao se propor discutir a atualidade da categoria alteridade, o autor faz uma revisão das explicações da fenomenologia, do marxismo, da psicanálise, da teoria crítica, dentre outros campos do conhecimento.

Os trabalhos da subcategoria tendências metodológicas também estão organizados em três grupos: produtos de pesquisa empírica, de revisão teórica e relatos de experiência.

As propostas metodológicas que constam nos dez trabalhos que desenvolveram pesquisa empírica são da abordagem qualitativa e, em todos, a opção está justificada na compreensão de que essa abordagem, ao dar voz aos participantes da pesquisa, tem melhores condições de apreender os processos educativos na sua complexidade, por exemplo: emoções, ser professor, formação docente, trabalho docente, identidade docente, conflitos, resiliência, processos grupais, educação alimentar e nutricional, dentre outros processos educativos. Das dez pesquisas que se autodenominam qualitativas, cinco fazem referência ao tipo ou à modalidade que desenvolveram, a saber: pesquisa participante, pesquisa-intervenção, pesquisa autobiográfica, pesquisa narrativa e pesquisa crítica de colaboração.

Todas as pesquisas foram desenvolvidas no contexto escolar, contando com a participação de professores em oito delas e de alunos em duas. Outros aspectos da metodologia que convêm ser destacados por indicar tendências no GT 20 – Psicologia da Educação são os instrumentos de produção de dados e os procedimentos analíticos. A entrevista foi escolhida por oito trabalhos, sendo a semiestruturada a técnica empregada em quatro, a reflexiva em duas e a narrativa em duas. Tem ainda um trabalho que empregou oficinas e outro o teste sociométrico. Quanto ao procedimento de análise dos dados, a tendência que predomina é a proposta dos Núcleos de Significação de Aguiar e Ozella, empregada em cinco trabalhos. Já a Análise de Conteúdo da Bardin é usada em um; Análise Textual de Minayo, em um; e Análise Lexical Contextual em um. Os outros dois trabalhos não informaram o procedimento empregado.

Contribuições para o campo de pesquisa

A segunda categoria revela as tendências relativas aos processos educativos investigados, bem como as contribuições para a psicologia da educação. Nos 14 trabalhos, o foco da discussão, em cada um deles, é um dado processo educativo que está envolvido na constituição de professores ou de alunos no contexto escolar.

Em um dos trabalhos, que é produto de revisão teórica, a autora desenvolve discussão sobre os processos de apropriação e de objetivação na constituição do ser humano, em especial daqueles que vivenciam processo educativo na escola. No outro trabalho, produto de revisão teórica sobre a categoria alteridade, a autora argumenta que, embora exista ausência de produções sobre esse tema na área pedagógica, a educação implica a alteridade e, por isso, pode explicar o processo de construção de alteridades e identidades na escola, que é o lócus privilegiado de formação humana.

Os dois trabalhos, que são relatos de experiência, abordam temas relacionados diretamente à educação escolar. Em um deles, o relato é de uma experiência de prevenção e superação de violência escolar por meio da análise do currículo oculto. A despeito de não recorrer a nenhuma abordagem da psicologia, o relato das experiências educativas vividas por estudantes tem por fundamentação a pedagogia institucional e produz conhecimento sobre atitudes e valores que os alunos aprenderam no cotidiano da escola. O outro trabalho relata a experiência de um grupo de pesquisa desenvolvendo investigações sobre a dimensão subjetiva da realidade educacional. A contribuição que este relato traz para a psicologia da educação está na explicação que as autoras dão ao potencial das pesquisas histórico-dialética na apreensão dos múltiplos determinantes da realidade investigada. Para elas, esse potencial está no planejamento rigoroso das ações em campo e no compromisso com a reflexão crítica.

Os trabalhos que tomaram o ser professor como tema de estudo investigaram emoções, identidade, formação acadêmica, trabalho e profissão docente, dentre outros processos educativos, os quais, analisados à luz do conhecimento da psicologia da educação e de outras áreas de conhecimento, trouxeram contribuições relevantes para as práticas educativas, na medida em que foram explicando mediações envolvidas na constituição do ser professor.

Nos trabalhos em que os pesquisadores elegeram a identidade docente como tema, a formação acadêmica, em especial a docente, bem como as experiências no trabalho docente foram escolhidas como processos identitários que explicam o ser professor, isto é, os modos de pensar, de sentir e de agir sendo profissional do ensino. Sobre esse aspecto, vale destacar também a importância das pesquisas que analisaram: elementos da profissão docente que demarcam características dos professores em início de carreira; a promoção da resiliência como via de reconhecimento na formação docente; as significações produzidas sobre o trabalho docente mediado pelas Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) revelando a necessidade de o professor entender a tecnologia como saber fazer que orienta a realização da atividade humana por meio do conhecimento científico. Há também a pesquisa que, ao discutir as significações sobre o ensino da educação alimentar e nutricional, revelou que a escola, apesar de seguir a ideologia dominante, precisa lutar contra a divulgação e o incentivo pela mídia para a ingestão de alimentos ultra processados, sobretudo, na merenda escolar.

Colocando em destaque a formação dos alunos, tem a pesquisa-intervenção, que analisou processos grupais no campo educacional por meio do teste sociométrico, o qual promoveu mudanças na rede de relações na medida em que criou situações de convivência, em que a junção dos alunos passou da condição de agrupamento (reunião de pessoas com objetivos distintos) para grupo (conjunto de pessoas reunidas em prol do mesmo objetivo).

Analisando as tendências investigativas nos trabalhos do EPEN 2018

No EPEN de 2018, o GT 20 aprovou dez trabalhos para apresentação e publicação. Em relação à primeira categoria, identificamos pesquisas de natureza bibliográfica, documental e empíricas assentadas na teoria das representações sociais, na teoria do desenvolvimento moral de Jean Piaget, na psicanálise de Lacan e na psicologia histórico-cultural. Foram identificadas ainda pesquisas sem uma base teórica definida, caracterizando-se como revisões de literatura.

Quanto às contribuições ao campo de pesquisa, pudemos identificar que estas são diversas, incluindo as referentes às relações entre ensino e aprendizagem, práticas de enfrentamento ao bullying, educação e saúde mental, violência escolar, práticas pedagógicas e gestão de conflitos, educação inclusiva, resiliência, trabalho docente e desenvolvimento moral. A seguir, detalharemos as categorias analisadas.

Tendências teórico-metodológicas

Das dez pesquisas analisadas, uma se apoia na teoria das representações sociais; duas na teoria do desenvolvimento moral de Jean Piaget; uma se fundamenta na psicanálise de Lacan; uma se orienta pela psicologia histórico-cultural e cinco são revisões de literatura. Em relação à metodologia, das pesquisas socializadas no GT, uma é do tipo estudo bibliográfico; uma é estudo documental; e seis são estudos empíricos.

No estudo que se apoia na teoria das representações sociais, é investigada a saliência das representações sociais de escola pública construídas por estudantes universitários em cursos da área da saúde. A pesquisa busca evidenciar que as representações sociais são conhecimentos elaborados e compartilhados socialmente que se refletem nos discursos e práticas dos grupos, no modo como interpretam e explicam a realidade.

A teoria do desenvolvimento moral de Jean Piaget fundamenta a pesquisa acerca das práticas de bullying e conflitos de estudantes existentes na escola com foco na análise da relação entre níveis de desenvolvimento moral e (des)engajamento moral docente. De acordo com essa teoria, o desengajamento moral de docentes diante das práticas de bullying e dos conflitos entre discentes colabora com a negligência de oportunidades privilegiadas de desenvolvimento moral dos estudantes.

A psicanálise de Lacan serviu de fundamentação para investigar práticas de inclusão de bebês autistas. Com base nessa teoria, a pesquisa orienta a compreensão de que, mesmo reconhecendo que o professor jamais poderá ocupar o lugar da mãe, este poderá operacionalizar o seu ato educativo de modo a construir um laço que possa permitir com que o bebê em risco de autismo tenha um outro destino na trama da linguagem, advindo como sujeito singular no encontro com os pares.

A psicologia histórico-cultural também aparece como aporte teórico para analisar as relações subjetivas do adolescente na escola. Com base nesse aporte teórico, a pesquisa orienta a análise da adolescência como fenômeno histórico e cultural, destacando que sua observação requer um olhar cuidadoso para a relação dos adolescentes com as pessoas e as instituições que fazem parte da sua vida. Tais relacionamentos contribuem para a construção da subjetividade desses sujeitos.

As demais pesquisas apresentadas no GT 20 se enquadram em revisões de literatura, uma vez que analisam suas problemáticas a partir de autores diversos, mas sem se apoiarem em uma base epistemológica definida.

Contribuições ao campo de pesquisa

As pesquisas do tipo bibliográfico e documental apresentam contribuições à medida em que articulam ideias em torno das relações entre ensino e aprendizagem, motivação discente e o enfretamento aos casos de disciplina e indisciplina na escola. As duas pesquisas sintetizam estudos que versam acerca das estratégias de ensino utilizadas pelos docentes na educação superior e também na educação básica, tratando de evidenciar os impactos na motivação na aprendizagem dos discentes.

As demais pesquisas se constituem de estudos empíricos que partem de problemáticas diversas e pertinentes às práticas pedagógicas, às relações interpessoais, ao desenvolvimento humano, ao trabalho e à atuação docente.

Uma das pesquisas empíricas envolveu 70 estudantes de graduação das áreas de saúde e biociências da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), egressos exclusivamente de escolas públicas estaduais e propedêuticas. Na análise de dados, foi possível identificar que as palavras mais destacadas pelos estudantes são “ensino”, “qualidade”, “professor”, “vestibular”, “preparados”, “cotas”, “contribuiu”, sinalizando que as representações sociais de escola pública dos participantes estão centradas em possibilidades e limitações. As precárias condições de ensino e o descaso do poder público para com a educação são os maiores limites da escolarização. A saliência dessas representações está marcada pelos elementos: qualidade, fragilidade do ensino, persistência e mérito individual dos estudantes. Tais componentes simbólicos estão aliados ao papel do professor como alguém que incentiva e marca a trajetória dos alunos.

Outra contribuição veio da pesquisa empírica centrada no fenômeno do bullying que muitos estudantes vivenciam na escola. Nesta, a contribuição está para o campo de enfrentamento junto a essa problemática, que provoca adoecimento psicológico e mental nos estudantes. A pesquisa chama atenção para a importância da atuação docente diante das práticas de bullying.

A saúde mental de jovens e adultos em tratamento psicossocial nas unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) também foi objeto de pesquisa com o intuito de compreender os efeitos de vivências lúdicas no desenvolvimento pessoal e social de 33 usuários, jovens e adultos, em psicoterapia. Por meio de uma metodologia baseada em partilhas, leituras de textos, vivências lúdicas que possibilitaram aos participantes a construção de habilidades criativas para a convivência com eles próprios e com os outros, foi possível concluir que a ludicidade auxiliou na diminuição dos episódios depressivos e transtornos de adaptação, conhecimento essencial ao campo de da educação, saúde mental e práticas pedagógicas.

O fenômeno da violência escolar também se constituiu em campo de interesse dos pesquisadores do GT 20 nesta edição do EPEN. Partindo das visões de docentes acerca das causas da violência escolar, o estudo trouxe contribuições para o entendimento de como se produz e se potencializa discurso acerca desse fenômeno. A pesquisa elucida que a percepção docente responsabiliza apenas a família e a sociedade sobre a origem do problema da violência. Ou seja, reduzem a probabilidade de planejarem atividades pedagógicas que contemplem a prevenção e a superação desse fenômeno na sala de aula. Ao visualizarem as causas desses conflitos como externas à escola, tal concepção dificulta o reconhecimento de si como sujeito de intervenção e de mudança imbricado nesse contexto educacional, que pode começar na família, mas, sem dúvida, alcança cada vez mais a escola.

O estudo envolvendo a postura de docentes diante dos conflitos de discentes também se constituiu em fenômeno a ser investigado por pesquisadores desse GT 20. A pesquisa contribuiu com a produção de conhecimento que explica que o desengajamento moral de professores acontece com frequência como minimização, ignorância ou distorção das consequências. Tais práticas não colaboram com o desenvolvimento moral dos estudantes, posto que a autonomia não é natural nem primária, carecendo ser desenvolvida – o que, no âmbito da escola, implica em práticas cooperativas.

A educação inclusiva também figura como temática de investigação no GT 20 na edição de 2018. Discutindo o autismo de bebês, a pesquisa oferece elementos teóricos e metodológicos que contribuem com a discussão acerca do estilo enquanto modo singular do sujeito ocupar um lugar e uma posição no encontro com o outro. Apoiada na rubrica de Lacan, destaca a implicação que leva o sujeito (professor) a colocar algo de si em sua produção e da formação inicial que trabalha em seu cotidiano com bebês em risco de autismo nos espaços das creches.

A última pesquisa analisada no GT 20 do XXIV EPEN, de 2018, envolve a temática do trabalho e da atuação dos docentes e apresenta elementos que ajudam a entender manifestações de resiliência na prática pedagógica de professores e professoras. Os resultados contribuem para a identificação das condições em que eles e elas conseguem superar limites, romper preconceitos e conviver com os infortúnios da profissão. Essas manifestações de resiliência favorecem a humanização dos sujeitos no contexto escolar.

Analisando as tendências investigativas nos trabalhos do EPEN 2020

O EPEN de 2020 aconteceu de modo remoto, pois, em março de 2020, o mundo foi surpreendido pela pandemia da covid-19, que exigiu, dentre outras medidas, o isolamento social e levou escolas e universidades a aderirem ao ensino remoto emergencial como alternativa para continuar as atividades educacionais.

A pandemia evidenciou, em contornos mais nítidos, as desigualdades sociais e levou à morte mais de 700 mil pessoas no Brasil, situação que expressou a política nefasta de um governo omisso e irresponsável, que se elegeu graças a um golpe parlamentar/midiático. Conforme Saviani e Galvão (2021), o governo Bolsonaro pode ser considerado como genocida, pois ignorou a gravidade da covid-19, desrespeitou as normas sanitárias e incentivou o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes. Nesse contexto extremamente adverso, o XXV EPEN aprovou 11trabalhos no GT 20.

Tendências teórico-metodológicas

Em relação às tendências teóricas adotadas nos 11 trabalhos analisados do GT 20, a psicologia histórico-cultural aparece como abordagem predominante em seis; seguida da Teoria das Representações Sociais, em três; psicanálise, em um; e, por último, um dos estudos faz menção a diversos autores, porém não aponta uma referência teórica específica. O dado confirma aspecto observado no trabalho encomendado do EPEN de 2020, que, ao analisar a referência teórica dos 60 trabalhos inventariados, constata que 26 deles se apoiavam na psicologia histórico-cultural, reafirmando a importância da abordagem para a compreensão dos fenômenos educacionais.

A clareza teórica dos trabalhos examinados é aspecto que merece destaque, considerando que a pulverização no aporte teórico, expresso na mesclagem de autores, tem predominado nas pesquisas em educação, tornando-se uma preocupação, tendo em vista que revela fragilidade epistemológica na produção do conhecimento, como indicam Silva, Nóbrega-Therrien e Farias (2014).

Os trabalhos inventariados expressam predomínio de estudos que se ancoram numa perspectiva qualitativa, sendo que apenas um estudo se identifica como quantitativo. Dentre os trabalhos analisados, seis deles têm natureza bibliográfica ou teórica e cinco são identificados como estudo empírico.

Contribuições para o campo da pesquisa

As pesquisas expressam contribuições para os campos da formação e da atuação docente; para a compreensão de processos psicológicos da aprendizagem, além de conferirem visibilidade a estudos que trazem as vozes de estudantes.

Em relação à formação de professores e à atuação docente, o primeiro estudo ressalta que a psicologia histórico-cultural possibilita a produção de condições objetivas e subjetivas para o desenvolvimento de uma pesquisa formação, favorecendo o desenvolvimento dos participantes. O segundo texto analisado ressalta que a Teoria da Atividade de Rubinstein pode contribuir para compreensão da atuação do pedagogo e de seus desafios e defende a necessidade de maior investimento em formação para esse profissional.

As reflexões sobre a atuação docente são apresentadas no estudo que buscou conhecer as representações dos docentes sobre a expressão “professor universitário”. Nessa mesma perspectiva, outra investigação objetivou analisar as possibilidades reais e abstratas na relação família e escola para mediação de práticas educativas potentes para formação humana.

O último escrito que aborda sobre formação e atuação docente teve por objetivo identificar fundamentos de práticas educativas na direção da emancipação humana. O estudo conclui que associar a prática social escolar às práticas sociais mais amplas permite enriquecer a formação humana.

Os estudos analisados expressam a natureza complexa que envolve a formação e a atuação docente. Pensar no trabalho docente, portanto, exige entendê-lo em sua dimensão ontológica como atividade intencional e dirigida por objetivos ao mesmo tempo em que é preciso compreender que o professor apresenta características próprias relativas à sua atividade docente em articulação com suas características pessoais. Nessa perspectiva, a formação docente deve ensejar oportunidades de análises e reflexões críticas e a apropriação de conhecimentos técnico-científicos, entendendo o professor como aprendente, situado em contexto histórico e cultural que produz sentidos em relação ao trabalho e à formação docente, como asseveram Santos e Falcão (2020).

A contribuição ao campo que envolve processos psicológicos da aprendizagem veio da pesquisa que teve como objetivo o estudo exploratório sobre a utilização de estratégias de aprendizagem e a autorregulação por estudantes universitários matriculados nas disciplinas de Cálculo. Os autores afirmam que parece haver uma cultura de reprovação entre os professores dessa disciplina, havendo necessidade de promover ações intra e extracurriculares que visem promover a aprendizagem autorregulada nos estudantes.

A afetividade foi temática em dois trabalhos, sendo que o primeiro explicita que o docente deve observar analiticamente as relações reais estabelecidas no ambiente escolar, considerando as emoções envolvidas, a fim de estabelecer vínculos afetivos, o que impulsiona o desenvolvimento de todos na situação educativa. O segundo texto busca refletir sobre o sentido do afeto na psicanálise freudiana e suas possíveis contribuições no campo da educação e explicita que o afeto desempenha papel fundamental nas atitudes do contexto escolar, desde que o docente não restrinja sua atuação ao desenvolvimento do aspecto cognitivo

As pesquisas analisadas sinalizam para a necessidade de que os processos educacionais não se restrinjam ao desenvolvimento dos aspectos cognitivos e considerem a pessoa de modo integral, incluindo aspectos de uma subjetividade. Em tempos em que os resultados das avaliações externas definem os rumos da educação e a competição é exaltada, o ensino de conteúdos, quase sempre descontextualizados, domina o cenário educacional, resultando em aprendizagens estéreis e na culpabilização daquele que não consegue apresentar os resultados esperados. Sendo assim, desconsidera-se o indivíduo em sua singularidade, as relações interpessoais estabelecidas e a realidade concreta em que se está inserido. Peroni (2020) alerta o fato de que o cenário social atual exalta a competição e a responsabilização dos indivíduos sobre seu sucesso ou fracasso, desconsiderado as condições materiais de existência.

Em relação à temática vozes de estudantes, os trabalhos analisados buscaram entender as representações sociais de estudantes sobre a escola pública e sobre engajamento estudantil. Um dos estudos aponta que as representações dos estudantes sobre a escola pública encontram-se diretamente relacionadas às práticas nesses espaços e, apesar dos desafios vivenciados na escola pública, os estudantes não negam o papel formativo exercido pela instituição. O outro texto concluiu que as representações sobre engajamento estudantil são fruto de ações e de intencionalidades interligadas por aspectos: pessoais, sociais e institucionais.

O último trabalho analisado versa sobre o estudo das vivências, percepções e representações que as crianças de até 12 anos apresentaram da pandemia e das mudanças por ela acarretadas em seus cotidianos. As produções analisadas sinalizam para a necessidade de ouvir os estudantes, entendendo que eles precisam ser considerados nos processos e decisões educacionais, pois suas falas quase sempre são abafadas por outras vozes que nem sempre consideram suas necessidades.

A análise empreendida nos 11 textos do GT 20 do XXV EPEN suscita reflexões interessantes sobre a produção acadêmica deste grupo de trabalho. De modo geral, os estudos apresentam uma concepção de psicologia que não se prende a uma visão biologizante, mas revelam uma psicologia atenta aos contextos e aos sujeitos, buscando olhar para os fenômenos psicológicos para além da dimensão individual, o que possibilita compreender de modo mais amplo a relação de tais fenômenos com a educação.

Outro aspecto importante a destacar sobre as pesquisas analisadas refere-se à concepção de ser humano que apresentam. Em sua maioria, os estudos buscam apreender o ser humano em sua totalidade e historicidade, não o apresentando de modo fragmentado ou dicotomizado. Além disso, refletem sobre a realidade em suas mediações e contradições, superando análises meramente descritivas dos fenômenos em estudo.

Analisando as tendências investigativas nos trabalhos do EPEN 2022

No que concerne à produção do GT no ano de 2022, seis trabalhos foram inscritos e apresentados versando sobre várias temáticas, contudo, não deixam de convergir em pelo menos dois pontos: 1) os temas tratam, de maneira evidente, de questões educacionais e 2) a instituição escolar, tanto a educação básica quanto a superior, tem sido o foco das investigações.

Vale ressaltar que a diversidade de temáticas estudadas pela psicologia da educação não se configura propriamente como problema epistemológico. A questão crucial é o modo pelo qual as discussões abordam e teorizam as possibilidades de desenvolvimento humano. Ou, como enfatiza Gatti (1997, p. 81), “ao nos preocuparmos com os modos pelos quais as pessoas se desenvolvem […] estamos no âmbito do que se poderia denominar, como campo de conhecimento, de ‘psicologia da educação’”. Mas esta é uma questão que será discutida mais adiante, quando estivermos tratando da terceira categoria.

Tendências teórico-metodológicas

Dentre os seis trabalhos, dois não definem os fundamentos da pesquisa nem há menção a nenhuma das “tradicionais” abordagens que têm definido o referido campo de conhecimento, conforme pontuam diversos estudiosos, a exemplo de Coll, Palacios e Marchesi (1996), Almeida (2005), Placco (2005), Carvalho e Matos (2021). Ao mesmo tempo, esses dois artigos não deixam de oferecer uma revisão de literatura sobre as temáticas centrais neles abordadas.

Os outros quatro trabalhos apresentam e discutem os dados de suas pesquisas com base em algum referencial epistemológico. Assim sendo, identificamos um que se fundamenta em Bandura, com foco na discussão sobre “desengajamento moral autoexonerativo”. Com base na Teoria das Representações Sociais, são dois os trabalhos que têm como pressupostos os saberes dos sujeitos, suas práticas, identidades, culturas, cotidianos e tradições.

Há um trabalho que se apoia na psicologia histórico-cultural, com enfoque no papel da educação no desenvolvimento das funções psicológicas superiores, “como criatividade, imaginação, atenção dirigida, intenção voluntária, pensamento lógico, linguagem articulada” (Marques, 2022, p. 2).

Contribuições para o campo de pesquisa

Começando pelo tema que trata da relação entre professor e estudante no ensino superior, o artigo analisado suscita algumas contribuições. Dentre as quais, duas se destacam: a motivação do estudante para o processo de aprendizagem e a questão da afetividade. São duas questões que, conforme o artigo, não podem ser pensadas deixando o papel do professor em segundo plano. Assim, a depender da configuração, a relação professor/aluno pode ser uma base de apoio (ou de impedimento) para o desenvolvimento do aluno na universidade.

No que diz respeito ao tema do ensino remoto emergencial na pandemia da covid-19, uma das contribuições do estudo está relacionada ao papel do professor no processo de reinvenção de sua prática pedagógica. Nesse caso, não se trata apenas do fato de alguns professores terem se esforçado para aprender e fazer uso de tecnologias digitais em sala de aulas, mas, sobretudo, de eles terem adaptado as ferramentas tecnológicas, de maneira pedagogicamente criativa para o ambiente real de aprendizagem dos alunos. Em síntese, não basta fazer uso de ferramentas pedagógicas. Mais que isso, é necessário que a sua utilização seja intencional e planejada, de forma a atender às necessidades do processo de ensino e aprendizagem.

As contribuições do terceiro tema, denominado “bullying e massacres em escolas”, são voltadas para uma questão muito sensível da realidade educacional no contexto atual, que é a violência na escola. O tema contribui com o entendimento da questão no campo educacional na medida em que encara o problema da violência não apenas como questão de segurança pública, mas como relações sociais que se configuram nas escolas e que devem ser construídas, do ponto de vista pedagógico, com atenção e respeito aos alunos no intuito de que os casos de bullying e de potenciais atos violentos possam ser superados.

Uma quarta contribuição vem de um tema que questiona limites, desafios e possibilidades de uma prática educativa desenvolvimental na educação infantil no período da pandemia. O estudo aponta que foram diversos os tipos de impactos negativos do ensino remoto na educação de crianças, com implicações no desenvolvimento intelectual, da linguagem, da formação de conceitos e tantas outras funções psíquicas, de modo a não se configurar, nesse período, como ensino desenvolvimental.

A questão relativa a tecnologias digitais é outra importante contribuição ao campo da pesquisa em psicologia da educação. Com base na Teoria das Representações Sociais, o artigo defende que o acesso à informação pode levar o indivíduo ao desenvolvimento, mas não somente isso. O artigo se debruça sobre as representações sociais de crianças no intuito de explicar que a tecnologia, hoje, se faz presente no seu cotidiano. Por isso, chegam a construir a representação social de que a tecnologia por elas utilizada tem relação com o brincar, mas tem também com o estudar.

A escola de ensino médio é também um tema que apresenta suas contribuições para o campo da pesquisa educacional. No caso do estudo em tela, compreendemos que é uma tripla contribuição, sendo uma gestada pelo próprio tema e outra que tem mais a ver com o potencial da Teoria das Representações Sociais na explicação do fenômeno. A terceira contribuição, talvez a mais importante, tem a tendência de superar as concepções de que os estudantes do ensino médio, jovens em sua totalidade, não se preocupam com a qualidade da educação a que eles têm acesso. O estudo do tema, apresentado no GT de Psicologia da Educação, em 2022, aponta o contrário, o que se configura como uma importante contribuição para o campo da pesquisa em educação.

Considerações finais

Consideramos que a produção do GT 20 – Psicologia da Educação, nas últimas edições da ANPEd Nordeste (2016-2022), consolida o esforço de pesquisadores comprometidos com a produção de conhecimento acerca dos inúmeros fenômenos psicológicos que se manifestam na realidade quando tratamos da educação, por exemplo, formação e trabalho docente, aprendizagem e aspectos psicossociais, desenvolvimento humano, dentre outros.

As análises empreendidas evidenciam que a psicologia da educação se consolida como campo de investigação caracterizado pela profunda diversidade teórica e metodológica, viabilizando a integração de muitos olhares sobre os processos educativos e as mediações que impactam na formação e desenvolvimento das pessoas, seja na escola, seja em outros espaços de relações sociais.

Se, por um lado, essa diversidade teórica e metodológica colabora com a consolidação desse campo de pesquisa, a ausência de fundamentos teóricos ou a sua indefinição contribui para seu enfraquecimento, uma vez que a ciência, como construção de interpretações e como processo humano-social-histórico (Gatti, 2010), precisa assegurar que essas interpretações não se constituem no vazio, prescindido de uma base epistemológica que as fundamente. Destarte, apesar de muitas pesquisas anunciarem suas bases epistemológicas e seu valor para a análise dos fenômenos estudados, ainda persiste a existência de produções sem a devida explicitação dos fundamentos teóricos assumidos pelos pesquisadores, de forma a permitir maior compreensão de suas exposições.

É preciso reiterar o que afirmam Carvalho, Facci e Barroco (2010) sobre a necessidade de assegurar um fazer científico comprometido com a emancipação humana, sendo, para isso, necessário valorizar o conhecimento teórico. É o conhecimento teórico que nos blinda das armadilhas do imediatismo, dos receituários pragmatistas e das explicações reducionistas para fenômenos essencialmente complexos que envolvem a realidade humana. É o conhecimento teórico que instrumentaliza nossa consciência e medeia nossa práxis no mundo.

Por fim, em forma de síntese, mesmo que provisória, consideramos que as tendências das pesquisas do GT 20 nas reuniões do Nordeste, realizadas entre os anos de 2016 a 2022, revelam a preocupação de pesquisadores em explicar os problemas que têm determinado a existência humana que, de modo geral, vem sendo afetada pelas questões próprias do momento que vivemos na contemporaneidade.

Essas explicações, em sua grande maioria, encontram-se fundamentadas em teorias como a psicologia histórico-cultural, representações sociais, desenvolvimento moral, psicanálise, teoria da atividade e psicogenética walloniana, e elas reverberam na realidade educacional e ajudam educadores, psicólogos e gestores no enfrentamento das questões que impõem óbices aos processos educativos e as relações humanas em sua totalidade. A exemplo disso, temos o efeito nefasto da pandemia na sociedade, as práticas de bullying, os casos de violência escolar, os processos de inclusão e exclusão social, os massacres em escolas, os efeitos das tecnologias digitais na educação, o desengajamento moral de professores etc. Para fazer frente à tal realidade, a psicologia da educação tem assumido compromisso ético, acadêmico e científico com a transformação das condições que determinam tais situações sociais, o que reforça ainda mais a importância da sua permanência nos cursos de formação de professores.

5A referência dos autores dos trabalhos é a psicologia sócio-histórica da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Os textos deste artigo foram revisados pela Texto Certo Assessoria Linguística e submetidos para validação dos autores antes da publicação.

Referências

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Recebido: 30 de Maio de 2023; Aceito: 11 de Agosto de 2023; Publicado: 31 de Outubro de 2023

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