Introdução
Este ensaio é parte da pesquisa científica aprovada pela Chamada Pública MCTI/CNPq/MEC/CAPES 2014, que se propôs a investigar a concepção de gestão escolar, novas atribuições e o trabalho do diretor de Centro de Ensino Médio Regular do Distrito Federal, considerando a vigência do Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE - 2007 e o Decreto Lei nº 6.094/07 - Compromisso Todos pela Educação (BRASIL, 2007).
Em 2007, o governo federal criou o Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE, que instituiu mecanismos da new public gestion nos sistemas de ensino e na gestão escolar, de modo a alterar a relação com as escolas públicas no país. É neste contexto, de disputa de projeto entre forças políticas e econômicas hegemônicas sociais, que situamos o Distrito Federal, o qual já conduzia discussões e propostas para a reconfiguração da gestão do sistema e das escolas sob a ótica da new public gestion (PAULA, 2009; CABRAL NETO, 2009).
Então, durante o movimento de expansão dos interesses empresariais pela educação pública, o Ensino Médio tornou-se parte integrante da Educação básica obrigatória e obteve três conquistas: (i) a Emenda Constitucional 59/2009: art. 1º “- Educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria” (BRASIL, 2009); (ii) a Lei nº 11.274/2006, que dispõe sobre a duração de 9 (nove) anos para o Ensino Fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade (BRASIL, 2006a); e (iii) a Lei nº 13.005/2014 - Plano de Educação - PNE prescreveu, na Meta 7: “fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem de modo a atingir as metas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - IDEB” (BRASIL, 2014). Na imprensa circulavam, naquele momento, ideias, propagandas e discussões sobre a identidade do Ensino Médio, e procurava-se uma alternativa que propiciasse algum alento para os estudantes, pois oscilava a velha dualidade de formação para o trabalho e formação para a vida.
Outra estratégia do governo federal foi modificar as finalidades do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, criado em 1997 para: a) avaliar competências e habilidades dos alunos do Ensino Médio; b) ser ferramenta para avaliar a qualidade do Ensino Médio: em 2009, c) passou a ser utilizado como critério para seleção de alunos aptos a receber a bolsa do Programa Universidades para Todos - Prouni, tanto em instituições públicas quanto privadas; e d) tornou-se um exame de acesso à Educação Superior por meio do Sistema de Seleção Unificada - SISU. Deste modo, o Enem tem ampla repercussão nacional e, de fato, reordena e modifica a política educacional brasileira, trazendo à tona desafios para gestores, reitores, diretores e professores.
Ainda no âmbito nacional, as decisões políticas propunham critérios de eficiência, eficácia e racionalidade para atingir o Índice de Desenvolvimento da Educação básica - IDEB, criado em 2007, de modo que a gestão da escola tornou-se elemento essencial a ser reconfigurado em prol dos objetivos econômicos. No âmbito do Distrito Federal, em sintonia com interesses externos, o governo associou a qualidade do ensino com o modo de gestão escolar. Supunham os tecnólogos que a qualidade do ensino e a gestão escolar estão imbricados em um processo de rendimentos e de resultado da aprendizagem dos estudantes. Esta crença fez surgir constantes discussões e inovações tecnológicas na área de gestão, exigindo novas competências e habilidades aos profissionais da Educação que se encontram em função diretiva. Programas de incentivo à formação de diretores e efetivação da nova gestão pública foram implantados nos estados brasileiros e no Distrito Federal.
Deste modo, havia algumas evidências nas atribuições e no trabalho do diretor: a) alteração na relação entre o ministério da Educação e o trabalho dos diretores, de modo a imprimir outra concepção e princípios nas escolas de Ensino Médio no Distrito Federal; b) aumento e individualização do trabalho do diretor para além das atribuições tradicionais; c) uso recorrente de terminologias, como descentralização, accountability, gerência, eficácia, eficiência, resultados, desempenho, indicadores, qualidade, competitividade, individualismo e liderança. Assim, as condições materiais reais e objetivas, as relações institucionais e o trabalho do diretor escolar são analisados à luz das contradições históricas e múltiplas determinações que ora se revelam e ora se ocultam. Buscam-se nas ações, legislação, no quotidiano e nas práticas, os fundamentos teóricos que estão subjacentes no modelo de gestão pública na Educação. Assim, elegeram-se as seguintes questões na pesquisa, em 2014: 1 - Estamos diante de outras exigências no trabalho e atribuições do diretor escolar em relação às dimensões administrativa, financeira, tecnológica e pedagógica? Como se apresentam as mudanças na concepção de gestão escolar após o Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE - 2007? 2 - Coexistem, no cotidiano escolar, práticas da nova gestão pública com as práticas de gestão democrática? Como se expressam? 3 - O que mudou no trabalho do diretor escolar após 2007? Neste ensaio, priorizaram-se as seguintes questões: nº 18 “Aponte cinco princípios ou elementos que devem fazer parte da gestão escolar”; e nº 25: “Que novas atribuições foram incorporadas ao seu trabalho?” Passemos à reflexão.
Das decisões políticas ao trabalho do diretor na gestão escolar
Dos anos noventa em diante tornou-se mais evidente, no cenário nacional, uma disputa em que empresários do setor educacional exigem mais espaços para a expansão de negócios e abertura para o capital internacional explorar a educação como bem público comercializável. Estas forças econômicas associadas com grupos internacionais atuam por meio de partidos políticos, confederação de empresários, setores de tecnologias, comunicações, imprensa, bolsa de valores e setores das igrejas católica e protestante em defesa de interesses comerciais. Lideranças destes grupos operam e atuam dentro das instituições do Estado brasileiro para dele extrair privilégios, benefícios e isenções, além de exigir alterações na legislação e segurança para suas atividades. Também neste cenário estão os distintos movimentos populares e sociais, associações científicas e acadêmicas, com propostas diferentes, disputando outro projeto nacional de Educação pública e laica.
Antes de prosseguir, cabe destacar que a Política Educacional é resultante das disputas entre forças hegemônicas e setores sociais e populares para dar prioridade a determinado projeto social. Neste movimento, a escola pública brasileira vem se tornando objeto de exploração de negócios lucrativos e rentáveis. Para tanto, busca-se alterar a gestão pública, subordinar os diretores às decisões externas, conduzir finalidades educativas, monitorar conteúdos curriculares e pedagógicos, metodologias de ensino e testes para medir o desempenho da escola e dos estudantes por índices externos. Persiste, ainda, a crença dos tecnólogos, empresários e de alguns secretários, de que a gestão da escola pública nas mãos do setor privado gera produtividade e competividade, bastando treinar o diretor escolar para torná-lo um gerente semelhante aos de empresas comerciais.
Entretanto, a realidade é muito mais complexa e não funciona de forma linear e padronizada como querem nos fazer acreditar esses tecnólogos, empresários e governos. A comunidade escolar reage e confronta decisões tomadas de cima para baixo, pois elas abalam o eixo do projeto pedagógico da escola, restringem os conteúdos, utilizam metas em si, e atormentam as ações de diretores e professores.
Pois bem! A gestão escolar refere-se às atividades administrativas, financeiras, tecnológicas, atos, ações, expedientes, atribuições institucionais, sociais e pedagógicas que as unidades escolares executam, de acordo com as normativas e legislação nacional vigente e seu projeto pedagógico, além de ações e relações que estabelecem com a comunidade local: famílias, comerciantes, indústrias e outros serviços públicos. Uma parte da gestão escolar é função do trabalho do diretor escolar e integra quatro dimensões: administrativa, financeira, tecnológica e pedagógica. Estas têm sido basilares na execução da política na Educação.
No conjunto das instituições sociais, a escola pública é o espaço por onde passam obrigatoriamente todas as pessoas durante quase sua inteira vida escolar e profissional. A escola é o lugar de formação, reinvenção, transmissão e divulgação do conhecimento produzido para crianças, jovens e adultos. É da escola pública que se espera que as pessoas recebam e adquiram atributos, atitudes, experiência e capacidades para se tornarem seres humanos e cônscios de seus direitos e de justiça social. Assim, construída nos locais mais distantes e periféricos, a escola pública tem a incumbência de elaborar e implementar seu projeto político-pedagógico; gerir recursos financeiros e a gestão de pessoas; zelar pela legislação, acompanhar a avaliação de ensino e de aprendizagem do estudante e fomentar a participação da comunidade escolar nos processos decisórios. Mesmo assim, o Ensino Médio regular vive um paradoxo: continua sendo excludente e persistem, ainda, a ilusão de formar jovens trabalhadores para o mercado e a preparação para o vestibular.
No caso específico da formação do diretor escolar, a Lei nº 9.394/1996, em seu art. 64, dispõe que “a formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em Pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional” (BRASIL, 1996). Por sua vez, as Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia, estabelecidas na Resolução CNE/CP nº 1/2006 (BRASIL, 2006b), definiram um entendimento de que os profissionais formados em tais cursos estariam aptos ao exercício de funções de gestão e, em alguns casos, cursos de especialização lato sensu tornar-se-iam o local de formação específica para o diretor escolar. Também é verdade que, em parte dos estados brasileiros e municípios, a experiência na docência tornou-se requisito obrigatório para ocupar cargo de diretor.
Em 2007 o Governo Federal instituiu o Plano de Metas: Compromisso todos pela Educação e, pelo Decreto nº 6.094/2007, instituiu outra relação do MEC com os entes federados. Assim, cada estado ou Distrito Federal ao aderir ao Compromisso todos pela Educação tinha que elaborar também o seu Plano de Ações Articuladas - PAR para, em regime de colaboração, conjugar os esforços em prol da melhoria da qualidade da Educação Básica e ordenar os instrumentos de avaliação. Nesta direção, o governo federal recompôs o regime de colaboração e reordenou as ações com os estados e o Distrito Federal, metas e indicadores a serem alcançados pelas escolas, e responsabilizou seus diretores. Para tanto, instituiu medidas que alteraram a relação do ministério da Educação com a Secretaria de Educação do Distrito Federal, que assumia compromissos com quatro dimensões: gestão educacional, formação de professores em serviço, práticas pedagógicas e avaliação, e a infraestrutura física e recursos pedagógicos e, em troca, recebia recursos financeiros, ajuda técnica para seus expedientes e resultados das escolas e dos estudantes.
Neste sentido, algumas alterações na gestão escolar foram encontradas em estudos (DINIZ, 2013; MENDES, 2011; SILVA, 2016) nos quais diretores de escolas públicas do Distrito Federal relataram que testes e exames tornaram-se ferramentas objetivas, que permitem ao Governo Federal medir um aspecto da qualidade do ensino. Há, nas escolas, um amontoado de programas, deles exigindo prestação de contas online nos ambientes virtuais, mesmo que a escola continue com falta de recursos financeiros e de equipamentos e com dificuldades para contratar professores efetivos ou substitutos para o ensino.
Neste sentido, ao descentralizar ações para o Distrito Federal e escolas públicas, ao instituir o Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle do Ministério da Educação - SIMEC como ambiente virtual que pode ser acessado pela internet, criou-se, assim, uma ferramenta tecnológica de agilidade, transparência e de monitoramento dos resultados dos programas do governo federal. O MEC rearticulou, no planejamento estratégico, as formas de controle e contato direito com as escolas da rede de ensino, na expectativa de poder gerir a transferência de recursos financeiros e prestação de contas online. Deste modo, ao descentralizar as ações para o Distrito Federal, recentraliza, fiscaliza, avalia e regula, tendo o IDEB como instrumento racional para medir o resultado da escola.
Entretanto, a lógica de racionalidade, competitividade e resultados sustenta os vários programas federais a que a escola pública faz adesão, na expectativa de obter mais recursos financeiros. Nesta relação, professores e diretores têm dificuldades de identificar as intenções e concepções subjacentes por trás dos programas. Não há tempo para isto, pois a lógica é alcançar metas e apresentar resultados. Portanto, com os programas oficiais e prestação de contas online, o governo federal alterou sua relação com o sistema de ensino e com as escolas, pois valorizou o espírito competitivo, o individualismo, os resultados e o conteúdo a ser cobrado na verificação de rendimentos pelo IDEB e por testes externos. Está em curso a crença de um padrão de qualidade de ensino baseado em finalidades e indicadores externos para todas as escolas de Ensino Médio, e o trabalho do diretor assume centralidade.
Características dos Centros de Ensino Médio Regular e do diretor escolar no Distrito Federal
Brasília, sede do governo Federal e do Distrital, possui trinta e cinco Regiões Administrativas (RA) e seus administradores são indicados pelo governador. De acordo com o art. 20 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), as áreas da Educação, Saúde e Segurança públicas são mantidas com o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) e, dado o crescimento das demandas sociais, os valores monetários tornaram-se cada vez mais insuficientes para cobrir as despesas dos três setores. Ademais, o Distrito Federal tem suas peculiaridades, pois somente em 1990 ocorreram eleições diretas para governador, e foi eleito Joaquim Domingos Roriz, pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que foi ministro da Agricultura do ex-presidente Fernando Collor de Melo (1990-1992). Joaquim Roriz, durante sua passagem pelo Palácio do Buriti, revisitou o jeito secular de fazer política: populista, fisiológico, troca de privilégios e favores, além de administrar os bens públicos como se fossem da esfera privada (MENDONÇA, 2001).
Em 2015, o Distrito Federal contava com um total de 658 escolas públicas, da Educação Infantil ao Ensino Médio, nas diversas RA, das quais 581 urbanas e 77 rurais. Destas escolas, 86 são de Ensino Médio e Médio Integrado (BRASIL, 2015). O Plano Piloto/Cruzeiro é a RA com o maior número de escolas, 103, sendo todas urbanas. A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, na organização da gestão do sistema educativo, conta com 14 Coordenações Regionais de Ensino (CRE) localizadas nas regiões administrativas do DF que, em articulação com o nível central, realizam ações que concretizam políticas para a Educação. No Distrito Federal, o engenheiro José Roberto Arruda, candidato pelo Partido da Frente Liberal (PFL), venceu as eleições de 2006 e deu continuidade tanto à política educacional estabelecida no governo distrital anterior, de Joaquim Roriz, quanto à política federal resultante dos dois mandatos do governo de Fernando Henrique (1995 a 2002).
Entretanto, a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 206, prescreveu os princípios constitucionais da gestão democrática no ensino público. Em seu mandato, Joaquim Roriz editou a Lei nº 575/1993, que dispõe sobre a “Gestão democrática das Unidades Públicas de Ensino do Distrito Federal” (DISTRITO FEDERAL, 1993), que estabelece, como forma de provimento do cargo de direção, a indicação política. Paradoxalmente, esta norma determina que a gestão de cada escola é de responsabilidade da Diretoria e do Conselho Escolar, mas estabelece que a composição dessa diretoria é de livre escolha do Governador. Esta contradição evidencia as tensões e limitações da gestão dos sistemas de ensino e da escola, pois estão eivados dos interesses dos grupos e forças hegemônicas locais. Neste movimento, legislação e documentos expedidos durante a gestão de Joaquim Roriz trazem termos como: desburocratização, modernização, racionalização, descentralização, participação, democracia, ou mesmo o princípio da gestão democrática. Porém, “todos os vocábulos estavam fortemente condicionados pela ideologia dos muitos que haviam servido à ditadura” (BARROSO, 2004, p. 122).
Neste contexto, José Roberto Arruda sancionou a Lei nº 4.036/2007, que dispõe sobre a “Gestão Compartilhada nas instituições educacionais da rede pública de ensino do Distrito Federal” (DISTRITO FEDERAL, 2007). A lei, apesar de retomar a eleição direta para o cargo de diretor, estabelece como pré-requisito a aprovação em processo seletivo através de prova de conhecimento e análise de títulos. Além desta exigência, ainda estabelece um perfil específico para os cargos de diretor e vice-diretor, em que são exigidas características de articulador, líder e executor. Emergem, nesse momento, novas atribuições para o diretor da escola pública do Distrito Federal, decorrentes da legislação vigente, da crença na qualidade educacional e das inovações tecnológicas impondo novos desafios, competências e habilidades aos profissionais da área de Educação que se encontram em função diretiva. Há uma crença nos preceitos neoliberais como se estes gerassem resultados e desempenhos melhores das escolas.
Na organização da gestão do sistema educativo, a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal conta com 14 Coordenações Regionais de Ensino (CRE). Delas, doze regionais (Ceilândia, Santa Maria, Samambaia, Plano Piloto/Cruzeiro, Planaltina, Recanto das Emas, Gama, Brazlândia, Paranoá, Sobradinho e São Sebastião) responderam o instrumento de pesquisa. Nesta pesquisa, 27 Centro de Ensinos foram selecionados a partir dos seguintes critérios: a) ser pública e ter diretor eleito; b) ofertar Ensino Médio regular; c) cobrir todas as regiões administrativas. Após contato inicial e agendamento, realizaram-se as entrevistas com os diretores entre dezembro e abril de 2015.
Em relação aos critérios de escolha, elegeram-se 27 Centros de Ensino Médio Regular, isto é, escolas públicas urbanas que oferecem somente Ensino Médio regular, com grande número de estudantes e com abrangência em todo o Distrito Federal. Aplicou-se um questionário que continha os seguintes itens: dados institucionais, perfil e formação do diretor, tempo na função, eixo de questões sobre concepção de gestão, intensificação do trabalho e ética na gestão. Neste ensaio, priorizaram-se as seguintes questões: nº 18: “Aponte cinco princípios ou elementos que devem fazer parte da gestão escolar”; e a nº 25: “Que novas atribuições foram incorporadas ao seu trabalho?”.
Quadro 1 Centros de Ensino Médio Regular no Distrito Federal participantes da pesquisa
Centro de Ensino Médio | Formação do diretor / Especialização lato Sensu | Nº Turmas | Nº Estudantes | Nº Equipe gestora |
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1. CEM 02 - Ceilândia | Geografia/Bacharel em Direito | 58 | 2.200 | 7 |
2. CEM 04 Ceilândia | Geografia/Gestão Ambiental | 45 | 1.600 | 6 |
3. CEM 09 Ceilândia | História/ Ciência Política | 37 | 1.380 | 8 |
4. CEM 10 Ceilândia | Letras/ Docência Ed. Superior | 38 | 1.375 | 7 |
5. CEM 12 Ceilândia | Filosofia/Filosofia | 42 | 1.661 | 7 |
6. CEM Gama | Letras | 58 | 2.200 | 7 |
7. CEM 417 Santa Maria | Filosofia/ Filosofia Existencial | 48 | 2.000 | 6 |
8. CEM 404 - Santa Maria | Matemática | 48 | 1.900 | 7 |
9. CEM Júlia Kubitschek | Geografia/ Direito Educacional | 42 | 1.250 | 7 |
10. CEM 01 - Núcleo Bandeirante | História /Ciência Política | 31 | 1.370 | 7 |
11. CEM 01 Riacho Fundo | Letras | 37 | 1.400 | 6 |
12. CEM Paranoá | Matemática / Gestão escolar | 54 | 2.200 | 8 |
13. CEM Planaltina | Matemática/ Biologia/ Psicopedagogia | 50 | 1.945 | 8 |
14. CEM Paulo Freire | Matemática/Docência E. Superior | 25 | 832 | 5 |
15. Elefante Branco | Letras/ Gestão Pública | 44 | 1.800 | 3 |
16. CEAN | Teologia/ Administração Escolar | 22 | 840 | 4 |
17. CEM Recanto das Emas | Filosofia | 57 | 2.000 | 9 |
18. CEM Recanto das Emas | Ciências Sociais/ Docência Ed. Superior | 46 | 1.800 | 9 |
19. CEM 414 Samambaia | Matemática/ Matemática Estatística | 42 | 1.960 | 5 |
20. CEM 34 Samambaia | Matemática/ Tecnologia | 52 | 1.950 | 6 |
21. CEM São Sebastião | Matemática/ Administração Escolar | 42 | 2.083 | 7 |
22. CEM Sobradinho | Matemática/ Matemática Estatística | 48 | 2.300 | 8 |
23. CEM Taguatinga | Matemática/ Matemática | 53 | 2.120 | 7 |
24. CEM Taguatinga | Zootecnia/ Pedagogia/ Administração Escolar | 39 | 1.653 | 7 |
25. CEM Taguatinga | Geografia / Educação de Jovens e Adultos | 64 | 2.700 a 3.000 | 7 |
26. CEM Taguatinga | Física/ Metodologia do Ensino de Física | 32 | 1.200 | 5 |
27. CEM 3 Ceilândia | História/ Administração Escolar | 72 | 3.100 | 7 |
Fonte: Elaborado pelos pesquisadores - Dados de 2016.
Sobre o perfil dos diretores, apurou-se que 19 diretores são do sexo masculino e 8 do feminino. Cerca de 40% dos diretores têm mais de 50 anos de idade, 30% têm entre 46 e 50 anos e 30%, entre 36 e 45, e um diretor tem menos de 35 anos. Todos os diretores afirmaram ter trabalhado como professor regente antes de exercer função de gestão na escola. Entre os diretores, 15 trabalharam há mais de dez anos como professores, o que representa 60%. Entre 27 entrevistados, 6 (24%) afirmaram que trabalharam como professor regente em torno de 4 a 5 anos; um deles respondeu que assumiu a direção com um ano de profissão como professor.
Sobre a formação na graduação, dos respondentes, 9 possuem graduação em Matemática; 4 em Geografia e 4 em Letras; 3 em História e 3 em Filosofia; e apenas 1 em Teologia, 1 em Ciências Sociais, 1 em Física e 1 em Zootecnia. Todos possuem Especialização lato sensu. Também, 7 dos entrevistados têm mais de 10 anos de experiência como diretor de escola; 6 deles, entre 4 e 5 anos; e 4 dos entrevistados têm entre 6 e 7 anos. Sobre a experiência, 3 diretores responderam ter de 8 a 9 anos; e 1 diretor afirmou ter um ano.
Sobre o tempo de trabalho como diretor, nos Centros de Ensino Médio Regular temos 5 diretores que afirmaram trabalhar na mesma escola há mais de 10 anos; 8 deles estão na escola entre 2 e 3 anos; e 7 entre 4 e 5 anos. Apenas 1 atua como diretor há 1 ano na mesma escola. A respeito das formas de provimento no cargo de diretor, 22 diretores responderam que chegaram ao cargo por meio de eleição; 5 por indicação de técnicos, e 2 por indicação política.
Portanto, os dados apontam que os diretores dos Centros de Ensino Médio Regular do Distrito Federal são, em sua maioria, do sexo masculino, com idade acima de 46 anos. 67% do total tem experiência educacional, 60% deles atuam como professor há mais de 10 anos. Em relação à forma de provimento da função de diretor escolar, 73% foram eleitos; e 15%, indicação de técnicos ou de políticos. Há um esforço nestes de Centros de Ensino Médio Regular para vivenciar mecanismos e conselhos mais democráticos de escolha dos diretores.
Discussão e análise dos princípios, concepção e trabalho do diretor escolar
A gestão escolar e, nela, o trabalho do diretor, adquiriu centralidade na legislação nos programas, planos e projetos educacionais na expectativa de melhorar as escolas públicas do país. A busca pela qualidade de ensino e por inovações na gestão escolar impôs novas atribuições, atitudes, competências e habilidades aos diretores. Há uma crença de que o paradigma da new public gestion pudesse remover os ranços tradicionais e assim obter, das escolas, resultados, desempenhos e indicadores melhores. Entre eles é possível citar a descentralização, a eficácia, a eficiência, a autonomia, a promoção da racionalidade, a flexibilidade, as parcerias público-privadas, e a ênfase nos resultados sob o ponto de vista neoliberal, isto é, competição e produtividade (CABRAL NETO, 2009; PAULA, 2005).
Das questões de investigação do projeto principal, selecionamos, neste ensaio, as seguintes questões, como exposto previamente: nº 18: Aponte cinco princípios ou elementos que devem fazer parte da gestão escolar; nº 25: Que novas atribuições foram incorporadas ao seu trabalho?
Quadro 2 Princípios e novas atribuições incorporadas no trabalho do diretor escolar
Questão nº 18: Aponte cinco princípios/elementos que devem fazer parte da gestão escolar | Questão nº 25: Que novas atribuições foram incorporadas ao seu trabalho após 2007? | |
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D.1. | Valorização da proposta pedagógica e avaliações e reuniões periódicas | Trabalho financeiro e prestação de contas. |
D.2. | Liderança, organização, democracia e participação | A escola, hoje (2016), virou uma empresa, tem CNPJ e demanda administração, gestor com conhecimento pedagógico e logística, desenvoltura na prestação de contas e tomada de preços. |
D.3. | Competência pedagógica, participação do coletivo de professores e alunos, articulação com a comunidade, aplicação de políticas da Secretaria e cumprimento do currículo | As financeiras. “A gente tem que cumprir o que o MEC e a Secretaria determinam para melhorar tanto a infraestrutura como a parte administrativa da escola”. |
D.4. | Autonomia, responsabilidade, participação efetiva, mais ajuda dos órgãos competentes e segurança | PDAF, PDDE Interativo e POEMI, fazer os orçamentos, prestação de contas, montar o conselho escolar. |
D.5. | Democracia, colaboração, respeito, disposição, e compreensão | Relatórios que chegam de última hora. |
D.6. | Valorização da proposta pedagógica | Trabalho financeiro, prestação de contas. |
D.7. | Gestão efetivamente democrática, conhecimento técnico, prestação de contas, tomar decisões ouvindo todos os segmentos | Mexer com verbas, cuidar da compra e fazer mapa da merenda, fazer orçamentos, ir às lojas e fazer prestação de contas, saber lidar com o dinheiro da escola depositado no banco. |
D.8. | Reuniões com a comunidade, estratégia de gestão, prestação de contas, organização pedagógica e administrativa | Programa de descentralização financeira gerou muito trabalho desde 2008, não houve treinamento e ficou tudo na mesma pessoa. |
D.9. | Equilíbrio emocional, flexibilidade, ética, profissionalismo, honestidade, transparência e conhecimento | A parte financeira é mais trabalho e grande responsabilidade. Pesou bastante porque você não pode errar. |
D.10. | Ter uma equipe gestora que fale a mesma linguagem, união, ter amor à educação, gostar do que faz | PROEMI, PROINFO, O programa veio com Excel e aqui é Linux; questão disciplinar, violência, bullying, racismo e homofobia, e uso de drogas e crack. |
D.11. | Comprometimento, transparência e união | “Quando estragava uma coisa, você mandava um memorando: olha, queimou a lâmpada... mas agora eu tenho que ir na loja, comprar a lâmpada, reator. E aí, neste caso, eu uso a verba do PDAF”. “No meu caso foi para melhor. Do diário de papel para o diário eletrônico foi uma mudança pra melhor”. |
D.12. | Autonomia, liberdade para tomar decisões. “Muitas vezes as pessoas que estão lá em cima, no gabinete, não sabem a realidade daqui; desburocratizar; flexibilidade para contratação de recursos humanos” | Proemi Ensino Médio inovador |
D.13. | Compromisso, responsabilidade, liderança, ética, coletividade e respeito | Desenvolver toda a parte pedagógica somente com um supervisor, além de atendimento à comunidade escolar. Atendimento de alunos especiais e substituição de professores em sala de aula. |
D.14. | Transparência, bom senso, participação e descentralização | Na maioria das vezes, levo para casa para dar conta das questões financeiras. |
D.15. | Participação, ter projeto político pedagógico e transparência | Demanda da sociedade civil e novos convênios com projetos do Proemi e PIBIC. Exigem de você um acompanhamento e envolvimento para que dê certo. É como um jogo. |
D.16. | Competência, disposição, buscar parceria na comunidade, bons relacionamentos | Trabalho na melhoria da escola e projetos |
D.17. | Liderança, ética, envolvimento. Tem que ser muito democrático. “Ter uma certa autonomia para que as coisas fluam” | O financeiro-administrativo. Tomar conta da compra tem que se envolver. Falar com fornecedor. Depois, a prestação de contas. Analisar documentação. |
D.18. | Compromisso, paciência, ser responsável, dedicação, espírito de liderança, tem que saber ouvir mais a comunidade escolar | Projetos triplicam a carga de trabalho do diretor. PDAF, PDDE e Proemi. A prestação de contas, compras, ter três orçamentos, certidões e correr atrás do fornecedor e ver o melhor preço. |
D.19. | Transparência, união do grupo, apoio dentro da Secretaria de Educação. Tem que se doar, arregaçar as mangas | A gente sempre fez PDAF, PDDE Proemi, PNLD, alimentação. Não acrescentou nada. Continua sendo atribuição do gestor. |
D.20. | Liderança, poder dialogar, responsabilidade, mais autonomia, flexibilidade e mais contratação de pessoal para trabalhar | “Olha, nós estamos sobrecarregados”. |
D.21. | Pedagógico, autonomia, seleção dos recursos humanos | “Decidir sobre o investimento faz parte das tarefas do diretor, acho que a prestação de contas não’”. |
D.22. | Ter autonomia para deliberar e transparência. | “O que incomoda é a pressa”. |
D.23. | Transparência, ética e legislação | “Eu acho que as atribuições já são inerentes ao cargo mesmo. Mas a gente tem que se empenhar”. |
D.24. | Compromisso, transparência e saber lidar com as pessoas | Proemi. “Me traz mais responsabilidade e mais orgulho, também. Coordenar os projetos, gastar o dinheiro. Porque toda verba que gasto, o conselho escolar tem que autorizar. Cuidar das notas fiscais e cheques”. |
D.25. | Disposição, saber lidar com conflitos, ter vontade e estar envolvida com todos os segmentos | É administrar a escola e fazer com que ela ande. Os projetos dentro da escola tomam esse tempo. “A gente costuma dizer que o diretor é aquele que faz de tudo um pouco”. |
D.26. | Disponibilidade, doação de seu tempo mesmo, ter jogo de cintura, planejando, e buscar conhecimento | PDDE, PDAF e PROEMi, parte financeira, buscar os orçamentos em lojas diferentes, reunir documentação e notas, prestar contas. |
Ao indagar sobre os princípios que fazem parte da gestão escolar (questão nº 18), obtiveram-se as seguintes narrativas, reagrupadas em três grupos: 1) autonomia, democracia, ser muito democrático, participação, transparência; 2) disposição, dedicação, compreensão, competência, responsabilidade, colaboração, compromisso, envolvimento, coletividade; 3) ética, equilíbrio, respeito, liderança, doação, articulação com a comunidade escolar, liberdade para tomar decisões, flexibilidade, honestidade, gostar do que faz e valorização da proposta pedagógica da escola. Constata-se que os diretores vivenciam, no cotidiano da escola pública, os princípios da gestão democrática: autonomia, participação, transparência, honestidade, responsabilidade e ética. Durante as entrevistas, os diretores expressaram os princípios da gestão democrática: autonomia, participação, pluralismo e transparência. Foram enfáticos e determinados, sabem o que dizem. Talvez porque, aqui no Distrito Federal, após o processo eleitoral, os diretores fazem um curso de formação específico, e cada vez mais as pessoas buscam seus direitos e fazem reivindicação dos serviços.
Ser diretor de escola pública exige experiência como professor, conhecimento técnico e institucional, ser democrático, honestidade, ética, capacidade de mediar e tomar decisões ouvindo os outros, saber respeitar os adversários e conviver com os diferentes, saber dialogar com órgãos da secretaria e do Ministério da Educação e serviços públicos.
Em seguida, revelaram que, “muitas vezes, as pessoas que estão lá em cima, no gabinete, não sabem a realidade daqui”. Esta percepção, de que as decisões são tomadas em gabinetes e destinadas para execução na escola revelou a distância a que ainda estamos da autonomia. Destacou dois elementos; um deles, as incertezas quanto aos recursos financeiros, pois não se sabe se eles vêm e nem quando. Isto dificulta o planejamento da escola. E quando chegam, é preciso utilizá-los de maneira apressada. Outro elemento que chamou atenção foi a falta de professores para as disciplinas do Ensino Médio, e a muita demora na substituição, pois se perde muito tempo na contratação.
Também, os diretores reconhecem a escola pública como um espaço em que as decisões devem ser coletivas; é necessário saber dialogar com a comunidade escolar por meio de outras tecnologias: WhatsApp, e-mail, celular, redes sociais, saber lidar com conflitos, com o uso de drogas, as violências, o bullying, a obesidade, o abandono juvenil, a falta de sentido da escola na vida do adolescente, e as várias formas de intolerância, como a homofobia. Além disso, ainda há o atendimento aos alunos especiais e a lida com as empresas privadas e terceirizadas dentro da escola, que são situações que demandam outras capacidades e atitudes do diretor.
Ao perguntar sobre as novas atribuições do diretor escolar após o Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE 2007 (questão nº 25), foram obtidas as seguintes narrativas, reagrupadas em dois grupos: a) trabalho financeiro e prestação de contas, buscar orçamentos em lojas diferentes, lidar com convênios e bancos, fazer compras, correr atrás de certidões e de fornecedores, contratar serviços para pequenos reparos; b) “estamos sobrecarregados; o que incomoda é a pressa; triplicou a carga de trabalho do diretor; a escola virou uma empresa, tem CNPJ, demanda um gestor com conhecimento pedagógico, logística e desenvoltura na prestação de contas e tomada de preços, relatórios que chegam de última hora; o programa de descentralização financeira gerou muito trabalho desde 2008 e não houve treinamento, ficou tudo na mesma pessoa; cuidar das notas fiscais e do patrimônio, além de saber aplicar dinheiro no banco”.
De fato, há alterações nas atribuições e no trabalho do diretor escolar. Aqui, parece que estão presentes as práticas da new public gestion, na forma de prestação de contas, accountability, racionalidade, desconcentração, liderança e competição. Há ênfase em relatórios, produtos, resultados e indicadores como condutores lineares para alcançar qualidade de ensino. No diálogo com os respondentes, constatou-se que atuam tendo como referência os princípios da Lei nº 9.394/1996 (BRASIL, 1996). Contudo, são forçados e pressionados para executar ações e práticas de negócios empresariais, conforme fragmentos selecionados:
“Na maioria das vezes levo para casa para dar conta das questões financeiras”.
“Projetos triplicam a carga de trabalho do diretor. PDAF, PDDE e Proemi. A prestação de contas, compras, ter três orçamentos de lojas diferentes, certidões, e correr atrás do fornecedor e ver o melhor preço”.
“A escola, hoje (2016), virou uma empresa, tem CNPJ e demanda administração, gestor com conhecimento pedagógico e logístico, desenvoltura na prestação de contas e tomada de preços”.
“Olha, nós estamos sobrecarregados”.
“Eu acho que as atribuições já são inerentes ao cargo, mesmo. Mas a gente tem que se empenhar”.
“O que incomoda é a pressa”. “Os relatórios em cima da hora”.
“Me traz mais responsabilidade e mais orgulho também. Coordenar os projetos, gastar o dinheiro. Porque toda verba que gasto, o conselho escolar tem que autorizar. Cuidar das notas fiscais e cheques”.
“É administrar a escola e fazer com que ela ande. Os projetos dentro da escola tomam esse tempo”.
“A gente costuma dizer que o diretor é aquele que faz de tudo um pouco”.
“PDDE, PDAF e PROEMi, parte financeira, buscar os orçamentos em lojas diferentes, reunir documentação e notas, prestar contas”.
“Quando estragava uma coisa, você mandava um memorando: olha, queimou a lâmpada... mas agora, eu tenho que ir na loja, comprar a lâmpada, reator. E aí, neste caso, eu uso a verba do PDAF... No meu caso foi para melhor. Saímos do diário de papel para o diário eletrônico, foi uma mudança pra melhor”.
Estes fragmentos revelam que o trabalho do diretor vem assumindo atribuições que se aproximam das práticas empresariais. O tempo da escola não é como o tempo das empresas. Não! A escola pública é uma instituição social, tem processos de ensino, aprendizagem e valores diferentes, que não se compram e nem se vendem. A escola pública muda sim, com as mudanças sociais, econômicas e tecnológicas. Querer torná-la análoga às empresas comerciais parece ser uma visão estreita, e indica perspectivas de querer tornar as práticas pedagógicas um objeto comercializável. E, como estratégias para tanto, instituíram-se tecnologias e busca-se alterar o trabalho do diretor. Antes, este trabalho era o de fazer os registros de matrícula do aluno no papel, preeencher formulário, fazer memorandos, comparecer às reuniões na Regional ou Secretaria de Educação, assinar cheques, guardar os livros contábeis, punir a indisciplina dos estudantes, fiscalizar o cumprimento dos conteúdos, conduzir os conselhos da escola, conduzir os registros profissinais dos professores e servidores, fazer registros no papel sobre a alimentação escolar, livro didático e transposrte escolar, entre outros.
Após o Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE - 2007 além das funções anteriores, as circunstâncias sociais e tecnologias fizeram emegir outras atribuições: domínio das tecnologias, saber utilizar mídias e diferentes formas de comunicação, redes sociais, imprensa, domínio de plataformas de serviços públicos, capacidade de prestação de contas de recursos financeiros, ter um saber técnico e institucional para comunicação com outras instituições e serviços públicos, preenchimento de censos escolares na plataforma online, formulários, cadastros, relatórios; enfim, dados da organização e funcionamento escolar. Também sobrevieram atribuições financeiras: receber, controlar e executar os recursos financeiros provenientes de várias rubricas e fontes, construir relações com bancos, comerciantes, papelarias, agricultura familar, profissionais de serviços de tecnologia, coordenar os programas federais e distritais, conhecer fornecedores, fazer cotação de preços, além de zelar pelo patrimônio e funcionamento da escola nos fins de semana.
Os diretores escolares afirmaram que o trabalho com questões financeiras exige novas atribuições e conhecimento técnico, em um universo que eles pouco conheciam. Os governos federal e distrital, ao desconcentrar os programas apontados pelos diretores, fizeram emergir os movimentos contraditórios: (i) a descentralização sem recursos reduz a autonomia escolar; (ii) recursos financeiros sem autonomia de decisão e execução dificultam a efetiva gestão democrática; (iii) há uma relação direta do diretor escolar com o Governo Federal por meio dos programas e das plataformas online. Após 2007, o que se constata é uma reaproximação do Estado da Educação. Assim, (iv) a prestação de contas, cotação de orçamentos, utilização de plataformas online e cadastros são mecanismos de controle e monitoramento que estendem os braços do Estado brasileiro para dentro da escola como ator de fiscalização, regulação e gestor de resultados. No fundo, não se trata de iniciativas para a melhoria da qualidade do Ensino Médio (Lei nº 13.415/2017, que dispõe sobre a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em tempo integral), mas almeja aproximar as finalidades e as práticas pedagógicas, curriculares e avaliativas dos expedientes de natureza empresarial, confinando o diretor como um elo entre escola, empresa e mercado. Trata-se de uma dissimulação do Estado brasileiro para desobstruir resistências de alguns setores populares e entidades, e expandir práticas de resultados do ponto de vista neoliberal. Trata-se, portanto, de imprimir, no sistema e na escola pública, os fundamentos desejáveis para obter resultados lucrativos.
Em relação às novas atribuições pedagógicas, exige-se do diretor: ser capaz de conduzir a escola pública para todos os estudantes, no respeito ao pluralismo de ideias, diversidade de culturas e nas condições materiais de vida de sua família, proporcionando a elevação da consciência, acesso ao conhecimento científico, tecnológico, artístico e estético. Ser capaz de utilizar as tecnologias e redes sociais e, ao mesmo tempo, ser capaz de garantir o contato humano com o outro. Aprender a conviver com os diferentes e primar pelos princípios éticos e de justiça. Defender a liberdade de expressão, de pensamento e de ideias. E mais: junto com professores, zelar pela Lei nº 9.394/1996, art. 3º, “I - Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber e; III - Pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas como princípios fundamentais da Educação Básica” (BRASIL, 1996).
Considerações parciais
Este ensaio trouxe à tona princípios de gestão escolar, outras atribuições ao trabalho do diretor, após o Plano de Desenvolvimento da Escola 2007, a partir da atuação de 27 diretores de Centros de Ensino Médio Regular do Distrito Federal, entre 2007 e 2015.
Nos Centros de Ensino Médio Regular, com dados empíricos, pode-se afirmar (questão nº 18) que persistem, na atuação e trabalho dos diretores, os princípios de autonomia, democracia, participação, transparência, compromisso e respeito. A escola pública, situada na sociedade capitalista, integra mudanças advindas dos governos, da utilização de tecnologias, e das reivindicações dos movimentos populares, sociais e associações científicas e acadêmicas. Em relação às novas atribuições do diretor escolar (questão nº 25), na prática cotidiana, coexistem práticas da gestão democrática e da nova gestão pública nas atividades, ações, tarefas, funções e atribuições do diretor. Além das funções tradicionais, o trabalho do diretor modificou-se com a utilização de tecnologias, mídias, imprensa, redes sociais, desconcentração dos programas federais e distrital, prestação de contas online, cotação de preços, orçamentos de lojas diferentes e a busca de competitividade entre as escolas, por meio de indicadores de qualidade de ensino. Ainda, demanda conhecimento técnico qualificado, respeito ao pluralismo de ideias e à diversidade de culturas, capacidade para garantir o contato humano com o outro; aprender a conviver com os diferentes e primar pelos princípios éticos e de justiça; defender a liberdade de expressão, de pensamento e de ideias, que são considerados indícios de aumento em quantidade e qualidade no trabalho do diretor escolar.