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Revista Diálogo Educacional

versión impresa ISSN 1518-3483versión On-line ISSN 1981-416X

Rev. Diálogo Educ. vol.23 no.76 Curitiba ene./mar 2023  Epub 05-Abr-2023

https://doi.org/10.7213/1981-416x.23.076.ds10 

Dossiê

Desafios e possibilidades na pesquisa com crianças: sob a perspectiva de quem investiga

Challenges and possibilities of researching children: a researcher’s perspective

Desafíos y posibilidades en la investigación con niños: bajo la perspectiva de quien investiga

Gabriela Medeiros Nogueiraa 

Eneusa Mariza Pinto Xavierb 
http://orcid.org/0000-0002-3087-8506

Eduardo Arriadac 
http://orcid.org/0000-0001-5216-2739

aUniversidade Federal do Rio Grande (FURG), Rio Grande, RS, Brasil. Doutora em Educação, e-mail: gabynogueira@me.com

bUniversidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil. Doutoranda em Educação, e-mail: eneusaxavier@gmail.com

cUniversidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil. Doutor em Educação, e-mail: earriada@me.com


Resumo

O artigo tem como temática a pesquisa com crianças. Apresenta dados de uma investigação realizada entre os anos de 2017 e 2019, a partir da etnografia interacional e observação participante. O objetivo da pesquisa foi analisar as práticas de letramento em um grupo de estudos bíblicos, da Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, situada em uma comunidade rural no interior do Rio Grande do Sul. Neste texto, o foco foi na perspectiva de quem investiga, a fim de identificar os desafios, as possibilidades e as negociações estabelecidas no momento de entrada no campo empírico, a partir das escritas no diário de campo. Dentre os aspectos discutidos no texto, destacam-se as negociações e os ajustes que foram sendo feitos tanto no início, quanto no decorrer das observações; os indícios de rejeição e aceitação da pesquisadora pelas crianças; os movimentos realizados entre teoria e a realidade observada, visando conhecer e compreender o fenômeno investigado e buscando se despir de preconceitos. Aspecto esse que exigiu um exercício constante da pesquisadora, uma vez que, observou-se um choque cultural, causado pelo estranhamento quanto às práticas pentecostais. As falas das crianças permitem compreender como elas pensam, sentem e valorizam alguns aspectos da cultura compartilhada com adultos, no contexto que estão inseridas. Os significados que elas atribuem às palavras, geralmente estão vinculados ao contexto da Igreja Evangélica Pentecostal que elas vivenciam cotidianamente. As crianças demonstram uma postura de evangelizadores, expressando aquilo que vivenciam no grupo de estudos bíblicos.

Palavras-chave: Pesquisa com Crianças; Etnografia Interacional; Observação Participante; Igreja Evangélica Pentecostal

Abstract

This paper, whose theme is research into children, introduces data collected throughout an investigation which used interactional ethnography and participant observation and was carried out from 2017 to 2019. It aimed at analyzing literacy practices conducted by a Bible study group in the Pentecostal Church named Casa da Oração located in a rural community in Rio Grande do Sul (RS) state, Brazil. This text focuses on the researcher’s perspective in order to identify challenges, possibilities and negotiations in the empirical field which were described in field diaries. Some issues discussed by the text are negotiations and adjustments which were conducted throughout the whole observation; children’s clues to the researcher’s acceptance and rejection; and movements between theory and reality to know and understand the phenomenon under investigation with no prejudice. The researcher underwent a cultural shock since the pentecostal practices caused estrangement. Children’s utterances enabled to understand how they think, feel and value some cultural aspects which are shared with adults in their context. Meanings they attribute to words are usually connected to the context of the Pentecostal Church which the children experience in their everyday life. Children have a posture of evangelizers and express what they experience in the Bible study group.

Keywords: Eesearch with Children; Interactional Ethnography; Participant Oobservation; Pentecostal Church

Resumen

El artículo tiene como temática la investigación con niños. Presenta datos de una investigación realizada entre los años 2017 y 2019, a partir de la etnografía interaccional y observación participante. El objetivo de la investigación fue analizar las prácticas de Letramento en un grupo de estudios bíblicos, de la Iglesia Evangélica Pentecostal Casa de Oración, situada en una comunidad rural en el interior del Río Grande del Sur. En este texto, el foco fue en la perspectiva de quien investiga, a fin de identificar los desafíos, las posibilidades y las negociaciones establecidas en el momento de entrada en el campo empírico, a partir de las escritas en el diario de campo. Entre los aspectos discutidos en el texto, se destacan las negociaciones y los ajustes que fueron siendo hechos tanto en el inicio, como en el curso de las observaciones; los indicios de rechazo y aceptación de la investigadora por los niños; los movimientos realizados entre teoría y realidad observada, buscando conocer y comprender el fenómeno investigado y buscando desnudarse de prejuicios. Aspecto ese que exigió un ejercicio constante de la investigadora, una vez que, se observó un choque cultural, causado por el extrañamiento en cuanto a las prácticas pentecostales. El habla de los niños les permite comprender cómo piensan, sienten y valoran algunos aspectos de la cultura compartida con los adultos, en el contexto que están insertados. Los significados que ellas atribuyen a las palabras, generalmente están vinculados al contexto de la Iglesia Evangélica Pentecostal que ellas vivencian cotidianamente. Los niños demuestran una postura de evangelizadores, expresando lo que experimentan en el grupo de estudios bíblicos.

Palabras clave: Investigación con Niños; Etnografía Interaccional; Observación Participante; Iglesia Evangélica Pentecostal

Introdução

Este artigo discorre sobre uma pesquisa com crianças que foi realizada entre 2017 e 2019, e teve como tema as práticas de letramento em um grupo de estudos bíblicos, da Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, localizada em uma comunidade rural no interior do Rio Grande do Sul1. A proposta do texto é apresentar o percurso da investigação a partir da perspectiva de quem investiga, evidenciando os desafios e as possibilidades vivenciados, trazendo como dados de análise as reflexões identificadas nas escritas do diário de campo de uma das autoras.

Realizar pesquisa com crianças é diferente de investigar com adultos ou idosos, pois requer um afastamento do modo ‘crescido de ver o mundo’ e adentrar em um universo que não nos pertence mais. É se despir do papel de adulto, daquele que supostamente teria maior vivência e ‘domínio das coisas do mundo’. É enxergar no outro, mesmo com pouca idade, potencialidade, conhecimento. É ter empatia e colocar-se no lugar de aprendiz. Diante disso, entende-se como Delgado e Müller (2008) que inúmeros desafios são colocados nas investigações com crianças. Conforme ressaltam as autoras, “[...] os pesquisadores da infância partilham que estudar crianças é problemático, principalmente ao considerarmos as distâncias entre adultos e crianças” (DELGADO; MÜLLER, p. 151).

Nessa direção, algumas estratégias fizeram-se necessárias no decorrer da investigação para que a pesquisadora tivesse maior aceitação e acolhimento pelas crianças como, por exemplo, levar alimentos nos encontros para compartilhar com elas, aprender os louvores entoados e mudar a forma de se vestir.

A opção metodológica da pesquisa apresentada neste artigo foi a etnografia interacional (CASTANHEIRA; GREEN; DIXON, 2007), realizada por meio de observação participante, tendo as crianças como centro da pesquisa. Conforme as referidas autoras

A abordagem etnográfica interacional possibilita o conhecimento de como os participantes utilizam tempo e espaço na sala de aula e definem quem pode fazer ou dizer o quê, com quem, quando, onde, em que condições e com que consequências (CASTANHEIRA; GREEN; DIXON, 2007, p. 12).

Sobre observação participante com crianças, Graue e Wlash (2008, p. 133) destacam que: “um observador participante está lá, não atrás de um ecrã ou de um vidro, mas ao lado das crianças, capaz de ouvir o que está a ser dito, interagindo com elas e partilhando até certo ponto das suas experiências”.

Nessa perspectiva, o momento da entrada em campo empírico e a aceitação do grupo social é o desafio inicial que o pesquisador precisa enfrentar, reconhecendo que isso trará implicações na continuidade da pesquisa. Sobre esse aspecto, Ameigeiras (2007, p. 125), colocam que:

El ingreso presenta la primera situación de interacción con los otros sujetos en una dimensión espacio temporal concreta, en un lugar y un momento en particular. Al respecto es importante tener en cuenta que la <<entrada>> se relaciona con la generación de un vínculo, con relación al cual se establece la ocupación de un <<lugar>> (grifos do autor).

Para o caso específico desta pesquisa, salienta-se que havia um vínculo estabelecido anteriormente por uma das autoras deste artigo, uma vez que ela integra a comunidade e tem um papel influente na mesma, atuando com as crianças e as famílias. Contudo, pelo fato de não frequentar inicialmente a Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, adentrar no grupo de estudos bíblicos para as crianças, foi um dos desafios iniciais.

As questões sobre pesquisa com crianças que serão discutidas ao longo do texto, pautaram-se nos referenciais da sociologia da infância, mais especificamente nos trabalhos de Sarmento (2003, 2008) e Corsaro (2011) e da antropologia da infância a partir de Cohn (2005).

Na primeira seção do artigo apresenta-se os pressupostos metodológicos da pesquisa, partindo da abordagem qualitativa e da etnografia interacional e na segunda seção trata-se especificamente da pesquisa com crianças. Na terceira e quarta seção, aborda-se a entrada no campo empírico da pesquisa, as negociações e ajustes necessários bem como os indícios de rejeição e aceitação da pesquisadora pelas crianças. A quinta seção problematiza o exercício realizado ao longo da observação participante para compreender o que acontece no contexto da Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, sem preconceitos, pois entende-se que o papel do pesquisador é conhecer e compreender um fenômeno social e as relações que ali se estabelecem.

Perspectivas metodológicas e suas implicações

Considerando que este texto versa sobre o percurso da investigação, a partir da perspectiva de quem investiga, tendo as práticas de letramento vivenciadas pelas crianças em um grupo de estudos bíblicos pentecostal, como tema da pesquisa, considera-se necessário esclarecer a perspectiva letramento assumida.

A partir de Britto (2004) e Street (2014), letramento é entendido como a capacidade do sujeito empregar a leitura e escrita em seu contexto social. Aprofundando a questão, Street (2014) trabalha com as expressões eventos de letramentos e práticas de letramentos. Para o autor eventos de letramento “[...] baseia-se na teoria que analisa os eventos da fala e é usada como ferramenta de pesquisa para ter a noção de evento de letramento no qual se pode dizer que há ali uma atividade, um evento” (STREET, 2010, p. 38).

Ainda para o autor, evento de letramento refere-se ao contexto em que ele é produzido e, desse modo, propõe a expressão práticas de letramento para referir-se ao que se repete nos eventos, ou seja “[...] aspectos que nos possibilitam começar a ver padrões nesses eventos e situar conjuntos de eventos de forma a dar a eles um padrão. Essa padronização, supomos carrega significados para os participantes” (STREET, 2010, p. 38).

Nesse sentido, entende-se que a abordagem qualitativa é a mais adequada. Acredita-se, assim como Gialdino (2007, p. 26), que:

La fuerza particular de la investigación cualitativa es su habilidad para centrase en la práctica real in situ, observando cómo las interacciones son realizadas rutinariamente. Sin embargo, el análisis de cómo las personas ven las cosas no puede ignorar la importancia de cómo hacen las cosas.

Portanto, na pesquisa qualitativa é necessário voltar o olhar às pessoas envolvidas no meio pesquisado, escutando, observando e valorizando sua forma particular de participar e perceber o contexto, considerando que “[…] la palabra, los silencios, los gestos, las acciones y las relaciones del sujeto conocido son los medios a través de los que, voluntaria o involuntariamente, suministra datos” (GIALDINO, 2007, p. 55).

Da mesma forma, conhecer o contexto em que os sujeitos estão inseridos é fundamental, pois eles influenciam e são influenciados mutuamente. Assim, o estudo dos contextos seguiu os pressupostos da antropologia, os quais possibilitam a compreensão de cultura, considerando principalmente a seleção dos participantes, gravações, filmagens, escrita e descrição densa dos dados para o mapeamento do campo da pesquisa. De acordo com os princípios da etnografia, um fato em si não pode ser interpretado se não estiver bem situado no contexto em que ele ocorreu (GEERTZ, 2008).

Pesquisas realizadas pelo grupo de estudos “Santa Barbara Classroom Discourse Group” (Universidade da Califórnia2) indicam a necessidade de analisar as relações entre o indivíduo e o contexto, uma vez que o conhecimento individual é situado socialmente, em um determinado tempo e espaço. A relação entre contexto e indivíduo também é ressaltada por Graue e Walsh (2003), as quais definem contexto como um espaço e um tempo situado cultural e historicamente. De acordo com as autoras, o contexto:

É o elo de união ente as categorias analíticas dos acontecimentos macro-sociais e micro-sociais, o contexto é o mundo apreendido através da interação e o quadro de referência mais imediato para actores mutuamente envolvidos (GRAUE; WALSH, 2003, p. 25).

O contexto pode ser conhecido por meio da observação participante, que é destacada por Cohn (2005, p. 45) como uma alternativa “rica e enriquecedora” porque permite uma “interação direta e contínua de quem pesquisa com quem é pesquisado”. Entretando, Geertz (2008) ressalta, que a apreensão de uma dada realidade é sempre a leitura do pesquisador e não a realidade como tal. A grande dificuldade em apreender é que se trata de um sistema simbólico, o qual “[...] não é mensurável, portanto, e nem detectável em um lugar apenas” (COHN, 2005, p. 19); todavia, é preciso entender que é esse sistema que possibilita as pessoas viverem em sociedade “compartilhando sentidos porque eles são formados a partir de um mesmo sistema simbólico” (COHN, 2005, p. 19).

Procurar significado no campo empírico da pesquisa e interpretá-lo considerando as “teias” tecidas pela própria cultura requer, antes de tudo, que o investigador seja capaz de “olhar, ouvir e escrever etnograficamente” (OLIVEIRA, 2006).

O olhar, guiado pelo viés teórico, que direciona o modo de ver a realidade, é descrito por Oliveira (2006) como a primeira experiência do etnógrafo no campo de pesquisa. Do mesmo modo, o ouvir é destacado ampliando o espectro de apreensão dos dados e da realidade investigada. O olhar e o ouvir não são independentes na investigação etnográfica, mas complementares na interpretação de uma dada realidade. O referido autor menciona ainda a escrita etnográfica, configurada nas anotações realizadas no diário de campo pelo investigador, no decorrer da pesquisa. Tais anotações precisam ser retomadas como subsídios para a escrita final, ou seja, como “[...] produto do trabalho de campo” (OLIVEIRA, 2006, p. 25). Cabe destacar, que o diário de campo tem um papel fundamental, visto que nele não constam apenas a descrição das situações, mas também as impressões e reflexões do pesquisador tanto no momento em que está observando quanto na retomada dos apontamentos. Em síntese, as escritas produzidas no diário de campo, são fonte de dados pujantes, que permitem conhecer não só o que ocorreu empiricamente, mas, sobretudo, o que mobilizou o pesquisador em cada momento. Na próxima seção, apresenta-se os pressupostos teóricos que pautaram a pesquisa com criança.

Especificidade da pesquisa com crianças

Dentre os autores que tratam sobre pesquisa com crianças, utilizou-se Graue e Walsh (2003) como referência para os procedimentos metodológicos, especialmente quando afirmam que o foco é compreender o que passa entre as crianças e não dentro delas.

Nessa mesma direção, outros autores argumentam sobre a necessidade de reconhecer que as crianças estão em constante interação com outros grupos, sendo influenciado por eles e, também, os influenciando. Silva, Barbosa e Kramer (2008, p. 86) consideram necessário “[...] analisar as mudanças nos papéis e nas formas de interação entre crianças e adultos”. Prout (2010) ressalta que hoje há o reconhecimento da interdependência mútua entre as ambos os sujeitos. Cohn (2005) ressalta que a criança é atuante no grupo em que convive e tem um papel ativo nas relações sociais em que se engaja. Em uma pesquisa com crianças e não sobre ela é importante reconhecer que “[...] a diferença entre as crianças e os adultos não é quantitativa, mas qualitativa; a criança não sabe menos, sabe outra coisa” (COHN, 2005, p. 33).

No campo dos estudos da infância, Corsaro (2011) propõe a abordagem da ‘nova sociologia da infância’ para investigações com crianças, indicando dois conceitos fundamentais, quais sejam, ‘cultura de pares’ e ‘reprodução interpretativa’. O referido autor define cultura de pares infantis “como um conjunto estável de atividades ou rotinas, artefatos, valores e preocupações que as crianças produzem e compartilham em interação com as demais” (CORSARO, 2011, p. 128). O outro conceito que o autor propõe é ‘reprodução interpretativa’, que contempla com os aspectos considerados inovadores e criativos da participação infantil da sociedade, ou seja:

[...] as crianças criam e participam de suas próprias e exclusivas culturas de pares quando selecionam ou se apropriam criativamente de informações do mundo adulto para lidar com suas próprias e exclusivas preocupações” (CORSARO, 2011, p. 31).

Para conhecer e adentrar neste contexto de cultura de pares exclusivas é necessário estar junto com as crianças, acompanhar por um tempo e observar o que elas fazem, dizem e manifestam.

Entretanto, um aspecto que precisa ser considerado em todas as etapas da investigação é a ética. Não só no caso de pesquisa com crianças, mas especialmente. Tendo em vista que legalmente a criança não é considerada apta a consentir sobre sua participação na pesquisa, moralmente é necessário que ela seja consultada e manifeste assentimento em participar. Um levantamento realizado por meio de narrativa da literatura científica nacional e internacional, considerando as bases de dados Scopus, LILACS, SciELO (FIALHO; DIAS; REGO, 2022), indicou que o Brasil está em um processo inicial em relação a países europeus ocidentais e estadunidense quanto ao estabelecimento de diretrizes éticas em pesquisas com crianças.

Contudo, o assentimento da criança à pesquisa vem sendo utilizado pela comunidade científica, entendido como a concordância em participar da pesquisa. De acordo com os autores citados no parágrafo anterior:

Entende-se que, embora a criança não possa dar seu consentimento legal para participar de estudos, ela pode e deve fornecer seu assentimento, expressando sua vontade e individualidade. Essa condição de respeito deve ser garantida, para além do consentimento esclarecido dos pais ou responsáveis (FIALHO, DIAS e REGO, 2022, p. 426).

Os referidos autores estabelecem quatro elementos essenciais do assentimento3, sendo um deles, a manifestação da criança em relação a vontade de participar da pesquisa e aceitar as intervenções. O uso do assentimento por parte dos pesquisadores demonstra respeito pela autonomia da criança e compreensão de que ela tem direito de querer ou não participar. É necessário, contudo, que o objetivo, os procedimentos e as implicações da investigação sejam explicitados para os responsáveis e para as crianças, a fim de que além do assentimento haja o consentimento dos adultos.

Em relação a identificar ou não os participantes da pesquisa, Kramer (2002), problematiza a utilização do nome próprio e a divulgação da imagem da criança. Para a autora:

Quando trabalhamos com um referencial teórico que concebe a infância como categoria social e entende as crianças como cidadãos e sujeitos da história, pessoas que produzem cultura, a idéia (sic.) central é a de que as crianças são autoras, mas sabemos que precisam de cuidado e atenção (KRAMER, 2002, p. 42)

Conceber as crianças como protagonistas na investigação é possibilitar que elas exercitem sua autonomia, é escutá-las não como quem recolhe uma informação, mas atribuindo um status relevante ao que ela pensa, sente e expressa, inclusive para escolher e permitir as imagens e os relatos que serão utilizados na pesquisa. Contudo, em relação ao modo de identificar as crianças nas escritas sobre a pesquisa, dentre as diversas possibilidades, optou-se, neste texto, por utilizar as iniciais do nome, a fim de preservar o anonimato, mesmo com o consentimento dos familiares e assentimento das crianças em participar da pesquisa.

Inserção no campo empírico da pesquisa

A inserção no campo empírico da pesquisa ocorreu em novembro de 2017 e seguiu ao longo de 2018, por uma das autoras deste artigo. Foram realizadas 28 observações participantes junto às crianças da comunidade rural no interior do Rio Grande do Sul, que frequentavam a Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração. Dessas, 10 foram no grupo de estudos bíblicos e 18 nos cultos proferidos na localidade. Ao total foram produzidas durante as observações do trabalho de evangelização das crianças no grupo de estudos bíblicos aproximadamente 300 minutos de gravações de voz e vídeos e 140 fotos4.

Em 2018, o grupo de representantes da Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração era constituído por aproximadamente 20 adultos, 24 jovens e 12 crianças, sendo responsáveis pelas ações da comunidade evangélica. A Igreja não tinha sede própria e suas atividades eram realizadas em um prédio alugado em uma cidade próxima à comunidade rural. As atividades de cultos e evangelização das crianças ocorriam aos sábados, sendo que às quintas-feiras era realizado o encontro para estudo bíblico e evangelização de jovens. O grupo de estudos bíblicos da Igreja Pentecostal Casa de Oração é denominado “Geração de Adoradores” e é formado por 12 crianças na faixa etária entre 5 e 12 anos, sendo 7 meninas e 5 meninos. O critério para escolha das crianças participantes da pesquisa foi ser morador da comunidade rural, além de frequentar efetivamente a evangelização e os cultos, assim, a investigação foi realizada com 6 crianças.

Nessa comunidade rural, a maioria das atividades da igreja é realizada pela senhora M., moradora próxima da localidade. Seu trabalho como missionária na comunidade era intenso, sendo ela a responsável pela evangelização das crianças, encontros, organização dos cultos, estudos da bíblia e do transporte das famílias para participar de eventos realizados na cidade vizinha, onde se encontra a sede da igreja.

A evangelizadora organizava as atividades do grupo com encontros semanais, nas quintas-feiras, para ensaio de louvores e estudo da bíblia. Nos sábados, as crianças e seus responsáveis, que moravam na comunidade, eram conduzidos para a igreja sede, na cidade vizinha quando acontecia o ensaio dos louvores para serem entoados no culto. Nesse dia também era feito o trabalho de evangelização das crianças com orientações sobre como as crianças deveriam se comportar no culto, indicando a posição do corpo correta, palmas das mãos viradas para cima, olhos fechados e pensamento ligado a Deus para receber as orações e os ‘livramentos’ - expulsão de demônios pelo pastor (Diário de campo, 25/11/2017). Aos domingos, as atividades eram realizadas na comunidade rural, com culto conduzido pelo pastor ou presbítero da igreja no prédio da escola da localidade.

Como foi indicado anteriormente no texto, a inserção neste grupo para conhecer as práticas de letramento vivenciadas pelas crianças pentecostais da comunidade, foi realizada por uma das autoras, por meio de um contato inicial com a senhora M., solicitando permissão para desenvolver as atividades de pesquisa com as crianças. Inicialmente, foi esclarecido o tema da pesquisa e explicado como seria efetivado o trabalho, sendo concedido para a pesquisadora a autorização.

Porém, tendo em vista os princípios éticos da pesquisa e a particularidade da etnografia interacional com criança, entende-se a necessidade de contar com a sua aceitação e confiança, uma vez que se reconhece os direitos delas como cidadãs. Assim, a pesquisadora que realizou a inserção no campo empírico, explicou para as crianças que estaria participando das atividades desenvolvidas durante as reuniões do grupo de estudos. Esclareceu que gostaria de aprender com elas sobre as práticas realizadas nesse espaço e solicitou o assentimento para dar continuidade à pesquisa. Além disso, foi solicitado o consentimento das famílias para realização da pesquisa e permissão para fotografar, filmar e entrevistar as crianças, elucidando o tema da investigação e se colocando à disposição para esclarecer dúvidas e fornecer informações sempre que fosse necessário.

A aceitação da evangelizadora, o assentimento das crianças e o consentimento das famílias foram prontamente concedidos. Entende-se que o fato da pesquisadora ser moradora na comunidade há mais de 30 anos e ter um papel atuante na localidade, foi crucial para isso, pois mesmo sendo ‘estrangeira’ na Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, não era desconhecida das pessoas que a frequentavam e, nesse sentido, a desconfiança e, até mesmo o receio que poderia haver inicialmente, caso fosse algum ‘intruso’, não se efetivou.

Contudo, ao analisar a escrita da pesquisadora em seu diário de campo, foi possível perceber a preocupação que sentiu no início da pesquisa, pois passaria a frequentar um espaço até então desconhecido para ela. Isso pode ser observado quando escreve “esta é a primeira vez que vou entrar em um culto, estou bastante ansiosa temendo como serei recebida. Moro há 31 anos na comunidade e todos sabem que eu sou católica e por muito tempo fui representante desta religião dentro da Granja” (Diário de campo, 25/11/2017).

O registro da pesquisadora indica que o ingresso no campo empírico da pesquisa é, muitas vezes, como adentrar em um ‘universo desconhecido’, especialmente no caso desta investigação que foi realizada no contexto de uma Igreja Evangélica Pentecostal, religião que a pesquisadora não frequentava. Se por um lado, há insegurança e receio sobre como será a entrada no campo empírico, pelo fato de ser a primeira exposição em uma determinada situação, por outro lado há a clareza do pesquisador que esta etapa da pesquisa pode ser definidora para sua continuidade.

O entendimento de que era necessário estar aberto a essa nova experiência, sem julgamento e pré-conceito, foi acompanhado de um exercício de reflexão sistemático, pois, muitas vezes, o modo como as ações eram conduzidas neste espaço, as falas, os valores, as cobranças para com as crianças eram contrários às expectativas dos pesquisadores. Contudo, a entendimento dos fundamentos da etnografia, que visam conhecer e até mesmo compreender o que acontece em uma comunidade, neste caso dos Pentecostais da Igreja Evangélica Casa de Oração, se fez presente a todo o momento. No que tange à pesquisa etnográfica, Hammersley e Atkinson (2022, p. 20) destacam que “o objetivo é investigar alguns aspectos da vida das pessoas, o que elas fazem, como elas encaram as situações que enfrentam, como consideram umas às outras, e também como veem a si mesmas”.

Desse modo, considera-se que para compreender o contexto pesquisado é necessário exercitar a sensibilidade para olhar, ouvir e aprender a cultura do outro. Nesse movimento, é alcançar uma aproximação, pesquisando, participando e interagindo com as atividades realizadas no grupo. A escrita da pesquisadora no diário de campo na primeira vez que participou do culto, demonstra esse movimento:

Fiquei quieta somente observando tudo que acontecia. Notei que quando havia indicação para leituras, as crianças também procuravam na Bíblia, até mesmo as que não eram alfabetizadas, os gestos dos adultos também eram repetidos pelas crianças como levantar as mãos em glória a Deus na hora das orações. Ainda percebi que certos cantos eram estrategicamente direcionados para minha presença no local como um que dizia: “Não importa que religião você é se está aqui meu irmão é” (Diário de campo, 25/11/ 2017).

Os eventos que envolveram a leitura da bíblia possibilitaram a participação das crianças, mesmo aquelas que não sabiam ler. Resalta-se, portanto, que o letramento se ocupa das competências de utilizar os conhecimentos de leitura e escrita no cotidiano, isso promove que o sujeito desenvolva curiosidade pela leitura e escrita e queira participar ativamente de situações do dia a dia, mesmo que não esteja alfabetizado, de acordo com Street (2014, p. 97) “o que o letramento é para qualquer grupo é o que ele é nos contextos em que é vivenciado”.

No que se refere ao comportamento das crianças no culto, identifica-se a perspectiva de Corsaro (2009), ao afirmar que elas não apenas se adaptam e reproduzem o que lhe é proposto, mas também interpretam por meio da interação entre seus pares, atribuindo sentido próprio às diferentes situações. Ou seja, ao imitar os gestos dos adultos elas não estão simplesmente copiando, mas ressignificando o que é vivido e construindo sobre os modos de participação esperados e aceitáveis por aquela comunidade. Contudo, Sarmento (2006, p. 19) ressalta que:

Quando nasce, a criança vai entrar num mundo em que lhe é permitido fazer certas coisas e outras lhe são interditadas, onde é conduzida a comportar-se e a pensar de determinados modos e onde outros modos de pensar ou de se comportar são reprimidos.

Conforme a participação nas ações promovidas pela Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração foi se tornando mais efetiva, foi possível perceber que tanto as permissões, quanto as proibições eram explicitadas de forma direta, de modo geral trazendo como justificativa pela evangelizadora o que agrada ou não a Deus.

Após essa participação inicial, em final de novembro de 2017, houve um recesso das atividades e a inserção no campo empírico da pesquisa foi retomado em 2018. Considerando esse intervalo, pode-se entender que foi como iniciar novamente, porém, sem o receio de adentrar em um terreno totalmente desconhecido, conforme indica o registro reflexivo no diário de campo:

Minha próxima observação no grupo aconteceu dia 02 de março de 2018, nesta ocasião já estava mais tranquila, pois já havia passado a aflição do primeiro momento e a incerteza de como seria recebida no grupo, também entendia que como todos estavam informados da minha condição de pesquisadora o trabalho seria menos tenso (Diário de campo, grifos do autor, 02/03/2018).

Visando uma maior apropriação do campo empírico da pesquisa, no intervalo de tempo em que não acompanhou as atividades das crianças no grupo de estudos nem no culto, a pesquisadora buscou informações sobre a religião e as práticas realizadas, conforme identifica-se no diário de campo:

Resolvi tomar algumas atitudes para que não fosse considerada como alguém que estivesse estrangeira naquele espaço, pois entendi que ser aceita é um processo que envolve principalmente ser vista como integrante daquele grupo. Assim, eu pesquisei por hinos que eles costumavam cantar e comecei a cantar e orar junto, o resultado foi imediato, no momento que a evangelizadora lia a Palavra de Deus, como eu não possuía Bíblia na mão para acompanhar, uma senhora procurou o salmo que estava sendo lido e me entregou sua Bíblia aberta. Neste momento eu percebi que estava começando a ser inserida como uma integrante do grupo (Diário de campo, 06/04/2018).

Esta interação com o grupo pesquisado foi aos poucos oportunizando um aprendizado sobre as pessoas, possibilitando entender seus olhares, expressões faciais, repetição de palavras, posição corporal e até mesmo silêncios, que falam da cultura e do letramento realizado neste contexto. Contudo, a aceitação inicial da pesquisadora no grupo não foi imediata, assunto tratado a seguir.

Rejeição/aceitação da pesquisadora pelas crianças

O estudo teórico realizado concomitantemente à inserção no espaço empírico em um movimento dialético, foi imprescindível. Todavia, os referenciais teóricos da etnografia interacional e da sociologia da infância não garantiram que o contato com elas fosse imediato e tranquilo. Muitas vezes a pesquisadora foi ignorada, conforme é possível perceber em outro excerto no Diário de Campo, do dia 23/05/2018:

Percebi que a A. e a L. conversavam sobre o culto ocorrido em um dia que eu não estava presente, me aproximei e perguntei se poderiam me contar sobre esse dia, as meninas se olharam e disseram que não aconteceu nada diferente, logo a L. começou a cantar um louvor bem baixinho e se afastou. Percebi então que não era bem-vinda na conversa e respeitei esse momento.

Esses eventos, que se configuraram em certa rejeição das crianças para com a pesquisadora, foram importantes para aprender sobre pesquisa com crianças, bem como para refletir sobre o que deu ou não certo e investir em novas estratégias visando ser aceita no grupo e participar das interações. Graue e Walsh (2003) tratam sobre a importância do respeito e dos acordos para obter aceitação no mundo das crianças, destacando que:

Entrar na vida das outras pessoas é ser-se um intruso. É necessário obter permissão, permissão essa que vai além da que é dada sob formas de consentimento. É a permissão que permeia qualquer relação de respeito entre as pessoas. Na vida quotidiana as pessoas estão constantemente a negociar essa permissão com os outros, mas só raramente os adultos o fazem com as crianças. Nas relações entre adultos e crianças, os adultos são, a maior parte das vezes, aqueles que detêm o saber, dão a permissão e fixam as regras. Na investigação com crianças são as crianças que detêm o saber, dão a permissão e fixam as regras para os adultos. (GRAUE E WALSH, 2003, p. 76 - 77).

Sabe-se que, muitas vezes, os tempos das crianças não são os mesmos que os dos adultos. Tem-se pressa para estabelecer vínculos, para produzir dados e, para escrever sobre eles. Contudo, quem se dispõe a fazer pesquisa etnográfica com crianças, precisa lidar com o tempo de outra forma, considerar o ritmo delas e compreender que isso também pode ser um dado relevante de ser analisado. Em relação à falta de aproximação com o grupo investigado, Campos (2008, p. 38) ressalta que, “uma das formas de tentar superar essa distância, [...], é colocar-se como parceiro, falando sobre si próprio, procurando mostrar-se como pessoa”.

Assim, considera-se que a participação nas atividades direcionadas para as crianças, a opção por dirigir a fala e as perguntas para elas e não para o adulto que estava conduzindo a atividade, valorizando suas respostas, foram estratégias importantes em direção à aproximação das crianças. Além disso, cabe destacar que a observação atenta ao que ocorria na rotina dos encontros indicou que o momento da alimentação era valorizado pelo grupo, desse modo, a pesquisadora passou a levar alimentos para contribuir com lanches durante as atividades, o que surtiu um efeito positivo.

Isso ficou evidente em um dos cultos que a pesquisadora participou como observadora. Nesse dia, o pastor recitou a seguinte parte da bíblia: “E quem der, mesmo que seja apenas um copo de água fria a um destes pequeninos, por ser este meu discípulo, com toda a certeza vos afirmo que de modo algum perderá a sua recompensa” (Mateus, capítulo 10, versículo 42).

Após terminar o culto, D. (5 anos) chamou a pesquisadora e falou: “Tu ouviu o que Deus falou pra ti no culto? Ele tá feliz porque tu nos dá lanche e vai te recompensar em dobro. Tu sempre vai ter muito dinheiro pra comprar essas coisas pra gente é só tu seguir sendo fiel a Deus e confiar” (Diário de Campo, 22/10/2018).

A fala da criança, a partir da leitura da Bíblia pelo pastor, é uma evidência que a estratégia de levar alimentos para o grupo de estudos bíblicos foi percebida como algo importante. Receber alimento, compartilhar refeições são ações que de modo geral aproximam as pessoas. De acordo com Carvalho, Luz e Prado (2011, p. 159):

Se a comida assume significados, o que é uma ideia convencional e arbitrária, o alimentar-se assume sentidos que dizem respeito à significação no contexto de um universo imaginário e simbólico, não necessariamente racional [mas] capaz de produzir identidades individuais e coletivas, relações sociais e vínculos que ultrapassam a lógica consciente do discurso.

Nessa perspectiva, observa-se que compartilhar alimento com as crianças, durante as reuniões do grupo de estudos bíblicos possibilitou construir laços, produzir identidade entre aqueles que participavam do ritual da alimentação. Isso foi manifestado por D. (5 anos) quando expressou para a pesquisadora que ela vai ter muito dinheiro para comprar comida para eles, contudo, coloca a condição de que é necessário ser fiel a Deus.

Aos poucos, outros sinais evidenciavam que ela estava conquistando a confiança das crianças e que elas entendiam a sua posição no grupo. Isso fica evidente na seguinte descrição no diário de campo, do dia 30/06/2018:

Hoje, em minhas observações no grupo de estudos bíblicos, percebi indícios de que estou sendo aceita pelas crianças e que elas não estão me vendo como um adulto disciplinador. Perguntei para a A. (6 anos) se ela rezava em casa e a sua resposta foi: “Eu não rezo, eu oro, já te ensinei isso umas quantas vezes e tu não aprende nunca”. Em outro episódio L. (9 anos) falava que queria contar seu sonho, mas estava com dificuldade para lembrar, então pedi que ele fizesse um esforço e tentasse recordar. A resposta dele foi. “Eu não tento, porque não tenho um tentador, precisas aprender a não falar mais esta palavra”.

Refletindo sobre o excerto acima, chama a atenção que os significados que as crianças atribuem às palavras são vinculados ao contexto da religião que elas vivenciam cotidianamente. As falas das crianças permitem, de certa forma, compreender como elas pensam, sentem e valorizam alguns aspectos da cultura compartilhada pelas pessoas que frequentam a Igreja Evangélica Pentecostal. Em diversos eventos, observa-se que as crianças demonstram uma postura de evangelizadores, reproduzindo aquilo que vivenciam no grupo de estudos bíblicos. Exemplo disso é o excerto do diário de campo no dia 03/08/2018:

Hoje a M. (11 anos) perguntou para mim o motivo que eu tinha faltado diversos encontros do grupo e alguns cultos, expliquei para ela que eu estava trabalhando muito e meu marido também. A resposta dela foi. “Mas vocês precisam entender que em primeiro lugar está a Igreja, o trabalho vem depois”. Lembrei do pastor falando que para um cristão a obra de Deus está em primeiro lugar e entendi a argumentação da M, era mais uma forma dela me ensinar.

Em outro momento a mesma menina mostrou para a pesquisadora uma publicação que tinha sido postada no grupo de WhatsAppp pelo Presbítero da igreja e falou: “Olha sobre o que eu te falei.”

Fonte: Igreja Pentecostal Casa de Oração.

Figura 1 Registro fotográfico de publicação do Whatsapp da Igreja Casa de Oração 

Interessante ressaltar o modo que as crianças passaram a se colocar na interação com a pesquisadora. Cabe lembrar que, inicialmente, ela procurou esclarecer que estava ali para aprender sobre o que acontecia no grupo de estudos bíblicos e contava com as crianças para isso. Ao que tudo indica, elas corresponderam a esse objetivo e passaram grande parte do tempo expressando o que pode e o que não pode perante os preceitos religiosos que seguiam. Isso é perceptível no diálogo estabelecido com o menino Ad. (5 anos):

Ad: Por que tu tem esse desenho no braço? Deus não se agrada disso

Eu: Vou te explicar. Quando eu me formei professora eu fiquei muito feliz e queria que todos pudessem saber que eu era uma professora, então resolvi fazer essa tatuagem que é o símbolo do meu curso e demonstra o amor que eu tenho em dar aula.

Ad: Satanás mora nesse desenho, tu pode ser castigada e não ir para o céu, mas como tu não conhecia Deus quando fez este desenho e como eu gosto de ti e tu gosta de mim eu não vou contar pra ninguém que tu tem esse desenho no braço. Tá combinado? (TRANSCRIÇÃO DIA 18/08/2018).

A fala do menino no diálogo acima apresentado, mostra as proibições, restrições e punições que são insistentemente pregadas no culto e no grupo de estudos bíblicos. Elas são incorporadas em seu vocabulário e servem para argumentação e cobrança.

Cabe ainda destacar no diálogo relatado, o conflito que certas contradições causam na criança e as estratégias que ela encontra para tentar resolver a situação. Ad., ao ver a tatuagem no braço da pesquisadora, percebe que é algo inaceitável pela Igreja e por isso ela deveria ser “castigada não indo para o céu.” Contudo, tendo em vista que ele gosta da pesquisadora e quer que ela permaneça no grupo, ele encontra uma estratégia para resolver esse problema, justificando que na ocasião que a tatuagem foi feita ela não conhecia Deus. Para Ad., esse fato livraria a pesquisadora da culpa e decidiu não contar para ninguém, o que na sua perspectiva, resolveria o problema.

A situação descrita vai ao encontro das palavras de Corsaro (2009, p. 34) quando afirma que “[...] as crianças não imitam simplesmente modelos adultos nessas brincadeiras, mas antes elaboram e enriquecem continuamente os modelos adultos para atenderem a seus próprios interesses” (CORSARO, 2009, p. 34). Analisando diálogos, ações e comportamentos das crianças, o autor identificou que elas vão além da imitação de situações conhecidas e das informações disponibilizadas pelos adultos, o que Corsaro (2009) denominou ‘reprodução interpretativa’. Esse conceito comporta as apropriações que as crianças fazem de informações do mundo adulto, com o intuito de atender seus interesses, elas também criam suas culturas, a partir dessa apropriação. A ‘reprodução interpretativa’ possibilita a compreensão de que as crianças são tanto produzidas pela cultura do contexto em que estão inseridas quanto produtoras dessa cultura. Os dados apresentados até então, mostram como as crianças vão fazendo parte do contexto que estão inseridas. A seguir coloca-se o foco da escrita nas reflexões da pesquisadora sobre as observações realizadas.

Julgar e despir-se de preconceito

Uma das primeiras preocupações em relação à inserção no campo empírico da pesquisa foi de não ser aceita pela liderança da Igreja Pentecostal. Isso porque, a pesquisadora que realizou as observações trabalhou como catequista da Igreja Católica por quase 20 anos na comunidade. Porém, para sua surpresa, foi acolhida sem nenhuma objeção, sendo isso decisivo para a realização da pesquisa. Interessante colocar, que a pesquisadora pensava que seria considerada uma rival ou inimiga, por ser engajada em outra religião, o que a fez rever sua posição, possíveis julgamentos e preconceito. Desse modo, a reflexão constante foi necessária, para investigar sobre as práticas de letramento em um grupo de estudos bíblicos e, principalmente, para se manter aberta e vigilante a todo o momento. Assim, realizou um constante exercício para que não houvesse um choque cultural, causado pelo seu estranhamento das práticas pentecostais e também pela constante crítica à igreja católica que estava presente no meio pentecostal. Esse processo está descrito em vários momentos no diário de campo, dentre eles, destaca-se o seguinte:

Percebo que durante os cultos, várias vezes acontecem pregações condenando as práticas da religião católica, dizendo em tom bastante fervoroso que Nossa Senhora Aparecida não é santa e que o único que merece a adoração é Deus. Nesses momentos, todos concordam com as expressões “Glória a Deus” ou “Amém” e vejo que muitos olhares são direcionados para mim, pois sabem de minha opção religiosa. Assim, resolvi que para não ser considerada estrangeira neste meio que precisaria também acolher os discursos com respeito sem trazer minhas convicções e preconceitos (Diário de campo, 07/03/2018).

No excerto acima, a pesquisadora toma uma decisão importante quanto sua posição no contexto da pesquisa. Percebeu que não poderia permanecer com uma postura de resistência aos preceitos religiosos que ouvia, pois não estava ali como fiel e sim como pesquisadora, desse modo, foi ajustando o que pensar e fazer.

Algumas mudanças de hábitos foram importantes, considerando, por exemplo, que o uso de saias e vestidos pelas mulheres era uma regra na igreja. Sobre isso a pesquisadora escreveu:

Aos poucos percebi que as vestimentas fazem parte da identidade pentecostal, sendo de imensa importância para todos, portanto quando eu uso calças causo nas pessoas estranhamento e por consequência, distanciamento. Então, assim como para mim o uso de escapulário é essencial para processar minha fé católica, para os pentecostais a vestimenta tem o mesmo significado e preciso respeitar meus sujeitos de pesquisa, pensando dessa forma, quando estiver observando as crianças nos cultos, vou passar a usar também saias ou vestidos (Diário de Campo, 19/05/2018).

Na parte final do culto, eram realizadas as sessões de ‘libertações’ que consistiam em orações feitas pelos obreiros - pessoas que tem um papel atuante na igreja - para expulsar espíritos ou demônios. Contudo, todos que frequentavam a igreja passavam por esse momento, inclusive as crianças, sendo uma etapa do culto permeada por intensas orações e comoções.

Dentre as observações realizadas, esse era o momento que causava intensa inquietação na pesquisadora, pois quando as crianças recebiam essas orações geralmente caiam como desmaiadas e ela sempre ficava preocupada com o que isso poderia causar na parte emocional delas. Porém, no decorrer da pesquisa com reflexões e aprofundamento teórico, foi compreendendo que “a verdade é que o que constitui um comportamento perigoso depende muito de quem está a julgar e de quando o faz” (GRAUE; WALSH, 2003, p. 78).

Por fim, apresenta-se mais um excerto do diário de campo em que se pode observar o grande desconforto da pesquisadora em relação a uma situação. O trecho refere-se ao discurso do pastor sobre o papel do homem e da mulher na sociedade. Conforme o registro:

Sua oratória foi intensa, falando alto, caminhando entre as pessoas e olhando fixo nos olhos, foi difícil ouvir calada trechos onde o pastor se referia à mulher como a parte fraca de um relacionamento, salientando que a condição feminina condiciona que fique vulnerável a ação do demônio, condenou a separação e pregou que a mulher deve sempre esperar o marido com chimarrão, alcançar a roupa no banho e lavar a louça com cuidado para economizar detergente, com paciência e sem reclamações (Diário de campo, 19/05/2018).

Mais uma vez o perfil de pesquisadora precisou se sobressair e entender que não caberia o julgamento. A sua postura, neste contexto, consistia em produzir dados aprendendo com as pessoas, entendendo o que fazem, o que pensam, como significam e como tudo isso se transforma em práticas de letramentos vivenciadas pelas crianças. Novamente, a imersão no campo empírico da pesquisa, concomitante ao aprofundamento teórico, tem um papel fundamental na condução da investigação. Conforme Graue e Walsh (2003, p. 93), “a compreensão deriva das formas de ver, conhecer e relacionar. O que se pode saber estar inerentemente ligado, não só a como observamos e porque o fazemos, mas também a como interagimos com os que nos rodeiam”. Porém, as interações que caracterizam a investigação etnográfica, também resultaram em profundo envolvimento com o meio pesquisado, trazendo reflexões e aprendizado, com cuidado para evitar julgamentos e pré-conceitos.

Diversas escritas no diário de campo indicam o movimento da pesquisadora em direcionar sua atenção para o cerne da pesquisa, ou seja, “tentei focar minhas observações no comportamento das crianças, percebi que estas repetiam os atos de se ajoelhar, abrir a Bíblia, levantar os braços em adoração e louvar, porém brincavam, conversavam e corriam na rua, apesar de seus pais solicitarem silêncio a todo o momento” (Diário de campo, 04/08/2018).

Esse exercício de ir e vir é constante, pois a evangelizadora, que conduz as atividades no grupo de estudos bíblicos “a todo momento proíbe as crianças de falar sobre algum assunto, e eles perguntam seguidamente para ela de podem contar sobre algo” (Diário de campo, 04/08/2018). Contudo, neste contexto a pesquisadora vai achando brechas e buscando “estratégias bem definidas para produzir dados a partir da escuta das crianças, com um olhar e ouvir muito atento e isso também inclui um envolvimento intenso e conhecimento baseado em um longo tempo em campo” (Diário de campo, 04/08/2018).

Aos poucos os acordos com a evangelizadora também aconteciam, mesmo que de forma não tão direta e explícita. A presença da pesquisadora como alguém que pode dar uma contrapartida ou a sua perspicácia em se colocar à disposição no momento apropriado, foi abrindo espaço para que a pesquisa avançasse. O excerto a seguir indica essas negociações.

No caminho para a cidade vizinha, a evangelizadora comunicou que iria realizar um trabalho antes do culto com as crianças, mas não tinha material para disponibilizar para as mesmas trabalharem, então me coloquei a disposição para comprar, porque considerei que seria uma ótima oportunidade de observar as práticas de letramento realizadas com as crianças e realmente foi (Diário de campo, 04/08/2018).

Assim, em diversas escritas no diário de campo, identificou-se situações como essas em que a pesquisadora percebe possibilidades de maior inserção no grupo e investe nesses momentos, ganhando a confiança dos participantes e ao mesmo tempo sentindo-se, de certa forma, mais pertencente ao contexto, ou seja, “[...] os eventos da vida cotidiana são como textos a serem lidos e interpretados pelos participantes do grupo, durante o próprio processo de constituição desses eventos” (CASTANHEIRA; DIKSON, 2007, p. 28).

Como se pode observar nesta seção, as escritas reflexivas no diário de campo foram muito importantes não só para a pesquisadora refletir por meio de suas escritas, mas também para que se pudesse voltar a elas, após cinco anos e analisá-las, a fim de compreender os desafios e possibilidades enfrentados nas pesquisas com crianças.

Considerações finais

Ao longo deste artigo, apresentou-se dados de uma pesquisa com crianças, realizada entre 2017 e 2019, sobre as práticas de letramento em um grupo de estudos bíblicos, da Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, em uma comunidade rural no interior do Rio Grande do Sul. No que se refere ao letramento, buscou-se analisar os aspectos situados no grupo de estudos bíblicos, entendendo que investigá-lo requer uma imersão no contexto onde se constitui, a fim de compreender as práticas estabelecidas por um grupo específico. Assim, observou-se que as crianças, mesmo sem saberem ler, participavam ativamente nos momentos de leitura da bíblia, utilizando diferentes estratégias que possibilitavam, mesmo que de forma restrita, a participação em eventos sociais permeados pela escrita.

Contudo, o foco da discussão ao longo do texto foi a perspectiva de quem pesquisa, apresentando os desafios, as possibilidades e as negociações estabelecidas no momento inicial de imersão no campo empírico tendo as escritas do diário de campo de uma das autoras como fonte de dados.

Os dados da pesquisa qualitativa, realizada com crianças, a partir da etnografia interacional mostraram os receios, os desafios e as reflexões registrados do diário de campo pela pesquisadora. Além disso, foi possível conhecer as estratégias que lançou mão para ser aceita pelo grupo, as constantes reflexões para se despir de preconceitos, administrar os momentos conflitantes, considerando, sobretudo, que os preceitos professados na Religião Pentecostal iam, muitas vezes, de encontro aos da pesquisadora. Destaca-se o quanto o aporte teórico foi fundamental para compreender e reafirmar o papel do pesquisador na perspectiva da pesquisa etnográfica bem como orientar a decisões tomadas a cada momento.

O processo da pesquisa exigiu constange vigilância, também demandou ouvir mais e falar menos, a observar e interpretar o significado das palavras, dos gestos e dos olhares em um contexto específico. Foi preciso aprender a lidar com o tempo, que é diferente para o adulto e para as crianças. Ao adentrar no contexto do grupo de estudos bíblicos, da Igreja Evangélica Pentecostal Casa de Oração, a pesquisadora vivenciou certa rejeição inicial, pois era uma ‘intrusa’ neste espaço. Foi alvo de críticas por parte das crianças, considerando que sua postura não era compatível ao que acontecia nos encontros.

Com isso, precisou se colocar no papel de aprendiz, mudar hábitos, pensar em estratégias para ser aceita pelas crianças, conforme foi demonstrado nos excertos analisados ao longo do texto, como, por exemplo, perguntar para as crianças e não para os adultos; identificar o modo de vestir e de se manifestar naquele espaço, reconhecer as palavras aceitas e as proibidas para assim, realizar mudanças de hábitos a fim de ser acolhida pelo grupo. Durante os momentos de interação com as crianças, diversas vezes foi ressaltado que a pesquisadora estava ali para aprender, reafirmado o lugar de participante/aprendiz no contexto do grupo pesquisado, o que oportunizou a observação atenta e um diálogo vigoroso com as crianças. Isso possibilitou, cada vez mais, despir-se da perpectiva adultocêntrica e buscar compreender o mundo através dos olhos das crianças.

Diante do exposto, acredita-se que o artigo traz uma contribuição importante, especialmente, para quem faz este tipo de pesquisa, desnudando o processo e a complexidade das ações envolvidas. Quem se aventura na pesquisa etnográfica com crianças, necessita conhecer seus ritmos, as estratégias que elas utilizam no contexto em que vivem e sair da posição de adulto, de quem detém o conhecimento e o domínio da situação. Trazer as reflexões da pesquisadora como objeto de análise permitiu adentrar nesse universo que, não raras vezes, fica restrito a quem escreve.

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1Em relação aos princípios éticos, a pesquisa pautou-se na Resolução CNS Nº 466, de 12 de dezembro de 2012 (Ética na Pesquisa com seres humanos) e da Resolução CNS Nº 510, de 7 de abril de 2016 (Ética na Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais), sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos - CAAE: 62023722.2.0000.5317.

2Algumas das pesquisas desse grupo podem ser localizadas em https://www.researchgate.net/publication/257938880_How_a_Community_of_Inquiry_Shapes_and_Is_Shaped_by_Policies_The_Santa_Barbara_Classroom_Discourse_Group_Experience_as_a_Telling_Case

3As quatro unidades de registro: 1) pesquisa envolvendo crianças; 2) termo de assentimento; três bases de dados científicos; 3) consentimento dos pais; e 4) riscos e benefícios em pesquisas envolvendo crianças.

4Os dados da pesquisa foram gerados a partir da análise do conjunto de fontes (imagens fotográfcas, transcrições das filmagens, escritas no diário de campo). Foram realizadas exaustivas leituras e cruzamento de dados sobre as práticas de letramento vivenciadas pelas crianças.

Recebido: 31 de Outubro de 2022; Aceito: 05 de Fevereiro de 2023

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