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Educação: Teoria e Prática

versión impresa ISSN 1993-2010versión On-line ISSN 1981-8106

Educ. Teoria Prática vol.29 no.62 Rio Claro set./dic 2019  Epub 01-Ene-2020

https://doi.org/10.18675/1981-8106.vol29.n62.p553-570 

Artigos

A PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA QUANTO AO LIVRO DIDÁTICO E O MMM

THE PERCEPTION OF MATHEMATICS TEACHERS ABOUT THE TEXTBOOK AND THE MMM

LA PERCEPCIÓN DE PROFESORES DE MATEMÁTICAS EN CUANTO AL LIBRO DIDÁCTICO Y EL MMM

Zionice Garbelini Martos RodriguesI 
http://orcid.org/0000-0002-4072-1174

IInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – Câmpus de Birigui, Birigui, São Paulo – Brasil. E-mail: zionice@gmail.com.


Resumo

Espera-se, com este artigo, trazer elementos acerca do modo como os professores de Matemática do interior paulista se apropriaram do Movimento da Matemática Moderna (MMM), e um dos modos dessa apropriação se deu via livro didático. Nessa perspectiva, pretende-se discutir algumas nuances dessa apropriação. A metodologia utilizada foi da História Oral. Sabe-se que os Congressos Nacionais de Ensino de Matemática, ocorridos no Brasil na década de 1950, foram os primeiros fóruns privilegiados de discussões sobre a Matemática escolar brasileira. À luz dos depoimentos, percebe-se uma motivação para o movimento da Matemática Moderna e alguns dos depoimentos apontaram que o uso do livro didático foi significativo para que o processo de mudanças efetivamente pudesse ocorrer, embora muitos artigos escritos sobre o movimento mencionem que a motivação inicial do Movimento da Matemática Moderna era a preocupação com a preparação matemática dos jovens que chegavam à universidade. Academicamente, intenciona-se que este artigo possa oferecer contribuições para a valorização do ensino da Matemática e, também, colaborar no desencadeamento de novas pesquisas

Palavras-chave História; Matemática Moderna; Livro Didático

Abstract

With this article, we aspire to discuss how Math teachers in the state of São Paulo understood the Modern Mathematics Movement. One way through which such appropriation took place was via textbooks. Therefore, we will discuss some nuances of this appropriation using the methodology of Oral History. It is acknowledged that the first deep discussions about Brazilian school Math took place at the National Congresses of Math Teaching in the 1950s. The teacher’s narratives indicate motivation towards the Modern Mathematics Movement and that the use of textbooks was crucial so that changes could effectively occur, even though many articles stress that the initial motivation for the Movement was the preparation of freshmen in universities. Academically, we aspire that this article may contribute to the fostering of Math teaching and also to inspire new research.

Keywords History; Modern Mathematics; Textbooks

Resumen

Se espera, con este artículo, traer elementos acerca de cómo los profesores de Matemáticas del interior paulista se apropiaron del Movimiento de la Matemática Moderna (MMM), y uno de los modos de esa apropiación se dio vía libro didáctico. En esta perspectiva, se pretende discutir algunos matices de esa apropiación. La metodología utilizada fue de la Historia Oral. Se sabe que los Congresos Nacionales de Enseñanza de Matemáticas, ocurridos en Brasil en la década de 1950, fueron los primeros foros privilegiados de discusiones sobre la Matemática escolar brasileña. Con los testimonios se percibe que una motivación para el movimiento de la Matemática Moderna y algunos de los testimonios apuntaron que el uso del libro didáctico fue significativo para que el proceso de cambios efectivamente pudiera ocurrir, aunque muchos artículos escritos sobre el movimiento mencionan que la motivación inicial del Movimiento de la Matemática Moderna era la preocupación con la preparación matemática de los jóvenes que llegaban a la universidad. Académicamente, se pretende que este artículo pueda aportar contribuciones para la valorización de la enseñanza de las Matemáticas y también colaborar en el desencadenamiento de nuevas investigaciones.

Palabras clave Historia; Matemáticas Modernas; Libros de texto

1 Introdução

Este artigo tem como objetivo apresentar um recorte da tese de doutorado, intitulada “O Movimento da Matemática Moderna na Região de Ribeirão Preto: Uma Paisagem”, apresentada em 2010, na Universidade Estadual de Campinas. Com ele, busca-se discorrer sobre um grupo de professores de Matemática que fez parte do Movimento da Matemática Moderna (MMM) nas décadas de 1960, 1970 e 1980. Esses documentos foram complementados por outros tipos de fontes escritas. No diálogo com as fontes, diversas facetas da Matemática escolar em tempos de Matemática Moderna se destacaram. Uma dessas facetas, os Livros Didáticos de Matemática Moderna, são discutidos neste trabalho.

A escolha do tema, do período e da região são decorrentes de circunstâncias de vida da autora e pesquisadora, o que, de certa forma, permitiu o registro de um determinado período de permanência na região em foco.

Quanto à opção pela metodologia da história oral para as entrevistas, foi baseada nos estudos de Garnica (2004, p. 154), que escreve:

Pensar a História Oral como metodologia, entretanto, nos trabalhos que temos desenvolvido, não significa reduzi-la a uma prática de coleta e arquivamento de informações. Significa, sim, pensar em regras de ação — associadas, como pretendia também Descartes, a uma ideia de eficácia — e fundamentá-las teórico-filosoficamente, analisando situações, propondo táticas e estratégias (no sentido que lhes dá Certeau), testando seus limites, esclarecendo tanto quanto possível o campo epistemológico e axiológico no qual estão assentadas.

Além do método citado acima, o uso do diário de campo possibilitou que fossem registrados alguns dados da parte informal da entrevista, de detalhes da fala e dos fatos. Cabe mencionar que foram utilizados os mecanismos de textualização e o cotejamento com outras fontes.

Em uma entrevista, segundo Camargo (1994, p. 12), cabe ao pesquisador a obrigação de “interpretar as informações obtidas e contextualizá-las” à necessidade do estudo. Já ao entrevistado é solicitado rememorar, assim pode “fornecer com autenticidade dados e impressões à luz de sua experiência, e de sua própria verdade; interpretá-los livremente, sem coibições de nenhuma espécie”.

Uma das razões que nos levaram à busca das “vozes” dos professores que participaram desses eventos e aplicaram a Matemática Moderna foi a necessidade de levar em conta as regionalidades, que são distintas dentro de um mesmo Estado, uma vez que em todo espaço geográfico existe, igualmente, uma cultura e uma história. Procuramos saber se a Matemática Moderna foi bem compreendida, aceita, ou ainda se houve resistência à sua introdução no Estado e na região. A experiência com os depoentes produziu na pesquisadora um novo olhar sobre o Movimento da Matemática Moderna.

Dez professores que lecionaram Matemática na região de Ribeirão Preto, no Estado de São Paulo, tanto em cursos de Licenciatura quanto em escolas de educação básica, foram entrevistados sobre o processo de apropriação do conjunto de ideias relativas ao Movimento da Matemática Moderna. A entrevista se deu de forma semiestruturada: algumas questões sobre as quais gostaríamos que eles discorressem foram levadas, as questões foram lidas e foi solicitado para que falassem um pouco sobre elas. A questão central foi “o que teria sido o Movimento da Matemática Moderna?”, o tema que direcionou a pesquisa e partir do qual decidimos ouvir aqueles que supostamente vivenciaram este período tão explorado na literatura.

Neste artigo, será feita uma breve descrição de um dos grupos de estudo que se constituiu para que houvesse a proliferação do ideário da MMM no país.

2 A Criação do Grupo de Estudos do Ensino de Matemática (GEEM)

A tese do professor Osvaldo Sangiorgi, no Segundo Congresso Nacional de Ensino de Matemática, já em seu título, anunciava as discussões sobre o ensino de Matemática que estariam em pauta nas décadas seguintes: “Matemática clássica ou Matemática moderna na elaboração dos programas do ensino secundário?”.

Dois anos depois da realização do Segundo Congresso, sob a direção de Osvaldo Sangiorgi, é criado o Grupo de Estudos do Ensino de Matemática (GEEM). Em artigo da época, quando questionado sobre o que era o GEEM, de São Paulo, o professor respondeu, em sua publicação “A Matemática no Ensino Secundário. Atualidades Pedagógicas” (1962):

Trata-se do Grupo de Estudos do Ensino da Matemática que, em cooperação direta com a Secretaria da Educação de São Paulo, objetiva principalmente coordenar e divulgar a introdução da Matemática Moderna na Escola Secundária.

(SANGIORGI, 1962, p. 10).

Contemplando em “seus quadros professores universitários e secundários de Matemática”, o grupo realizava, “em convênio com os Governos Federal e Estadual, Cursos de Aperfeiçoamento (que variavam desde uma quinzena de duração) destinados a professores secundários e que objetivavam a introdução dos novos conceitos e da renovação da linguagem matemática” (SANGIORGI, 1962, p. 12).

Os primeiros cursos da GEEM foram realizados em 1961 nas cidades de Santos e Itapetininga e seu programa contava com disciplinas como: “Lógica Matemática, Álgebra Moderna e Seminários sobre tópicos de assuntos de um moderno programa de Matemática para a Escola Secundária” (SANGIORGI, 1962, p. 12). Pouco depois, em 1962, aconteciam reuniões mensais do grupo, “destinadas a professores secundários, de trabalhos experimentais que cerca de nove professores vêm realizando com uso de linguagem moderna em suas aulas” (SANGIORGI, 1962, p.12); isso para que, nos anos seguintes, os cursos oferecidos pelo GEEM fossem reorganizados e dessem origem a três estágios, com dois grupos distintos de disciplinas: “teóricas” e “práticas”.

No Programa para os três estágios de cursos oferecidos pelo GEEM em 1965, por exemplo, encontram-se disciplinas de “Tópicos Matemáticos” (Teoria dos Conjuntos, Lógica Matemática, Álgebra Moderna 1 e 2, Cálculo Infinitesimal, Vetores e Geometria Analítica Probabilidades, Topologia e Programação Linear” e “Pedagógicas” (Seminários de Ensino, Práticas Moderna e Sessões de Estudo – Curso Normal) (LIMA, 2006).

A distinção entre os dois grupos de disciplinas, no entanto, nem sempre era perceptível. Algumas que pertenciam à parte pedagógica nem sempre problematizavam questões do ensino fundamental ou médio.

Em entrevista a Flainer Rosa de Lima (2006), o professor Irineu Bicudo, responsável pela disciplina Seminários de Ensino, afirma que ela era direcionada à “formação matemática do professor” e não tinha a intenção de “aplicar de imediato aquilo que estava sendo ensinado”. O professor pondera ainda que “faltava essa bagagem matemática que pudesse servir de fundamento para ele por a prática dele sobre. E os cursos que ministrei sempre foram nesse sentido. Não esperava que fossem aplicados em sala de aula” (LIMA, 2006, p. 67).

Ao contrário do que afirma o professor Irineu Bicudo, alguns dos entrevistados consideram que nem sempre conteúdos matemáticos disponibilizados em cursos de Matemática Moderna foram importantes para a fundamentação da prática escolar.

Faz-se necessário apresentar os cursos e os livros didáticos ou livro textos que nossos entrevistados fizeram ou ministraram sobre o tema em foco. Além disso, um dos depoentes possuía toda coleção dos livros de Papy.

3 Cursos e Livros sobre Matemática Moderna

A professora Mirthes M. B. Alexandre, aluna do Curso de Especialização sobre Álgebra de Boole, oferecido pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras “Barão de Mauá” e ministrado por Osvaldo Sangiorgi, manifesta essa posição. Ela considera que, no início, achou meio complicada a “Álgebra de Boole”, ao rememorar o curso em que foi aluna e de que gostou muito, e pondera que “foi um curso muito bom, uma aula diferente, com uma pessoa que admira demais” e que gostou “da parte de socialização e do conteúdo que ele ministrou”. Entretanto, a professora Mirthes conclui afirmando que “não foi possível aproveitar muito do que aprendi em sala de aula” (BORTOLIN ALEXANDRE, 2006, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 100).

Para a professora, o conteúdo matemático central do curso, a saber, Álgebra de Boole, não auxiliou na sua prática docente. Maria Aparecida Coelho, também professora formada em Licenciatura em Matemática e que frequentou o mesmo curso de Mirthes, manifesta uma posição semelhante ao afirmar que:

[...] embora o curso tenha sido sobre Álgebra de Boole e aplicações, o forte da aula do Sangiorgi eram histórias de contextos escolares que ele compartilhava com os alunos. As aulas eram muito ricas nesse sentido, não no conteúdo da Álgebra de Boole, mas no sentido da experiência dele como professor e das experiências dele nas salas de aula.

(COELHO, 2006, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 86).

A dificuldade de muitos professores na apropriação dos novos conteúdos da Matemática Moderna em suas aulas, mesmo após a participação em cursos, palestras e outras atividades propostas pelo GEEM ou por outros grupos a ele filiados, como o Centro Regional de Aperfeiçoamento e Ensino da Matemática (CRAEM), muitas vezes levou à adoção de livros didáticos, os quais eram “usados como uma bíblia”. E a bíblia era o livro de Osvaldo Sangiorgi para o Curso Ginasial.

Usávamos os livros didáticos como uma bíblia; basicamente eu usei os livros do Sangiorgi, mesmo porque eu fiz um curso de especialização com ele e o conhecia pessoalmente. Usava os livros do Sangiorgi do começo ao fim, tudo o que estava proposto ali, com poucas alterações.

(COELHO, 2006, depoente apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 86).

Ainda segundo a professora Mirthes, “nós adotamos os livros do Sangiorgi na escola municipal São Luiz. Adotávamos os livros dele porque achávamos que eram os melhores” (BORTOLIN ALEXANDRE, 2006, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 86).

Os livros do professor Sangiorgi, como várias investigações já apontaram, foram os maiores orientadores da introdução da Matemática Moderna nas séries finais do Ensino Fundamental das escolas brasileiras. A grande vendagem desses volumes transformou a coleção em uma recordista de vendas no período. A tiragem dos exemplares da Coleção Matemática Moderna “chegou à casa dos quatro milhões, com exatamente 4.332.702 exemplares de 1964 a 1972” (LAVORENTE, 2008, p. 233).

4 A Matemática Moderna e a Prática de Ensino de Matemática em Ribeirão Preto/SP

Nos depoimentos concedidos por professores de Matemática que lecionaram à luz da Matemática Moderna, em Ribeirão Preto/SP, em vários momentos, há ênfase na importância dos livros para a formação do professor na nova proposta.

O professor Antonio Santilli, por exemplo, afirma que a “Matemática Moderna foi introduzida em Ribeirão Preto, com a prática dos professores”, na qual o livro didático desempenhou um papel fundamental.

[...]Não tivemos uma introdução, um preparo inicial. Baseávamo-nos nos ensinamentos dos livros didáticos, em especial, os livros do matemático Osvaldo Sangiorgi. Após um início titubeante e pouco promissor, graças ao esforço dos professores, a troca de ideias e algumas palestras do Sangiorgi, a Matemática Moderna teve uma aceitação muito boa e sua aplicação ao educando foi evoluindo muito bem, em todos os níveis, especialmente nas primeiras séries ginasiais, hoje 5ªs e 6ªs séries do Ensino Fundamental.

(SANTILLI, 2006, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 51).

Para a professora Maria Aparecida, os livros, naquela época, eram os principais referenciais para o trabalho pedagógico.

[...] Não me lembro de livros paradidáticos ou de materiais. O livro didático era o único material utilizado. A gente só trabalhava mesmo com livros didáticos; matemática formal e livro didático. Agora, não sei se lhe interessa diretamente este fato, mas o que veio romper um pouco com esse formalismo foi quando tomei conhecimento do livro do ‘Polya’.

(COELHO, 2006, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 67)

A Coleção Matemática Moderna, de Osvaldo Sangiorgi, já contempla algumas das características dos livros didáticos que surgem com as inovações do setor editorial brasileiro, dentre as quais estão a introdução de cores, mudanças de dimensões, introdução de notas, lembretes, amigos, entre outros. O volume 1 da coleção é o primeiro livro brasileiro para o ensino ginasial, de autoria de Osvaldo Sangiorgi, já com a utilização de um título com o termo moderno, publicado pela Companhia Editora Nacional, em 1963 (MIORIM, 2005).

Durante o período em que o Movimento da Matemática Moderna foi implantado em escolas brasileiras, a produção de livros didáticos começou a ser efetuada de uma maneira diferente de outros momentos históricos. Neste período, muitas obras foram escritas a partir de experiências inovadoras realizadas em diferentes tipos de escolas. Muitos desses livros eram escritos em parceria por professores que compartilhavam experiências semelhantes ou eram parceiros em grupos de estudo.

O professor Ruy Madsen Barbosa, membro atuante do GEEM e do CRAEM, escreveu diversos livros didáticos de Matemática Moderna, alguns deles relacionados a disciplinas que ministrava em cursos de aperfeiçoamento de professores e outros para o Ensino Fundamental e Médio.

Talvez o primeiro texto didático do professor Ruy Madsen Barbosa tenha sido o volume 5 da Série Professor do GEEM, intitulado “Combinatória e Probabilidades” (1971). Esse tema era desenvolvido pelo professor Ruy em cursos e palestras de Matemática Moderna promovidas pelo GEEM.

Fonte: Martos Rodrigues (2010, p. 143)

Figura 1 Combinatória e Probabilidades 

Outro livro do professor Ruy Madsen Barbosa, que se relaciona diretamente com as disciplinas dos cursos oferecidos pelo GEEM, é o “Elementos de Lógica aplicada ao ensino secundário”, publicado em 1968 pela Editora Nobel.

Fonte: Martos Rodrigues (2010, p. 144)

Figura 2 Elementos de Lógica aplicada ao ensino secundário 

A coleção de livros didáticos de Matemática Moderna para o Ensino Médio, então denominado Colegial, foi escrita por Ruy Madsen Barbosa e Luiz Mauro Rocha, junto com os companheiros do GEEM.

Fonte: Martos Rodrigues (2010, p. 145)

Figura 3 Curso Colegial Moderno (1968) – 3º Volume 

Outro entrevistado, Armando Righetto, professor universitário, escreveu livros de Matemática Moderna para o Ensino Superior. Com relação ao livro “Vetores e Geometria Analítica”, publicado em 1988 pelo Instituto Brasileiro do Livro Cientifico (IBCL), o professor, ao folheá-lo no decorrer na entrevista, teceu os seguintes comentários:

É um livro bem extenso, tem exercícios propostos e exercícios resolvidos; geralmente os exercícios resolvidos são os exercícios mais difíceis, mas tem muitos exercícios. O primeiro capítulo é o de Vetores, depois é que vem a Analítica e eu chego até lá nas quádricas; todo o livro é assim e tem de cálculo também.

(MARTOS-RODRIGUES, 2010)

Fonte: Martos Rodrigues (2010, p. 145)

Figura 4 Vetores e Geometria Analítica (1976) 

O professor Righetto também escreveu livros de Cálculo, um deles em parceria com o professor Antonio Sergio Ferraudo.

Fonte: Martos Rodrigues (2010, p.146)

Figura 5 Cálculo Diferencial e Integral (1976) 

Os entrevistados levantaram diferentes aspectos com relação aos livros didáticos de Matemática Moderna. Para o professor Marcio de La Corte, esses livros não apresentam uma Nova Matemática, mas, sim, uma nova abordagem da Matemática. Para ele, o modo como o cálculo foi aprendido não era igual ao que ele, com sua prática de ensinar, construiu e apresentou como resultado no livro que escreveu.

Estes livros didáticos apresentaram aos estudantes e professores não uma moderna Matemática, mas uma nova abordagem da matéria, como Teoria dos Conjuntos, Estruturas Algébricas Elementares e Estruturas de Ordem. Antigamente e, por muito tempo, no ensino da Matemática foi feito na base de muitos cálculos, muita conta e com ênfase na decoração, os livros quase não mudavam e passavam de uma geração para outras.

O professor Santilli considera que o trabalho com a teoria dos conjuntos, associado a uma simbologia mais adequada, possibilitou uma articulação entre conceitos, até então trabalhados isoladamente, e uma maior compreensão da Matemática.

Já conhecíamos a teoria dos conjuntos, porém, o enfoque dado a essa teoria pela Matemática Moderna foi altamente positivo. A abrangência da teoria dos conjuntos nos vários conceitos, em todos os campos da Matemática, nos trouxe uma compreensão muito maior de cada assunto. O realce do conjunto, aliado à riqueza da simbologia, tornou mais clara a compreensão e muito mais compreensível para o educando. Em classe, a Matemática ficou mais fácil, ganhou mais vida e tornou-se se agradável. A Matemática, como eu falei, foi introduzida aqui em Ribeirão Preto, mais no sentido prático, dentro das salas de aulas, pelos próprios professores, com as matérias iniciais fornecidas por Osvaldo Sangiorgi e sua coleção de livros. No mais, eram estudos feitos pelos próprios professores que aplicavam; aqueles que enfim, se dedicavam. Nós trocávamos ideias e íamos aplicando, nós não tivemos uma orientação mais segura, vinda de fora, a não ser a de Osvaldo Sangiorgi.

(De La Corte, 2005, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 147).

O professor Ruy Madsen Barbosa também fez uma crítica aos livros didáticos de Matemática Moderna. Em certo momento de sua entrevista, ele disse: “foi uma pena que naquela época houve uma corrida para redigir textos, livros...” Solicitado a explicar melhor a sua afirmação, o professor Ruy faz uma avaliação pessoal sobre as produções didáticas daquele período. Ele concorda que “os livros estavam, de certa forma, desatualizados”, mas considera que “surgiram coisas que prejudicaram o Movimento de Modernização da Matemática, o que me parece aconteceu também no exterior” (MADSEN BARBOSA, 2005, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 147). Relembra, nesse momento, o livro “O Fracasso da Matemática Moderna”, de Morris Kline (1978). Entretanto, ele afirma não concordar com essa leitura. Para ele, o problema estava relacionado ao mercado editorial, à corrida pela publicação de livros novos, pioneiros, o que levou ao “surgimento de textos escritos por pessoas não preparadas”. Erros, falta de exatidão...

Livros, por exemplo, para a escola primária com gravíssimos erros e, naquela ânsia de se fazer talvez uma coisa nova, a própria teoria dos conjuntos foi empregada em várias séries, desde o primário até o colegial. Alguns se desculpavam por ter feito isso porque eles precisavam dessa linguagem subjacente que eram os conjuntos, ou a lógica. A lógica, no ensino colegial, ficou, nos primeiros anos, somente em termos das tabelas verdade e não houve desenvolvimento. Então, você veja que vários desses textos que foram preparados, obviamente não podiam ter exatidão em tudo. Os antigos autores tinham que se reformular ou mesmo aprender. A teoria dos conjuntos e estruturas algébricas eram dadas nas faculdades nessa época, mas sobre outro ponto de vista. (...). Essa é a grande verdade.

(MADSEN BARBOSA, 2006, depoente, apud MARTOS RODRIGUES, 2010, p. 148).

A partir de uma leitura atenta às entrevistas, percebeu-se que a ênfase aos livros didáticos foi dada pelos depoentes escolhidos para este artigo. Assim, foram destacadas as falas mais significativas no que se refere a essa temática.

O professor Luiz Manoel Paes Leme recordou também de um fato curioso ocorrido em sala de aula: ao encontrar respostas erradas no livro utilizado, solicitou aos alunos que rasgassem a página onde estavam as respostas. Coincidentemente, um de seus alunos tinha assistido ao filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, o qual, curiosamente, representa este fato relacionado com a literatura.

Quanto ao livro abaixo, teve tradução para cinco línguas: alemã, inglesa, neoholandesa, espanhola e romana.

Fonte: Mathématique Moderne - Volume 1. Bruxelles-Paris, Marcel Didier, 1964.

Figura 6 Mathématique Moderne 1 (1964) 

Em entrevista, o professor Márcio de La Corte nos apresentou cinco capas da coleção de livros de George Papy, todas na versão francesa, sendo elas: Mathématique Moderne - Volume 1. Bruxelles-Paris, Marcel Didier, 1964. O segundo volume é intitulado: Mathématique Moderne - Volume 2, Paris, Marcel Didier, 1965, 442 p; o terceiro livro chamado de Mathématique Moderne - Volume 3, Paris, Didier, 1967, 452 p. Quanto ao quarto não foi encontrado em nossas pesquisas. Aparentemente, não existe o número 4 desta coleção, pois mesmo no índice dos livros proposto pela editora, o número não aparece. O quinto livro da coleção é o mesmo nome dos demais, no entanto, muda-se apenas o ano de edição, Mathématique Moderne - Volume 5. Paris, Didier, 1967, 286p. O sexto livro tem o nome de Mathématique Moderne - Volume 6, Paris, Didier, 1967, 249p.

5 Considerações Finais

Neste trabalho, o proposto foi procurar uma interlocução com os depoentes que buscasse comprovar a intenção de investigar maneiras ou de que forma o ideário do Movimento da Matemática Moderna teve seu surgimento na região de Ribeirão Preto/SP e, subsequentemente, como (e se) seus livros didáticos tiveram implicação neste cenário. Além disso, buscamos apresentar como se alinharam a teoria e prática do MMM.

O processo de apropriação do conjunto de ideias relativas ao Movimento da Matemática Moderna por dez professores que lecionaram na região de Ribeirão Preto representou um grande desafio. À medida que ocorriam as entrevistas e aprofundavam-se as temáticas sorteadas, novos conhecimentos foram examinados, reformulados, ampliados, revalorizados e transformados.

A participação de professores em cursos foi essencial: foi um dos fatores que nos ajudou a visualizar a vivência dos professores da região em estudo, uma vez que a prática muitas vezes diverge do que é proposto na literatura, e possibilitou a interlocução com os pares para discutir o movimento.

Um exemplo claro dessa divergência entre teoria e prática é que muitos artigos escritos sobre o movimento mencionaram que a motivação inicial do Movimento da Matemática Moderna era a preocupação com a preparação matemática dos jovens que chegavam à universidade. Além disso, no caso americano, muitos citavam o grande temor do satélite artificial soviético Sputinik como uma motivação para o surgimento do MMM. Entretanto, nos depoimentos colhidos, conforme fica claro ao longo da apresentação deste texto, houve pouca menção a esses fatos.

À luz dos depoimentos, percebemos que as maiores motivações para o Movimento da Matemática Moderna foram, sobretudo, quanto ao uso do livro didático. Alguns dos professores entrevistados apontam que o uso do livro foi significativo para que o processo de mudanças efetivamente pudesse ocorrer.

Academicamente, intencionamos que esta tese possa oferecer contribuições para a valorização do Ensino da Matemática e, também, colaborar no desencadeamento de novas pesquisas.

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Recebido: 10 de Junho de 2019; Aceito: 11 de Outubro de 2019; Publicado: 19 de Dezembro de 2019

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