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Revista Diálogo Educacional

versão impressa ISSN 1518-3483versão On-line ISSN 1981-416X

Rev. Diálogo Educ. vol.22 no.73 Curitiba abr./jun 2022  Epub 17-Dez-2022

https://doi.org/10.7213/1981-416x.22.073.ds14 

Dossiê

Primeiras letras, pesca, pasto e lavoura: a influência do Código de Menores Mello Mattos no Paraná*

First letters, fishing, pasture and farming: the influence of the Mello Mattos Minors Code in Paraná

Maria Nilvane Fernandesa 
http://orcid.org/0000-0002-3420-2714

aUniversidade Federal do Amazonas (UFAM). Doutora em Educação, e-mail: nilvane@gmail.com


Resumo

O artigo apresenta uma pesquisa historiográfica sustentada em fontes primárias e secundárias para uma análise documental e bibliográfica de maneira a identificar como ocorreu o atendimento de meninos e meninas durante as três primeiras décadas do século XX, no Paraná, com um foco inicial em três instituições estruturadas na Capital do estado. O estudo articula quatro questões que se entrecruzam: as orientações normativas para o atendimento dos menores; a organização e a construção inicial de um sistema de atendimento estadual; a efetivação de um atendimento escolar de primeiras letras, acompanhado da inserção no trabalho dos meninos e meninas nessas instituições; e, por fim, o estudo evidencia o panorama geral da construção dessas instituições que deixaram de estar centralizadas na Capital, sendo então construídas no interior do estado. O estudo concluiu que, em relação ao atendimento escolar, até a década de 1940, os meninos e meninas só possuíam acesso ao ensino de primeiras letras e nem sempre com a garantia de realmente terem acesso a ele, visto que nenhum dos pesquisadores identificou matrículas registradas na Secretaria de Estado da Educação. Aliados a um ensino informal e precário, os meninos e as meninas foram inseridos em atividades de trabalho pecuário, agrícola e pesqueiro com uma suposta inserção em qualificação profissional.

Palavras-chave: Paraná; Código de Menores; Escolas Rurais; Inserção escolar

Abstract

The article presents a historiographical research, supported by primary and secondary sources for a documentary and bibliographic analysis in order to identify how the care of boys and girls occurred during the first three decades of the 20th century, in Paraná, with an initial focus on three institutions structured in the State Capital. The study articulates four intertwined issues: normative guidelines for the care of minors; the organization and initial construction of a state service system; the implementation of a primary school service, accompanied by the insertion in the work of boys and girls in these institutions; and, finally, the study shows the general panorama of the construction of these institutions that are no longer centralized in the Capital, being then built in the interior of the State. The study concluded that, in relation to school attendance, until the 1940s, boys and girls only had access to the teaching of first letters and, not always, with the guarantee of actually having access to it, since none of the researchers identified enrollments registered with the Secretary of State for Education. Allied to an informal and precarious education, the boys and girls were inserted in livestock, agricultural and fishing work activities with a supposed insertion in professional qualification.

Keywords: Paraná; Minors Code; Rural Schools; School insertion

Resumen

El artículo presenta una investigación historiográfica, apoyada en fuentes primarias y secundarias, para un análisis documental y bibliográfico con el fin de identificar cómo ocurrió el cuidado de niños y niñas durante las primeras tres décadas del siglo XX, en Paraná, con un enfoque inicial en tres instituciones estructuradas en la Capital del Estado. El estudio articula cuatro temas entrelazados: lineamientos normativos para el cuidado de menores; la organización y construcción inicial de un sistema estatal de servicios; la implementación de un servicio de educación primaria, acompañado de la inserción en el trabajo de los niños y niñas de estas instituciones; y, finalmente, el estudio muestra el panorama general de la construcción de estas instituciones que ya no están centralizadas en la Capital, construyéndose entonces en el interior del Estado. El estudio concluyó que, en relación con la asistencia escolar, hasta la década de 1940, los niños y niñas solo tenían acceso a la enseñanza de primeras letras y, no siempre, con la garantía de tener realmente acceso a ella, ya que ninguno de los investigadores identificó matrículas registradas. con la Secretaría de Estado de Educación. Aliado a una educación informal y precaria, los niños y niñas se insertaban en actividades laborales pecuarias, agrícolas y pesqueras con una supuesta inserción en la calificación profesional.

Palabras clave: Parana; Código de Menores; Escuelas Rurales; inserción escolar

Introdução

A história da escolarização de adolescentes privados de liberdade no Paraná iniciou com as instituições menoristas do começo do século XX. Esse período tem sido estudado mais pelo interesse na instituição do que no tipo de atendimento ofertado aos menores, e, embora inserida nos textos, a temática serve para contextualizar a diversidade de atendimento realizada por tais instituições; porém, não se busca compreender como se deu o desenvolvimento escolar para meninos e meninas em cumprimento de medidas socioeducativas - termo utilizado na bibliografia corrente moderna.

Esse estudo é o primeiro, de uma série, que busca apresentar a história e a memória da organização escolar para crianças, menores e adolescentes institucionalizados no Paraná durante o século XX. A investigação realizada utiliza como fonte dissertações e teses que trataram da temática e investigaram as instituições agrícolas existentes no Paraná até 1940 e documentos como leis, regimentos e decretos estaduais.

A análise realizada nos permite compreender que até 1930 já existiam no estado diversas instituições que buscavam preparar os meninos e as meninas pelo trabalho. Entretanto, tais instituições, aos moldes do que já acontecia no Distrito Federal do Rio de Janeiro e em São Paulo, eram estruturadas em formatos de abrigos de acolhimento, escolas de preservação para abandonados e órfãos e escolas de reforma (reformatório) para delinquentes, em um modelo que estava mais focado na prevenção (preservação). Esse modelo foi adotado no primeiro Código de Menores - Decreto n. 5.083, de 1º de dezembro de 1926 -, incluso no Decreto n. 17.943-A, de 12 de outubro de 1927 -, que consolidou a Lei de Assistência e Proteção a Menores (BRASIL, 1926; 1927). Entretanto, como veremos aqui, a sua adoção no Paraná ocorreu muito antes da promulgação da norma, mas de maneira mais branda, com foco na preservação dos menores.

Nesse formato, o ensino da educação elementar e o trabalho como atividade preparatória para a inserção nas fábricas eram fundamentais para um país que se tornava industrial, por isso o Juizado Privativo de Menores, estruturado em Curitiba em 1925, tinha como objetivo regenerar os adolescentes por meio do trabalho educativo industrial e contava com diversas oficinas ligadas a essa vocação. Entretanto, depois do Código Mello Mattos, essa vocação perdeu lugar para a vocação agrícola e agropecuária, como veremos no texto. Isso se dá por dois motivos: o primeiro é o Código ter proibido menores de 12 anos, e aqueles que tivessem idade entre 12 e 14 anos, mas que não estivessem estudando, de serem inseridos no trabalho (BRASIL, 1926, arts. 59 e 60); e o segundo se deve ao embate entre socialismo e capitalismo.

A bibliografia corrente e os pesquisadores que estudam as escolas agrícolas (COLOMBO, 2002; DONI FILHO, 1995; MARTINIAK, 2011; OGANAUSKAS, 2015; PANDINI, 2006) justificam que a mudança vocacional ocorreu devido a uma tentativa de o Estado garantir a não migração dos trabalhadores rurais para a área urbana. Entretanto, havia naquele contexto uma preocupação dos governos com a influência que os pequenos trabalhadores receberiam do proletariado sindicalizado, imbuído de preceitos socialistas pós-revolução de 1917, o que explica a ênfase nas atividades agrícolas.

Nesse período já existiam no Paraná diversas instituições de atendimento para menores desvalidos, mas a estruturação do Juizado e a promulgação do Código de Menores foram determinantes para que o atendimento de menores ganhasse novas características com a implantação da Escola para Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti, da Escola de Pescadores Antônio Serafim Lopes e da Escola de Reforma do Canguiri que passaram a receber infratores e abandonados de todo o estado em um contexto em que o ensino profissional passou a ser visto como mecanismo de controle e disciplinamento de uma parcela da sociedade.

O Contexto de atendimento pré Código de Menores

A tentativa de conter os desviantes e manter a ordem urbana era uma preocupação do final do século XIX, não apenas do Brasil, mas do mundo. Nesse período, diversas instituições começaram a ser criadas com vistas a educar os meninos e meninas, com a especial intenção de retirá-los/as da influência do proletariado que nas fábricas lutavam por melhores condições de trabalho. Os diversos movimentos políticos a favor e contra a República eram também uma preocupação. Assim, nesse período começam a surgir instituições para retirar os menores das ruas.

Diversas instituições criadas para a educação de meninas da sociedade transformaram-se, com o incentivo do Governo, em instituições para meninas órfãs. Em Curitiba, por exemplo, desde 1886 funcionava na Capital uma escola de artes para meninas. Em 1917, o Decreto n. 548 transformou a instituição na Escola Profissional Feminina de Curitiba, e, em 1933, uma nova alteração a renomeou para Escola Profissional Feminina República Argentina (FREITAS, 2011).

As instituições para atendimento de meninos recebiam incentivo da União, e a agricultura recebia o maior deles. Nesse movimento, em 17 de junho de 1907 foi inaugurado um campo de experiências do Instituto Agronômico do Paraná, após a aquisição de uma chácara nos arrabaldes do Bacacheri, motivo pelo qual a instituição passou a assumir a nomenclatura de Instituto Agronômico do Bacacheri (IAB).

Em 12 de abril de 1909, a Lei Estadual n. 887 estabeleceu que deveria ser criado no local uma Colônia Infantil de Primeiras Letras (1.ª a 4.ª séries) e Ensino Profissional, na qual o diretor da instituição deveria ser como um pai para os internos, promovendo, além da educação física, a educação moral e cívica. A Colônia era um estabelecimento de ensino profissional e de primeiras letras destinado a internar menores de 8 a 15 anos, devendo mantê-los no local até os 18 anos de idade. A proposta era oferecer um lar infantil às crianças moral e materialmente desamparadas, ensinando a elas um ofício que os tornassem úteis (OGANAUSKAS, 2015). Segundo a pesquisadora, essas instituições caracterizavam-se essencialmente por práticas informais de ensino agrícola.

Em 16 de janeiro de 1910 foi instalada em um prédio da Praça Carlos Gomes, a Escola de Aprendizes Artífices do Paraná para atender 45 meninos desprovidos da sorte1. Os cursos inicialmente oferecidos pela Escola foram alfaiataria, marcenaria e sapataria, e posteriormente de serralheiro mecânico e seleiro tapeceiro; como é possível observar, atividades ligadas à indústria. As aulas eram ministradas de segunda a sábado, das 9 às 16 horas, divididas entre instrução primária pela manhã e oficinas à tarde. Matrículas foram aceitas praticamente durante todo o ano letivo; quando da abertura de suas portas, os 45 alunos iniciais da escola transformaram-se em um total de 219. Ainda assim, uma das reclamações do diretor da instituição era de que o mercado exercia uma pressão sobre os meninos e os convencia a deixar os cursos, já que representavam, naquele contexto, mão de obra de custo reduzido (LEITE, 2010).

Diez (1999) aponta que a Lei n. 887 - já mencionada -, além de ter a criado especificamente para atendimento de menores desvalidos, deu à Colônia Infantil um regulamento sob o regime premonitório, não permitindo os menores delinquentes na mesma instituição e mandando abrir os créditos necessários à sua execução. Para a pesquisadora, essa lei foi a semente do Juizado de Menores de Curitiba e do ensino agronômico do Paraná. Em 1917, a Lei n. 1.663 decretou a construção da primeira colônia correcional em qualquer ilha entre Antonina e Paranaguá. Alguns anos depois, uma instituição foi construída na Ilha das Cobras, em Paranaguá - como descreveremos mais à frente.

Em 1918, a Lei n. 1.780 criou o Instituto Disciplinar e a Escola Agronômica do Paraná. O Instituto deveria possuir duas seções para incutir hábitos de trabalho e educação, fornecendo aos meninos instrução literária, profissional e industrial e de preferência o ensino agrícola para os meninos com idade entre 9 e 14 anos. No ano seguinte, o Decreto n. 943, de 3 de outubro de 1920, criou o Patronato Agrícola do Paraná (PAP), anexo e sob a responsabilidade administrativa da Escola Agronômica do Paraná. Em regime de internato, o PAP incumbia-se da educação moral e física dos alunos, da higiene individual, além do ensino de música e desenho. Para tanto, fornecia alimentação, vestuário, atendimento médico e odontológico.

Quanto ao trabalho agrícola, as instituições, ocupavam o dia dos menores com o trabalho nos campos de cultivo, jardins e instalações do estabelecimento. A educação oferecida pelos Patronatos Agrícolas deveria ter sua maior carga horária destinada às atividades práticas, mediadas pela experimentação. Este direcionamento do ensino nessas instituições guardava uma estreita relação com os pressupostos divulgados pelos reformistas educacionais que atuaram em diversos estados brasileiros ao longo da década de 1920, e que estavam fortemente ancorados nos ideais da Pedagogia Moderna (OGANAUSKAS, 2015, p. 40).

Convém mencionar que a mesma pesquisadora enfatiza ainda que, “após um ano de internato, era cobrada uma mensalidade aos menores [...]” (OGANAUSKAS, 2015, p. 111). Essa mensalidade era proporcional ao trabalho realizado, o que abria a possibilidade de os meninos e as meninas receberem algum valor pelo trabalho realizado. Assim, “no primeiro ano de funcionamento, o Patronato Agrícola atendeu a vinte e dois alunos, encaminhados pela Repartição Central de Polícia, sendo que nos anos seguintes esse número aumentou para vinte e cinco” (OGANAUSKAS, 2015, p. 111).

Segundo Pandini (2006), esses meninos eram trabalhadores, pobres, filhos de imigrantes ou, ainda, abandonados moral e materialmente por serem órfãos ou desamparados da fortuna, mas homogeneizados em identidades “de aprendizes artífices, futuros trabalhadores laboriosos, capazes de construir uma identidade paranaense e nacional” (PANDINI, 2006, p. 8). Ou seja, até meados da segunda década do século XX, essas e outras experiências de atendimento aos meninos e meninas vinham sendo realizadas como uma estratégia preventiva e assistencialista - daí o nome Escola de Preservação, mas depois da promulgação do Código de Menores, as nomenclaturas e a forma de atender aos menores se modificou.

Em consonância com o movimento nacional, que estruturava a promulgação da Lei n. 4.242, de 1921, o serviço de assistência e proteção à infância abandonada e delinquente e que culminou com a criação do Juízo de Menores, formalizado no Decreto n. 16.273, em 1923, exemplo que foi seguido por São Paulo e depois pelo Paraná, que foi o terceiro estado a organizar um Juizado Privativo de Menores. A partir de então, os menores deixaram de ser tratados pela perspectiva assistencialista da promoção e passaram a ser tratados como objeto de correção, por isso as instituições que atendiam aos infratores recebiam o nome de Escolas de Reforma (ZANELLA, 2018).

Até meados da década de 1920, os menores julgados como infratores ficavam presos no Complexo Penitenciário do Ahú no contato com adultos. Até esse período, as situações envolvendo crianças eram tratadas em varas diferentes. O abandono era atendido pela 1.ª Vara Cível Comercial e Menores, e as infrações pela 1.ª Vara Criminal de Órphãos e Interdictos da Capital; em algumas situações, os casos eram atendidos também pelas Varas de Família. Finalmente, em 1923, os procedimentos da autoridade policial e os encaminhamentos dos menores ao juiz de órfãos de sua comarca ou termo foram estabelecidos pela Lei n. 2.232.

Isso só se modificou quando a Lei n. 2.380, de 1925, criou na sede da Capital o cargo de juiz privativo de menores, na rua Marechal Floriano com a Avenida Sete de Setembro - local em que hoje está a edificação da Escola Técnica Federal do Paraná. A partir desse momento, o Juizado passou a organizar o trabalho que já era desenvolvido e passou a ter na sua estrutura, a partir do ano seguinte, o Abrigo, a Escola de Preservação e a Escolas de Reforma, já existentes na Capital, no mesmo local, numa mansão em que o juiz, o curador, o promotor, o médico, os comissários e o porteiro trabalhavam. O abrigo e a Escola de Preservação Feminina foram estruturados na Rua Aquidaban, n. 35/atual rua Emiliano Perneta2, e a Escola de Reforma Feminina junto ao Asilo São Vicente (DIEZ, 1999)3.

Conforme aponta a pesquisadora, nesse período teve início na Capital a atuação de Congregações religiosas de missionários de outros países, como a Ordem Josefinos de Murialdo, por exemplo, tanto no atendimento de meninas quanto de meninos. O estudo aponta que, inicialmente, a Ordem Josefina, o Juizado de Menores e a Escola de Aprendizes Artífices pareciam estar mescladas como uma mesma instituição.

A Ordem tomou posse, a pedido do governador, do Abrigo de Menores e da Escola de Preservação em 25 de janeiro de 1926. Em 01 de julho do mesmo ano, a Escola de Reforma Masculina foi transferida para a Avenida Batel, n. 12. O trabalho dos Josefinos ganhou corpo, e os alunos passaram a ser popularmente chamados meninos pés descalços. Nesse período, a instituição teve instalada novas oficinas: alfaiataria, sapataria e ferraria.

A profissionalização de crianças e jovens pobres, como estratégia disciplinadora, foi de uso tão intenso e freqüente, que ao encontrarmos fragmentos de relatos de algumas instituições, facilmente as confundimos com outras. Além disso, o discurso sobre a criança pobre como vagabunda, as propostas de correção através de educação pelo ou para o trabalho e as práticas de enquadramento em um padrão, exercícios físicos e ensino prático (oficinas, agricultura, etc.) foram homogeneizadas de forma à obtenção de similaridades tais que dificultam ao pesquisador a identificação, nas histórias, de seus cenários institucionais (DIEZ, 1999, p. 212, grifos da pesquisadora).

O Juizado pretendia inicialmente regenerar os adolescentes pelo trabalho educativo industrial. Para isso, “em 1927, a Escola de Preservação Masculina do Juizado teve intaladas suas oficinas de alfaiataria, sapataria e ferraria” (COLOMBO, 2006, p. 85). Entretanto, pouco a pouco é possível perceber que essa intenção foi sendo alterada, e a possível inserção na indústria perde lugar para a vocação agrícola e agropecuária.

Segundo Diez (1999), gradativamente essas instituições foram saindo do âmbito do Judiciário, passando a se organizar no sistema público e privado, sob a supervisão da Magistratura. Assim, a junção da Colônia Infantil, do Patronato Agrícola e do Instituto Disciplinar, que recebeu os menores vindos da Escola de Reforma e Preservação, constituiu posteriormente a Escola de Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti do Bacacheri - a que nos reportaremos mais à frente.

Conforme Freire (2013), em 1928 foram recolhidos na Escola de Preservação do Juizado 203 meninos, sendo que 105 deles frequentavam aulas de instrução primária, já na seção feminina foram recolhidas 136 meninas. Na Escola de Reforma foram institucionalizados 61 meninos e 53 meninas, sem contar os desligamentos. Segundo a pesquisadora, em todas as seções funcionavam a instrução primária, a instrução profissionalizante e as oficinas.

A mudança da Escola de Reforma e Preservação masculina para o mesmo espaço, na Estação Experimental do Bacacheri, no ano de 1928, juntou a Colônia Infantil, regida pela Lei de 1909, que era incisiva em não aceitar delinquentes no mesmo espaço, com o Instituto Disciplinar, regido pela Lei de 1918. Com isso, a delimitação entre a Preservação e a Reforma, para o atendimento de meninos, começou a perder a nitidez, e, posteriormente, não encontraremos mais uma distinção específica entre as formas de atendimento. Para as meninas, a distinção entre Abrigo e Preservação, que nunca foi especialmente distinta, ficou cada vez mais indefinida.

As mudanças pós Código de Menores

Depois da promulgação do Código de Menores, as instituições mudaram o foco, que antes era educativo, no sentido da prevenção ou preservação, para dar ênfase às instituições disciplinadoras e reformadoras. Os dados oficiais apontam que, da década de 1930 até meados da década de 1960, as Escolas de Reforma funcionaram com a concepção de que o trabalho era um princípio educativo, o que fundamentou a proposta pedagógica das unidades correcionais paranaenses durante o século XX.

Nesse aspecto, até meados do século XX, o processo educacional voltado aos menores desviantes, no Paraná, realizou-se prioritariamente em três instituições: na Escola de Reforma do Canguiri, que custou aos cofres públicos, em 1933, 114:123$400 (cento e quatorze contos, cento e vinte e três mil e quatrocentos réis); na Escola para Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti, em 1935, que custou 532:167$900 (quinhentos e trinta e dois contos, cento e sessenta e sete mil e novecentos réis); e, por fim, na Escola de Pescadores Antonio Serafim Lopes criada em 1937, por 186:026$000 (cento e oitenta e seis contos, vinte e sei mil réis) (COLOMBO, 2002; 2006; MS, 1940).

Doni Filho (1995) explicita que a tentiva de eliminar meninos de rua, desocupados e malandros que vagavam pelas ruas da cidade fez com que Manuel Ribas, interventor nomeado por Getulio Vargas, implantasse um fluxo de recolhimento - especialmente dos meninos. Assim que apareciam, a polícia os recolhia e os conduzia para o reformatório do Canguiri - como uma espécie de etapa de acolhimento; se fosse condenado, o destino era a Escola de Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti, para os casos mais brandos, e a Escola de Pescadores Antonio Serafim Lopes, na Ilha das Cobras, no município de Paranaguá, para os casos graves.

Curitiba, naquele período, “atraía o interesse de imigrantes e pessoas que saiam da zona rural e pretendiam buscar sua sobrevivência mais próximas da vida urbana” (ZANLORENSE, 2013, p. 71). O interventor Manoel Ribas justificou a instalação de 10 escolas rurais e duas escolas de pesca para resolver dois problemas centrais: a economia e a delinquência.

Na década de 1930 foram criadas diversas Escolas de Trabalhadores Rurais e Escolas de Pescadores em diversos municípios paranaenses, sendo que as primeiras foram instaladas em Curitiba, Piraquara, Ponta Grossa, Castro e Paranaguá. Nessas escolas era ministrado o ensino primário (1.ª a 4.ª séries) e o ensino prático elementar rural; após esses estudos os alunos frequentavam [...] o curso de Capataz Rural, que era um programa especial de três anos e incluia trabalhos com instrumentos e máquinas agrícolas, prevenção e combate de pragas e moléstias de animais domésticos, noções de botânica, avicultura, laticínios, horticultura, fruticultura, oficinas, etc. (CEE, 2000, p. 12).

A aglomeração nos arredores de Curitiba contribuiu para a formação de cidades no entorno, dentre elas, São José dos Pinhais ao que pertencia Piraquara que se formou a partir de um conjunto de fazendas e só se desmembrou, em 1890. O progresso teve início com a estrada de Ferro do Paraná, que ligava Curitiba ao litoral, e continuidade com a chegada dos imigrantes, que trabalhavam na pecuária e na agricultura, por esse motivo era o lugar ideal para a instalação, em 1932, de uma Escola de Reforma, que foi renomeada para Escola de Trabalhadores Rurais do Canguiri em 1936 (ZANLORENSE, 2013).

Fonte: Memória Urbana (2022a).

Figura 1 Granja do Canguiri 

A escola que funcionava na Granja do Canguiri tinha capacidade para atender 85 alunos, mas foi instalada, em 1936, com 65 matriculados em regime de internato para cultivar centeio, milho, feijão e pecuária4. Com caráter assistencialista, a escola oferecia instrução primária e ensino prático na agricultura e na pecuária, e as despesas com alimentação, assistência médica e dentária, vestuário e educação eram subsidiadas pelo Estado.

Fonte: Memória Urbana (2022b).

Figura 2 Escola de trabalhadores rurais Dr. Carlos Cavalcanti 

A formação de bairros como o Bacacheri, situado na região nordeste de Curitiba ganhou ênfase com crescimento da Capital que começou a ser cortada por estradas de regiões que se desenvolviam. A Estrada da Graciosa, cortava o bairro e contribuiu para o aparecimento do comércio e de colonos imigrantes europeus que desenvolviam atividades, tanto de agricultura, quando de pecuária (ZANLORENSE, 2013). Segundo a autora, essas características foram primordiais para a instalação da Escola de Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti .

Criada em 1935, a Escola teve o seu Regulamento Interno aprovado pelo Decreto n.º 234 do mesmo ano. Com capacidade para atender 60 alunos, foi instalada formalmente no ano de 19375. A Escola tinha uma estrutura moderna para a época e custou aos cofres 355:243$456 (trezentos e cinquenta e cinco contos, duzentos e quareta e três mil e quatrocentos e cinquenta e seis réis).

A sua estrutura possuía dois pavimentos com todas as acomodações necessárias para atender em regime de internato aos 200 meninos do Abrigo de Menores alojados no prédio situado na Rua Marechal Floriano. Além disso, a Escola atendia a 600 alunos externos que recebiam instrução igual à que era ministrada nos grupos escolares. Apesar disso, as pesquisas de Colombo (2006) e de Cossentin (2006) denunciam que a instituição nunca foi vinculada à Secretaria de Educação, sendo, por isso, inexistente o registro de matrículas no Arquivo Público do Estado.

Fonte: Memória Urbana (2022c).

Figura 3 Escola de pescadores Antônio Serafim Lopes 

A Escola de Pescadores Antonio Serafim Lopes atualmente é apresentada como uma Residência Oficial do Governo do Paraná e encontra-se localizada na Ilha das Cobras, na cidade de Paranaguá. A estrutura arquitetônica era formada por um bloco único, datato de 1932, mas começou a receber menores em 1936. O local já foi sede de um lazareto - local para doentes de uma epidemia do cólera, no século XIX - e, mais recentemente, casa oficial de veraneiro do Governo do estado. Na década de 1930, depois do Estado Novo, Getúlio Vargas mandou construir na Ilha das Cobras um presídio para os dissidentes, o que não foi levado em frente porque Manoel Ribas já tinha planos de instituir ali a Escola de Pescadores como obra de prevenção, preservação e regeneração de menores (CALSAVARA, 2021).

Com capacidade inicial para atender a 100 menores, a Escola de Pescadores tinha cunho correcional, focada em meninos que não apresentavam comportamentos aceitos socialmente. Para cumprir a tarefa, ela fornecia educação, instrução, ensinamentos morais e cívicos, além de lições de trabalho e de pesca.

O ensino profissional, naquele contexto, era visto como mecanismo de controle e disciplinamento de uma parcela da sociedade. Para regulamentar o funcionamento das escolas rurais, em 1938 foi publicado o Decreto n. 7.782, que oportunizou a criação “dos cursos de Primário Agrícola e Agrícola Profissional. O curso Primário tinha duração de quatro anos, sendo, em sua primeira fase, semelhante ao ensino elementar dos grupos escolares do estado e dispunha, em seu programa dos conteúdos e procedimentos de ensino a serem desenvolvidos em cada uma das séries. O ensino ficou dividido em quatro séries e era obrigatório para os meninos de 7 a 14 anos e para as meninas de 7 a 12 anos de idade. O programa do ensino primário para os alunos das escolas de trabalhadores rurais era o mesmo do restante do estado, porém simultaneamente eles recebiam formação prática voltada para a agricultura e a pecuária. Eram matriculados alunos com idade entre 10 e 14 anos, e atendidos em regime de internato menores abandonados e órfãos, conforme encaminhamento do Juizado de Menores do Estado” (MARTINIAK, 2011, p. 270).

Conforme Martiniak (2011), a equipe dirigente da instituição (diretor e secretário) era responsável pelo controle disciplinar tanto dos internos quanto dos funcionários. Para tanto, contava com a ajuda do auxiliar de disciplina, dos assistentes educacionais e de um guardião, os quais, em conjunto, fiscalizavam a rotina diária das escolas. Ainda segundo a pesquisadora, os menores eram subdivididos em grupos de 50 alunos e coordenados por um funcionário ou assistente educacional que auxiliava no controle disciplinar. Os assistentes educacionais poderiam ser professores diplomados do magistério público ou pessoas nomeadas pelo Governo e vigiavam todos os passos dos educandos, acompanhando nos estudos, nas refeições, higiene, recreio e trabalho para orientá-los (MARTINIAK, 2011).

Além da equipe dirigente, havia funcionários que exerciam funções diversas na cozinha, lavanderia, portaria etc. “Por seu regime de internato, os alunos eram assistidos por profissionais que deveriam zelar pelas condições de saúde e alimentação, como a enfermeira e o dentista, que faziam parte do quadro funcional da escola” (MARTINIAK, 2011, p. 273). Segundo a pesquisadora, o quadro docente era constituído por professores de ensino primário, um para cada cadeira do curso agrícola profissional, e um instrutor de educação física.

Esses professores eram auxiliados pelos seguintes profissionais: um chefe de cultura, para cada grupo de 50 internos, e um assistente de pecuária escolar. Para as oficinas estavam previstos ainda: um mestre ferreiro, um mestre carpinteiro, um mestre seleiro e um técnico de indústrias rurais (MARTINIAK, 2011, p. 272-273).

No Capítulo IV do regimento que tratava das disposições gerais, explicitava-se: “Serão admitidos gratuitamente, como alunos internos dos Cursos das Escolas, menores abandonados e órfãos, a juizo do Govêrno” (PARANÁ, 1938, art. 37).

Conforme resposta apresentada a um questionário submetido em 1940 para o Ministério da Educação e Saúde, as três instituições eram Estações Experimentais de Animais. Na Granja Canguirí, o trabalho era realizado com gado da raça Schwitz e com equinos da raça ingleza de corridas; já na Escola de Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti e na Escola de Pescadores Antonio Serafim Lopes o gado era pertencente à raça Jersey (MS, 1940, Questionário n.º 06).

Por isso, as construções possuíam estábulos, silos, depósito de sementes e de máquinas e sua finalidade primeira era “[…] a formação de braços para a lavoura, ambientados com a moderna agricultura, com ligeiros e suficientes conhecimentos práticos da agricultura e da pecuária”. Tais escolas, funcionavam “[…] todas com um curso primário de quatro anos, perfeitamente idêntico ao dos Grupos Escolares do Estado e regidos por professors normalistas diplomados”. Além disso, recebiam paralelo à instrução primária, recebiam “[…] instrução prática agrícola, de acordo com o programa estabelecido pelo Departamento de Agricultura” (MS, 1940, p. 803).

Ainda segundo o questionário, quando findavam o período de Ensino primário, os meninos eram transferidos à Escola de Trabalhadores Dr. Carlos Cavalcanti e ali submetidos ao Curso Profissional de Trabalhadores Rurais, de maneira a complementar e aperfeiçoar os conhecimentos adquiridos na etapa anterior. A idade mínima para a admissão era de 10 anos, e a máxima de 12 anos, sendo que só eram desligados da instituição aos 19 anos, já que a instituição funcionava em regime de internato.

No Questionário de n.º 14, que perguntava como o estado vinha desenvolvendo o ensino profissional, a resposta era que o campo do ensino profissional era uma das grandes preocupações do Governo de Manoel Ribas e que várias modalidades vinham sendo abordadas: aprendizes artífices, trabalhadores rurais, pescadores com vistas a resolver “[...] um dos graves e importantes problemas constituido pelo amparo que é devido à infancia desvalida” (sic!) (MS, 1940, p. 801).

Todas as escolas mantinham seções de Ensino Profissional com oficinas de carpintaria, selaria e ferraria, nas quais eram ministrados os conhecimentos necessários aos homens do campo em paralelo com o ensino primário, como já mencionado. Convém mencionar que as meninas ficavam em escolas independentes das escolas para os meninos, o que acontece também no momento atual nas Escolas femininas. Além das disciplinas que os meninos assistiam, havia o ensino de educação doméstica, com o objetivo de torná-las donas de casa rurais que soubessem manusear os produtos da lavoura de forma a garantir melhor alimentação familiar.

A construção de um sistema

Conforme registro do site Memória Urbana, o estado investiu largamente na projeção e construção de escolas para trabalhadores rurais na década de 1930. Nessa década, iniciou-se a construção de nove instituições, como demonstra o Quadro 1.

Quadro 1 Escolas de Trabalhadores Rurais (ETR) projetadas e construídas na década de 1930 

Escola Cidade Data Inauguração Capacidade Imóvel
Escola de Capatazes e Operários Rurais Curitiba 1932 1933 Alunos internos Existente
ETR Dr. Carlos Cavalcanti Curitiba 1933 1935 200 Existente
Escola de Pescadores Antônio Serafim Lopes Ilha das Cobras Paranaguá 1932 1936 75 Existente
ETR do Canguiri Pinhais, depois Quatro Barras 1936 85 Existente
ETR Augusto Ribas Ponta Grossa 1937 110 Existente
ETR Olegário Macedo Castro 1938 100 Existente
Escola de Pescadores de Guaratuba Guaratuba   1940 60 Existente
ETR Getúlio Vargas Palmeira 1936-1937 1940 100 Existente
ETR de Rio Negro Rio Negro   1940 60 Existente

Fonte: Memória Urbana (2022e).

Como é possível observar, as escolas foram sendo construídas primeiro na Capital e depois nas regiões metropolitana, ganhando finalmente a direção do interior do estado, mas mantendo ainda uma proximidade com geográfica com a Capital. Na década de 1940, o investimento em escolas para trabalhadores rurais continua até 1948, como demonstra o Quadro 2.

Quadro 2 Escolas de Trabalhadores Rurais (ETR) projetadas e construídas na década de 1940 

Escola Cidade Data Inauguração Capacidade Imóvel
ETR de Campo Comprido Curitiba   1941 30 Existente
ETR de Ivaí Ipiranga   1942 60 Existente
ETR de Três Bicos Reserva / depois Candido de Abreu   1942 60 Existente
ETR Franklin D. Roosevelt Santo Antônio da Platina 1945     Existente
ETR de Guarapuava Guarapuava 1948 1952 100 Existente
ETR de Piraí do Sul Piraí do Sul 1948 1952 100 Existente
ETR de Clevelândia Clevelândia 1948 1956 100 Existente
ETR de Apucarana Apucarana 1948 1958 100 Existente
ETR de Foz do Iguaçu Foz do Iguaçu 1948   100 Existente
ETR de Santa Mariana Santa Mariana 1948   100 Existente
ETR de Tibagi Tibagi 1948   100 Existente

Fonte: Memória Urbana (2022d).

Na década de 1940, onze instituições foram construídas, sete delas, no ano de 1948, o último ano em que houve investimento público neste tipo de escola. Interessante observar que apenas uma das escolas foi construída na Capital do estado. Tais instituições eram regidas por leis nacionais promulgadas no início do século, sendo possível dizer que quase todas elas tiveram a especificidade de atender aos menores abandonados, mas apenas três delas foram destinadas a este fim: ETR Dr. Carlos Cavalcanti, Escola de Pescadores Antonio Serafim Lopes e ETR do Canguiri. A ilustração a seguir identifica a localização das 20 escolas da modalidade construídas no estado.

Nota¹: Mapa SEDU/PARANACIDADE, 2019.

Nota²: Localização das escolas baseado em Memória Urbana, 2022e.

Fonte: Elaborada pela pesquisadora (2022).

Figura 4 Mapa com a inserção das 20 ETRs construídas entre 1930 e 1940 

Em face da localização das escolas rurais apresentadas no registro do Memória Urbana, a pesquisadora inseriu no Mapa da Divisão Político-Administrativa do Estado do Paraná, de 2019, elaborado pelo Paranacidade, ícones das escolas, sendo em azul os ícones das escolas construídas em 1930, e em verde os ícones das escolas construídas em 1940, totalizando assim as 20 construções realizadas nas duas décadas.

Considerações finais

O artigo se sustenta em documentos que constituem fontes primárias e em dissertações, teses, artigos e livros que formam uma fonte secundária elaborada por diversos pesquisadores que estudaram o tema, especialmente, para entender as instituições. Em relação ao atendimento escolar, a investigação comprovou que, até a década de 1940, os meninos e meninas só possuíam acesso ao ensino de primeiras letras, e, ainda assim, nem sempre isso era garantido, visto que nenhum dos pesquisadores tiveram acesso ao número de matrículas registradas na Secretaria de Estado da Educação. Aliado a um ensino informal e precário, os meninos e as meninas eram inseridos em atividades de trabalho pecuário, agrícola e pesqueiro, com uma suposta inserção em qualificação profissional. Convém mencionar que a construção do sistema nesse período foi articulado pelo Juizado de menores que o organizou em escolas rurais e contou com o auxílio de ordens religiosas, especialmente, para atender aos abrigos.

No decorrer do texto ficou evidente que, até o final da década de 1920, os meninos e as meninas eram preparados para uma inserção no trabalho industrial, mas, depois da década de 1930, essa vocação modifica-se para o trabalho agrícola, com isso três instituições específicas foram criadas para atender aos menores: a Escola de Trabalhadores Rurais do Canguiri, a Escola de Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti e a Escola de Pescadores Antonio Serafim Lopes.

Nesse período, a delimitação entre a Preservação e Reforma, para o atendimento de meninos, começou a perder a nitidez e, como sabemos, nas décadas seguintes, essa distinção específica entre as formas de atendimento se perde. Para as meninas, a distinção entre Abrigo e Preservação, que nunca foi especialmente distinta, ficou cada vez mais indefinida. No total foram construídas no estado 20 instituições rurais que atendiam a menores, mas apenas três delas tinham os menores como principal alvo de atendimento.

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* Este artigo contou com o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

1Em 1936, o abrigo da Marechal Floriano foi desativado para que, em seu lugar, funcionasse a Escola de Aprendizes Artífices. A sede do Juizado mudou continuamente até 1968, quando se instalou em imóvel próprio na Avenida Iguaçu, local em que permanece até o momento atual (DIEZ, 1999).

2Em julho de 1928, o Abrigo e a Escola de Preservação Feminina foram transferidos para a República Argentina, n. 2.376, em um prédio adquirido pelo Governo do Estado. Em 26 de julho de 1953, a fundação passou a ser denominada Educandário Dr. Caetano Munhoz da Rocha. A instituição, posteriormente, passou a pertencer à Secretaria de Saúde e Assistência Social, tendo sido desmembrada, mais tarde, em Secretaria do Trabalho e Assistência Social. Em 1954, o Educandário ficou sob a responsabilidade dessa Secretaria. No mesmo ano, a instituição foi transferida para a Rua Jacarezinho, n. 1691, no Bairro da Mercês, local em que funcionava o Lar-Escola Hermínia Lupion (Lar das meninas), atual Pastoral da Criança (DIEZ, 1999).

3“A Escola de Reforma Feminina, desde o início do Juizado, esteve localizada em prédio anexo ao Asilo São Vicente, até 1969. Neste ano foi transferida para o Educandário Yvone Pimentel, no Tarumã, continuando ainda sob a administração das Irmãs Passionistas até 1976, [...] quando a Congregação das Irmãs Passionistas de São Paulo de Cruz deixou a administração do Educandário Yvone Pimentel e assumiu a organização do trabalho social na Escola Profissional Maria José, em Piraquara, levando com elas seis infratoras do Educandário, que foram lá educadas até a maioridade. Entre 1976 e 1981 as meninas que tinham problemas de conduta, alternavam suas permanências entre o Lar das Meninas e o Educandário Yvone Pimentel” (DIEZ, 1999, p. 211).

4A estrutura da escola está localizada na Estrada da Graciosa, 6960 - Parque das Nascentes, na cidade de Pinhais, local em que funciona hoje o Centro Paranaense de Referência em Agroecologia (CPRA) (MEMÓRIA URBANA, 2022a).

5A Escola de Trabalhadores Rurais Dr. Carlos Cavalcanti localiza-se na Rua dos Funcionários, 1540 - no Bairro Cabral, com a denominação de Campus I da Universidade Federal do Paraná. A sua edificação sofreu alterações em relação ao projeto inicial (MEMÓRIA URBANA, 2022b).

Recebido: 27 de Janeiro de 2022; Aceito: 06 de Março de 2022

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