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Revista Brasileira de Educação Médica

versão impressa ISSN 0100-5502versão On-line ISSN 1981-5271

Rev. Bras. Educ. Med. vol.45 no.1 Rio de Janeiro  2021  Epub 28-Jan-2021

https://doi.org/10.1590/1981-5271v45.1-20200098.ing 

ARTIGO ORIGINAL

Desafios para o aprendizado de neurorradiologia na graduação médica: análise do ponto de vista discente

Esther de Alencar Araripe Falcão Feitosa1  2 
http://orcid.org/0000-0003-1447-7320

Luiz Henrique Costa Neto2 
http://orcid.org/0000-0001-7195-4432

Carina de Oliveira Gregório1 
http://orcid.org/0000-0001-6579-599X

Letícia Nobre Limas1 
http://orcid.org/0000-0001-7758-4372

Paulo Goberlânio de Barros Silva1 
http://orcid.org/0000-0002-1513-9027

Carlos Eduardo Barros Jucá1  2 
http://orcid.org/0000-0003-3269-2577

1 Centro Universitário Christus, Fortaleza, Ceará, Brazil.

2 Universidade de Fortaleza, Fortaleza, Ceará, Brazil.


Resumo:

Introdução:

O ensino da neurorradiologia na graduação médica deve ser encarado como uma ferramenta de integração para o estudo interdisciplinar de radiologia, anatomia e neurologia. Na prática, percebe-se uma limitação dos alunos em adquirir tais conhecimentos, seja pela “neurofobia”, seja pela falta de conhecimentos anatômico-radiológicos prévios e também pela carência de materiais didáticos integrados direcionados para a graduação. Contudo, há poucos trabalhos relatando as dificuldades encontradas pelos alunos no aprendizado de neurorradiologia .

Objetivo:

Avaliar a percepção dos estudantes de medicina sobre as dificuldades do aprendizado em neurorradiologia.

Método:

Estudo quantitativo, realizado com estudantes de medicina matriculados no segundo e no sétimo semestres de uma universidade de Fortaleza. Os dados foram obtidos por meio de questionário estruturado com 12 questões de respostas sim ou não. As questões versaram sobre as possíveis dificuldades encontradas para aquisição do conhecimento neurorradiológico, dentre elas: à carência de material didático direcionado, à falta de integração com a neurologia, à necessidade de conhecimentos básicos radiológicos e anatômicos, ao volume de assunto, e às limitações das metodologias ativas e tradicionais.

Resultados:

Foram analisados 181 questionários. Grande parte discente refere como dificuldade a necessidade de ter conhecimentos básicos prévios de radiologia (80,1%); de neuroanatomia (77,5%); e de correlacionar radiologia e neuroanatomia (70,9%). Quando comparados os grupos do 2o semestre e do 7o semestre, houve uma tendência maior a apontar a ausência de conhecimento prático de neurologia pelos alunos do 2o semestre como um fator de maior dificuldade para o aprendizado de neurorradiologia (82,6% versus 67,4%, com p<0,0018). Quando perguntados sobre a utilidade da criação de um e-Book direcionado para a graduação para o aprendizado de neurorradiologia, 85,6% dos alunos responderam afirmativamente; no caso de um aplicativo, 92,3% concordaram. Quanto à correlação entre a neurorradiologia e a prática médica, 98,3% responderam que é um conhecimento útil e necessário.

Conclusão:

Na opinião dos estudantes, os conhecimentos prévios de neuroanatomia e de neurologia clínica são importantes para o aprendizado de neurorradiologia. A elaboração de um material como e-book ou aplicativo com foco em integrar o ensino dessas disciplinas é considerada uma boa alternativa para facilitar a compreensão da neurorradiologia.

Palavras-chave: Educação Médica; Radiologia; Neurologia; Neurociências; Ensino; Material Didático; Estudantes de Medicina; Neurofobia

Abstract:

Introduction:

The teaching of neuroradiology in undergraduate medical school must be seen as an integration tool for the interdisciplinary study of radiology, anatomy and neurology. In practice, there is a limitation on the part of students in acquiring such knowledge, either due to “neurophobia”, or due to the lack of previous anatomical-radiological knowledge and also due to the lack of integrated didactic materials aimed at undergraduate school. However, there are few studies reporting the difficulties encountered by students in learning neuroradiology.

Objective:

To assess the perception of medical students about learning difficulties in neuroradiology.

Method:

Quantitative study, carried out with medical students enrolled in the second and seventh semesters of a university in Fortaleza. Data were obtained through a structured questionnaire with 12 yes or no answer questions. The questions addressed the possible difficulties encountered in acquiring neuroradiological knowledge, among them: the lack of targeted didactic material, the lack of integration with neurology, the need for basic radiological and anatomical knowledge, the large volume of content to study, and the limitations of active and traditional methodologies.

Results:

181 questionnaires were analyzed. Most students report as difficulties: the need for basic knowledge of radiology (80.1%); neuroanatomy (77.5%); and to correlate radiology and neuroanatomy (70.9%). When comparing the 2nd semester and 7th semester groups, there was a greater tendency to point out the lack of practical knowledge of neurology by 2nd-semester students as a factor of greater difficulty in learning neuroradiology (82.6% versus 67.4 %, with p <0.0018). When asked about the usefulness of creating an e-book aimed at undergraduate students for learning neuroradiology, 85.6% of the students answered affirmatively; in the case of a mobile application, 92.3% agreed. As for the correlation between neuroradiology and medical practice, 98.3% answered that it is useful and necessary knowledge.

Conclusion:

In the students’ opinion, previous knowledge of neuroanatomy and clinical neurology is important for learning neuroradiology. The development of material such as an e-book or mobile application focused on integrating the teaching of these disciplines is considered a good alternative to facilitate the understanding of neuroradiology.

Keywords: Medical Education; Medical Student; Medical School; Radiology; Neurology; Neuroscience

INTRODUÇÃO

O ensino da neurorradiologia para a graduação médica pode funcionar como uma ferramenta de integração interdisciplinar e transdisciplinar dentro da matriz curricular das universidades, introduzindo o desenvolvimento de competências assistenciais desde o início de sua abordagem no curso médico1),(2. A inserção precoce da radiologia nos primeiros semestres do curso tem efeito positivo, visto que essa área permite a elucidação de processos fisiopatológicos e alterações morfofuncionais ainda dentro de semestres básicos do curso de Medicina1)-(6.

Uma grande limitação apontada pelos estudantes para a fixação dos conhecimentos das áreas básicas é justamente a falta de integração com a prática médica2. A falta de conhecimento sobre as possíveis aplicações práticas do que está sendo estudado gera desinteresse7)-(9. A radiologia, neste contexto, pode auxiliar na introdução de conceitos clínicos de forma introdutória dentro do curso, fazendo elo com questões práticas do cotidiano médico10).

É cada vez mais comum nos cursos de Medicina a mudança da matriz curricular com o intuito de adotar as metodologias ativas como pilares do ensino, permitindo que o aluno busque livremente o conteúdo necessário, emponderando-o do seu próprio conhecimento11),(12. Para o sucesso do método, porém, é necessário que o discente possua intimidade e confiança com as diversas fontes bibliográficas disponíveis. Além de artigos científicos e livros, atualmente é possível encontrar e-books, sites, aplicativos e até mesmo redes sociais. Contudo, essas últimas fontes menos tradicionais, embora sejam muitas vezes até mais didáticas, costumam gerar dúvidas quanto à confiabilidade, limitando de certo modo o seu uso de forma mais ampliada2).

Na prática docente, a neurorradiologia é considerada um assunto complexo pelos alunos. Alguns fatores podem ser implicados, como a neurofobia relacionada às neurociências8),(9),(13; a limitação na compreensão dos aspectos mais básicos da radiologia em si, como a física aplicada à Medicina e o uso correto das terminologias radiológicas2; além da noção de tridimensionalidade dos aspectos anatômicos. Percebe-se ainda carência de material direcionado para a graduação, limitando o aprendizado na ausência de um profissional radiologista como guia, algo que vai de encontro às bases do aprendizado por meio de metodologias ativas2.

Embora muito seja proposto, há poucos trabalhos nacionais direcionados para esta avaliação, limitando a viabilização de soluções para os possíveis problemas. Sendo assim, é fundamental avaliar a opinião dos discentes sobre as dificuldades encontradas para o aprendizado de neurorradiologia, com o intuito de subsidiar a aquisição de conhecimentos neste campo14),(15.

O objetivo deste trabalho foi analisar a percepção dos estudantes de Medicina sobre os desafios no ensino da neurorradiologia, inclusive avaliando o uso das metodologias ativas nesse processo, permitindo a construção de estratégias que estimulem o aprendizado.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal e quantitativo, realizado por meio da elaboração de um questionário estruturado direcionado a alunos de uma faculdade de Medicina privada situada na cidade de Fortaleza (CE), que utiliza estratégia de ensino centrada no aprendizado baseado em problemas (ABP), a qual apresenta ferramentas pedagógicas que estimulam o aluno a buscar o conhecimento, diferentemente da metodologia passiva, composta predominantemente por aulas expositivas.

O questionário possuía um total de 16 itens e foi direcionado para avaliação das dificuldades enfrentadas pelos discentes no estudo de neurorradiologia. As perguntas versaram sobre características demográficas da população e suas concepções pessoais sobre o ensino de neurorradiologia na graduação.

Os critérios de inclusão foram que os alunos estivessem matriculados e com assiduidade maior que 75% nos semestres com neurorradiologia: o segundo (devido ao módulo de sistema nervoso central) e o sétimo semestre (neurologia clínica) do curso de graduação em Medicina. Foi considerado como único motivo de exclusão a ausência deste critério.

Para a análise e disposição dos resultados, foram utilizados os softwares Epi Info 7 (CDC, 2019) e Google Forms. Os resultados numéricos foram expressos em forma de frequência absoluta e percentual e analisados pelos testes exato de Fisher e qui-quadrado de Pearson.

Quanto aos aspectos éticos, todos os respondentes decidiram livremente sobre a participação neste estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre Esclarecido e recebendo uma via do documento. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Christus, sob o parecer consubstanciado número 3.021.673. Não houve conflito de interesse por parte dos pesquisadores.

RESULTADOS

Ao todo, foram analisados 181 questionários, sendo 91 alunos do 2º semestre da faculdade de Medicina, em contato com disciplinas básicas, como neurociências e neuroanatomia; e 90 alunos do 7º semestre, cursando módulos clínicos, como neurologia, neurocirurgia e trauma. Todos os questionários foram aproveitados, não sendo necessário excluir nenhum discente. A maioria dos alunos tinha mais que 20 anos (67.6%) e houve um leve predomínio de mulheres (58,6%). A maioria (65,2%) possuía veículo próprio.

Inicialmente foram feitas cinco perguntas para avaliar fatores que pudessem contribuir para a dificuldade no ensino da graduação de neurorradiologia. As duas primeiras buscaram investigar se a necessidade de ter conhecimentos básicos sobre radiologia e neuroanatomia poderia representar uma dificuldade no estudo de neurorradiologia. Os dois questionamentos seguintes versaram sobre a importância da integração entre radiologia e neuroanatomia, bem como com a prática de neurologia e quanto ao estudo da disciplina. A quinta pergunta avaliou se o volume de conteúdo para pouco tempo disponível poderia ser visto como uma dificuldade no estudo de neurorradiologia.

A maioria dos alunos referiu como dificuldade para a compreensão de neurorradiologia a necessidade de ter conhecimentos básicos prévios de radiologia (80,1%), de conhecer a neuroanatomia (77,5%) e de correlacionar radiologia e neuroanatomia (70,9%). Quando comparados os grupos do 2º semestre e do 7º semestre, houve uma tendência maior a apontar a ausência de conhecimento prático de neurologia pelos alunos do 2º semestre como um fator de maior dificuldade para o aprendizado de neurorradiologia (82,6% versus 67,4%, com p<0,0018). Essas perguntas objetivaram avaliar se o próprio aluno tinha a capacidade de identificar o papel da integração interdisciplinar na sua formação. Além disso, a maioria dos alunos (89,9%) aponta como fator de dificuldade para o aprendizado de neurorradiologia o grande volume de conteúdo para o pouco tempo disponível dentro da matriz curricular.

A seguir, foram realizadas quatro perguntas para avaliar quais metodologias de ensino seriam preferíveis, na opinião dos alunos, para o aprendizado da neurorradiologia: PBL (problem based learning), TBL (team based learning), aula expositiva (metodologia passiva) e disposição dos exames de neurorradiologia numa workstation de laudos.

Quando questionados se consideravam o PBL e o TBL boas metodologias para o aprendizado em neurorradiologia, os alunos do 2º semestre tiveram uma maior tendência a responder positivamente em comparação com os alunos do 7º semestre (p<0,004), sendo que 51,7% dos alunos do 7º semestre responderam que não consideravam estes métodos adequados para o aprendizado de neurorradiologia. Um total de 78,2% dos alunos responderam que a aula expositiva seria uma boa metodologia para o aprendizado da disciplina, porém não houve diferença significativa entre os semestres. Ademais, a maioria dos alunos refere que o uso de workstations com exames reais (91,1%) seria útil para o aprendizado.

As duas perguntas seguintes objetivaram compreender se um e-book e um aplicativo direcionados para a graduação poderiam ser úteis no aprendizado de neurorradiologia. Quando perguntados sobre a criação de um e-book, 85,6% dos alunos responderam afirmativamente, concordando que poderia auxiliar no estudo da disciplina. No caso da criação de um aplicativo, 92,3% concordaram com um esperado efeito benéfico.

Por fim, o último item buscou avaliar de forma mais incisiva se a correlação mais explícita com a prática médica poderia ser útil no aprendizado de neurorradiologia. Um total de 98,3% dos alunos responderam que essa correlação é um conhecimento útil e necessário.

DISCUSSÃO

A vinculação entre dificuldade de compreensão de neurorradiologia e a necessidade de ter conhecimentos básicos prévios de radiologia, de neuroanatomia e de correlacionar radiologia e neuroanatomia corroboram com a necessidade de integração entre esses conteúdos. Tais percepções fortalecem a introdução da radiologia na matriz curricular desde o início do curso, de forma integrada com a anatomia16),(10),(17)-(23, como também sua manutenção nos ciclos clínicos, em conjunto com a neurologia15),(19),(24)-(26.

Outro ponto crítico destes dados é a carência no conhecimento das bases radiológicas, algo que deve ser encarado com preocupação. Na prática, percebe-se que muito comumente a matriz curricular das escolas médicas não possui módulos específicos para essa abordagem, deixando um déficit importante de conhecimento para o aluno, o qual talvez seja sanado no internato, ou apenas após a formatura, na prática médica, limitando o aprendizado de vários assuntos ao longo da graduação por falta de conhecimento sobre terminologia radiológica e princípios físicos.

Além disso, a neurorradiologia pode ser encarada como um pilar de ensino de metodologia ativa para o aprendizado de neuroanatomia. Além das dificuldades técnicas em conseguir cadáveres27 e dos custos de uma mesa de anatomia com recursos tridimensionais, é possível identificar nos exames de ressonância magnética e de tomografia computadorizada a anatomia, a fisiologia e a patologia in vivo19),(28. Uma prática já realizada em algumas universidades consiste na utilização de listas de trabalhos de casos clínicos anonimizados, previamente selecionados, onde todos os alunos podem ver as imagens sequenciais em “workstations” próprias para laudos. Além disso, a disponibilização de atlas online aproxima o aluno da prática, sem a necessidade de estar dentro do laboratório de anatomia. É certo que a visualização das imagens permite a aplicação prática de conceitos teóricos multidisciplinares29, sendo um verdadeiro tratamento para a “neurofobia”8),(9),(13),(19.

Quando comparados os grupos do 2º semestre e do 7º semestre, houve uma tendência maior a apontar a ausência de conhecimento prático de neurologia pelos alunos do 2º semestre como um fator de maior dificuldade para o aprendizado de neurorradiologia. Tal situação é apontada na literatura como um fator limitante para a fixação do conteúdo. Uma solução para essa questão é justamente introduzir alguns pontos da clínica neurológica de maneira associada, evitando que ocorra falta de interesse pelo tema por não haver conexão com aplicações práticas8),(9),(13.

“Um ponto que merece ser ressaltado é a escolha pormenorizada do conteúdo fundamental de neurorradiologia e neurologia para a graduação, algo que merece ser discutido dentro e fora das universidades, já que a introdução destes assuntos já no ciclo básico deve ser estimulada para uma maior fixação deste conteúdo8),(9. Reuniões periódicas sobre a análise curricular contemplando coordenadores, docentes e discentes de diferentes anos na graduação poderia trazer uma rica discussão sobre como proceder na construção de conteúdo contextualizado. Também nesse sentido, a aproximação dos alunos com a instituição e entre os próprios professores permite uma maior integração do conteúdo médico, tanto horizontal quanto vertical, facilitando o aprendizado das neurociências. Merece destaque a opinião dos recém-formados atuantes em pronto-socorro e nas unidades básicas de saúde, que podem trazer importantes contribuições para a reestruturação de um plano curricular mais prático e coerente dentro das universidades. Embora seja bastante desafiador manter proximidade com ex-alunos, acredita-se que os benefícios da auto avaliação curricular universitária seriam vastos.

Gráfico 1 Existe correlação entre a dificuldade no estudo na graduação de neurorradiologia e a falta de correlação com a prática clínica da neurologia. 

A maior tendência dos alunos do 2º semestre na valorização dos métodos PBL e TBL do que os do 7º semestre trouxe à tona uma questão enfrentada no ambiente de aula. Percebe-se, na prática docente, que a motivação com as metodologias ativas pode diminui ao longo dos anos, provavelmente devido à fadiga e à repetição, assim como ao grande volume de assunto a ser estudado e, no caso da neurorradiologia, à carência de material didático direcionado para este público2. Dessa forma, o aluno nos semestres mais avançados tem uma tendência a preferir que o conteúdo seja mais enxuto, poupando-o do estresse de procurar o conhecimento de forma livre na literatura. Nesse momento, cabe à universidade possibilitar que os alunos se sintam mais motivados na busca do conhecimento, fazendo do ambiente aula um momento inovador e evitando repetição de estratégias de ensino ao longo dos anos. O incentivo ao lúdico e inclusive o próprio uso de workstations com exames reais podem ajudar nesse processo, como confirmado pela maioria dos alunos. É importante perceber quando a mudança de uma dinâmica é necessária, já que são bem estabelecidas as vantagens em estimular o empoderamento dos protagonistas do aprendizado, compreendendo as limitações pedagógicas dos métodos em certos momentos7.

Gráfico 2 O TBL e o PBL podem ser boas metodologias para aprendizado de neurorradiologia 

Uma importante queixa da maioria dos alunos foi o grande volume de conteúdo de neurorradiologia para o pouco tempo disponível dentro da matriz curricular. Percebe-se na prática que os alunos seguem por grande parte da graduação sem conhecimento adequado sobre os princípios físicos, os riscos de cada método, a terminologia dos diferentes exames e a aplicação prática de sua solicitação, algo que traria impacto positivo no decorrer do curso médico se fosse adequadamente introduzido ainda no ciclo básico2.

Também existiu interesse no estudo com um e-book direcionado para a graduação e/ou uso de aplicativos confiáveis, sugerindo uma carência de material radiológico direcionado para esse público. O aluno do início do curso ainda não se familiarizou com vários termos médicos e a maioria tem dificuldade nas visualizações das imagens em diferentes planos. Tais habilidades podem ser melhoradas com o treinamento tridimensional, mais facilmente disponível nessas ferramentas.

Esse resultado permite considerar o uso de aplicativos e e-books como boas metodologias ativas. Tais dispositivos são altamente disponíveis, estando vinculados a smartphones e tablets, permitindo consultas rápidas e estudos mais demorados, além de possibilitar a visualização tridimensional das estruturas radiológicas, algo considerado muito importante no processo pedagógico do aprendizado em radiologia há muitos anos30. Uma estratégia bem avaliada em instituições médicas europeias para o ensino de Radiologia é o e-Learning. Trata-se justamente do uso de material eletrônico via internet para otimizar o entendimento, melhorar habilidades e promover mais experiência prática entre os alunos31.

Acredita-se que esses dados possam forçosamente ser estendidos para uma interpretação mais ampla sobre integrações efetivas e possíveis dentro de cada instituição. Entende-se que trazer o quotidiano do radiologista para a universidade, com o uso de “workstations”, programas reais de laudo com armazenamento de casos anonimizados em listas de trabalho, possa despertar maior interesse nos alunos a respeito da neurorradiologia, e consequentemente no estudo das neurociênciais.

Quanto à correlação entre a neurorradiologia e a prática médica, foi praticamente unânime que é um conhecimento útil e necessário. Tal percepção é clara na literatura, uma vez que a radiologia e a clínica são indissociáveis8),(25),(26),(32)-(34 e uma mesma imagem pode representar doenças completamente diferentes. Essa dependência deve servir de estímulo para a introdução precoce de casos clínicos nos semestres iniciais, estimulando o estudo multidisciplinar tanto horizontal, como vertical entre os semestres.

Gráfico 3 A correlação mais explicita com a prática médica pode ser útil no aprendizado de neurorradiologia. 

CONCLUSÕES

Percebe-se a necessidade de uma carga horária adequada de Radiologia nos laboratórios morfofuncionais nas novas matrizes curriculares, permitindo que conceitos básicos sejam trabalhados de forma mais perene, uma vez que, na opinião dos alunos, uma limitação do aprendizado de neurorradiologia é justamente a falta de conhecimentos básicos anatômico-radiológicos. É fundamental lembrar o papel interdisciplinar e multidisciplinar que a neurorradiologia desempenha perante os demais conteúdos básicos, agregando conhecimentos básicos anatômicos e clínicos já no início do ensino médico17),(22. Cabe às instituições de ensino explorar as reais possibilidades de integração, tanto horizontal quanto vertical, para o melhor aprendizado das neurociências. Reuniões periódicas entre os discentes e docentes dos diferentes anos e a aproximação entre a universidade e o recém-formado podem contribuir para uma reestruturação curricular e como também para a escolha adequada dos conteúdos fundamentais a serem abordados ao longo do curso.

A neurorradiologia pode ser encarada como um pilar de ensino de metodologia ativa para o aprendizado de neuroanatomia, tanto pelas dificuldades técnicas para a aquisição de cadáveres dentro das universidades, como também pelos custos de uma mesa digital de anatomia com recursos tridimensionais16),(22),(35),(36. É possível identificar em ressonâncias magnéticas e em tomografias computadorizadas a anatomia, a fisiologia e a patologia in vivo, permitindo inclusive planejamentos pré-cirúrgicos19),(28, levando o aluno a integrar conceitos teóricos29) na prática médica8),(9),(13),(19.

Faz-se necessária a introdução de alguns aspectos clínicos neurológicos e de neurociências durante o ensino de neurorradiologia para que os alunos de ciclo básico compreendam a importância do que lhes é apresentado. Outro ponto igualmente fundamental é a correlação de aspectos anatômicos durante o ensino de neurologia. Essas duas estratégias são verdadeiros pilares para o tratamento e a prevenção da “neurofobia” (8),(9),(21),(32),(33),(36.

Na opinião dos estudantes, os conhecimentos prévios de neuroanatomia e de neurologia clínica são importantes para o aprendizado de neurorradiologia, sinalizando que a integração multidisciplinar é percebida como uma ferramenta fundamental tanto para sedimentação do conteúdo, como também para despertar o interesse em assuntos menos atrativos.

A elaboração de materiais direcionados a graduação, como e-book ou aplicativo com foco em integrar o ensino das neurociências é considerada uma boa alternativa para facilitar a compreensão da neurorradiologia, algo que pode reduzir a resistência dos estudantes ao tema, consequentemente reduzindo a neurofobia. Tal resultado permite a extensão de que quanto mais real o quotidiano do radiologista for trazido para a sala de aula, com uso de listas de exames completos, visualização das imagens em “workstations”, mais interessantes os conteúdos de neurorradiologia e ciências correlatas se tornarão.

Este estudo foi realizado em apenas uma instituição, o que pode limitar generalizações.

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7Avaliado pelo processo de double blind review.

FINANCIAMENTO Declaramos que não houve financiamento para a realização desta pesquisa.

Recebido: 14 de Abril de 2020; Aceito: 05 de Dezembro de 2020

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Editora-chefe: Daniela Chiesa. Editor associado: Pedro Tadao Hamamoto Filho

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Esther de Alencar Araripe Falcão Feitosa colaborou na análise da discussão e na conclusão. Luiz Henrique Costa Neto elaborou e aplicou os questionários e participou da revisão bibliográfica. Carina de Oliveira Gregório e Letícia Nobre Limas aplicaram os questionários e participaram da revisão bibliográfica. Paulo Goberlânio de Barros Silva realizou a análise estatística. Carlos Eduardo Barros Jucá colaborou na análise da discussão e na conclusão.

CONFLITO DE INTERESSES

Os autores declaram não haver conflito de interesses neste estudo.

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