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Educação: Teoria e Prática

versão On-line ISSN 1981-8106

Educ. Teoria Prática vol.29 no.60 Rio Claro jan./abr 2019  Epub 01-Set-2019

https://doi.org/10.18675/1981-8106.vol29.n60.p216-236 

Artigos

PROGRAMA CIÊNCIAS SEM FRONTEIRAS: ESTUDO DE CASO COM ESTUDANTES INTERCAMBIÁRIOS DA FATEC/TQ

SCIENCE WITHOUT BORDERS PROGRAM: CASE STUDY WITH FATEC/TQ EXCHANGE STUDENTS

PROGRAMA CIENCIAS SIN FRONTERAS: ESTUDIO DE CASO CON ESTUDIANTES INTERCAMBIARIOS DE FATEC/TQ

Maria Aparecida BovérioI 
http://orcid.org/0000-0003-0259-4909

Joyce Mary AdamII 
http://orcid.org/0000-0003-2576-2194

I Universidade Estadual Paulista - Câmpus de Rio Claro, São Paulo - Brasil. E-mail: mariaboverio@hotmail.com.

II Universidade Estadual Paulista - Câmpus de Rio Claro, São Paulo - Brasil. E-mail: joyce.adam@unesp.br.


Resumo

Este artigo apresenta, analisa e discute os dados do estudo de caso, realizado com estudantes intercambiários do Programa Ciências sem Fronteiras (CSF), da Faculdade de Tecnologia (FATEC), Câmpus de Taquaritinga/SP. Para isso, realizou-se uma pesquisa de caráter qualitativo, e como instrumento de coleta de dados aplicou-se um questionário online, desenvolvido no Google docs. Os resultados da pesquisa indicam que a maioria dos estudantes intercambiários teve as expectativas atendidas, pois obtiveram significativa ascensão pessoal, profissional, estudantil e cultural e, por isso, não concordam com o fechamento do CSF.

Palavras-chave: Programa Ciências sem Fronteiras; Políticas Públicas; Intercâmbio.

Abstract

This article presents, analyzes and discusses the data of the case study carried out with exchange students of the Science Without Borders Program (CSF), of the Faculty of Technology (FATEC), Campus of Taquaritinga/SP. For that end, a qualitative research was carried out and, as a data collection tool, an online questionnaire was applied, developed in Google Docs. The results of the survey indicate that the majority of exchange students had their expectations met, given that they obtained significant personal, professional, student and cultural growth and therefore do not agree with the closure of CSF.

Keywords: Science without Borders Program; Public policy; Exchange.

Resumen

Este artículo presenta, analiza y discute los datos del caso de estudio realizado con los alumnos de intercambio del programa Ciencia sin Fronteras (CSF), Facultad de tecnología (FATEC), Campus de Taquaritinga/SP. Para ello se realizó una investigación de carácter cualitativa y como herramienta de recopilación de datos se aplicó un cuestionario en línea, desarrollado en Google Docs. Los resultados de la encuesta indican que la mayoría de los estudiantes de intercambio tuvieron satisfechas sus expectativas, porque obtuvieron un beneficio significativo personal, profesional, estudiantil y cultural y, por lo tanto, no están de acuerdo con el cierre del CSF.

Palabras clave: Programa de Ciencias sin Fronteras; Políticas públicas; Exchange.

Introdução

O Programa Ciências sem Fronteiras (CSF), do governo federal, teve como objetivo central, em sua criação, ampliar as oportunidades de experiências em universidades do exterior. O CSF é uma política de intercâmbio de estudantes implementada pelos Ministérios da Educação (MEC) e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), envolvendo o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPQ), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e as Secretarias de Ensino Superior e Tecnológico do MEC. O principal objetivo do Programa CSF é o de permitir a mobilidade de estudantes brasileiros para os países conveniados com o projeto, oferecendo várias modalidades de bolsas para: Graduação, Tecnólogo, Desenvolvimento Tecnológico e Inovação, Doutorado Sanduíche, Doutorado Pleno, Pós-Doutorado e Mestrado Profissional, e pessoas interessadas em aperfeiçoar seus conhecimentos no exterior. No entanto, apesar do expressivo número de estudantes que participaram do programa, bem como dos resultados positivos indicados por eles, na época de seus retornos, o programa encerrou-se em julho de 2016.

A proposta deste artigo é apresentar, analisar e discutir os dados do estudo de caso realizado com estudantes intercambiários da Faculdade de Tecnologia (FATEC), Câmpus de Taquaritinga/SP. O objetivo principal dessa pesquisa é evidenciar e analisar as oportunidades e aberturas que o programa proporcionou para os estudantes, bem como as dificuldades pelas quais eles passaram, com o propósito de indicar possibilidades de melhorias para futuros beneficiários da política pública investigada, se, em alguma ocasião, esta política for retomada para alunos de graduação, pois o Ministério da Educação (MEC), em julho de 2016, encerrou o programa Ciência Sem Fronteiras, na modalidade de cursos para graduação, sendo que agora o programa atenderá, apenas, cursos de pós-graduação, como mestrado, doutorado, pós-doutorado e atração de jovens cientistas.

Assim, a pesquisa teve como objetivos específicos observar o percurso acadêmico dos estudantes participantes da pesquisa, bem como verificar se o programa CSF atendeu às expectativas estudantis, pessoais e profissionais. Além disso, buscou identificar as dificuldades e facilidades encontradas pelos beneficiários do programa. O interesse pelo estudo de caso dos intercambiários da FATEC/Tq surgiu durante o tempo de docência neste Câmpus, e em virtude do significativo número de estudantes intercambiários pelo programa CSF, uma vez que o Câmpus possui 25 anos de existência e um relevante trabalho de inserção de alunos em programas de intercâmbio e de ênfase na língua inglesa. Tal razão, dentre outras, motivou a realização desse estudo de caso, contemplando a investigação de uma temática tão importante no âmbito das políticas públicas inclusivas do ensino superior brasileiro. Nesse sentido, entende-se que este artigo contribui para a reflexão e o debate das políticas educacionais, bem como para a análise dos prós e contras, na perspectiva de um estudo de caso qualitativo.

Aspectos metodológicos da pesquisa

A pesquisa, na íntegra, realizou-se no período de novembro/2015 a janeiro/2018. Inicialmente, realizou-se uma pesquisa na legislação que constituiu o programa CSF, bem como nos documentos fornecidos pela professora coordenadora do programa, no âmbito da FATEC/Tq. No segundo passo metodológico, realizou-se uma pesquisa bibliográfica. Em seguida, fez-se o estudo de caso com os estudantes intercambiários. Nessa perspectiva metodológica, para análise do estudo de caso foram utilizados os conhecimentos obtidos na pesquisa sobre a legislação que constituiu o programa CSF, na pesquisa bibliográfica sobre o tema e em um questionário online aplicado aos estudantes intercambiários no período de 18 de outubro de 2017 a 31 de janeiro de 2018.

De acordo com Oliveira (2010, p. 87), em pesquisa o termo população, ou universo, significa o conjunto de elementos que compõem o objeto de estudo, neste caso, 30 estudantes intercambiários. “Nem sempre é possível pesquisar a totalidade desses elementos, ou todas as pessoas e grupos que se situam na área que delimitamos” para a pesquisa. Portanto, segundo a autora, “cabe ao pesquisador a partir da totalidade (universo) definir o tamanho de sua amostra”. Considerando-se que “a amostra é uma representação da população ou universo da pesquisa, faz-se necessário estabelecer critérios no processo de seleção para que ela seja significativa”. A amostra pode ser não probabilística (que pode ser subdividida em acidental, por cotas ou intencionais) ou probabilística (OLIVEIRA, 2010, p. 88-89). Utilizou-se a amostra probabilística, pois “nesse tipo de amostra, que pode ser aleatória ou ao acaso, todos os componentes ou sujeitos têm igual probabilidade de serem selecionados”. (OLIVEIRA, 2010, p. 88-89). Nesta perspectiva, aplicou-se o questionário para todos os 30 estudantes, e destes, constituem a amostra probabilística 12 estudantes intercambiários que responderam ao questionário online, sendo que todos eles tiveram iguais probabilidades de serem selecionados, por meio da intenção de que todos respondessem.

Portanto, essa pesquisa investiga, por meio de amostragem probabilística, se o Programa CSF, enquanto política pública do Governo Federal, atendeu às expectativas dos intercambiários da FATEC/Tq que participaram do programa. O questionário foi desenvolvido no aplicativo ‘Google Docs.’ e armazenado no ‘Google Drive’; foi composto por 63 questões - fechadas, objetivas, alternativas e abertas -, organizadas em oito categorias: identificação do aluno, trabalho e profissão, percurso acadêmico, contexto familiar, desempenho escolar, prosseguimento nos estudos, ampliação da rede de relacionamentos profissionais, pessoais e culturais, questões sobre o Programa Ciências sem Fronteiras, no que diz respeito a critérios de seleção, preconceitos ou constrangimentos, e outros inerentes ao Programa Ciências sem Fronteiras (CSF). Todas elas foram construídas considerando-se todas as possíveis abordagens do programa, identificadas na pesquisa sobre a legislação que constituiu o programa CSF e na bibliográfica, com o intento de contemplar as questões inerentes a ele, especialmente aquelas que dizem respeito aos estudantes intercambiários.

Acreditamos que os dados mais importantes desta pesquisa são os que foram obtidos junto aos estudantes intercambiários. Por isso, nossa maior preocupação com este artigo é a de evidenciar e analisar as oportunidades e aberturas que o programa proporcionou para os estudantes, bem como as dificuldades pelas quais eles passaram, com o propósito de indicar possibilidades de melhorias para futuros beneficiários da política pública investigada, bem como suscitar um debate sobre a possibilidade de reabertura do programa, considerando-se sua importância no âmbito das políticas educacionais inclusivas.

O programa ciências sem fronteiras

No contexto de políticas públicas de inclusão, foi proposto o Programa Ciências sem Fronteiras (CSF), instituído pelo Decreto nº 7.642, de 13 de dezembro de 2011. Segundo os documentos analisados, o programa tinha como objetivo propiciar a formação e a capacitação de pessoas com significativa qualificação em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa estrangeiros de excelência, e atrair para o Brasil jovens talentos e pesquisadores estrangeiros de elevada qualificação, em áreas de conhecimento definidas como prioritárias (BRASIL, 2011). O programa CSF tinha por iniciativa “promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional”. No contexto geral do programa CSF, os benefícios financeiros do programa foram: mensalidades de bolsas, adicional de localidade, seguro saúde, auxílio instalação, auxílio material didático e auxílio deslocamento para bolsa no exterior, de acordo com cada modalidade de bolsa. (BRASIL, 2014).

A finalidade do programa CSF foi a de promover o intercâmbio de estudantes, em vários países que possuíssem parcerias com o programa. Possuiu como propostas conciliar conhecimento e pesquisas, e promover a expansão e a internacionalização de áreas importantes para o desenvolvimento do Brasil, tais como: ciência, tecnologia, inovação, empreendedorismo e competitividade. Os candidatos às bolsas do programa CSF deveriam possuir bom desempenho acadêmico e ter proficiência em Inglês, Alemão, Francês, Espanhol ou Italiano, dependendo do país e das exigências para o intercâmbio. Embora o programa tivesse como objetivo a ‘capacitação de pessoas com elevada qualificação’, verifica-se a necessidade do oferecimento de benefícios complementares, tais como o Idioma sem Fronteiras (ISF), como iniciativas de incentivar o aprendizado de outro idioma e a possibilidade de aperfeiçoamento na Língua estrangeira de maneira rápida e eficiente, para que os candidatos tivessem melhores condições de participar dos intercâmbios oferecidos.

Contudo, apesar da evidente necessidade de implementações de políticas públicas inclusivas no ensino superior, é cabível ressaltar que o Brasil enfrenta, há quase quatro anos, um corte de R$ 3 bilhões ao ano no orçamento do Ministério da Educação. Durante os anos de vigência, o orçamento do CSF, para internacionalização de estudantes, foi de R$ 12 bilhões, e com a crise econômica e o enxugamento das contas, aplicou-se esse corte de verbas que impactou significativamente a educação superior. Tal corte afetou o repasse de verbas federais para o número de vagas e bolsas de programas que compõem o conjunto de políticas públicas inclusivas de nível superior, e o programa Ciências sem Fronteiras foi um deles, tendo sido encerradas suas atividades em julho de 2016 para as novas vagas, para alunos de graduação. A crise financeira do Brasil também afetou outros setores, e se faz necessária a crítica de que tais medidas representam um retrocesso às conquistas que demandaram, historicamente, muita luta pelos direitos das classes sociais que até então eram excluídas desse nível de ensino.

Como justificativa, o Ministério da Educação (MEC) afirma que o programa CSF deixou dívidas elevadas, e o custo para manter os bolsistas lá fora era muito alto. Em 2015, o governo investiu R$ 3,7 bilhões no programa, o mesmo valor usado na merenda escolar de 39 milhões de alunos. Apesar de o programa ter levado quase cem mil universitários para estudar fora do país, acabou para os alunos da graduação. O programa CSF foi mantido para o intercâmbio dos alunos da pós-graduação, pois segundo o presidente da CAPES, Abílio Baeta, 70% das bolsas do Ciências Sem Fronteiras foram para alunos da graduação, e que lhes foi enriquecedor, mas, segundo ele, nem tanto para o país, pois “a volta desses meninos não impactou a prática de ensino de nossas universidades e, com isso, não foi multiplicada para melhorar o ensino em geral da graduação no Brasil nas áreas que tinham sido selecionadas”. (CIÊNCIA..., 2017).

No entanto, há que se considerar os dados do Programa Ciências sem Fronteiras, especialmente no âmbito da graduação, pois proporcionou conquistas para os estudantes intercambiários, e seu fim é um retrocesso no âmbito das políticas públicas inclusivas, pertinentes à “cooperação acadêmica internacional", “internacionalização da educação superior no Brasil" e "mobilidade estudantil", pois o programa CSF implementou-se no âmbito dessas políticas públicas.

Um bom exemplo são os dados da inclusão de afrodescendentes, uma vez que o Programa CSF beneficiou 17,5 mil negros, com bolsas de estudo no exterior. Os afrodescendentes representam 25,23% das vagas oferecidas pelo programa, e desde que a etnia foi incluída no formulário de inscrição, em 2013, pôde-se verificar que um a cada quatro desses bolsistas é negro. Além disso, foram beneficiados, também, 161 indígenas. (BRASIL, 2015).

Estudo de caso: intercambiários da FATEC/TQ

O estudo de caso é uma estratégia metodológica do tipo exploratório, descritivo e interpretativo, cujo método de estudo é eclético. (OLIVEIRA, 2010, p. 55). “O estudo de caso é uma investigação empírica que investiga um fenômeno contemporâneo em profundidade e em seu contexto de vida real [...]”. (YIN, 2010, p. 39). O estudo de caso visa explorar um caso singular, situado na vida real contemporânea, bem delimitado e contextualizado em tempo e lugar para realizar uma busca circunstanciada de informações sobre um caso específico. (CHIZZOTTI, 2010, p. 136). Com fundamento nas citações dos autores, buscou-se explorar, descrever e interpretar os dados obtidos por meio do estudo de caso com os estudantes intercambiários da FATEC/Tq. Ressalta-se que, antes de participar da pesquisa, os estudantes intercambiários tiveram acesso a um texto que o explicava, junto do Termo de Consentimento Livre Esclarecido, no qual autorizavam a divulgação de todas as informações por eles fornecidas. O objetivo principal do questionário online é avaliar se o CSF, enquanto política pública de inclusão no ensino superior, atende às expectativas dos estudantes intercambiários. Nessa perspectiva, buscou-se, a partir das 63 questões e dos tópicos abordados, analisar as categorias empíricas pertinentes ao estudo de caso.

Identificação: perfil dos estudantes

A construção do questionário buscou, inicialmente, caracterizar os estudantes intercambiários e procurou saber sobre sua identificação.

Sexo

Compõem o grupo de estudantes intercambiários da FATEC/Tq 83,3% do sexo masculino (10 estudantes) e 16,7% do sexo feminino (dois estudantes). Nesta pesquisa, considera-se a variável sexo muito importante, pois representa um aspecto positivo, se considerarmos as lutas históricas pelas quais a sociedade brasileira passou, no que diz respeito à questão de gêneros. Os dados representam um avanço nos índices de escolaridade feminina no ensino superior, especialmente por se tratar de uma faculdade de cunho tecnológico, cuja presença geralmente é majoritariamente masculina e, ainda assim, há a presença de 16,7% de estudantes do sexo feminino que, além de cursar uma faculdade tecnológica, conseguiram participar do intercâmbio pelo Programa CSF.

Faixa etária

Os dados da pesquisa indicam que a idade mais frequente dos bolsistas pesquisados pertence à faixa etária de 16 a 24 anos, identificados pela presença de 75% (nove estudantes), seguidos por 25% (três estudantes), presentes na faixa etária dos 25 aos 32 anos. Não foram encontrados estudantes presentes nas faixas dos 32 aos 40 anos e com mais de 40 anos. O Plano Nacional de Educação (PNE, 2014) estabelece como faixa ideal para se cursar o ensino superior, a faixa de 18 a 24 anos. Nesse sentido, pode-se afirmar que o grupo desses estudantes intercambiários representa essa perspectiva estabelecida no PNE.

Contexto familiar

Em relação ao contexto familiar, considerou-se o número de pessoas que residem na mesma casa, como integrantes do grupo familiar (incluindo o estudante intercambiário). A tabela 1 apresenta esses dados.

Tabela 1 Distribuição de estudantes intercambiários segundo o número de integrantes do grupo familiar: nº de pessoas que residem na mesma casa 

Integrantes do grupo familiar Quantidade de estudantes intercambiários %
1 pessoa 0 0
2 pessoas 3 25
3 pessoas 5 41,7
4 pessoas 1 8,3
Mais de 4 pessoas 3 25

Fonte: Autoras

O número de integrantes do grupo familiar está diretamente relacionado ao contexto socioeconômico, cultural e educacional em que o estudante intercambiário está inserido, e tal contexto, conforme afirma Bourdieu (2001))1, influencia diretamente a trajetória estudantil, nas escolhas dos cursos e nas condições pelas quais os estudantes estudarão. Ou seja, determina diretamente a trajetória dos estudantes, de acordo com o capital econômico, simbólico, social e cultural que cada família possui (ou da falta deste), e que corroborou com as escolhas dos estudantes.

Egressos e estudantes

Pertencem ao universo desta pesquisa 58,3 (sete estudantes intercambiários que já são egressos) e 41,7% (cinco intercambiários que ainda são estudantes). O fato de ambos os tipos de intercambiários (estudantes e concluintes/egressos) participarem da amostra da pesquisa é significativo, porque ambos podem proporcionar informações diferentes e complementares, de acordo com a trajetória até então percorrida, relevantes para análise desta pesquisa.

Curso e categoria: presencial e educação à distância (EAD); escolha pelo curso

Todos os estudantes pertencem aos cursos presenciais oferecidos pela FATEC/Tq, que são classificados como cursos superiores de Tecnologia. Compõem o universo amostral desta pesquisa 75% (nove estudantes intercambiários) do Curso Superior de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas, e 25% (três estudantes intercambiários) do Curso Superior de Tecnologia em Sistemas para a Internet. Além desses cursos, a FATEC/Tq oferece os cursos superiores de Tecnologia em Agronegócio, Tecnologia em Produção Industrial, ambos na modalidade presencial, e Tecnologia em Gestão Empresarial, na modalidade à distância (EAD), mas que não se fizeram representados pelos estudantes intercambiários.

Uma das questões sobre a identificação dos estudantes buscou saber se o curso, no qual estavam matriculados, ou concluíram, era o curso que desejavam. Como resposta, obteve-se 91,7% (11 estudantes intercambiários) vinculados aos cursos que desejavam, e 8,3% (um estudante intercambiário), a cursos indesejados.

Cursinho pré-vestibular

Considerando-se que a FATEC/Tq é uma instituição pública de qualidade, e tradicional na região, tendo completado, em 2017, 25 anos no oferecimento de cursos superiores de Tecnologia e, portanto, possuindo uma relação candidato/vaga significativamente concorrida, especialmente nos cursos representados pela amostra desta pesquisa, indagaram-se os estudantes intercambiários sobre se frequentaram cursinho pré-vestibular e qual a categoria. Obteve-se um total de 66,7% (oito estudantes intercambiários) que não frequentaram cursinho pré-vestibular, 16,7% (dois estudantes intercambiários) que frequentaram cursinho pré-vestibular comunitário (instituição pública) e 16,7% (dois estudantes intercambiários) que frequentaram cursinho pré-vestibular particular (na condição de pagante). Não se fizeram representados, na amostra desta pesquisa, estudantes intercambiários que tiveram frequentado cursinho pré-vestibular particular (na condição de bolsista).

Período (o de maior frequência) que os estudantes intercambiários estudam ou estudaram no ensino superior da FATEC/Tq

50% (seis estudantes intercambiários) estudam ou estudaram no período noturno, 25% (três estudantes intercambiários), no período vespertino, e 25% (três estudantes intercambiários), no período matutino. Verifica-se, portanto, que a maioria dos estudantes intercambiários da faculdade FATEC/Tq frequentou o período noturno. Segundo Ristoff (2008), a oferta de cursos noturnos é uma das ações que corroboram os direitos dos historicamente excluídos, que assegura o acesso e a permanência a todos os que seriamente procuram a educação superior.

Modalidade de escola de Ensino Médio, onde os estudantes intercambiários estudaram, e turno

50% (seis estudantes intercambiários) cursaram o ensino médio em escola particular (na condição de pagante), 25% (três estudantes intercambiários), em escolas públicas, 16,7% (dois estudantes intercambiários), em Escola Técnica Estadual (ETEC), e 8,3% (um estudante intercambiário), em escola particular, na condição de bolsista. 83,3% (10 deles) estudaram no período matutino e 16,7% (dois deles) no período vespertino. 58,3% (sete deles) consideram que o ensino médio os preparou para concorrer às vagas nas instituições de ensino superior públicas (IESP), 25% (três deles) consideram que não, 8,3% (um deles) acredita que apenas para as IESP de média e baixa concorrência, e 8,3% (outro deles) não sabe opinar.

Trabalho, profissão e ascensão profissional

A segunda categoria a ser investigada é trabalho e profissão, construída por meio de questões pertinentes ao trabalho, cuja análise será apresentada a seguir:

91,7% (11 estudantes intercambiários) trabalham e 8,3% (um estudante intercambiária) não trabalham, mas por opção da própria estudante, pois já trabalhou durante

o período da faculdade e agora não trabalha, por ter optado por estudar, uma vez que já está fazendo mestrado;

dentre os estudantes intercambiários que trabalham, 83,3% (10 deles) trabalham em período integral, e 8,3% (somente um) trabalham em período parcial;

25% (três estudantes intercambiários) ainda exercem o mesmo tipo de trabalho de quando ingressaram na FATEC/Tq e 66,7% (oito estudantes intercambiários) possuem trabalho diferente daquele que possuíam quando ingressaram na FATEC/Tq;

83,3% (10 estudantes intercambiários) conseguiram um trabalho ou um novo emprego após ter participado do Programa Ciências sem Fronteiras (CSF), 16,7% (dois estudantes intercambiários) não conseguiram;

50% (seis estudantes intercambiários) já trabalhavam na área do curso que escolheram, e outros 50% não trabalhavam;

75% (nove estudantes intercambiários) estão trabalhando na área do curso que escolheram e 16,7% (dois deles) ainda não.

Apesar de difícil, não é novidade para os estudantes dos cursos de tecnologia da FATEC/Tq o fato de ter que conciliar as atividades de trabalho e estudos nos poucos intervalos que sobram “livres”, pois já faz parte do habitus desses alunos, muito antes de ingressarem no ensino superior. Já os estudantes que trabalham em período parcial e aqueles que não trabalham possuem mais tempo livre para dedicar-se aos estudos, às atividades extracurriculares, aos estágios, à pesquisa, etc, de forma a cursar esse nível de ensino com mais qualidade. Não que seja tarefa fácil, porque cursar o ensino superior com dedicação exige muitas horas de estudo e pesquisa, mas o fato de não trabalhar corrobora a quantidade e a qualidade de seus estudos.

Percurso acadêmico: Idioma sem Fronteiras (ISF), inscrição no CSF e semestre de intercâmbio

A terceira categoria investigada é o percurso acadêmico dos estudantes intercambiários, realizada por meio de questões que buscaram explorar tópicos pertinentes ao ingresso no Programa Ciências sem Fronteiras (CSF):

91,7% (11 estudantes intercambiários) não precisaram participar do Programa Idiomas sem Fronteiras (ISF), para poderem concorrer à vaga no Programa Ciências sem Fronteiras

(CSF), e 8,3% (somente um deles) precisou participar do ISF;

66,7% (oito estudantes intercambiários) frequentaram cursos de idiomas, e 33,3% (quatro estudantes intercambiários) não frequentaram;

83,3% (10 estudantes intercambiários) se inscreveram apenas uma vez, e 16,7% (dois estudantes intercambiários) se inscreveram duas vezes;

41,7% (cinco estudantes intercambiários) estavam matriculados no 5º semestre, 33,3% (quatro deles) estavam no 6º semestre, 16,7% (dois deles), no 4º semestre, e 8,3% (um), no 3º semestre, quando realizaram o intercâmbio por meio do Programa CSF.

Contexto familiar

Um conjunto de questões buscou saber sobre a quarta categoria investigada, com o propósito de conhecer o contexto familiar dos estudantes intercambiários, para verificar se eles já possuíam o ethos do ensino superior (particular e público), originário de suas famílias. Buscou-se, ainda, verificar se os estudantes intercambiários foram geradores desse ethos no âmbito familiar:

33,3% (quatro estudantes intercambiários) possuem duas pessoas na família que já concluíram ou estão cursando o ensino superior; 25% (três deles) possuem uma pessoa na família que já concluiu ou está cursando o ensino superior; 8,3% (um deles) possui três pessoas; 8,3% (um deles), mais de quatro pessoas, e 25% (três deles) não possuem ninguém que já concluiu ou esteja cursando o ensino superior.

Se fazem presentes na vida desses estudantes dois pais, seis mães, cinco irmãos, e um parente que reside na mesma casa, que estão cursando ou concluíram o ensino superior. Não se identificaram esposo(a) e filhos. Buscou-se verificar, ainda, se dentre esses membros familiares que concluíram ou estão cursando o ensino superior, se o fizeram em instituição de ensino superior pública. A análise dos dados nos permitiu verificar que 41,7% (cinco estudantes intercambiários) possuem membros na família que estudaram ou estudam no ensino superior público, e 58,3% (sete deles) não possuem.

Com relação ao possível ethos familiar que estes estudantes podem construir em suas famílias, os dados da pesquisa indicam que apenas 16,7% (dois estudantes intercambiários) possuem, em sua família, outras pessoas que pretendem cursar o ensino superior. Dos dois estudantes intercambiários que indicaram a intenção de membros da família cursar o ensino superior, um deles informou que são os irmãos, e o outro informou que são parentes que residem na mesma casa. E no que diz respeito a intercâmbios, nenhum dos estudantes intercambiários possui membros da família que já fizeram intercâmbios, ou seja, eles pertencem à primeira geração familiar a realizar um intercâmbio em nível de educação superior, por meio de uma faculdade pública.

Desempenho escolar

Outro bloco de questões pesquisou a vida estudantil dos estudantes intercambiários e procurou saber sobre a possibilidade de dedicação aos estudos e o desempenho no curso. Atrelado a essas questões, verificou-se que 33,33% (quatro estudantes intercambiários) conseguem dedicar apenas 1 hora por semana aos estudos, 25% (três deles) dedicam 2 horas, 16,7% (dois deles), 3 horas, e 25% (três deles) dedicam mais de 4 horas.

No entanto, todos os estudantes (100%) consideram que conseguiram ter bom desempenho no curso, sendo que 58,3% (sete estudantes intercambiários) nunca reprovaram, 33,33% (quatro deles) foram reprovados em uma matéria, 8,3% (um deles), em duas matérias. Tais dados permitem afirmar que não é a quantidade de horas que determinará o sucesso ou insucesso do bolsista no curso. Há outras variáveis, como o tipo de curso, os talentos envolvidos dos estudantes para o tipo de curso que estão vinculados, o tipo de trabalho que executam e o quanto tal trabalho exige de esforço físico e/ou mental, bem como a percepção que eles têm sobre desempenho escolar, pois 41,7% (cinco estudantes) possuem reprovação em matérias e, apesar disso, consideram que tiveram um bom desempenho no curso. Pode-se inferir, assim, que é uma boa percepção, pois cada estudante tem o seu tempo de aprendizagem, ou seja, ser reprovado em uma ou duas matérias não significa mal desempenho do aluno, mas sim que ele precisou de um pouco mais de tempo para aprendê-la, considerando-se, inclusive, que a maioria são alunos trabalhadores (tem de organizar seu tempo entre a dedicação ao trabalho e aos estudos).

Prosseguimento nos estudos

Com a intenção de verificar a categoria interesse de prosseguimento nos estudos, foram feitas questões para verificar se os estudantes pretendem dar sequência nos estudos em nível de Pós-Graduação e em qual modalidade. Todos os estudantes (100%) pretendem dar sequência nos estudos em nível de Pós-Graduação, 41,7% (cinco deles) pretendem cursar Master of Business Administration (MBA)2, 33,3% (quatro deles) pretendem fazer especialização lato sensu, e 25% (três deles), fazer mestrado, sendo que um deles inclusive já está fazendo.

Ampliação da rede de relacionamentos profissionais, pessoais e culturais

Algumas questões buscaram saber a opinião dos estudantes em relação ao Programa CSF, no que diz respeito à ampliação da rede de relacionamentos profissionais, pessoais e culturais:

83,3% (10 estudantes intercambiários) consideram que o Programa CSF contribuiu para a ampliação da rede de relacionamentos profissionais e pessoais, e 16,7% (dois deles) consideram que o programa CSF contribuiu somente com a ampliação da rede de relacionamentos pessoais;

Todos os estudantes (100%) consideram que o Programa CSF contribuiu para ampliar sua cultura, despertando o interesse em frequentar espaços culturais, tais como bibliotecas, museus, cinemas e outros espaços de cunho cultural.

Programa Ciências sem Fronteiras: critérios de seleção, o programa, preconceitos ou constrangimentos e fechamento do programa

Critérios de seleção

Perguntou-se aos estudantes se eles concordam com os critérios de seleção do programa, e 66,7% (oito estudantes intercambiários) concordam com os critérios de seleção do Programa CSF, e 33,3% (quatro deles) não concordam. Os trechos, a seguir, elucidam as opiniões dos alunos que não concordam com a seleção:

Fui selecionada com base no resultado da prova de proficiência e do ENEM. Tendo tais requerimentos, tive apenas que me inscrever e aguardar os resultados.

No geral foi bem demorada e burocrática.

A professora responsável selecionou pelo meu desempenho na língua inglesa e nas disciplinas na Fatec.

Fui selecionado pelo nível de inglês.

Instituição(ções) onde fizeram o intercâmbio e países

O quadro 1 apresenta as instituições, onde os estudantes intercambiários fizeram o intercâmbio e respectivos países.

Fonte: Autoras

Quadro 1 Instituições e países 

Período de duração do intercâmbio em meses

O gráfico 1 apresenta o período de duração do intercâmbio dos alunos, em meses:

Fonte: Autoras

Gráfico 1 Duração do intercâmbio dos estudantes 

Os períodos de intercâmbio foram de 9 a 18 meses, como demonstrado no gráfico 1.

Ano de realização do intercâmbio

Os estudantes intercambiários realizaram o intercâmbio nos anos 2013, 2014 e 2015.

Desenvolvimento de projetos de pesquisa, estudos, treinamentos e capacitação etc

66,7% (oito estudantes intercambiários) participaram do desenvolvimento de projetos de pesquisa, estudos, treinamentos e capacitação etc., durante o intercâmbio pelo Programa CSF, e 33,3% (quatro deles) não participaram.

Cooperação entre grupos de pesquisa brasileiros e estrangeiros na universidade onde você realizou o intercâmbio

66,7% (oito estudantes intercambiários) tiveram a cooperação entre grupos de pesquisa brasileiros e estrangeiros na universidade onde realizou o intercâmbio e 33,3% (quatro deles) não participaram.

Benefícios financeiros do programa Ciências sem Fronteiras

Os benefícios disponíveis foram: mensalidades de bolsas, adicional de localidade, seguro saúde, auxílio-instalação, auxílio material didático e auxílio deslocamento para bolsa no exterior etc. Os dados da pesquisa mostram que 41,7% (cinco estudantes intercambiários) receberam todos os benefícios, 8,3% (um deles) recebeu mensalidade de bolsas, 41,7% % (cinco deles) só não receberam adicional de localidade, 8,3% (um deles) recebeu mensalidades de bolsas, seguro saúde, auxílio instalação e auxílio material didático.

Modalidade de sua bolsa

Todos (100%) fizeram o intercâmbio por meio da graduação sanduíche.

Preconceito ou constrangimento por ser brasileiro

Nenhum dos estudantes sofreu algum tipo de preconceito ou constrangimento.

Encerramento do Programa Ciências sem Fronteiras (CSF)

75% (nove estudantes intercambiários) não concordam e 25% (três deles) concordam. No que diz respeito aos motivos de 25% deles concordarem com o encerramento do programa, os motivos pautam-se nas seguintes opiniões:

Acredito que a maioria dos alunos enviados não dão o devido valor, não levando as aulas a sério etc. Não há real utilidade dos profissionais que se formam com uma graduação sanduíche. Não é um programa que de fato deu oportunidade de melhorar de vida. Apenas premiou com um intercâmbio e obrigou o retorno ao Brasil, de modo que ao retornar o país não tinha condições de emprego para o conhecimento obtido.

Percebe-se que mesmo os alunos que concordam com o encerramento do programa fundamentam seus motivos em razões que “poderiam ser melhoradas”, por exemplo, com ações como: selecionar melhor os alunos que de fato tenham interesse no intercâmbio; ter um acompanhamento “pós-intercâmbio” adequado às reais necessidades e interesses dos intercambiários, demonstrando sua “utilidade” e/ou que este pós-intercâmbio possa alargar os conhecimentos dos intercambiários, indo além das questões “utilitárias”; e, finalmente, que o pós-intercambio possa proporcionar condições de melhorias de vida, seja no Brasil ou no exterior.

Considerações finais

As considerações finais deste artigo não pretendem esgotar todas as possibilidades de análise do Programa CSF, mas se focam especialmente nos dados obtidos por meio deste estudo de caso. Entende-se, aqui, que é um importante instrumento de pesquisa, especialmente porque proporcionou a obtenção e criação de dados primários como parte de um conjunto de dados que podem servir de diagnóstico para a avaliação de uma política pública inclusiva no âmbito da educação superior, uma vez que permitiu uma experiência em pesquisa, no exterior, para estudantes que, sem tal política, não teriam a possibilidade. É de se entender que em um momento de desmantelamento das políticas públicas, faz-se necessária e primordial a compreensão, e também a identificação, dos prós que esse programa proporcionou aos estudantes beneficiários.

Considerando-se que o habitus dos indivíduos ganha corpo no campo e que os indivíduos elaboram e implementam as estratégias de ação, por meio dos capitais econômico, simbólico, social e cultural, pode-se inferir que o Programa CSF contribuiu para ampliar a cultura dos estudantes, despertando o interesse em frequentar espaços culturais, tais como bibliotecas, museus, cinemas e outros espaços de cunho cultural. Cremos que o programa CSF proporcionou um habitus análogo ao conceito desenvolvido na teoria do sociólogo francês Pierre Bourdieu. No entanto, neste caso, contemplou, também, os alunos egressos de escolas de ensino médio públicas que participaram do intercâmbio e que, muitas vezes, não teriam condições de frequentar esses espaços tão importantes para a formação humana. Ressalta-se, ainda, que são estudantes dos cursos de tecnologia e, portanto, dificilmente teriam acesso a esses espaços de formação humana, se não fosse por meio do CSF.

É possível identificar que o habitus e o ethos dos estudantes da FATEC/Tq são muito diferentes dos estudantes das classes mais altas da sociedade. Nesse sentido, o programa CSF corroborou o acesso a ambientes educacionais e culturais dificilmente acessíveis para esses alunos que até então tiveram acesso aos estudos, focados nos aspectos da tecnologia e do mercado de trabalho. Pode-se acrescentar, ainda, que a vida dos estudantes que precisam compatibilizar trabalho e estudo não é nada fácil e, portanto, as desigualdades econômicas e sociais e as exclusões culturais e educacionais são, ainda, visíveis. Portanto, o que já se fez em termos de uma educação de qualidade para todos, desde a educação básica até a pós-graduação ainda não é suficiente para contemplar todas as demandas da classe trabalhadora.

O “impacto” de ascensão desses estudantes é considerável, pois há possibilidades de seus filhos e netos passarem a ser possuidores de um ethos e de uma relação com o conhecimento, com a ciência e com a cultura muito diferente daquela que eles têm. Muitas vezes, “a vida” se movimenta por caminhos que “não são exatamente aqueles mais previsíveis ou ideais” e, nesse sentido, é preciso fazer uma releitura da realidade educacional e dos “pré-conceitos” que existem, inclusive daqueles existentes nos meios acadêmicos em relação à formação dos alunos dos cursos de tecnologia e de sua inserção nos programas de intercâmbio.

Diante de tal contexto, conclui-se que os prós do programa CSF são muito mais significativos que os contras e tudo aquilo que o programa representa, enquanto política pública inclusiva de educação superior, especialmente na graduação, nível de ensino em que os alunos dificilmente fariam intercâmbio, principalmente aqueles pertencentes às camadas socioeconômicas, culturais e educacionais mais baixas da população brasileira.

Encerramos este artigo, com uma perspectiva e com um propósito de que os conhecimentos empíricos e primários podem indicar caminhos e possibilidades de melhorias para futuros beneficiários da política pública investigada, na ‘esperança’ político-educacional de que o programa CSF seja reativado para a graduação, considerando-se sua importância no âmbito das políticas educacionais inclusivas.

Referências

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Notas:

1Há uma riquíssima literatura de Pierre Bourdieu que foca nas questões educacionais, sociais, econômicas e culturais, cujos conceitos determinam o ingresso e a permanência no ensino superior, na perspectiva do autor. No caso desta pesquisa, buscou-se verificar se os estudantes possuem o habitus e o ethos familiar, tal como são definidos pelo autor. Bourdieu (1930-2002) foi um dos grandes pensadores das áreas da educação, sociologia e filosofia do século XX, e na educação o autor formulou uma teoria fundamentada teórica e empiricamente sobre o problema das desigualdades escolares.

2De acordo com o MEC, o MBA é uma modalidade de curso de Pós-Graduação lato sensu. Porém, inseriu-se separadamente no questionário, porque geralmente ele é identificado pelas IES como MBA.

Recebido: 15 de Fevereiro de 2018; Revisado: 19 de Setembro de 2018; Aceito: 25 de Outubro de 2018

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