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Revista Diálogo Educacional

versión impresa ISSN 1518-3483versión On-line ISSN 1981-416X

Rev. Diálogo Educ. vol.19 no.61 Curitiba abr./jun 2019  Epub 31-Ene-2020

https://doi.org/10.7213/1981-416x.19.061.ao03 

Artigos

Significações de Estética: desafios para a educação estética com base em um curso superior de Design

Significations of Aesthetics: challenges for aesthetic education based on a higher education course in Design

Significación de Estética: desafíos para la educación estética basada en un curso superior de Diseño

aHC: Universidade do Porto (UPorto), Porto, Portugal. Doutor em Design e Doutor em Educação, e-mail: humbertoccosta@gmail.com. Apoio: CNPQ - Brasil.

bTS: Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil. Doutora em Educação, e-mail: tania.stoltz795@gmail.com


Resumo

Esta pesquisa teve por objetivo identificar as significações de Estética junto a discentes de um curso superior de Design, tendo em vista a Educação Estética. Trata-se de uma investigação de cunho qualitativo e exploratório-descritivo. Os métodos utilizados foram a revisão bibliográfica e um estudo de caso. O campo de estudo foi um Curso Superior Tecnológico (CST) em Design e os discentes do referido curso constituíram o público-alvo da investigação. No estudo de caso utilizou-se o questionário on-line para coletar os dados. Dada a natureza qualitativa dos dados, utilizou-se o método dos “núcleos de significação” para analisá-los. Três núcleos de significações de Estética foram identificados: 1) Estética é aparência; 2) Estética como categorias estéticas; 3) Estética como conhecimento sensível. A presente pesquisa, ao identificar as significações de estética segundo a visão dos discentes de um curso superior de Design, oferece meios para compreender e estruturar uma educação Estética que permita integrar a Estética, o Design e a Educação, com vistas a educar esteticamente o homem para desenvolver a sua liberdade.

Palavras-chave: Significação; Educação Estética; Design; Educação Superior

Abstract

This research aimed to identify the meanings of Aesthetics among students of a higher degree in Design, in view of Aesthetic Education. This is a research of a qualitative and exploratory-descriptive nature. The methods used were the bibliographic review and a case study. The field of study was a Superior Technological Course (CST) in Design and the students of said course constituted the target audience of the research. In the case study the online questionnaire was used to collect the data. Given the qualitative nature of the data, the "meaning nuclei" method was used to analyze them. Three nuclei of meanings of Aesthetics were identified: 1) Aesthetics is appearance; 2) Aesthetics as aesthetic categories; 3) Aesthetics as sensitive knowledge. The present research, by identifying the meanings of aesthetics according to the vision of the students of a superior course in Design, offers means to understand and structure an Aesthetic education that allows integrating Aesthetics, Design and Education, with a view to aesthetically educate the man to develop their freedom.

Keywords: Significance; Aesthetic Education; Design; Higher education

Resumen

Esta investigación tuvo por objetivo, identificar las significaciones de Estética junto a discentes de un curso superior de Diseño, teniendo en vista la Educación Estética. Se trata de una investigación de cuño cualitativo y exploratorio-descriptivo. Los métodos utilizados fueron la revisión bibliográfica y un estudio de caso. El campo de estudio fue un Curso Superior Tecnológico (CST) en Diseño y los discentes de dicho curso constituyeron el público objetivo de la investigación. En el estudio de caso se utilizó el cuestionario en línea para recoger los datos. Dada la naturaleza cualitativa de los datos, se utilizó el método de los "núcleos de significación" para analizarlos. Se identificaron tres núcleos de significados de Estética: 1) Estética es apariencia; 2) Estética como categorías estéticas; 3) Estética como conocimiento sensible. La presente investigación, al identificar las significaciones de estética según la visión de los alumnos de un curso superior de diseño, ofrece medios para comprender y estructurar una educación estética que permita integrar la estética, el diseño y la educación, con miras a educar estéticamente al hombre para desarrollar su libertad.

Palabras clave: Significación; Educación Estética; Diseño; Educación universitaria

Introdução

A presente pesquisa teve por propósito identificar as significações de Estética junto a discentes de um curso superior de Design, com vistas a respaldar uma educação Estética condizente com os desafios contemporâneos. Nessa direção, a presente investigação volta-se para a Estética, uma vez que a literatura especializada mostra que, de todos os aspectos do Design, os aspectos estéticos são aqueles que se têm mostrado mais refratários a uma objetivação concretamente exequível (COSTA, 2017a). A Estética sempre permeou as discussões acerca do Design, seja pelo viés artístico, filosófico, sociológico, educacional ou científico (BOMFIM, 1998). Os resultados do Design também são passíveis de fruição e de desencadear uma experiência estética, pois o estético não é particularidade do artístico (DZIEMIDOK, 1996), mas do mundo da vida.

Identificou-se na literatura, três principais interpretações para a Estética: 1) Estética enquanto estudo da percepção sensorial e dos conhecimentos adquiridos por intermédio desta; 2) Estética enquanto estudo do belo na natureza, nas atividades do homem e nos objetos por ele criados, sendo estético o belo, o agradável, o sublime, etc.; 3) Estética enquanto estudo da arte.

Entende-se que a Estética deve ser abordada por intermédio de uma acepção ampliada, ou seja, a Estética como experiência integradora das percepções sensorial, comportamental e reflexiva. Assim, a Estética envolve um tipo de experiência que se inicia com a percepção sensorial, que transforma a paisagem corporal e culmina em uma significação acerca de todo o processo. Por essa via, o mundo é o lugar da Estética e este é o caminho que se mostra mais profícuo para se abordar problemas que se circunscrevem à contemporaneidade. Uma obra de arte pode despertar uma experiência estética, assim como um pôr do sol, um carro, uma rua suja, uma vestimenta, um móvel, um edifício, um gesto corporal, um tom de voz empregado na conversa, a imagem de uma instituição etc.

A discussão da Estética no Design considera que o Design dá sentido às coisas (KRIPPENDORFF, 2006). Por tal definição, o termo “criar” vai para além de inventar, pois dar sentido às coisas requer um compartilhamento estético do sentido que se dá na esfera individual e na esfera social. Requer um vibrar em uníssono que não está expresso em fórmulas matemáticas, tampouco na utilidade ou na funcionalidade dos objetos e serviços. A base educacional de um designer deve também considerar um tipo de conhecimento que está para além de questões circunscritas ao útil, ao funcional e ao racional, pois as criações oriundas do campo do Design estão intimamente ligadas ao homem. Deve-se buscar o conhecimento holístico que seja capaz de conjugar racionalidade com sensibilidade e que culmine em um estar estético no mundo.

Vislumbra-se a Educação Estética como uma possibilidade de lançar novos olhares para o homem, para a Estética, para o Design e para a Educação. Aqui, entende-se que a Educação Estética é o elo integrador entre a Estética, o Design e a Educação, uma vez que ela tem por objetivo educar esteticamente o homem para ser livre, ou seja, para pensar por si mesmo, integrando o saber sensível e o saber racional de um lado e, de outro, cuidando para ele não cair nas armadilhas do esteticismo ou do cientificismo.

Percurso metodológico

Esta pesquisa é de cunho qualitativo e exploratório-descritivo. Os métodos adotados foram a Revisão Bibliográfica e o Estudo de Caso. O campo de estudo foi um Curso Superior Tecnológico (CST) em Design Gráfico, ofertado por uma instituição de ensino superior privada. No estudo de caso, utilizou-se o questionário on-line para coletar os dados, devido à restrição de tempo e à quantidade de respondentes. A escolha de tais métodos e da ferramenta justifica-se pelo fato de estar o problema da pesquisa voltado ao estudo do fenômeno em seu contexto (YIN, 2001). Os discentes do referido curso de Design constituíram o público-alvo do estudo. 77 discentes (87,5%) responderam ao questionário.

Duas questões foram colocadas aos respondentes: 01 - No seu entender, o que é estética? 02 - Na sua opinião, para que serve a Estética?

Dada a natureza qualitativa dos dados, utilizou-se o método dos “núcleos de significação” (AGUIAR; OZELLA, 2006) para analisá-los. A identificação dos núcleos de significação (NS) se deu em quatro etapas: 1) realização da “leitura flutuante”; 2) identificação dos pré-indicadores; 3) identificação dos indicadores e 4) identificação dos núcleos de significação. Utilizou-se uma planilha construída com o Excel para elencar os dados e para facilitar o processo de análise dos dados.

Os núcleos de significação sobre Estética

Os NS revelam os modos de pensar, agir e sentir dos respondentes, baseados no movimento dialético de suas vidas. O processo iniciou-se com a leitura flutuante sobre os dados. A seguir, buscou-se relacionar as respostas obtidas, considerando a recorrência das falas, a frequência com que se repetiam nas respostas, as contradições e reiterações internas. Os indicadores identificados estão presentes no Quadro 1.

Quadro 1 Os indicadores identificados 

Questão Indicadores
01 - No seu entender, o que é estética? A Estética diz respeito à aparência; A Estética circunscreve ao belo e ao agradável; A Estética como padronização da beleza e do gosto; Estética diz respeito à harmonia; Estética como formadora da beleza; Estética como Percepção de categorias Estéticas; Estética como algo necessário e superficial; Estética como criação da beleza; Estética como conhecimento; Estética como o senso comum; Estética como coerência visual; Estética como organização; Estudo da Beleza; Estética como Emoção/Sentimento; Estética como Reflexão sobre a beleza; Estética como Avaliação.
02 - Na sua opinião, para que serve a Estética? A Estética intervém nos aspectos relacionados à aparência dos fenômenos; Estética como disciplina de estudo; Estética como veículo de comunicação; A Estética como padronização; A Estética se volta para as categorias estéticas; A Estética como estímulo da percepção; A Estética se volta para o belo e para o harmonioso; A Estética como cuidado da beleza; A Estética como conhecimento sensível; Estética como forma de protesto; Estética como definição do gosto.

Fonte: Os autores (2018).

Com base nas respostas obtidas e detendo-se nos indicadores aglutinados, o próximo passo foi identificar os NS (vide Quadro 2).

Quadro 2 Os núcleos de significação identificados 

INDICADORES NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO
A Estética diz respeito à aparência; Estética como coerência visual; A Estética intervém nos aspectos aparentes dos fenômenos; A Estética como padronização da beleza e do gosto; A Estética serve para instituir padrões; Estética como organização; A Estética como padronização; Estética como avaliação; Estética como definição do gosto; Estética como o senso comum. A Estética diz respeito à aparência
A Estética circunscreve-se ao belo e ao agradável; Estética diz respeito à harmonia; Estética como formadora da beleza; Estética como criação da beleza; A Estética se volta para as categorias estéticas; A Estética se volta para o belo e para o harmonioso; Estética como Percepção de categorias estéticas. A Estética a partir de categorias estéticas
Estética como Emoção/Sentimento; Estética como conhecimento; A Estética como estímulo da percepção; A Estética como conhecimento sensível; Estética como disciplina de estudo; Estudo da Beleza; Estética como reflexão sobre a beleza. A Estética como conhecimento sensível

Fonte: Os autores (2018).

Por fim, realizou-se análise dos núcleos de significação e a análise internúcleos, que serão apresentadas a seguir.

Análise dos núcleos de significação

Buscou-se refletir acerca dos NS, com o propósito de expor os sentidos que o público-alvo atribuía à Estética. O processo iniciou com a análise intranúcleo e finalizou com a análise internúcleo (AGUIAR; OZELLA, 2006). Os resultados serão discutidos a seguir.

A Estética diz respeito à aparência

Este núcleo emergiu de falas dos discentes, tais como: “Estética é a aparência de algo”, “Estética é a aparência visual de algo”, estética “é a aparência externa, visual das coisas.” Percebe-se que é por meio da aparência que se reconhece a própria realidade. A aparência é entendida em seu sentido dicionarizado, que diz respeito à exterioridade e à parecença (PRIBERAM, 2018).

Nesse núcleo, aparência e ser são iguais. Sob a influência da Fenomenologia, a consideração da relação entre parecer e ser deixou de ser feita, pois se algo parece, ele é e é real (ABBAGNANO, 2007). Assim, a aparência e, portanto, a Estética, é “o que você vê [...]”, é a “visão sobre alguma coisa tangível.” O que se sente pelos outros sentidos assume um caráter abstrato. Mas o que é o gosto do chocolate? O toque da pessoa amada? O cheiro de esgoto? Os sons caóticos das ruas? Ora, são dados concretos que são percebidos e que também alicerçam uma experiência estética. De acordo com as falas dos respondentes, tais percepções não contribuem para uma experiência estética, pois não são aparentes. Infere-se que tais informações dificilmente são convertidas em conhecimento. A educação contemporânea poderia estimular a reflexão acerca das informações oriundas de todos os sentidos e de como transformá-las em conhecimento que comunga dados sensíveis e racionais.

No Design, há fatores que explicam a hegemonia da visualidade. Grande parte das publicações utilizadas para o ensino da Estética e presentes na maioria das bibliografias dos cursos de Design centra-se no sentido da visão. Por exemplo, podem ser citadas as obras de Arnheim (1979), Löbach (2000), Bürdek (2006) e Hsuan-Na (2017). As obras de Bürdek (2006) e de Hsuan-Na (2017) ao tratar da Estética, abordam-na pelo viés da visualidade. Não há nenhuma menção aos outros sentidos humanos, tampouco como tais sentidos desempenham um papel fundamental na percepção e na significação daquilo que é o resultado do Design. Não se tem por intenção negar ou emascular a importância do aspecto visual. O que se propõe é que se alargue o horizonte, pois toda a criação humana traz em seu bojo suas múltiplas qualidades estéticas.

O sentido da visão também é proeminente na Estética gestaltista e na Estética behaviorista. Na primeira, a visualidade permeia todas as suas leis e é essa a forma de perceber os fenômenos que está presente nas falas dos respondentes, quando entendem que a Estética coordena “[...] uma distribuição harmoniosa (ou não) de um layout, superfície ou algo próximo disso”. Na Estética Behaviorista, entende-se que é a visão o sentido responsável por estimular o observador, disparando processos de excitação que causam prazer ou desprazer (BOMFIM, 1988). Ao falar que a Estética diz respeito à “beleza plástica de algo ou alguém”, ou que a Estética diz respeito ao “visual agradável e harmonioso”, nota-se que é a sensação de prazer visual que norteia tais considerações. Todavia, tanto o sentido da visão quanto os demais sentidos enfrentam uma “anestesia”, decorrente, dentre outros fatores, do uso instrumental da razão humana e da negação do saber sensível (DUARTE JR., 2004; DAMÁSIO, 2011). Tal negação ainda constitui um obstáculo a ser vencido, com urgência, pela educação contemporânea.

Ainda, muitos dos discentes disseram ser a Estética uma forma de padronização e isto pode ser constatado nas seguintes falas que dizem que a Estética “[...] pode ser considerada como um padrão de beleza” e que Estética é um “Padrão criado do que é feio ou bonito.” Ainda, outro respondente diz entender a Estética como “[...] um julgamento sobre o que é bonito e feio. Bonito é o padrão que tudo e todos devem seguir. Tudo relacionado à beleza.” Em uma sociedade em que quase todos os aspectos recebem a atenção de produtores e vendedores de mercadorias e serviços, que ditam o que se deve vestir, o que se deve consumir, no que se deve crer, etc., tudo é cuidadosamente ensinado pela mídia, aliada a poderosas instituições industriais. O que se vê são padrões ditados e disseminados, em que se muda de opinião e de estilo constantemente. A beleza passou a ser padronizada a partir da estreita visão calcada em modelos ideais de harmonia e pureza, todavia decalcada na concepção de que o belo implica padrões consagrados pelo grande público suscetível às modas e aos ditames da indústria cultural. A experiência da beleza é imposta verticalmente e, assim, não pode ser plenamente vivida, pois não há lugar para tal experiência em uma sociedade que se preocupa em demasia com o acúmulo de bens e com a quantidade de “likes” nas redes sociais.

Embora compreensível, uma vez que a aparência é privilegiada, nota-se que a percepção de mundo dos respondentes necessita de urgente alargamento para que se possa ganhar qualidade e profundidade na percepção e na significação dos inúmeros fenômenos que se manifestam ao seu redor. Isso é especialmente relevante no Design, que além de conceber aquilo que está mais próximo das pessoas, preocupa-se também com questões que vão do seu comportamento a suas experiências.

A Estética a partir de categorias estéticas

O presente núcleo alinha-se com a interpretação de que a Estética se restringe ao estudo do belo na natureza, nas atividades do homem e nos objetos por ele criados (BONFIM, 1998).

Há várias acepções para o termo “categoria estética”, orientadas tanto pelas abordagens estéticas quanto pelas correntes estéticas. Entende-se por categoria estética a propriedade característica do juízo estético, com a qual se pode caracterizar um fenômeno. Um fenômeno possui valor estético quando este é preferido pelo prazer que suscita.

Há diversas categorias estéticas, tais como o belo, o sublime, o trágico, o feio, o cômico, o grotesco, a harmonia, o patético, o gracioso, o horrível etc., e tais categorias são temporais. Por exemplo, no século XVIII, houve o desenvolvimento das reflexões acerca do sublime e do grotesco; no século XIX, houve a legitimação do feio e as modificações do belo, com o intuito de se encontrar um ordenamento sistemático, envolvendo categorias como o sublime, o idílico etc. (CARCHIA; D’ÂNGELO, 2009). Ainda, a associação entre o belo e o bom gerou a associação entre o feio e o mau (CARCHIA; D'ÂNGELO, 2009). No século XX, há o resgate do feio como um instrumento da luta modernista contra o classicismo (CARCHIA; D’ÂNGELO, 2009). As vanguardas dispuseram uma variedade de novas categorias estéticas e o feio passou a ser grotesco, trágico ou perturbador e sua apreciação pode despertar prazer. Assim, o feio pode ser identificado em diferentes contextos, sem que cause desprazer, figurando até mesmo nas estórias infantis.

Acerca do belo, a Estética psicológica resgatou os conceitos de ordem e de perfeição, uma vez que ambos compõem uma beleza que é harmônica (BOMFIM, 1988). Na abordagem gestaltista, a beleza personifica-se na boa forma, sendo esta resultante de sete leis. As leis da Gestalt são importantes para o estudo do Design, figurando na maioria das ementas dos cursos e são encontradas em diversas obras sobre o assunto. As leis da Gestalt constituem um importante material didático utilizado nas diversas habilitações presentes nos cursos superiores de Design. Ora, mas a Estética vai para além de categorias e categorizações. Não se nega a importância de se abordar as categorias estéticas. No entanto, isso é apenas parte de algo maior. A abordagem gestaltista é uma das possíveis formas de leitura estética e recomenda-se que este conteúdo seja ministrado pari passu com outros conteúdos que aprimoram e aprofundam a leitura estética.

A quantidade de categorias estéticas citadas pelos respondentes limitou-se à beleza, à harmonia, ao agradável e ao perfeito. Infere-se que, dentre todas essas categorias estéticas, a “beleza” ocupa um lugar central, sendo esta resultante da convergência das demais categorias. Tal limitação dificulta a elaboração de uma reflexão consonante com os desafios atuais. Deve-se admitir que o feio, o horrível e a imperfeição também despertam uma experiência estética que não seja necessariamente indesejável. Por exemplo, é requerido que uma sala de interrogatório evoque desprazer, ainda que se encontrem, em sua estrutura, a harmonia e a beleza das formas, das cores, das texturas, etc. Ao ressaltar aquilo que se mostra esteticamente desagradável, haverá maior probabilidade de se atingir os propósitos para o qual a sala de interrogatórios foi projetada. Os serviços oferecidos por clínicas de fisioterapia não têm como pano de fundo a beleza. Entende-se que tais conceitos necessitam serem pensados esteticamente para que se possa estabelecer uma relação entre sujeito e fenômeno que tem potencial para culminar numa relação entre sujeito e mundo. É esse agir estético sobre o mundo que fará o homem ir além de si, possibilitando um sensus communis estético (SCHILLER, 2002), que pode ser universalmente compartilhado. É por essa via que o homem se sente, se entende como pertencente a uma comunidade e eleva o outro ao mesmo patamar em que se encontra em um agir empático no mundo.

A Estética como conhecimento sensível

Este núcleo de significação, a Estética como conhecimento sensível, foi o menos presente. Apareceu em falas que entendem que a Estética está relacionada com as “[...] características que podem ser percebidas pelos sentidos... relações de conhecimento ou sentimento”.

O baixo indicativo do entendimento da Estética como conhecimento sensível por parte dos discentes pode ser, em grande medida, explicado pela abordagem que se deu à Estética nos períodos anteriores de estudo, como no ensino médio. Tratada de forma aglutinada e superficial, mais pelo viés da Filosofia da Arte ou da História da Arte, assunto abordado dentro de disciplinas como Educação Artística ou Arte-educação (BARBOSA, 2006), não é de se espantar que o aprofundamento acerca da temática se dê somente em alguns cursos de graduação ou em cursos de pós-graduação.

A literatura mostrou que uma das interpretações que cabe à Estética é a de que esta se ocupa do estudo da percepção sensorial e dos conhecimentos adquiridos por intermédio desta percepção. Como postulou Baumgarten (1993), os fenômenos sensíveis são objetos da Estética, ou seja, a Estética é a teoria do conhecimento sensível, e o que se conhece por intermédio da mesma é análogo ao conhecimento racional. Disso, entende-se que a Estética, voltando-se para o conhecimento sobre a realidade que se pode obter mediante a percepção sensorial, abarca todos os fenômenos que se manifestam na realidade.

O conhecimento sensível deve ser estimulado para atuar em um patamar anterior ao da simbolização. A miríade de fenômenos que se manifestam na realidade humana, como as cores, os sabores, os odores, os sons, as formas, as texturas, os movimentos etc., constituem manifestações estéticas que estão ao alcance de todos os homens, de diferentes idades, poder aquisitivo, localização geográfica etc. São manifestações estéticas capazes de proporcionar prazer ou desprazer e têm potencial para reconciliar a razão e o sentidos e, assim, dar nascimento a uma sociedade de homens harmoniosos, tal como propõe Schiller (2002). As dificuldades e os problemas da contemporaneidade não tiram do homem a sua capacidade de se emocionar. Assim, o conhecer pela sensibilidade, satisfatoriamente exercido, potencializará tal capacidade tanto na confrontação com a arte quanto nas manifestações de outros fenômenos cotidianos, como, por exemplo, a beleza de uma rua grafitada ou a feiura de um rio poluído.

A Estética, abordada como filosofia da arte ou estudo da beleza, despreza a Aisthesis. Ora, os sabores, os odores, as formas, as cores, os sons etc. não são destinados somente para a apreciação de um ponto de vista privilegiado. São para serem sentidos, experimentados, penetrados, aderidos em uma comunhão carnal com todas as zonas erógenas da sensibilidade humana, uma vez que a Aisthesis envolve todo o corpo no sentir.

Assim, o que o aprendiz necessita é de uma educação que o conduza ao conhecimento sensível que se pode obter com o olhar, com a audição, com o paladar, com o tato e com o olfato. Com os sentidos apurados, o homem terá melhores condições para vivenciar uma experiência estética cada vez mais plena.

Há, de outro lado, a necessidade de empreender esforços para evitar as armadilhas de se privilegiar apenas uma forma de conhecer. Ora, é impossível a aquisição de conhecimentos desprovidos de sensibilidade. O conhecimento sensível está pleno de razão, sendo que esta só se constrói a partir do conhecimento sensível (DUARTE JR. 2004; DAMÁSIO; 2011).

Do ponto de vista da Estética abordada pela Psicologia, vê-se que o homem sempre está em busca daquilo que lhe é ou lhe parece ser uma promessa de felicidade, tanto que Freud, em sua teoria, tomou como fundamental tal fato, conceituando este impulso à felicidade que rege o homem como “princípio do prazer” (BOMFIM, 1988).

A percepção dos discentes que entendem a Estética como conhecimento sensível necessita de maior aprofundamento e clareza. No campo do Design, há trabalhos recentes que ampliam o escopo da Estética, levando-a a áreas que lidam com questões que não estão totalmente relacionadas com a materialidade. As pesquisas de Cho (2013) e de Costa (2017a), por exemplo, voltadas para o campo do Design para serviços, entendem que a dimensão Estética envolve os sentidos, o comportamento e a significação do ser humano, quando estes lidam com o imaterial. Os novos desafios envolvem compreender que o designer deve projetar e solucionar problemas de toda uma cadeia de valor. Isso significa que o Design está também caracterizado por um senso multidisciplinar e sistêmico que necessita, no processo projetual, envolver diferentes atores, métodos, processos e ferramentas, advindos de diversas áreas do saber.

Análise internúcleos

A análise internúcleos tem com propósito, aclarar as semelhanças e/ou as contradições que revelam o movimento de significação.

Os núcleos de significação aqui arrolados estão alinhados com a história do Design desde os idos da Bauhaus, aquela que é considerada como a escola de Design mais importante e que, de certa forma, ainda baliza o que se entende por Design na contemporaneidade. Para atender seus propósitos, a concepção estética adotada na Bauhaus partia da arte como meio privilegiado para sensibilizar o homem. Depois, passou a privilegiar a forma e a formação da forma, mas sem abrir mão dos preceitos artísticos. Assim, a meta de toda atividade plástica estaria voltada para a construção e para a decoração e estas eram tidas como sendo as tarefas mais nobres das artes que deveriam andar pari passu com a técnica. Com o fechamento da Bauhaus em 1933, houve uma disseminação de seus ideais (COSTA, 2017b).

Não surpreende que as significações identificadas para Estética estejam circunscritas à aparência, à beleza e à categorização. O ponto de inflexão está na significação que entende a Estética como conhecimento sensível. Aqui se encontra o ponto para o qual se deve direcionar maiores esforços para alargar uma visão que, ao menos em potência, mostra-se mais adequada para o enfrentamento dos desafios contemporâneos.

Considerações finais

O propósito de identificar as significações de Estética junto a discentes de um curso superior de Design, tendo em vista a Educação Estética, foi cumprido e os métodos e ferramentas utilizados mostraram-se eficazes.

Esta pesquisa confirmou que está na aparência a principal significação de Estética. Também, apontou que os respondentes entendem as categorias estéticas como sinônimo de Estética. Mais exatamente uma Estética calcada na beleza. Categorias negativas, como o feio, por exemplo, quando existem, só ganham corpo como categorias opostas. Viu-se que tal significação, também, está atrelada ao sentido da visão.

Ainda, o estudo mostra que há o entendimento de Estética como a ciência do conhecimento sensível, mesmo que timidamente. Isso aponta para o fato de que há a necessidade de se abordar a Estética de forma mais ampliada, pois os desafios inerentes ao Design contemporâneo exigem uma abordagem também contemporânea.

A significação de Estética que impera nos cursos de Design circunscreve-se à visualidade. Há de se vislumbrar as contribuições que podem advir da relação entre o Design e outras áreas do saber, tais como a Educação, a Gestão, a Antropologia, a Filosofia etc. Também, há de se discutir como o Design pode contribuir para um mundo melhor e como o próprio Design pode se relacionar adequadamente com o homem. Há áreas nas quais o Design adentrou e que necessitam de pesquisas mais aprofundadas, como o Design & Emoção, o Design para Serviços, a Sustentabilidade, o Design Thinking e o User Experience.

A relação entre Estética e Design está na abordagem acerca do ser humano. Antes de serem clientes ou usuários, pessoas são pessoas. De outro lado, há o mercado e suas demandas. O desafio que se apresenta é possibilitar uma visão integradora que permita que um resultado do Design seja útil, usável e desejável do ponto de vista das pessoas e efetivo, eficiente e distinto do ponto de vista daquele que solicita o trabalho de um profissional do Design.

Vislumbra-se a Educação Estética como uma possibilidade de lançar novos olhares para o homem, para a Estética, para o Design e para a Educação. A presente pesquisa, ao identificar as significações de estética segundo a visão dos discentes de um curso superior de Design, oferece meios para compreender e estruturar uma abordagem educacional capaz de integrar a Estética, o Design e a Educação, com vistas a educar esteticamente o homem para desenvolver a sua liberdade. Em outras palavras, para preparar o homem para pensar por si mesmo, integrando o saber sensível e o saber racional e cuidando para que não caia nas armadilhas do esteticismo ou do cientificismo.

Referências

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Recebido: 04 de Agosto de 2018; Aceito: 22 de Janeiro de 2019

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