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Revista Brasileira de Educação Médica

Print version ISSN 0100-5502On-line version ISSN 1981-5271

Rev. Bras. Educ. Med. vol.47 no.1 Rio de Janeiro Jan./Mar. 2023  Epub Feb 20, 2023

https://doi.org/10.1590/1981-5271v47.1-20220058 

ARTIGO ORIGINAL

A preceptoria médica em medicina de família e comunidade: uma proposta dialógica com a andragogia

Medical preceptorship in family and community medicine: a proposal for dialogue with andragogy

Paula Zeni Miessa Lawall1  , concepção do projeto, análise e interpretação dos dados
http://orcid.org/0000-0003-0125-5518

Adelyne Maria Mendes Pereira2  , orientação e revisão do conteúdo intelectual
http://orcid.org/0000-0002-2497-9861

Josué Miguel de Oliveira3  , revisão e adequação do texto para publicação
http://orcid.org/0000-0003-3263-1387

Kellen Cristina da Silva Gasque4  , elaboração do manuscrito, revisão crítica do conteúdo intelectual, aprovação da versão final
http://orcid.org/0000-0003-2015-2717

1Secretaria de Saúde do Distrito Federal, Brasília, Distrito Federal, Brasil.

2Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

3Secretaria Executiva da UNA-SUS, Brasília, Distrito Federal, Brasil.

4Gerência Regional de Brasília da Fundação Oswaldo Cruz, Brasília, Distrito Federal, Brasil.


Resumo:

Introdução:

O Brasil está em um amplo processo de fortalecimento das residências médicas nas áreas básicas, porém existe a necessidade de um currículo estruturado para qualificar a formação do preceptor.

Objetivo:

Este estudo teve como objetivo construir uma matriz dialógica para orientar a formação educacional da preceptoria em medicina de família e comunidade (MFC).

Método:

Por meio de um estudo qualitativo-analítico, analisaram-se três programas de preceptoria médica no Brasil: Associação Brasileira de Educação Médica, Hospital Sírio-Libanês e Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Em seguida, uma proposta formativa foi apresentada contendo macrodiretrizes que possibilitem mudanças nos processos de ensino e aprendizagem para qualificação da prática preceptora em diálogo com a andragogia.

Resultado:

A matriz construída norteia-se pela aprendizagem do adulto, enfatizando a autonomia do aprendiz, em detrimento do controle da aprendizagem pelo educador. Envolve cinco dimensões: direcionalidade da formação; conteúdo; estratégias pedagógicas; concepções e estrutura formativa; e relação entre saúde, educação e pesquisa. Cada uma delas agrega um conjunto de diretrizes que valorizam o contexto e os princípios da formação em serviço no SUS; o desenvolvimento de competências acerca de conteúdos da atenção, gestão e educação em saúde; concepções e estruturas pautadas pela construção de vínculos significativos entre os sujeitos envolvidos no ato educativo, respeitando seus saberes prévios e experiências; estratégias pedagógicas colaborativas, trabalho com grupos operativos e o uso de tecnologias da informação e comunicação; e o estímulo à pesquisa como princípio educativo.

Conclusão:

A matriz considerou as necessidades da formação em MFC, baseando-se em aspectos-chave da andragogia. Acredita-se que ela possa promover mudanças nos processos de ensino-aprendizagem dos preceptores, com o objetivo de qualificar sua prática.

Palavras-chave: Preceptoria; Formação do Preceptor; Andragogia; Medicina de Família e Comunidade; Atenção Primária à Saúde

Abstract:

Introduction:

Brazil is in a broad process of strengthening medical residencies in basic areas, but there is a need for a structured curriculum to qualify the training of preceptors.

Objective:

To build a dialogic matrix to guide the educational training of preceptorship in Family and Community Medicine (FFM).

Methodology:

Through a qualitative-analytical study, three medical preceptorship programs in Brazil were analyzed, namely: Associação Brasileira de Educação Médica, Hospital Sírio-Libanês and Hospital Alemão Oswaldo Cruz. A training proposal was subsequently presented containing macro-guidelines that allow changes in the teaching and learning processes to qualify preceptor practice in dialogue with andragogy.

Results:

Based on andragogy, the resulting matrix emphasized the learner’s autonomy, to the detriment of the educator’s control of learning. It involves five dimensions: directionality of training; contents; pedagogical strategies; training concepts and structure; and the relationship between health, education and research. Each dimension included guidelines that value: the context and principles of in-service training in the SUS; the development of competences about the contents of health care, management and education; conceptions and structures guided by the construction of significant bonds between the subjects involved in the educational act, respecting their previous knowledge and experiences; collaborative pedagogical strategies, work with operative groups and the use of information and communication technologies; and encouraging research as an educational principle.

Conclusion:

The matrix considered the needs of FCM training, based on key aspects of andragogy. It can promote changes in the teaching-learning processes of preceptors, with the aim of qualifying their practice.

Keywords: Preceptorship; Training of the Preceptor; Andragogy; Family and Community Medicine; Primary Health Care

INTRODUÇÃO

A instituição do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil representou a universalização do acesso aos serviços de saúde e a adoção de um modelo de atenção pautado em uma concepção ampliada de saúde, que tem avançado em que pesem os desafios institucionais, políticos e financeiros em sua implementação1)-(3. Um dos marcos importantes desse processo foi a criação do Programa Saúde da Família (PSF), transformado mais tarde em Estratégia Saúde da Família (ESF), com o objetivo de promover nacionalmente a reorganização da atenção primária à saúde (APS)4. A ESF tem sido bem avaliada como uma política pública de expansão, qualificação e consolidação da APS, capaz de redirecionar o processo de trabalho para ampliar sua resolutividade e seu impacto, numa relação custo-benefício positiva e com potencial para efetivar os princípios, as diretrizes e os fundamentos do SUS5)-(7.

Um dos desafios da APS é a qualificação de médicos em medicina de família e comunidade (MFC) e a fixação desses profissionais em ESF, em áreas remotas e com poucos profissionais5. O Programa Mais Médicos (PMM) foi uma das estratégias para responder a essa necessidade, prevendo ações para provimento emergencial, qualificação da infraestrutura e mudanças na formação8),(9. No âmbito da formação, um dos seus eixos foi o Plano Nacional de Formação de Preceptores (PNFP), de 2015, que, por sua vez, tinha o objetivo de subsidiar a expansão de vagas de Programas de Residência em Medicina de Família e Comunidade (PRMFC), de acordo com a Lei nº 12.871/201310),(11.

Tais políticas promoveram a ampliação das vagas de residência em MFC e estimularam a formação de preceptores, contudo permanecem desafios acerca dos sentidos e das estratégias pedagógicas empregadas. A preceptoria requer o desenvolvimento de habilidades e competências, por parte do preceptor, que estimulem os residentes a desenvolver conhecimentos e atitudes12 para desempenhar um papel estratégico na ESF. Sabendo da importância do preceptor para a qualidade da formação oferecida ao residente, este trabalho propõe macrodiretrizes para a formação para preceptoria baseada nos princípios da andragogia.

Segundo Boeve13, Grow14, Mezirow15, Wlodkowski et al.16 e Courtney17, a andragogia, como base pedagógica para aprendizagem do adulto, abrange sete aspectos-chave: a necessidade de saber, o autoconhecimento, o papel das experiências anteriores, a prontidão para aprender, a orientação da aprendizagem, a motivação e a capacidade de mudar a sociedade. A partir desses aspectos, espera-se que o papel do preceptor seja promover a autonomia e independência do residente, favorecendo um processo de ensino e aprendizagem que gere respeito, empatia e capacidade de resolver problemas e compreender seus contextos e suas razões.

No Brasil, destaca-se o trabalho de educação de adultos produzido por Paulo Freire. Para ele, a educação é entendida como um ato, uma prática social e política, pois está no exercício da progressiva autonomia do fazer, com curiosidade crescente, reflexão contínua sobre a ação, estimulando o pensamento crítico e o comprometimento da equipe, e resultando em um sentido de responsabilidade por seus atos18.

Isso posto, este estudo pauta-se pelo argumento de que os elementos da andragogia podem colaborar de maneira importante em formações de preceptores, bem como no exercício da preceptoria, sendo base para o desenvolvimento de novos conhecimentos, competências e habilidades pelos residentes. Dessa maneira, o objetivo foi formular macrodiretrizes que estimulem mudanças nos processos de ensino e aprendizagem para qualificação da prática de preceptoria em diálogo com a andragogia na área de MFC. Tais diretrizes compõem uma matriz dialógica que visa orientar a formação educacional da preceptoria, prezando a autonomia e a articulação entre teoria e prática em uma perspectiva crítico-emancipatória.

MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa e analítica, pautada no estudo de três programas de preceptoria médica vigentes no Brasil, a fim de construir uma matriz de macrodiretrizes para o ensino da preceptoria em diálogo com a andragogia. A pesquisa foi desenvolvida em três etapas:

  1. Leitura das principais perspectivas e conceitos relacionados à educação de adultos em diálogo com a andragogia, e resgate das formações profissionais voltadas às necessidades da APS: Buscas recorrentes foram feitas em bases que concentram as mais importantes fontes de informação em saúde para pesquisas e projetos científicos, especialmente nos contextos brasileiro e latino-americano: a Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, na Biblioteca Científica Eletrônica Online (SciELO) e no Portal de Periódicos Capes.

  2. Análise de três programas de preceptoria médica no Brasil: Foram selecionadas experiências de programas de preceptoria de três instituições brasileiras: Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), Hospital Alemão Oswaldo Cruz (Haoc) e Hospital Sírio-Libanês (HSL). As ementas dos cursos foram o recurso utilizado para a análise, considerando: ano de implantação; número de turmas e preceptores treinados; carga de trabalho; metas; perfil do graduado desejado; estrutura e trajetória formativa proposta pela formação; e abordagem pedagógica (conceitos e estratégias).

  3. Construção de uma proposta educativa significativa para a preceptoria médica em MFC: Construiu-se uma proposta formativa centrada em uma matriz de macrodiretrizes para a formação do médico preceptor em MFC, dialogando com a andragogia, em que se utilizaram como recurso as duas primeiras etapas. O objetivo desse guia é estimular mudanças nos processos de ensino-aprendizagem dos preceptores com o propósito de qualificar sua prática.

Este trabalho considera todos os aspectos éticos de uma pesquisa de revisão sem intervenção, de acordo com os princípios éticos de autonomia, beneficência, não maleficência, justiça e equidade. Os benefícios da pesquisa estão relacionados a organizar referenciais teóricos das experiências da preceptoria médica em MFC, evidenciando caminhos para melhorar a qualificação dos preceptores.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Andragogia é a ciência que estuda e orienta as melhores práticas durante o processo de ensino e aprendizagem de adultos19. Andro significa adulto, e agein, guiar ou liderar. Seu conceito foi popularizado por abordagens que tentam desenvolver uma base para a aprendizagem de adultos, resultando na reorientação da educação, de modo a enfatizar a escolha do aprendiz e não o controle da aprendizagem20. A autorreflexão e objetivos claros de aprendizagem são necessários para que um adulto aprenda, e o aprendiz é responsável por identificar quais conhecimentos agregam valores pessoais e/ou profissionais21.

Ao exercer o papel de facilitador de aprendizagem, o docente preceptor precisa mostrar respeito aos saberes dos especializandos, ética e estética de uma prática educacional emancipadora, e reflexão crítica sobre essa prática. Segundo Paulo Freire, cabe a esse facilitador: promover a curiosidade e a criticidade; reconhecer que o processo educativo está inacabado; respeitar a autonomia do especializando; mostrar responsabilidade, tolerância e bom senso; aceitar o novo e construir novos conhecimentos; integrar intenção e gesto; e apostar na educação como forma de intervenção no mundo e transformação da realidade22)-(24. Além disso, respeitar os saberes dos alunos de especialização, assumindo uma prática educativa emancipatória e uma reflexão crítica sobre essa prática23),(25.

É desejável que os preceptores conheçam as complexas teorias e os fundamentos em relação à natureza da aprendizagem e do ensino para auxiliar seus residentes supervisionados no desenvolvimento de competências profissionais. Assim, o preceptor tem papel fundamental no desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes durante a formação do médico na residência26.

As discussões acadêmicas têm negligenciado o papel desempenhado pelas emoções na aprendizagem humana. Atualmente, há a necessidade de reavaliar as práticas pedagógicas, considerando a aprendizagem, a compreensão, a cognição e a emoção, como fenômenos congruentes e interdependentes. As emoções são essenciais na atividade cognitiva humana, especialmente nas atividades de percepção, atenção, planejamento, raciocínio, memória, tomada de decisão e em todas as etapas da aprendizagem27),(28. A educação é produzida considerando que o adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, transforma-se espontaneamente, de modo que seu modo de vida se torna progressivamente mais congruente com o do outro no espaço de vivência. Assim, a aprendizagem ocorre de forma contínua e recíproca21),(27),(29. As emoções não se limitam aos sentimentos, mas são disposições corporais dinâmicas que definem os diferentes domínios de ação pelos quais nos movemos23),(30. Quando mudamos as emoções, mudamos o domínio da ação28. As emoções e os sentimentos são atores-chave reguladores do processo de ensino e estão relacionados à predisposição para aprender, principalmente considerando a aprendizagem significativa, por meio de impulsos, interesses e motivações tanto do aluno quanto do educador31),(32.

A formação na preceptoria médica em MFC é entendida como um processo contínuo de “ensino”, baseado no estreitamento entre a predisposição para aprender e a aprendizagem significativa, inter-relacionando os interesses e as motivações do binômio aluno-educador31),(33)-(35. É essencial criar ambientes de partilha para a análise da prática e do desenvolvimento de competências pedagógicas21),(34),(35.

As metodologias ativas fortalecem progressivamente o vínculo entre o residente e seu preceptor ao ressignificarem suas vivências34. A reorganização dos processos educativos para uma cultura de valorização do educando e dos seus interesses de aprendizagem é desejável e deve basear-se em práticas colaborativas que considerem a experiência anterior, reconhecendo que as motivações e emoções são essenciais na história de cada aluno, reforçando a importância da perspectiva andragógica35. Metodologias ativas na preceptoria devem ser incentivadas e priorizadas, principalmente na MFC34),(35.

As atividades de ensino-aprendizagem devem partir de um instantâneo da realidade, incluindo observação analítica e crítica, de modo a possibilitar a extração de um problema relevante para o estudo. A partir da bagagem e da experiência anterior, nos moldes da andragogia, deve ser sistematicamente desenvolvida a articulação entre teoria e prática, que, na perspectiva crítico-emancipatória, consiste em um processo em que as bases teóricas e científicas serão apropriadas pelo aluno desde sua experiência. Hipóteses de solução podem ser formuladas a partir da delimitação e do aprofundamento do problema, oportunizando aos alunos a aplicação do conhecimento à realidade36. O cotidiano do atendimento na APS no SUS, que envolve ações de atenção, comunitárias, educativas e gerenciais, será a base sobre a qual o preceptor construirá um processo de ensino com o médico residente34.

É importante estimular pesquisas sobre preceptoria e currículo, entendendo a relação entre academia, currículo e sociedade. O desenvolvimento de um bom currículo busca estabelecer o discurso e a construção de empoderamento e significado, sendo o ponto de conexão entre diferentes contextos culturais e sociais. Existem quatro visões de convergência entre currículo e conhecimento37, a saber:

  1. Acadêmica: o conhecimento depende do rigor metodológico e das regras.

  2. Instrumental: legitimação do conhecimento, exigido pela perspectiva acadêmica, sendo moldado por iniciativas comprometidas com o aumento da produtividade econômica.

  3. Progressiva: o conhecimento se alimenta da experiência e visa agregar o bem-estar social às relações sociais democráticas.

  4. Crítica: foco na distribuição do poder e na luta pela hegemonia.

As habilidades curriculares, por vezes, podem ser usadas para fins instrumentais. Apreender a competência como conceito, no desenvolvimento curricular, pode servir para ressignificar a prática profissional como centro de reflexão mediada pela problematização das atitudes profissionais e pela análise do contexto que a permeia38. Competência é entendida como a capacidade circunstancial de mobilizar conjuntamente diferentes recursos (cognitivos, psicomotores, afetivos), permitindo abordar/resolver situações complexas relacionadas à prática profissional. Em 2008, Perrenoud elencou dez domínios de competência prioritários na formação continuada de educadores no século XXI39, resumidos no Quadro 1.

Quadro 1 Dez domínios de competências considerados prioritários na formação continuada de educadores no século XXI, segundo Perrenoud39  

Domínios Princípios e ações
Gerenciar situações de aprendizagem Foco no aprendiz, considerando a equidade e diversidade. Por meio da mediação, gera-se o contrato de convivência.
Liderança para a construção da identidade grupal inclusiva.
Administrar a progressão da aprendizagem Individualização do processo de formação, reconhecendo os diversos papéis e estimulando a gestão do tempo.
Oferta de feedback, valorizando potencialidades.
Estabelecer os dispositivos de diferenciação Avaliação formativa com foco no objetivo da atividade.
Reflexão sobre a individualidade e a experiência, considerando o grupo.
Integração das diferentes contribuições para o produto coletivo, conscientizando sobre os desafios de atuar num sistema sob supervisão.
Domínio dos aspectos afetivos e relacionais, com estímulo à cooperação.
Envolver os alunos em sua aprendizagem e em seu trabalho Formação para a atuação profissional, desenvolvendo a autoavaliação.
Complementariedade das ideias, permitindo a comunicação, traduzindo as necessidades individuais e a convergência entre elas.
Mediação de conflitos, favorecendo consenso e promovendo a inclusão e o pertencimento, com identificação de projetos pessoais de aprendizagem.
Trabalhar em equipe Valor profissional da cooperação, renunciando à individualidade.
Desprendimento de experimentar, alinhando os ritmos, adaptando a atividade à realidade dos participantes.
Corresponsabilidade na comunicação verbal e não verbal, identificando problemas de cooperação intensiva, com olhar compreensivo e apreciativo aos componentes resistentes.
Elaboração e implantação de projetos comuns, com alternância na gestão e liderança, administrando crises ou conflitos interpessoais.
Participar da administração do projeto do curso Proatividade e protagonismo do processo de ensino-aprendizagem.
Organização prévia do ambiente e dos materiais.
Gestão logística de grupos, estimulando a criatividade e autonomia.
Identificação dos riscos das responsabilidades compartilhadas.
Promoção do prazer no processo educacional.
Informar e envolver responsáveis Identificação de pessoas-chave.
Comunicação com grande público e com superiores.
Habilidade de trabalhar com o imprevisto e o improviso.
Utilizar novas tecnologias Potencialidades didáticas do instrumental de ensino disponível e coerente com o alcance dos objetivos de aprendizagem.
Formação para a utilização de novas tecnologias da informação e comunicação, desenvolvendo a capacidade de fazer escolhas.
Comunicação a distância de forma pessoal e comprometida.
Reconhecimento dos limites e busca por ajuda.
Flexibilidade com os diferentes “caminhos e tempos”.
Enfrentar os deveres e dilemas éticos da profissão Enfretamento aberto da contradição entre os valores, sua prática e os costumes da sociedade em que vive.
Exercício da reflexão, reconhecendo a integração entre teoria e prática, e respeitando o debate sem julgamentos.
Observação das consequências das opções pedagógicas.
Valorização do protagonismo dos participantes na mediação.
Criação de identidade coletiva cidadã, lidando com o preconceito.
Desenvolvendo senso de responsabilidade, solidariedade e de justiça.
Administrar a própria formação contínua Busca pela atualização e pelo desenvolvimento, auditando seu próprio desempenho e refletindo sobre a prática em ambiente protegido.
Análise de seu desempenho no processo de formação.
Explicitação da própria prática, com identificação dos desafios.
Desenvolvimento de projeto pessoal de aprimoramento, com reflexão.
Oferta e recebimento de feedback, consolidando aprendizagens conquistadas e reconhecendo seu lugar na equipe.
Valorização do trabalho em equipe.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Uma variedade de fatores influencia a escolha do conteúdo e das metodologias do programa. É preciso estimular a investigação das melhores práticas e as formas mais adequadas de realizá-las, pautadas pela andragogia, de modo a recontextualizar a formação do preceptor. A recontextualização é a convergência entre os discursos instrucional, normativo, moral, avaliativo e técnico. Essa recontextualização da educação permite a releitura de ideias anteriores em outras perspectivas, trazendo, por fim, um novo significado das práticas40.

A regulamentação legal da formação oficial e da certificação da preceptoria é uma exigência, conforme determina a Constituição Federal brasileira2, em razão da natureza essencial da preceptoria na formação do perfil profissional médico, compatível com as necessidades da população. A regulação nacional, em forma de lei, apesar de ser um processo mais complexo, é consideravelmente mais firme para a consolidação de uma carreira, exigindo grande mobilização para despertar interesses, sensibilizar a sociedade e angariar apoios.

Considerando os achados na literatura apresentados, foi feita uma avaliação em três cursos de formação de preceptores, a saber: do HSL, do Haoc e da Abem (Quadro 2).

Quadro 2 Avaliação da formação de preceptores em três instituições distintas, segundo objetivos, perfil do preceptor egresso e competências desenvolvidas 

Formação de preceptores Objetivos Perfil do preceptor egresso Competências desenvolvidas
HSL Capacitar o preceptor para uma atuação que reduza os macroproblemas no contexto do SUS. Capacidade de atuar como educador na área da saúde, nas dimensões da atenção, da educação e da gestão do trabalho. Capacidades cognitivas, atitudinais e psicomotoras, e sua mobilização para a realização de ações, refletindo a excelência na prática da preceptoria nos cenários do SUS.
Haoc Contribuir para a formação de preceptores e supervisores de residência médica na formação em educação e na gestão de ensino em saúde. Capacitado a elaborar e coordenar um programa ou estágio de residência médica de acordo com as normas e leis vigentes, reconhecendo as necessidades de saúde da população brasileira. Competente na sua área de atuação, ético, crítico, reflexivo, humanista, capacitado a formar profissionais em serviço, com visão crítica do seu papel social como educador.
Abem Desenvolver competências pedagógicas para a prática da preceptoria na residência médica, pautado pelos princípios do SUS e pelas competências gerais das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do curso de Medicina. Egressos transformados pela experiência educativa e mais aptos a lidar com a realidade e as incertezas que atravessam os cenários de práticas. Interface cuidado-educação e capacidade de influenciar práticas individuais e coletivas, concebendo a educação de maneira integrativa.

HSL: Hospital Sírio-Libanês, Haoc: Hospital Alemão Oswaldo Cruz e Abem: Associação Brasileira de Educação Médica.

Fonte: Elaborado pelos autores com base nas ementas dos referidos cursos.

A preceptoria da Abem utiliza a abordagem pedagógica crítico-reflexiva como norteadora e a problematização como método pedagógico principal. De acordo com o plano do curso, escolheu-se a perspectiva de Paulo Freire como referencial e elegeu-se o método da problematização como elemento estruturador da atividade docente. Segundo o curso da Abem: “Não estamos propondo dogmas ou doutrinas da educação e sim a experiência sensível de ser educador, com singeleza, generosidade, abertura, fundamento, confiando que ‘viver educação’ é muito mais potente para se ‘saber educador’ do que falar sobre educação (pag.2)”41.

O Ministério da Saúde instituiu o Programa de Apoio ao Fortalecimento Institucional (Proadi)42, sendo o HSL um de seus parceiros na formação em preceptoria43. Por meio da perspectiva construtivista, a ementa do curso apresenta como objetivo estimular a capacidade de aprender a aprender, o trabalho em equipe e a postura ética, colaborativa e alinhada às necessidades de saúde da sociedade. Visa também aprofundar, de modo crítico e reflexivo, o conhecimento cientificamente produzido, contribuindo para o crescimento pessoal e profissional e para a melhoria na formação de profissionais de saúde, como estratégia para ampliar o acesso aos serviços de saúde e a integralidade de um cuidado seguro e com qualidade no âmbito do SUS44.

A terceira formação em preceptoria avaliada foi a do Haoc, que também foi parceiro do Ministério da Saúde por meio do Proadi. Essa formação optou pelo uso de comunidades de práticas de comunicação digital para o compartilhamento de informações, considerando que o aprendizado nessas comunidades ocorre pela aplicabilidade dos conhecimentos e pela facilidade de interação mesmo a grandes distâncias geográficas e em meio à dificuldade de compatibilidade de agenda profissional. Além disso, a fundamentação teórico-referencial desse projeto está alicerçada nos conceitos da aprendizagem significativa, da aprendizagem de adultos e da liderança na complexidade. O curso preconiza a participação bilateral e a relação horizontal entre educando e educador, além de focar o processo reflexão-ação sobre a realidade42.

Após essas avaliações, é possível destacar que, para que um curso tenha êxito em sua proposta, deve estar atento para a necessidade de entendimento dos adultos sobre a importância de cada aprendizado e que ele ocorre quando há esse reconhecimento, que pode ser potencializado por atividades que têm situações reais como eixo orientador e que tanto experiências prévias relevantes quanto recursos intelectuais individuais são pontos de referência primordiais para a aquisição de novas aprendizagens. É importante lembrar ainda que é necessária a presença de devolutiva constante e qualificada14.

Matriz propositiva

Considerando o estudo profundo da andragogia e da observação criteriosa nessas três formações de preceptores de centros e associação de referência brasileiros, propõe-se uma matriz de macrodiretrizes para formação em preceptoria médica em MFC, que pode auxiliar na construção de um currículo alinhado às necessidades de formação em APS no SUS (Quadro 3).

Quadro 3 Matriz de formação da preceptoria médica em medicina de família e comunidade 

Dimensões da formação de preceptores Macrodiretrizes para formação de preceptores
Direcionalidade da formação 1. Desenvolver competências pedagógicas para preceptores que considerem a realidade de formação em serviço, os princípios da educação de profissionais de saúde no contexto do SUS e as boas práticas assistenciais, que os instrumentalizem para trabalhar adequadamente com as características locais da comunidade e de cada cenário de ensinagem.
Conteúdo 1. Trabalhar com um perfil de competências que expresse a articulação de conhecimentos, habilidades e atitudes para realizar ações contextualizadas perante os problemas prevalentes na respectiva atuação profissional, em três frentes: • Saúde: Atenção à saúde e preceptoria; • Gestão: Gestão do trabalho e educação em saúde; • Educação: Formação profissional e produção de conhecimento em saúde.
2. Defender as dez áreas de competência consideradas prioritárias na formação continuada de educadores do século XXI, elencadas por Perrenoud.
Estratégias pedagógicas 1. Oferecer atividades pedagógicas autodirigidas para estimular a busca ativa do conhecimento, bem como vivências em diferentes grupos, em encontros presenciais, a fim de favorecer a integração e o desenvolvimento de habilidades colaborativas para o trabalho em equipe.
2. Oferecer práticas colaborativas que considerem a experiência anterior, que reconheçam que as motivações e emoções têm papel fundamental na história de cada aprendiz, reforçando a importância da perspectiva andragógica.
3. Trabalhar com grupos operativos com foco na educação, incentivando a formulação de objetivos comuns, para que o grupo proponha mudanças e simultaneamente trabalhe o medo da mudança, medo que causa barreiras emocionais ao aprendizado e à comunicação.
4. Utilizar as tecnologias de informação e comunicação (TIC) no desenvolvimento pedagógico e profissional de preceptores, inclusive em comunidades de prática e aprendizagem colaborativa.
Concepções e estrutura formativa 1. Experimentar o preceptor na teoria e na prática com base em experiências, dados, fatos, reflexões e teoria aplicada, utilizando evidências validadas da literatura, em modelos híbridos e com referências de formação andragógica.
2. Simular a prática da preceptoria, utilizando a teoria da educação aplicada nesse contexto, a fim de demonstrar que a experiência que forma é aquela que se reflete e que mudar de lugar é importante porque ensina.
3. Trabalhar intencionalmente com a incerteza para desenvolver a flexibilidade e a capacidade de reorganizar os planos educacionais de acordo com as necessidades de aprendizagem de um grupo.
4. Desenvolver um ambiente de prática educativa coerente e a construção de vínculos significativos entre os sujeitos envolvidos no ato educativo, por meio de metodologias ativas, fazendo com que o preceptor perceba um significado maior em relação ao seu cotidiano e fortaleça progressivamente o vínculo com o residente para ressignificar experiências.
5. Estimular o desenvolvimento da resiliência formando preceptores transformados pela experiência educativa e mais capacitados e preparados para lidar com a realidade e as incertezas que atravessam os cenários de prática.
6. Utilizar a abordagem pedagógica crítico-reflexiva como guia e a problematização como principal método pedagógico, preparando preceptores, por meio do contato com suas realidades, para a identificação e priorização de problemas, de modo a buscar sair do senso comum para a apropriação da teoria e hipóteses de solução, até chegar à possibilidade de elaborar seus pensamentos e, agindo, transformar a própria realidade.
7. Envolver as dimensões sociocognitivas e socioafetivas na educação, como uma prática integral capaz de ampliar a capacidade de compreender e interpretar o mundo, com o objetivo de fomentar a interação social como promotora de vínculos, como facilitadora e como promotora de aprendizagem para o trabalho.
8. Desenvolver competências na interface cuidado-educação e influenciar as práticas individuais e coletivas, concebendo a educação de forma ampla e integrativa.
9. Estimular o desenvolvimento da capacidade de observar, analisar e refletir sobre a prática, de modo a criar ambientes para analisá-la, compartilhar contribuições, identificar e diferenciar o desenvolvimento dessa competência pedagógica.
10. Orientar a organização de práticas voltadas à construção de uma assistência integral, eficiente, eficaz e segura, pautada na garantia de acesso, continuidade, equidade e qualidade da atenção à saúde, especialmente por meio da aplicação de instrumentos e dispositivos para gestão clínica.
11. Promover a articulação trabalho e educação, participando de iniciativas de mudança de práticas educativas e assistenciais, orientadas para as necessidades de saúde da população.
12. Desenvolver ações educativas ancoradas nas teorias interacionistas da aprendizagem, na metodologia científica e dialógica, a partir da identificação das necessidades de aprendizagem da equipe, do aluno e do próprio educador.
13. Priorizar a formação em educação e a formação em gestão da educação em saúde.
14. Trabalhar a liderança na complexidade, incentivando o desenvolvimento da resiliência institucional e das habilidades de liderança por meio do Modelo de Ações Adaptativas.
15. Promover um equilíbrio instável de certezas e instigar a busca de soluções criativas, de modo a potencializar o preceptor como ser humano.
16. Preconizar um processo de avaliação formativa contínua, com o objetivo de observar o deslocamento individual de cada preceptor nesse processo.
Dimensão política: relação entre saúde, educação e pesquisa 1. Fortalecer políticas e programas para reorientar a formação dos profissionais de saúde e a educação dos profissionais em serviço.
2. Visar à produção de movimentos multiplicadores na formação e qualificação dos profissionais de saúde, no âmbito do SUS, conforme prerrogativa legal.
3. Estimular a valorização do exercício da preceptoria e a construção da identidade do preceptor como facilitador da aprendizagem, com ampliação da consciência crítica e comprometido com a transformação da realidade.
4. Incentivar a produção científica relacionada à formação em preceptoria, de modo a promover a geração de conhecimento para construção de currículos e projetos de formação pedagógica de preceptores, sempre com base na enunciação andragógica.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Em estudo semelhante, com a preceptoria de enfermagem, uma matriz de decisões para as experiências em preceptoria foi proposta com o intuito de avaliar e identificar as atividades de aprendizagem clínica individualizadas por meio dos princípios da andragogia. Na construção dessa matriz, incorporaram-se os elementos de Knowles20, em resposta a uma falta habilidade de desenvolver planos de aprendizagem individuais nos enfermeiros após a formatura, o que impactou o desenvolvimento da carreira desses profissionais. Assim, princípios da aprendizagem dos adultos foram incorporados na matriz, incluindo a valorização de saberes anteriores e o interesse na aprendizagem de assuntos e aquisição de habilidades que tenham mais impacto em seus trabalhos ou na vida pessoal. Além disso, a matriz possuía medidas para promover a oportunidade de o aprendiz se envolver tanto no planejamento quanto na avaliação da própria aprendizagem45.

Em outra experiência, também em enfermagem, os princípios da andragogia foram utilizados em um programa de residência clínica. Os resultados mostraram que a utilização dos princípios da andragogia provocou grande satisfação nos residentes e benefício no desenvolvimento de habilidades clínicas e da autonomia. Esse processo auxiliou tanto os residentes quanto os preceptores na conclusão das atividades clínicas propostas. Além disso, permitiu maior colaboração entre professores, preceptores e aprendizes, o que é essencial no trabalho esperado em saúde, demonstrando que a andragogia deve ser buscada nas atividades dos preceptores para que os objetivos de aprendizagem sejam alcançados e ainda seja desenvolvida autonomia dos residentes46.

Um estudo de coorte sobre a importância da andragogia na formação médica incluiu estudantes desde a matrícula até o fim da pós-graduação, no qual se utilizaram os estilos de aprendizagem de Kolb (Figura 1) como base para avaliação. A pontuação inicial do grupo para a coorte indicou uma preferência de estilo indeterminada com uma ligeira inclinação em direção ao quadrante convergente da grade que pode indicar maior orientação técnica, menos emotividades e avaliação da relevância dos problemas, antes da busca por aprofundamento sobre eles. Ao final do primeiro semestre letivo, os alunos eram predominantemente convergentes. Nos próximos semestres, houve uma mudança para a acomodação, que é a busca por significado de um problema e a consideração sobre suas habilidades e aquelas de outrem em situações semelhantes. No início da experiência clínica, uma mudança para o estilo divergente ocorreu, em que há foco no questionamento e na análise da situação ao mesmo tempo que favorece a colaboração com outros para obter as informações necessárias para problema. Esse estilo foi mantido durante todo o ano de experiência clínica e mesmo após a formatura. Esses resultados apontam para a predominância de determinados estilos de aprendizagem em detrimento de outros na clínica médica, e isso pode fornecer dados sobre as características dos médicos ao aprenderem e indicar por que alguns métodos ou atividades propostos na formação médica podem não ser muito efetivos e, por isso, devem estar no radar dos professores e preceptores para que se priorizem atividades e exercícios que possam estar alinhados com os estilos de aprendizagem e contribuam para uma formação médica mais efetiva47.

Fonte: Elaborada pelos autores com base em Kolb48.

Figura 1 Estilos de aprendizagem de Kolb 

Considerando a percepção sobre a preceptoria e seu papel como educadores, um estudo brasileiro foi conduzido com mais de 300 preceptores, no qual se questionou, entre outros pontos: “O que é preceptoria?” e “Qual é a sua percepção sobre o papel do preceptor como educador?”. Os resultados revelaram que os preceptores sentem que aprendem com os alunos e consideram a rede de serviços corresponsável pela sua formação. Houve concordância nas respostas de que apenas uma pequena parte da equipe de saúde participa do programa. Os preceptores descreveram a preceptoria como uma tarefa educativa em um ambiente clínico, em que métodos ativos de aprendizagem são utilizados para a formação de profissionais de saúde. A preceptoria foi considerada uma ponte entre o SUS e a atividade acadêmica. O papel de educador é visto por eles como modelo, tutor, líder, supervisor e mentor. Os autores concluíram que os preceptores expressaram uma visão crítica sobre a natureza da preceptoria e seu papel como educadores, reconhecendo seus desafios, bem como seu potencial em ambientes clínicos49. Esses dados corroboram a proposta de matriz apresentada neste estudo, a qual busca a formação de líderes e mentores, e prioriza métodos ativos de aprendizagem.

Uma parceria simbiótica deve existir entre os estudantes, os preceptores e os demais membros da instituição formadora relacionados com a preceptoria. Para além do domínio de trabalhar em equipe, descrito por Perrenoud39, que valoriza a cooperação e a renúncia da individualidade, as parcerias devem ser mutuamente gratificantes e sustentáveis. De acordo com o estudo de Walters et al.50, alguns domínios podem impactar a preceptoria em saúde da família e comunidade (SFC), a saber: pessoal, tempo, cuidado do paciente, relações e desenvolvimento profissionais e infraestrutura. No Quadro 4, apresenta-se uma adaptação desses domínios e de seus impactos na preceptoria em SFC, segundo a percepção dos preceptores.

Quadro 4 Domínios que podem impactar a preceptoria em saúde da família e comunidade 

Domínios Impactos na preceptoria em SFC (do ponto de vista dos preceptores)
Pessoal Alegria e contribuição em seu próprio aprendizado e desenvolvimento.
Tempo Tempo de consulta aumentado com os estudantes.
Cuidado do paciente Responsabilidade primária e compatível com a preceptoria.
Relações e desenvolvimento profissional Trabalho em equipe e percepção como professores; orgulho do papel de preceptor; e reconhecimento comunitário do papel docente.
Infraestrutura Importância da estrutura física para acomodar os estudantes; disponibilidade de materiais educativos e de equipamentos e internet para os estudantes.

Nota: Domínios como custo e negócio foram omitidos por serem muito específicos da realidade da preceptoria médica australiana.

Fonte: Adaptado de Walters et al.50

Esses estudos corroboram a importância na melhoria constante dos currículos e das formações dos preceptores e dos impactos que podem incidir sobre a formação do médico. Assim, alinham-se à matriz proposta neste estudo para qualificação das formações em preceptoria médica à luz da andragogia.

CONCLUSÕES

Por seu caráter integrador, a MFC exige que o preceptor, como interlocutor de referência, realize, com singularidade, o planejamento, o acompanhamento e a avaliação da formação e aprendizagem do residente, sempre por meio de acolhimento e mediação. O residente deve ser sempre incentivado a coordenar o próprio processo de aprendizagem, estando no foco da formação, e a desenvolver gradualmente a responsabilidade e o profissionalismo.

Há necessidade de promover políticas públicas e iniciativas já existentes para regular a formação de preceptores. O desenvolvimento da investigação nessa área é estratégico para o desenvolvimento de propostas curriculares adequadas à formação desse essencial formador. O Programa de Mestrado Profissional em Saúde da Família (PROFSAÚDE) oferece, por meio da linha de pesquisa em educação em saúde, a oportunidade de trazer novamente à discussão esse tema tão relevante, na esperança de sensibilizar pares e atores envolvidos nos processos formativos e regulatórios.

A reflexão sobre o ensino e o alcance da educação em saúde transformou a relação entre a teoria ensinada e a prática profissional. Seguindo essa linha de raciocínio, o preceptor está no centro da formação em serviço, sendo mais do que evidente a necessidade de fomentar oportunidades de crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional por meio da educação continuada e permanente. Em outras palavras, é preciso formar bem. É preciso estimular os pensadores.

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2Avaliado pelo processo de double blind review.

FINANCIAMENTO Declaramos não haver financiamento.

Recebido: 22 de Fevereiro de 2022; Aceito: 15 de Dezembro de 2022

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Editora-chefe: Rosiane Viana Zuza Diniz.Editor associado: Kristopherson Lustosa Augusto.

CONFLITO DE INTERESSES

Declaramos não haver conflito de interesses.

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