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Revista Diálogo Educacional

versão impressa ISSN 1518-3483versão On-line ISSN 1981-416X

Rev. Diálogo Educ. vol.19 no.63 Curitiba out./dez 2019  Epub 30-Jan-2020

https://doi.org/10.7213/1981-416x.19.063.ds05 

Dossiê

Religiosa, imigrante, mulher: Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas num olhar transnacional (1895-1917)

Religious, immigrant, woman: Missionary Sisters of Saint Charles Borromeo - Scalabrinians from a transnational point of view (1895-1917)

Religiosa, inmigrante, mujer: hermanas misioneras de San Carlos Borromeo - Scalabrinianas en una mirada transnacional (1895-1917)

a Universidade de Caxias do Sul (UCS), Caxias do Sul, RS, Brasil. Doutora em Educação. Bolsista PQ Cnpq e FAPERGS, e-mail: taluches@ucs.br

b Universidade de Caxias do Sul (UCS), Caxias do Sul, RS, Brasil. Mestra em Educação, e-mail: marinamatiello@gmail.com

c Università degli Studi del Molise (UniMol), Molise, Campobasso, Itália. Doutor em Educação, e-mail: barausse@unimol.it


Resumo

O objetivo do presente artigo é analisar as transferências culturais e os processos de hibridização que marcam e constituem os primeiros anos da congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas, em sua chegada ao Brasil, com especial atenção ao Rio Grande do Sul em uma abordagem transnacional. O recorte espaço-temporal considera a migração de um pequeno grupo de irmãs da Itália e seu estabelecimento, inicialmente em São Paulo e, depois, a vinda para o Rio Grande do Sul e a emergência das primeiras escolas em solo gaúcho. Num diálogo entre a História Cultural e a História da Educação e por meio da análise documental histórica de correspondências, jornais, fotografias e relatórios, compreendemos o desafio do movimento migratório e algumas das possíveis ressonâncias na constituição da própria congregação. A experiência da migração de religiosas-mulheres produziu marcações, seja pelas trocas culturais, pelas confrontações com diferenças e com os processos de negociação construídos nos deslocamentos. Concluímos que a congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeu, Scalabrinianas, constitui-se numa condição transnacional, entre o prescrito na Itália e o vivido no Brasil, num deslocamento que envolveu inventividades e negociações nas dimensões do étnico, das relações de gênero e do próprio catolicismo na emergência de suas escolas.

Palavras-chave: Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas; Transnacional; História da Educação

Abstract

This article aims at analyzing the cultural exchange and the hybridization processes which characterize and constitute the first years of the congregation of the Missionary Sisters of Saint Charles Borromeo, Scalabrians, upon their arrival in Brazil, with a focus on the state of Rio Grande do Sul and from a transnational point of view. The space-time delimitation regards the migration of a small group of sisters from Italy and their establishment, initially in São Paulo and, afterwards, their arrival in Rio Grande do Sul and the foundation of their first schools in the state. In a dialogue between Cultural History and the History of Education, and through the historical documental analysis of correspondence, newspapers, photographs and reports, we come to understand the challenges of migration and its ripple effect on the very constitution of the congregation. The experiences of migration by missionary women produced markings, be it from cultural exchanges, struggles with differences and the bargaining processes created by the displacement. We conclude that the congregation of the Missionary Sisters of Saint Charles Borromeo - Scalabrians is created under a transnational condition, between what was prescribed back in Italy and what was experienced in Brazil, in a displacement that involves innovation and negotiation regarding issues of ethics, gender relations and Catholicism itself in the development of their schools.

Keywords: Missionary Sisters of Saint Charles Borromeo - Scalabrians; Transnational; History of Education

Resumen

El objetivo de este artículo es analizar las transferencias culturales y los procesos de hibridación que marcan y constituyen los primeros años de la congregación de las Hermanas Misioneras de San Carlos Borromeo, Scalabrinianas, a su llegada a Brasil, con especial atención a Río Grande do Sul en una mirada transnacional. El enfoque espacio-temporal considera la migración de un pequeño grupo de hermanas de Italia y su establecimiento, inicialmente en São Paulo y, más tarde, la llegada a Rio Grande do Sul y la aparición de las primeras escuelas en Rio Grande do Sul. En un diálogo entre la Historia Cultural y la Historia de la Educación y a través del análisis documental histórico de correspondencias, periódicos, fotografías e informes, entendemos el desafío del movimiento migratorio y algunas de las posibles resonancias en la constitución de la propia congregación. La experiencia de la migración de mujeres religiosas produjo marcas, ya sea por los intercambios culturales, por enfrentamientos con las diferencias y con los procesos de negociación basados en los desplazamientos. Concluimos que la congregación de las Hermanas Misioneras de San Carlos Borromeo - Scalabrinianas es una condición transnacional, entre lo que se prescribe en Italia y lo que se vive en Brasil, una dislocación que involucró la inventiva y las negociaciones en las dimensiones de las relaciones étnicas, de género y el propio catolicismo. en la emergencia de sus escuelas.

Palabras clave: Hermanas Misioneras de San Carlos de Borromeo - Scalabrinianas; Transnacional; Historia de la educación

Migram as sementes nas asas do vento. Migram as plantas de um continente a outro, levadas pelas correntes das águas. Migram os pássaros e os animais. E mais do que todos, coletiva ou individualmente, migra o próprio homem [...].

(CONGREGAÇÃO, 2012, p. 7)

É desejo da Madre Geral que em todas as casas da Congregação, encontrando-se as Irmãs pela manhã se saúdem com a devota invocação: “Louvado seja N. Senhor Jesus Cristo” precedido pela resposta: “Sempre seja louvado”. Após o café da manhã as Irmãs beijarão o crucifixo da própria Superiora”.

(Madre Assunta Marchetti, 1929)

Introdução

O deslocamento em massa de emigrados da península itálica no último quartel do século XIX resultou em um amplo processo de debate e iniciativas em torno do acompanhamento, da tutela dos emigrados por parte da Igreja Católica. Um dos bispos católicos italianos que mais se mobilizou em torno da migração foi Giovanni Battista Scalabrini que, como na epígrafe de abertura do presente texto, denota o quanto migrar tinha se tornado parte do cotidiano na Itália recém-unificada. A segunda epígrafe, de Madre Assunta, sinaliza para trecho de uma correspondência1 que buscava ordenar o cotidiano da Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas apontando para rituais de fé, submissão/hierarquia e ordem. Giovanni Battista Scalabrini e Madre Assunta Marchetti são os sujeitos estruturantes em torno dos quais se organizou a congregação que é foco desta análise.

Desse modo, o objetivo do presente artigo é analisar as transferências culturais e os processos de hibridização que marcam e constituem os primeiros anos da congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas, em sua chegada ao Brasil, com especial atenção ao Rio Grande do Sul em uma abordagem transnacional. O recorte espaço-temporal considera a migração de um pequeno grupo de irmãs da Itália e seu estabelecimento, inicialmente em São Paulo e, depois, a vinda para o Rio Grande do Sul e a emergência das primeiras escolas em solo gaúcho.

Num diálogo entre a História Cultural e a História da Educação e por meio da análise documental histórica de correspondências, jornais, fotografias e relatórios, compreendemos o desafio do movimento migratório e algumas das possíveis ressonâncias na constituição da própria congregação. A experiência da migração de religiosas-mulheres produziu marcações, seja pelas trocas culturais, pelas confrontações com diferenças e com os processos de negociação construídos nos deslocamentos.

O artigo está organizado em dois momentos analíticos: o primeiro situa a emergência da congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo como parte do projeto do Bispo Giovanni Battista Scalabrini, sua relação com a Igreja Católica e os processos migratórios. O segundo movimento aborda a migração para o Brasil, São Paulo e, após, o novo deslocamento, de São Paulo para o Rio Grande do Sul, analisando as primeiras iniciativas escolares.

1 - Primeiros movimentos e negociações para a constituição da congregação

A formação de novas congregações religiosas femininas instituídas no decorrer do século XIX ocorreu pelo investimento que a Igreja fez no desejo de revigorar o sentimento religioso feminino e de fazer amadurecer na mulher católica uma maior consciência do próprio papel e de suas tarefas familiares. Outra finalidade foi a de proteger dos “graves perigos” aos quais era exposta a família por desprendimento dos vínculos tradicionais e pelos fenômenos de desagregação produzidos pelos processos de modernização econômica e social, urbanização, expansão capitalista, além da secularização dos modos de pensar e dos costumes. Como afirma Perrot (2005, p. 272) a “[...] exaltação da diferença, do feminino (figura da Virgem Maria) pode alimentar uma forte consciência de gênero e, com isso, um feminismo cristão, às vezes missionário e combativo, baseado na promoção dos valores femininos como forma de salvação”.

No caso da congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos, para além dessa questão, está o intenso processo de emigração que marcava a península itálica na segunda metade do século XIX e que embasou o projeto de acompanhamento e tutela dos emigrantes proposto pelo bispo Scalabrini. É importante considerar esse contexto de fundação da congregação e implementação das suas obras, pois “até os anos 1880, as intervenções promovidas pela Igreja italiana para a tutela dos emigrantes foram limitadas e revestidas, no conjunto, por um caráter episódico e marginal” (SANI, 2017, p. 143). Foi nos pontificados de Leão XIII e Pio X que se presenciou uma mudança na atuação da Igreja, podendo-se citar o empenho de Pio X

[…] tanto na intensificação de iniciativas de obras de assistência e na centralização das políticas para apoio às cúrias pastorais dos migrantes, quanto no recrutamento, formação cultural e espiritual do clero destinado a animar a vida religiosa das comunidades de imigrantes italianos no exterior. (SANI, 2017, p. 143).

O projeto de Scalabrini marca o carisma das Irmãs de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas, assim como o movimento realizado pelas próprias Irmãs para atenderem migrantes instalados no Brasil. A Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas, foi fundada no final do século XIX, tendo como missão o cuidado com o migrante, especialmente o italiano. Foi idealizada por Giovanni Battista Scalabrini, bispo italiano que se preocupou com a mobilidade humana fundando três instituições - a masculina (1887), a feminina (1895) e a de leigos (1889) para o atendimento dos que emigravam, principalmente para as Américas. Como expressa Fongaro (1998):

Dom Scalabrini é o bispo italiano que ligou seu nome ao fenômeno migratório [...]. Seu mérito, além de ter adotado para eles uma pastoral “específica” que consistia na transmissão e conservação da fé mediante a própria cultura (língua, sacerdotes, religiosidade popular, etc., nacionais) foi o de haver interessado a Igreja universal pelo problema migratório, que viu de fato um ‘sinal dos tempos’, e nele fazer sentir a sua presença, ‘para fermentar o evangelho a realidade das transmigrações e, possivelmente, fazer delas um meio para o cumprimento de sua missão’ (FONGARO, 1998, p. 98-99).

Tendo como projeto o atendimento dos que emigravam promovendo “Religião e Pátria”, o entendimento era de que ao migrar a intensidade das confrontações com o novo, o impacto com o diferente e o diverso poderia afastar os católicos de sua fé. Assim, Scalabrini propunha que os emigrados fossem acompanhados e/ou recebidos em seus destinos por missionários que os acolhessem, reforçando a fé pela manutenção das práticas culturais próprias dos espaços de proveniência. Assim, os missionários foram orientados a pregar nas missas e ministrar os sacramentos, além de criar escolas e difundir jornais católicos. Assim, o intuito foi manter os laços de pertencimento com a pátria por meio do entorno cultural inclusive com a língua para que o sentido da religiosidade, do catolicismo também fosse preservado. Nesse sentido, a escola foi entendida como espaço privilegiado como expressou Scalabrini (1979, p. 217):

[...] essa atividade religiosa deve ser completada pela escola, onde os filhos dos migrantes possam aprender, juntamente com as primeiras noções da leitura, da escrita e da matemática, a língua do país que será a sua nova pátria, bem como a língua pátria de origem, já que um elemento muito importante para a conservação da fé é precisamente o sentimento das origens, [...].

Conservar a fé pela preservação do sentimento de “origem” mesmo que distante da Pátria. Foi com esse intuito que logo após a constituição da congregação masculina, de acordo com Baggio (2011), a obra dos missionários foi considerada incompleta por Scalabrini, justamente por não contar com a presença de Irmãs, especialmente no Sul da América. Inicialmente, existia a intenção que as Irmãs tivessem um estilo de vida semelhante ao das dioceses francesas, vivendo em pequenas comunidades, dedicando-se ao catecismo, ministrando o ensino elementar e, se possível, assistindo aos doentes. “A primeira tentativa foi a de encaminhar para a assistência aos emigrantes as “Missionárias de Codogno”, isto é, as Missionárias do Sagrado Coração, fundada por Santa Francisca Xaxier Cabrini” (FRANCESCONI, 1975, p. 15), mas como a congregação Cabriniana não ficou limitada à ação aos emigrantes e Scalabrini “desejava que as suas religiosas tivessem a mesma finalidade dos seus Missionários” (FRANCESCONI, 1975, p. 16), escreveu à Madre Cabrini, no dia 19 de março de 1889, agradecendo o trabalho realizado pelas irmãs e justificando a necessidade de trabalhar com os emigrantes, especialmente italianos.

Em busca de um trabalho mais efetivo com os emigrantes, Scalabrini buscou as “Filhas de Sant’Ana, congregação fundada pela Serva de Deus, Rosa Gattorno, do qual obteve a liberação de algumas Irmãs para o hospital italiano Cristóvão Colombo, fundado em New York por Pe. Francisco Morelli” (FRANCESCONI, 1975, p. 16). No entanto a parceria não teve continuidade, pois poucos meses depois “a fundadora retirou as Irmãs porque as Constituições não permitiam que elas se dedicassem à coleta de esmolas, recursos, então, em voga na América para sustentar as obras beneficentes” (FRANCESCONI, 1975, p. 16).

O empenho de Scalabrini para fundar a congregação feminina foi reforçado por Padre José Marchetti, que teve uma decisiva participação ao presenciar o sofrimento vivido por um pai de uma criança com a morte da mãe da mesma no navio. Marchetti se comprometeu a cuidar da criança e assim o fez ao deixá-la em uma casa religiosa (SLOMP; BARBIERI, 1997, p. 30). De acordo com Signor (1986), em carta de 31 de janeiro de 1895, Marchetti informou Scalabrini sobre seus planos de construção de um orfanato, pois verificou a recorrência de órfãos entre os emigrados e a necessidade de assistência. Para que o orfanato fosse viabilizado era fundamental a presença de irmãs, pois “crianças, idosos, doentes e pobres constituíam os interlocutores privilegiados de uma mulher dedicada às tarefas caritativas e de socorro, a partir de então, organizadas no trabalho social” (PERROT, 2005, p. 252). As qualificações para o trabalho no orfanato, por exemplo, eram consideradas como “naturais”, “inatas” das mulheres, em que a abnegação, o devotamento ao cuidado das crianças, a organização, a limpeza e a disciplina fossem estimuladas. As Irmãs com comportamento delicado, acolhedor e, preferencialmente, submisso poderiam instruir e educar para a fé.

Na busca pela “fundação de uma Congregação de Missionárias para se dedicarem à instrução e à formação cristã da juventude e das obras sociais em geral” (CONGREGAÇÃO, 1965, p. 12), Pe. Marchetti anuncia à Scalabrini uma solução quase doméstica por intermédio de carta: “partirá na expedição de julho minha mãe, com as Irmãs, duas noviças que estão em Florença para exercitar-se no espírito de sacrifício e no amor a Deus; duas estão aqui e assim teremos 7 ou 8. Deo Gratias.” (MARCHETTI, 1895apudSIGNOR, 1986, p. 166). Por meio do exposto se entende que a Congregação iniciou para auxiliar nas obras dos missionários Scalabrinianos, sendo o Padre Marchetti considerado cofundador, junto à sua irmã, Assunta Marchetti2. Assunta aceitou fazer parte da Congregação e esteve à frente das Missionarias e de diferentes obras durante sua vida. Analisando a história da congregação, Assunta Marchetti foi um importante protagonista seja para efetivar a obra por meio de iniciativas vinculadas ao carisma da congregação, seja para a organização dos princípios que orientaram seu cotidiano. Destaca-se ainda que a própria mãe do Pe. Marchetti participou da Congregação, podendo-se constatar, conforme afirma Signor (2007) que o início da congregação foi marcado pela informalidade, pois não foi encontrado nenhum decreto de criação como requerido pela prática canônica.

Signor (1986, p. 166) refere que “a Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo começou a tomar forma em Camaiore, província de Lucca, no outono de 1895”, onde Padre Marchetti reuniu o primeiro grupo de candidatas que estava disposto a iniciar uma vida religiosa, destinado a exercer sua primeira missão no Orfanato Colombo. A fundação da Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas ocorreu no dia 25 de outubro de 1895, na cidade de Milão, Itália, quando Dom Scalabrini admite os votos perpétuos do Rev.mo Padre José Marchetti e, na mesma cerimônia, emitem os votos de pobreza, castigo e obediência por seis meses, nas mãos do fundador, às seguintes candidatas: “Carolina Marchetti, Assunta Marchetti, Angela Larini e Maria Franceschini. As duas primeiras, respectivamente, mãe e irmã do Padre Marchetti e as duas últimas antigas paroquianas” (CONGREGAÇÃO, 1965, p. 12).

Os votos de castidade, pobreza e obediência, como “Servas dos órfãos e abandonados no exterior” e a cruz missionária das mãos do fundador Dom Giovanni Battista Scalabrini representam, simbolicamente, o início do que seria, mais tarde, a congregação. Em um primeiro momento, conforme afirma Pe. Marchetti em carta a Scalabrini, datada de 4 de abril de 1895, as missionárias seriam consideradas damas de caridade e “quando tiverem dado prova, poderão realmente formar uma Congregação; são muito necessárias e sinto que Jesus as quer para afastar um mal na Imigração, que os Padres não poderiam remover” (SIGNOR, 1986, p. 166). Não houve tempo para formação ou preparo, já que no dia 27 de outubro de 1895, o grupo embarcou para o Brasil. Chegaram em 20 de novembro do mesmo ano. O deslocamento migratório representava um desafio ainda maior para aquelas mulheres e religiosas. Novas referências culturais e outros modos de vida lhes foram apresentados. Para além do oceano, aquelas primeiras religiosas tiveram que transpor e negociar com o diferente. O deslocamento cultural produziu interstícios entre o que era conhecido e o novo que se descortinava com o trânsito. Mestiçagem e hibridismo, migrar foi vivenciar o lugar da fluidez, do movimento que no fluxo impactou o modo de viver, pensar e se posicionar no mundo. Os primeiros anos no Brasil foram marcados por instabilidade, mudanças e processos de adaptação. Apenas em 1912, Madre Assunta Marchetti assumiu a direção da congregação e fundou a Sede Geral da Congregação junto à seção feminina do Orfanato Cristóvão Colombo, localizada na Vila Prudente, São Paulo.

Apresentamos a seguir uma fotografia com as primeiras missionárias vestindo hábito e portando objetos religiosos, podendo destacar a cruz e, supostamente, a Bíblia. As Irmãs, ainda consideradas damas de caridade no momento do registo, foram organizadas para o retrato, chamando a atenção a Irmã que está de pé, Clarice Baraldi, o que poderia ter o intuito de passar a impressão de naturalidade e, talvez, de certa integração do grupo. Podemos ver, da esquerda para a direita, Angelina Meneguzzi, Ângela Larini, Assunta Marchetti, Camila Dal Ri, Clarice Baraldi e Maria Franceschini.

Fonte: CONGREGAÇÃO (2014, p. 30).

Figura 1 Primeiras religiosas scalabrinianas 

O registro fotográfico nos permite lembrar que o espaço dado ao corpo é aquele da docilidade, da decência na apresentação da roupa, na retidão do gesto, na mansidão do olhar, “mulheres que se deseja silenciosas” (PERROT, 2005, p. 248). A roupa é um código que representa, pela aparência, o que se quer que seja visto, pensado e sentido - austeridade, discrição e recato. Portar objetos da fé - cruz, Bíblia - imprimem o sentido central da representação - propagadoras da fé e da palavra de Deus. E foi com essa “missão” e buscando realizar sua “vocação” que as Irmãs constituíram a Congregação e suas obras, seguindo o prescrito no projeto de Scalabrini na Itália, mas efetivando-o no contexto brasileiro.

2 - A congregação no Brasil e no Rio Grande do Sul

Do grupo de Irmãs que vieram ao Brasil em 1895, já nos primeiros anos de 1900, restava apenas Madre Assunta, o que explica o fato de Assunta tornar-se uma referência para a Congregação, tendo assumido o governo geral por diferentes gestões no período de estudo delimitado nesta pesquisa. Signor (1986) auxilia na compreensão ao mencionar a saída da Congregação de Carolina Marchetti, mãe de Assunta, em 1897, que precisou retornar para a Itália a fim de assistir a família, bem como o falecimento de Angela Larini (em 1899) e de Maria Franceschini (em 1902), ambas vítimas de tuberculose. As perdas de Angela Larini e Maria Franceschini denotam as muitas fragilidades e impactos sofridos por essas primeiras religiosas scalabrinianas. Além disso, Irmã Maria Bassi e Camila Dal Ri se retiraram da Congregação após o fim da fusão com as Apóstolas do Sagrado Coração de Jesus3.

Pode-se afirmar que a congregação se constituiu a partir das necessidades percebidas e do fazer cotidiano, tendo iniciado suas atividades, efetivamente, com o Orfanato Cristóvão Colombo, cuja pedra fundamental foi lançada no dia 15 de fevereiro de 1895 e em 8 de dezembro do mesmo ano o orfanato foi inaugurado. O estabelecimento que recebia órfãos, de qualquer nacionalidade, no início foi dividido em seção masculina e feminina (SIGNOR, 1986, p. 165). Isso porque:

[...] o edifício do Ipiranga, depois seção masculina do Orfanato, estava ainda em fase de acabamento, e já Marchetti encaminhava a construção do novo edifício, em Vila Prudente, que viria abrigar a seção feminina. O terreno de Vila Prudente foi doação da Sra. Maria do Carmo Cypariza Rodrigues e dos Irmãos Falchi (FRANCESCONI, 1973 apudSIGNOR, 1986, p. 165).

A seção feminina do orfanato Cristóvão Colombo só foi inaugurada em agosto de 1904. A morte inesperada do Padre José Marchetti em fins de 1896 provocou a paralização da obra por algum tempo. Scalabrini esteve presente na inauguração, ocasião em que também visitou os missionários e as regiões em que atuavam no atendimento de imigrantes no Brasil (BAGGIO, 2011) conforme se observa na Figura 2.

Fonte: Museu dos Padres Scalabrinianos - Piacenza/Itália.

Figura 2 Scalabrini na inauguração da Seção Feminina do orfanato Cristóvão Colombo, 1904  

Na Figura 2 é possível observar indícios da preparação do grupo para o registro fotográfico. A organização dos padres, a disposição das 10 irmãs e as fileiras de meninas atendidas no Orfanato. Como figura de destaque estão Scalabrini que está sentado no meio ao lado de outro religioso com vestuário semelhante ao do então bispo. A partir da análise da imagem e correlação com o recorte temporal sabemos que se trata do 12º bispo de São Paulo, Dom José de Camargo Barros. As alunas estão com vestidos semelhantes havendo apenas duas com tecidos de estampas diferentes. O cuidado com a apresentação das meninas pode ser evidenciado, pois as que não estão com os cabelos curtos, estão com o cabelo preso, arrumado, indicando cuidado com a aparência e a higiene. Merece destaque as irmãs colocadas entre as alunas permitindo pensar no cuidado e na vigilância. Pela postura delas e havendo a presença dos bispos Scalabrini e Barros, entende-se que nesse contexto era necessário manter ainda mais a disciplina para que as 66 alunas estivessem adequadas para o registro. Duas irmãs, que estão dispostas na última fileira (de baixo para cima) têm uma das mãos sobre o ombro de duas estudantes. Essa postura marca o controle na fileira que não tinha a presença de irmãs. As menores colocadas na frente, sentadas aos pés dos religiosos. As demais dispostas também obedecendo certa ordem de tamanho, estando as menores mais na frente e as maiores nas fileiras atrás. A maioria das meninas está na mesma posição com mãos sobrepostas e olhando para frente. Algumas delas, especialmente as menores, descuidaram da pose4, para a qual, possivelmente, foram colocadas. Se no registro estava visível o controle do corpo, é possível afirmar que a disciplina estava presente também nas práticas educacionais. “Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e lhes impõe uma relação de docilidade-utilidade” são o que Foucault (2010, p. 133) denomina de “disciplinas”. No Orfanato Cristóvão Colombo essa relação de utilidade-docilidade era vista como necessária e estava presente nas concepções e práticas das Irmãs Carlistas-Scalabrinianas. Por fim, pensamos que o controle do corpo e a disciplina para um registro considerado importante para o Orfanato Cristóvão Colombo e para as irmãs: a visita do fundador da Congregação, conta com um quadro ao fundo - do Papa Pio X, pontífice daquele momento.

Com relação à Figura 2, ainda, ressaltamos que o número de meninas negras, quantitativamente, é menor na fotografia. Oliveira e Lombardi (2008) indicam que o orfanato ofereceu educação, assistência religiosa e profissionalização através de uma formação técnico-profissionalizante, indo além do seu papel social de acolher o imigrante, o índio, o negro, o abandonado, contribuindo assim, para a reorganização da própria sociedade paulistana.

A diferença na educação para meninos e meninas foi percebida no programa do Orfanato Cristóvão Colombo. No documento, disponível na Casa Madre Assunta5, localizada em São Paulo, assinado pelo Padre José Marchetti, consta que o orfanato “tem que educar e fazer bons operários e bons cidadãos dos órfãos dos infelizes emigrantes que sobre o mar, ou nas colônias tenham falecido, deixando ao desamparo seus filhos menores” (MARCHETTI, 1895). No documento ainda estava registrado que se esperava que o programa fosse bem-acolhido pelo povo. Mesmo que destinadas ao Orfanato, com uma missão bem determinada, reforça-se que “os quinze primeiros anos são assinalados por sacrifícios, controvérsias e lutas, porém de 1910 em diante, a Congregação progride rapidamente, estendendo seu apostolado na parte meridional do País” (CONGREGAÇÃO, 1965, p.12). É a partir desse período que se observa a instalação de diferentes obras sociais, educacionais e da área da saúde.

As Irmãs desenvolvem o cuidado e a instrução das órfãs da seção feminina, mas o trabalho reforça funções distintas para meninos e meninas. Como afirma Perrot (2017, p. 186) “aos homens, o cérebro (muito mais importante do que o falo), a inteligência, a razão lúcida, a capacidade de decisão. às mulheres, o coração, a sensibilidade, os sentimentos”. É ainda continuidade do que se preconizou ao longo do “século XIX acentua[ndo] a racionalidade harmoniosa dessa divisão sexual” (PERROT, 2017, p. 187), em que cada sexo assumia suas funções e papéis com espaços, lugares e atividades predeterminados.

Apesar da Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas ter sido constituída para atender especificamente ao migrante e especialmente aos descendentes de imigrantes italianos órfãos e vulneráveis, outras ordens religiosas instalaram-se no Brasil, devido “às medidas anticlericais do início do século XX”, que incluía a proibição de lecionar e “movimentou uma quantidade de homens e mulheres especialmente, que partiram, então, para fundar escolas em outros países” (ROGERS, 2014, p. 58). Algumas congregações, sejam elas femininas ou masculinas, que se dispersaram, buscaram a continuidade de suas atividades em outros países.

Observam-se, assim, razões diversas para o estabelecimento delas no Brasil (BITTENCOURT, 2017), resultando, no entanto, em um mesmo movimento: abertura de escolas confessionais católicas, especialmente pelas congregações que já possuíam instituições de ensino no país em que estavam instaladas anteriormente. No Rio Grande do Sul, constata-se a vinda de diferentes congregações, podendo-se citar, na chamada Região Colonial Italiana, no período de 1875 a 1930, de acordo com Luchese (2008), os Capuchinhos, as Irmãs de São José de Moûtiers, as Irmãs do Puríssimo Coração de Maria, os Irmãos Maristas, os Irmãos da Doutrina Cristã (Lassalistas), os Padres Passionistas, os Josefinos e também as Irmãs de São Carlos, dentre outras.

A primeira obra assumida pelas missionárias estava instalada na capital São Paulo e a segunda, no interior do Rio Grande do Sul, em Bento Gonçalves, foi construída pelas próprias Irmãs, designadas para oferecerem educação católica aos italianos6 que colonizaram o município e a região. “O trabalho missionário da Congregação no Sul, se inicia, portanto, na área da educação. Nove de fevereiro de 1915 - eis o primeiro dia de uma história que hoje soma mais de 100 anos” (ASSOCIAÇÃO, 2016, p. 48).

Entender a vinda das Irmãs Missionárias de São Carlos - Scalabrinianas, para Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul exige ter em conta que a paróquia de Santo Antônio de Bento Gonçalves contava com a presença de missionários carlistas. É provável que isso tenha influenciado a decisão do pároco, o italiano Pe. Enrique Poggi, a resolver tomar a iniciativa de convidá-las para que abrissem um colégio em Bento Gonçalves. Pe. Poggi atua como um mediador cultural no processo ao entender que a presença das Irmãs representava um importante reforço na difusão do catolicismo e da etnicidade, pois que fundariam um colégio católico e com ensino em italiano.

A iniciativa foi concretizada por meio de carta enviada do pároco e entregue ao Pe. Carlos Porrini para convencer a Madre Superiora, na época Assunta Marchetti. Recebida a autorização para efetuar a expansão da obra, Madre Assunta Marchetti envia as Irmãs Madre Lúcia Gorlin, Borromea Ferraresi, Josefina Oricchio, Maria de Lourdes Martins e Joana de Camargo. É sob a direção dessas Irmãs que tem início a Província Imaculada Conceição (CONGREGAÇÃO, 1965).

O Pe. Enrico Poggi pagou a passagem para as Irmãs que aos 4 de fevereiro partiram da Vila Prudente em São Paulo, dirigindo-se ao porto de Santos. Dali, a bordo do Itapuí, seguiram até Porto Alegre. Ao chegarem, ninguém as esperava. Sem conhecer ninguém buscaram informações junto ao Hotel Savóia que acolhia imigrantes. Ali uma senhora as acolheu e acompanhou até a sede da diocese onde foram recebidas pelo Bispo D. João Becker. O bispo lhes deu as boas-vindas e as acomodou junto às Irmãs de São José que mantinham o Colégio Sevigné. Dali, no dia seguinte, 09 de fevereiro partiram de trem seguindo até Carlos Barbosa. Foram recebidas por Paulo Pasquetti que as transportou numa diligência puxada por mulas até Bento Gonçalves. Permaneceram, provisoriamente, em uma casa de madeira onde iniciaram as primeiras atividades letivas em 1º de março de 1915. Ministravam aulas em italiano no Colégio São Carlos. Em publicação no jornal Il Corriere d’Italia (1915a, p. 2) uma nota relata a chegada das Irmãs e comunica o início das matrículas. Madre Lúcia Gorlin foi a primeira superiora e as matrículas foram por ela realizadas.

Na Figura 3, o registro fotográfico das primeiras Irmãs que migraram de São Paulo para Bento Gonçalves/RS: Madre Lúcia Gorlin, Madre Borroméa Ferraresi, Irmã Josefina Orrícchio, Irmã Maria de Lourdes e Irmã Joana de Camargo. Em meio a elas, de branco, provavelmente, uma das jovens que seguiria vida religiosa.

Fonte: acervo do Colégio Nossa Senhora Medianeira, Bento Gonçalves/RS.

Figura 3 As primeiras Irmãs Missionárias em Bento Gonçalves/RS, 1915 

As freiras se apresentam e representam com vestes longas, corpos encobertos. Apenas parte do rosto e as mãos são visíveis. Pela vestimenta é possível distingui-las, mesmo que a distância. Cores sóbrias, comportamentos contidos. A feminilidade é apagada. Ser mulher não está em evidência. Precisam apagar a condição de gênero para romper com certos lugares pré-estabelecidos, inclusive a liberdade de viverem sozinhas em uma residência, de viajarem, administrarem suas vidas em congregação, decidirem sobre rumos e tarefas. Se alguns espaços ocupados pelas Irmãs não seriam bem-vistos para mulheres em geral, o são quando elas são freiras, são missionárias. A condição de religiosa se sobrepõe a de mulher. E isso permite que tenham iniciativas, exerçam certo protagonismo na abertura de escolas, no acompanhamento de migrantes e ao abraçar diferentes tarefas demandadas pelas comunidades locais.

O funcionamento do Colégio São Carlos foi autorizado pelo Bispo Dom João Becker. No acervo da Paróquia Santo Antônio, em Bento Gonçalves localizamos a correspondência que transcrevemos, em parte, a seguir:

Dom João Becker. Por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica, Arcebispo Metropolitano de Porto Alegre. [...]. Atendendo ao que nos requer o R. P. Henrique Domingos Poggi, havemos por bem conceber como de fato pela presente portaria concedemos que as Irmãs Missionárias de São Carlos fundem uma escola paroquial aqui em Bento Gonçalves. Muito recomendamos às dignas famílias da referida Vila a nova escola paroquial, na certeza de que seus queridos filhos receberão uma sólida educação e uma boa instrução, segundo as normas traçadas pela Santa Igreja. Outrossim, esperamos e estamos certos que as beneméritas Irmãs Missionárias de São Carlos correspondam aos nossos desejos e aos sacrifícios que os paroquianos de Bento Gonçalves fazem para manter a nova escola. E registramos aqui os nossos aplausos e louvores ao zelo [do] vigário da freguesia, o qual não mede esforços para promover o ensino cristão. [...]. Esta nossa portaria será lida a estação da missa conventual, na matriz Bento Gonçalves e no ato da inauguração da nova escola. Dada e passada em Nossa Câmara Eclesiástica, sob o sinal de Nosso Vigário Geral e selo de nossas armas, aos 25 de fevereiro de 2015. Mons. D. Luiz Mariano da Rocha. (p. 238-239).

A fundação da escola paroquial, num primeiro momento, era recomendada às “famílias dignas”, em que os filhos seriam educados e teriam boa instrução. O entendimento era de que a educação seria moral e católica, sendo instrução os demais conhecimentos. Chama atenção que seguiriam - pela autorização - as normas da Santa Igreja. A centralidade é da evangelização, de acordo com os pressupostos da Igreja Católica, mas como afirma Rogers (2014, p. 60) “as congregações, de fato, trazem consigo um modelo de ensino que vai bem além das aulas de religião, sobretudo quando dirigido às elites”.

Em agosto de 1915 o Pe. Poggi, coadjuvado pelas Irmãs, arrecada fundos7 e compra um terreno e com rapidez erigiu uma nova casa com três andares, maior e mais arejada, que em fins janeiro de 1916 já abrigava as Irmãs e era preparada para acolher os alunos. Na Figura 4 apresentamos uma fotografia em que sinalizamos o prédio do Colégio São Carlos localizado na área central do município, todo em alvenaria e que em 1916 abrigou mais de 80 alunos:

Fonte: acervo Museu Casa do Imigrante, Bento Gonçalves/RS.

Figura 4 Centro de Bento Gonçalves/RS, década de 1930 

O Colégio de São Carlos estava bem localizado e afluíam bom número de alunos. Na figura, sinalizado com o número 1, a Igreja Santo Antônio, o 2, a sede administrativa do município, a Intendência Municipal, o 3 o prédio do Hospital Tacchini e no 4, o Colégio São Carlos até o final da década de 1930. A imagem permite atentar para o entorno e a localização central do colégio desde os primeiros anos.

As Irmãs ministravam desde 1915 aulas do curso primário, além de trabalhos manuais e piano. E ensinavam o catecismo, auxiliavam na paróquia e ainda dirigiam o coro. Na sequência, apresentamos as imagens das turmas de alunas e alunos de 1915. Em ambas, a presença do pároco local, Pe. Enrique Poggi, que viabilizara a vinda das Irmãs e a abertura do Colégio:

Fonte: acervo do Colégio Nossa Senhora Medianeira, Bento Gonçalves/RS.

Figura 5 Alunas e alunos do Colégio São Carlos acompanhados pelo Pe. Enrique Poggi e Irmãs Missionárias, 1915 

Colocadas lado a lado, as fotografias anteriores evidenciam a diferença de idade entre meninos e meninas atendidos. Entre as meninas constam algumas moças, provavelmente que aspiravam dar continuidade aos estudos na vida religiosa. Também há o distintivo do internato para as meninas. Dentre os meninos se observa alguns realmente bem jovens, provavelmente com 4 a 5 anos de idade. Não localizamos outras informações, mas as fotografias colocam em evidência essa diferença de idades entre os estudantes. Não há uso de uniforme nos primeiros anos. E, se olharmos atentamente, algumas crianças estão descalças.

Em novembro de 1915 as Irmãs Missionárias comemoravam o dia do patrono São Carlos e em publicação são destacados os méritos das Irmãs, do colégio e dos fazeres ali desenvolvidos.

As Rev.mas Irmãs de São Carlos tanto beneméritas da instrução e sobretudo da educação das nossas crianças, festejam hoje, 04, o patrono São Carlos, o festejam ensinando em sua sólida escolinha ainda com maior empenho e solidez, tudo ali. Há para nós uma alta significação: daquela pobre casa humilde onde hoje se aninha o providente Instituto de onde sai um perfume suave de modéstia e caridade. Sempre sorridentes, as pias Irmãs alimentam a escolinha com o encanto e a bondade alegre, com orientações gentis e uma suave carícia aprendem nossas crianças os sanos preceitos de uma moral pura e simples. A Vila toda já mostra seu pareço ao seu justo valor, à obra bela e benéfica e guarda com senso de verdadeira gratidão não apenas às pias instituidoras, mas também ao Pároco, o Pe. E. Poggi, que com empenho há pouco se deve a vinda das Irmãs e a fundação do Instituto. A nossa homenagem reverente e agradecida8.

As Irmãs são representadas como portadoras de modéstia, caridade, piedade, bondade e gentileza. Essas representações “produzem as brechas que rompem às sociedades e as incorporam nos indivíduos” (CHARTIER, 2010, p. 60). A recorrência dos sentidos que se quer conferir às Irmãs e ao Colégio sinalizam o desejo de educação e instrução católica que se propunha produzir.

Em 23 de julho de 1916, Madre Assunta Marchetti, acompanhada de Ir. Faustina Bosio visitaram a nova obra no Rio Grande do Sul e Madre Assunta “ficou encantada com o progresso da nova missão” (Histórico do Colégio São Carlos, acervo do Colégio Nossa Senhora Medianeira, Bento Gonçalves/RS). No Il Corriere d’Italia a visita foi noticiada na capa, juntamente com a fotografia do novo prédio que abrigava o colégio:

Na ocasião da vinda para esta vila da Superiora Geral das Irmãs de São Carlos, Ir. Assunta Marchetti, expomos ao público a fotografia9 do Colégio que as referidas irmãs dirigem com grande competência e entendimento. Como se vê, o edifício de três planos oferece, para a hábil distribuição de suas partes, grande comodidade para a escola, para os trabalhos manuais e para as pensionistas internas. Este colégio surgiu quase de repente como um fungo e é fruto dos esforços e sacrifícios da alma boa do pároco que se chama Pe. Enrico Poggi, o qual sozinho, se um mínimo de ajuda, enfrentou dificuldades e despesas grandes, mas sabia preparar nesta vila uma casa modelo de educação e instrução, onde as famílias encontram asilo seguro para a juventude. Encontramos ocasião para congratular o digno pároco, referindo com a admiração de todos e para dar as boas-vindas à Irmã Assunta Marchetti a quem agradecemos por ter mandado as distintas Irmãs e muito beneméritas na educação e instrução da juventude10.

A presença de Madre Assunta permitiu ampliar a missão no RS, pois no ano seguinte, 1917, uma nova iniciativa escolar era promovida com a abertura do Colégio Nossa Senhora de Lourdes em Nova Vicenza, hoje município de Farroupilha. Além disso, a presença de Madre Assunta e das Irmãs promoveu a difusão da oportunidade - entre as filhas de muitas famílias locais - de seguirem vida religiosa. Ao retornar a São Paulo, Madre Assunta o fez acompanhada pelas cinco primeiras aspirantes: Catarina Lunelli, Margarida Bolzan, Sabina Caldieraro, Clotilde Caldieraro e Emília Cherubini11.

As atividades do Colégio foram sendo mantidas e o número de alunos, com algumas flutuações, manteve-se superior aos 70, como demonstrado no Quadro 1:

Quadro 1 Alunos matriculados no primeiro quinquênio do Colégio São Carlos, Bento Gonçalves/RS 

Ano 1915 1916 1917 1918 1919 1920
Nº de alunos 54 82 53 66 89 84

Fonte: acervo do Colégio Nossa Senhora Medianeira, Bento Gonçalves/RS

Apoiadas em sua obra educacional pelo único jornal do município e que circulava na região, as Irmãs passaram a anunciar, de forma recorrente entre os meses de janeiro e fevereiro, as matrículas para o Colégio São Carlos. Em 1916, por exemplo, destacavam o novo prédio das escolas e as matérias de ensino:

Colégio São Carlos em Bento Gonçalves. Este colégio de ensino dirigido pelas Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeu tem por fim: Dar as jovens uma educação verdadeiramente cristã e uma instrução sólida em relação à sua posição social, incutindo-lhes amor à virtude, ao trabalho, à docilidade e à modéstia. Neste colégio o idioma italiano faz parte das matérias de ensino. Tendo reaberto as aulas na nova casa, temos lugar suficiente para aceitar qualquer número de pensionistas internas. Esclarecimentos mais minuciosos dará. A Superiora. Reabertura das aulas a 7 de fevereiro12.

Um colégio com ensino dos princípios cristãos que “incutiria” virtude, docilidade, modéstia e amor ao trabalho. Era destacado o ensino de italiano e o pensionato. No anúncio de 1917 acrescentava que se ensinava música, piano e canto; ainda bordados em branco, seda, ouro, lã e o filó. Além disso, leitura, análise gramatical, italiano, aritmética, geografia, história pátria (da Itália), ciências naturais e físicas, desenho e o catecismo, sempre promovendo a “educação completa da juventude.” As transferências culturais, no interior de “dinâmica de ressemantização” (ESPAGNE, 2017, p. 136) produzem um modo de pensar e organizar a instituição escolar pelas Irmãs Missionárias de São Carlos que é marcada pelo hibridismo, por conexões entre a pátria “lontana” (Itália) e a pátria de adoção, o Brasil. Nos exames finais realizados em 1917 ficam evidentes, novamente, os processos de transferência, mas também de negociação. Não é um modelo cultural de escola que é exportado, mas sim uma escola criada a partir de negociações entre o que conheciam e possuíam como prescrição do ensinar na Itália e o que era possível no interior do Rio Grande do Sul, mais especificamente em Bento Gonçalves. Os exames iniciaram em 11 de dezembro de 1917 com o pároco Enrico Poggi examinando os estudantes e constatando que o Catecismo tinha sido aprendido, “obtendo quase todos ótimas notas” (JORNAL, 1917, p. 2). Na manhã seguinte, o examinador foi o agente consular da Itália em Bento Gonçalves, Gino Battochio, que aplicou as provas de italiano e “também ele, muito satisfeito partiu após haver constatado que no Colégio São Carlos, além do português, se ensina a linda língua de Dante” (JORNAL, 1917, p. 2). Consta que Battochio “antes de retirar-se fez uma bela exortação aos alunos e alunas, incitando-os a terem amor aos estudos, para que um dia tenham uma sólida instrução e uma boa educação” (JORNAL, 1917, p. 2). No mesmo dia, à noite, o maestro Cappelli, diretor da Orquestra e maestro da Banda Municipal, fez o exame de piano forte, sendo que “não só ficou satisfeito assim como se manifestou surpreso pelo progresso feito pelas pequenas alunas em um tempo relativamente breve” (JORNAL, 1917, p. 2). Na quinta-feira foram aplicados os exames de todas as outras matérias com a presença do Intendente, o Dr. Casagrande (médico), o pároco local, o Padre Carlo Porrini e o maestro Cappelli. Ao verificarem os resultados declararam alegria mediante o “esplêndido resultado dos exames e ao deixarem o Colégio, levavam uma ótima impressão do trabalho ativo das ótimas freiras de São Carlos, que merecem o aplauso de todos aqueles que se importam com a boa educação e a verdadeira instrução” (JORNAL, 1917, p. 2).

As evidências documentais sinalizam para os protagonismos que as Irmãs Missionárias de São Carlos exerceram mediante a comunidade bento-gonçalvense. Negociaram, metamorfosearam seus fazeres conectando as prescrições advindas da Itália às demandas e necessidades dos locais em que instalaram escolas. Entre os anos de 1939/1940, apoiadas pelo pároco local, Antônio Zattera, para a obtenção da permissão de abertura da escola complementar e depois do ginásio, construíram novo prédio para o colégio que permanece até a atualidade, conforme se pode observar naFigura 6:

FIGURA 6 Centro de Bento Gonçalves/RS, final da década de 1940 Fonte: acervo Museu Casa do Imigrante, Bento Gonçalves/RS 

A figura apresenta a Prefeitura (1), o Hospital Tacchini (2) e o prédio do colégio (3). Se comparadas as Figuras 4 e 6, ambas da área central do município de Bento Gonçalves, mesmo que com projeções diferentes, deixa claro a monumentalidade obtida com a nova construção. Um dos maiores e mais imponentes prédios da cidade, na área central.

É certo que em alguns anos a obra das Irmãs Missionárias de São Carlos se expandiu na região e para nos determos apenas em nosso recorte temporal, mencionamos a abertura de outras escolas como consta no Quadro 2:

Quadro 2 Escolas de atuação dessa congregação 

Data Nome Localidade Diocese
1915 Escola N. Nossa Senhora Medianeira13 Bento Gonçalves Caxias do Sul
1917 Ginásio Nossa Senhora de Lourdes Farroupilha Caxias do Sul
1917 Escola Normal Scalabrini Guaporé Passo Fundo

Fonte: Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo (1965, p. 15)

Pelo exposto é possível reconhecer que as obras tinham como principal intuito a acolhida de migrantes, especialmente italianos. O atendimento, diferente do que se poderia imaginar, não era realizado prioritariamente em casas assistenciais, mas através das obras de saúde17 e educação. Para Luchese (2015, p. 252),

A melhor forma de educar os filhos pelos princípios da religião católica foram as escolas mantidas pelas congregações. Tal ideia foi reforçada nas missas, nos jornais, nos atendimentos religiosos particulares, em diferentes ocasiões em que se pudesse dar visibilidade e reforçar a instituição do significado, da importância e diferencial produzido pela educação em escolas confessionais.

A relação entre escolarização e religiosidade fica explícita, sendo a escola confessional-católica a instituição recorrentemente indicada para educar e preparar crianças e jovens a partir de princípios cristãos. No caso específico das Missionárias Carlistas-Scalabrinianas o apelo étnico junto ao ensino do italiano também foi destacado.

Considerações finais

Concluímos que a congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeu - Scalabrinianas se constitui numa condição transnacional entre o prescrito na Itália e o vivido no Brasil, num deslocamento que envolveu inventividades e negociações nas dimensões do étnico, das relações de gênero e do próprio catolicismo na emergência de suas escolas. “Ensinar, cuidar, assistir, esta tripla missão constitui a base das ‘profissões femininas’ que levarão, por muito tempo, a marca da vocação e do voluntariado” (PERROT, 2005, p. 286). De outro lado, reconhecemos que no interior da sala de aula, em suas escolas e nos espaços que “eram os seus”, as Irmãs puderam exercer poder e contaram com certa “liberdade” na escolha de iniciativas e obras.

O trânsito migratório foi marcante e os primeiros anos das “damas” foram difíceis, marcados por perdas e constantes desafios a serem enfrentados - culturais, econômicos e de organização da própria congregação. Além do orfanato feminino mantido em São Paulo, primeira obra associada ao trabalho dessa congregação, a constituição do Colégio São Carlos em Bento Gonçalves/RS e a expansão com a fundação de novas escolas na região em poucos anos é parte dos protagonismos exercidos por essa congregação ímpar - vista e difundida como italiana, mas que contou, em sua maioria com o trabalho de descendentes de imigrantes e de muitas “brasileiras” na concretização de seu carisma, mesmo no recorte temporal deste artigo.

O objetivo das Irmãs em sua missão, o de preservar o catolicismo por meio da manutenção das práticas culturais dos grupos, ou seja, “Religião e Pátria” como orientava Scalabrini, foi concretizado pela abertura de escolas, hospitais e obras assistenciais. Educar e evangelizar se materializou. A presença de religiosidade, de uma educação e instrução católica era requisitada pela Igreja, mas também atendia às demandas da comunidade, especialmente dos migrantes italianos, incentivados pelos párocos locais.

As muitas Irmãs, entre aquelas que imigraram e aquelas que se juntaram à congregação em terras brasileiras (recrutamento e formação no Brasil), foram marcadas pela condição de missionárias e ungidas com diversas representações que circularam e produziram significações. A condição de mulher foi apagada e a de imigrante quase nunca lembrada. Elas representaram a expansão da fé por meio do cuidado - em escolas e hospitais, posto que sendo Irmãs era o suficiente para que soubessem ensinar e acompanhar os doentes.

Referências

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ACERVO do Museu Casa do Imigrante. Bento Gonçalves/RS. [ Links ]

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1O documento sobre usos e costumes, de 1929, arquivado na Província Imaculada Conceição, em Caxias do Sul/RS, indica, através das cinco páginas escritas a mão, o regramento da congregação, visando que as comunidades tenham rotinas institucionalizadas. Por terem tido algumas dificuldades na formalização da Congregação, esse documento indica a organização interna das missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas o que, provavelmente, facilitou o entendimento e a execução das regras. Os usos e costumes podem ser entendidos como uma lei, justamente por regrarem o cotidiano da congregação e denotarem a necessidade de organizar a ação coletiva. Certeau (1994, p. 83) ao discorrer acerca do cotidiano, sustenta que “toda a sociedade mostra sempre, em algum lugar, as formalidades a que suas práticas obedecem”. A formalidade, percebida no documento que orientava as práticas cotidianas da congregação, demonstra a preocupação com a religiosidade e com a disciplina, seja ela relacionada às rotinas ou às vestimentas da congregação.

2Maria Assunta Caterina nasceu em Lombrici, distrito de Camaiore, na região da Toscana, Itália, em 15 de agosto de 1871, sendo a terceira filha de Angelo e Carolina, que tiveram 11 filhos. Madre Assunta, como ficou conhecida, foi nomeada por dois mandatos não consecutivos superiora-geral e esteve na vida religiosa-missionária durante 53 anos, dedicando-se em evidenciar e dar solidez ao carisma congregacional e à Congregação (BONDI, 2011).

3A separação oficial das duas congregações, das missionárias de São Carlos e das apóstolas do Sagrado Coração de Jesus, ocorrida a 22 de setembro de 1907 graças à intervenção de d. Duarte Leopoldo e Silva, significou o triunfo das justas reivindicações das Irmãs de São Carlos, mas não a imediata solução dos problemas que preocupavam Assunta Marchetti e sua ainda pequena família religiosa. (BREVI CENNI, 1931, p. 16 apud SIGNOR, 2005, p. 156). “BREVI CENNI sulla fondazione e lo sviluppo della Congregazione delle Suore Missionarie di S. Carlo, anteriormente denominate “ancelle degli orfani e dei derelitti all’stero”. 1931” (“BREVI CENNI é um registro histórico e contém memórias confiáveis, em especial de Madre Assunta Marchetti. O documento foi apresentado à congregação Consistorial em 1931”) (SIGNOR, 2005, p. 63).

4Esse termo é utilizado aqui justamente para marcar a falta de naturalidade e espontaneidade dos sujeitos que estão na fotografia.

5Antigo Orfanato Cristóvão Colombo, seção feminina, localizado na Vila Prudente em São Paulo.

6Utilizou-se a designação para evidenciar que mesmo sendo migrantes saídos da península itálica e instalados no Rio Grande do Sul, eram conhecidos por italianos, tendo-se construído uma identidade cultural específica e um fortalecimento étnico quando já estavam no Brasil.

7Uma das iniciativas para arrecadação dos fundos foi noticiada no Jornal Il Corriere d’Itália (1915b, p. 02): “Pró-Colégio São Carlos. Um comitê de gentis senhoras e senhoritas bem amparadas e favorecidas pela empresa cinematográfica ‘Edison Franco e Cia’ organiza um interessante espetáculo em benefício do Colégio São Carlos, que merece verdadeiramente todo o favor e apoio dos bons”.

8JORNAL Il Corriere d’Itália, Settimanale per la Colonia Italiana. Bento Gonçalves/RS, ano III, nº 44, sexta-feira, 05/11/1915, p. 02.

9Trata-se do prédio identificado com o nº 4 na figura 4.

10JORNAL Il Corriere D’Italia, Settimanale per la colonia italiana. Bento Gonçalves/RS, sexta-feira, ano IV, nº 31, 04/08/1916, p. 01.

11Conforme informações presentes no livro do Cinquentenário da Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeu, acervo do Colégio Nossa Senhora Medianeira (CONGREGAÇÃO, 1965).

12Jornal Il Corriere d’Itália. Anúncios em diversas edições entre os meses de janeiro e fevereiro de 1916.

13Como mencionado neste artigo, nos primeiros anos o Colégio denominava-se São Carlos.

14No limite deste artigo não foi possível analisar, mas as Irmãs também se dedicaram e tiveram diversas iniciativas voltadas para a área da saúde (hospitais).

Recebido: 24 de Setembro de 2019; Aceito: 20 de Novembro de 2019

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