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Educação: Teoria e Prática

versão impressa ISSN 1993-2010versão On-line ISSN 1981-8106

Educ. Teoria Prática vol.30 no.63 Rio Claro  2020

https://doi.org/10.18675/1981-8106.v30.n.63.s13452 

Artigos

REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO E ENSINO DA ARTE A PARTIR DE MARX E BOURDIEU

REFLECTIONS ON EDUCATION AND TEACHING OF ART FROM MARX AND BOURDIEU

REFLEXIONES SOBRE EDUCACIÓN Y ENSEÑANZA DEL ARTE A PARTIR DE MARX Y BOURDIEU

Fabiana Souto Lima Vidal1 
http://orcid.org/0000-0003-0439-7378

1Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco – Brasil


Resumo

As reflexões teóricas apresentadas no presente artigo foram elaboradas a partir da nossa incursão nos estudos sobre os fundamentos sociopolíticos e econômicos da educação, mais especificamente do estudo da produção teórica de Pierre Bourdieu e Karl Marx, pensadores importantes na/para a construção de um pensamento crítico. Parte-se da premissa de que as contribuições desses estudiosos são fundamentais para dois grandes campos de conhecimentos, a Educação e o Ensino da Arte, trazendo aporte para se compreenderem o processo histórico e os enfrentamentos sofridos por esses campos, além de pensar processos de fissuras e resistências. O artigo discute também os elementos que dão base para a perspectiva contemporânea na qual o Ensino da Arte se ancora, ao pensar a formação de sujeitos mais humanizados e ao valorizar e inserir nas práticas as diferentes produções intelectuais, culturais, estéticas, artísticas, como não hierárquicas, uma vez que essa perspectiva compreende que diferentes sujeitos, de diferentes contextos e culturas, produzem conhecimentos e podem ser, estar e intervir no mundo de maneira crítica, ativa, artística e estética.

Palavras-Chave Marx; Bourdieu; Educação; Ensino da Arte

Abstract

The theoretical reflections presented in this article were drawn from our foray into studies on the socio-political and economic fundamentals of education, more specifically, on the theoretical production of Pierre Bourdieu and Karl Marx, important thinkers in/for the construction of critical thinking. The study is based on the premise that the contributions of these scholars are fundamental to two great fields of knowledge, Education and Art Teaching, adding to the understanding the historical process and the confrontations suffered by these fields, besides thinking about processes of breaches and resistances. The article also discusses the elements that give basis to the contemporary perspective on which the Teaching of Art is anchored, to think of a more humanized subjects formation, and to value and insert the different productions, intellectual, cultural, aesthetic, artistic and non-hierarchical in the practices, since this perspective understands that different subjects from different contexts and cultures produce knowledge and can both be and intervene in the world in a critical, active, artistic and aesthetic way.

Keywords Marx; Bourdieu; Education; Art Teaching

Resumen

Las reflexiones teóricas presentadas en el presente artículo se elaboraron a partir de nuestra incursión en los estudios sobre los fundamentos sociopolíticos y económicos de la educación, más específicamente del estudio de la producción teórica de Pierre Bourdieu y Karl Marx, pensadores importantes en la construcción de un pensamiento crítico. Se parte de la premisa de que las contribuciones de estos estudiosos son fundamentales para pensar dos grandes campos de conocimientos, la Educación y la Enseñanza del Arte, trayendo aporte de éstos para comprender el proceso histórico y los enfrentamientos sufridos por estos campos, además de pensar procesos de fisuras y resistencias. El artículo discute también los elementos que dan base a la perspectiva contemporánea en la que la Enseñanza del Arte se ancla, al pensar la formación de sujetos más humanizados y al valorar e insertar en las prácticas las diferentes producciones intelectuales, culturales, estéticas, artísticas, como no jerárquicas, ya que esta perspectiva comprende que distintos sujetos, de distintos contextos y culturas, producen conocimientos y pueden ser, estar e intervenir en el mundo de manera crítica, activa, artística y estética.

Palabras clave Marx; Bourdieu; Educación; Enseñanza del Arte

1 Introdução

As reflexões trazidas no presente artigo foram fomentadas pela necessidade de compreendermos o campo do Ensino da Arte numa perspectiva contemporânea, quando arte é entendida como um campo expandido que dilui as hierarquias historicamente normatizadoras dos conceitos de Arte e de Estética que tradicionalmente enfatizam os binarismos responsáveis por categorias como arte maior e arte menor, arte da elite e arte da povo, alta estética e estética popular, entre outras nomenclaturas que evidenciam polaridades. Isso implica afirmar que as perspectivas de arte e de estética pensadas para o campo do Ensino da Arte na contemporaneidade e referências para este estudo partem da ideia de abertura e diálogo com diferentes campos de conhecimentos, e não como doutrinas, sendo, portanto, abertas a múltiplas interpretações, advindas de diferentes campos e necessárias à formação humana de sujeitos.

Partindo da compreensão apresentada, adentramos numa incursão teórica e nos debruçamos no estudo de autores(as) que nos ajudam a entender os aspectos sociais, filosóficos, econômicos e históricos para pensar o campo da Educação e, mais especificamente, que contribuem para pensar o Ensino da Arte na perspectiva discutida na contemporaneidade, percebendo criticamente os enfrentamentos históricos, os silenciamentos e as incompreensões sofridos por esses campos do conhecimento. De início, elegemos dois referenciais fundantes para o campo educacional, os pensadores Karl Marx e Pierre Bourdieu. Parte-se da compreensão de que esses estudiosos contribuem para pensar a formação de sujeitos, seja na educação básica ou na formação de professores(as), a partir de um olhar crítico para aspectos essenciais ao entendimento do campo.

Marx, pensador alemão e intelectual defensor da ideia do homem como ser social, dedicou seus estudos à crítica radical ao sistema capitalista e não abordou amplamente questões sobre Educação e Arte, porém suas contribuições nesses campos continuam sendo pertinentes para o estudo que se segue. Por sua vez, o teórico e pesquisador Pierre Bourdieu, estudioso de orientação marxista e weberiana, realizou diversas pesquisas sobre Educação e contempla, em suas produções literárias, discussões sobre Arte que são pertinentes para o presente estudo.

2 Educação e Ensino da Arte a partir de Marx

O primeiro pressuposto de toda a existência humana e, portanto, de toda a história, é que os homens devem estar em condições de viver para poder fazer história. Mas, para viver, é preciso, antes de tudo comer, beber, ter habitação, vestir-se e algumas coisas mais

(MARX, 1987, p. 39).

Inquieto com as incoerências da sociedade capitalista, Marx, embora não tenha deixado uma obra acabada sobre Educação e sobre Arte, traz contribuições relevantes dispersas em suas obras para pensar a formação do homem e sua relação, intelectual e , com o trabalho enquanto atividade essencial para a humanização, no sentido de transformação de si e do mundo. Marx vê o homem como ser em processo, que se constrói nas relações marcadas na evolução histórica e isso o torna capaz de pensar e criticar a alienação derivada das condições socioeconômicas.

Partimos do pressuposto de que existe uma concepção de Arte em Marx, mesmo que ele não a tenha estruturado como o fez em sua concepção do capitalismo. Viana (2007) reforça que os fragmentos deixados em suas obras, ao abordarem questões sobre a Arte em sua teoria da sociedade e ao discutirem a divisão social do trabalho em sua teoria do capitalismo, trazem elementos para se pensar o fenômeno artístico. Nessas discussões, Marx aborda a autonomização da arte e o surgimento do artista profissional e dos especialistas na produção de arte como sendo decorrentes do desenvolvimento do capitalismo e do processo de divisão social do trabalho. Sobre isso Viana (2007, p. 77), esclarece:

[...] com o desenvolvimento capitalista, surgem diversas subdivisões e este processo culmina com a especialização crescente e com a subdivisão social do trabalho na sociedade capitalista. A esfera artística é um produto desta subdivisão social do trabalho na sociedade capitalista.

No cerne do pensamento marxista, os fatores econômicos são determinantes da organização social e as classes dominantes exercem um controle dos meios de produção da cultura, exercendo, por conseguinte, o controle sobre a Educação e, consequentemente, sobre os indivíduos. Conforme afirma:

Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras coisas, também consciência e, por isso, pensam; na medida em que dominam como classe e determinam todo o âmbito de uma época histórica, é evidente que o façam em toda sua extensão e, consequentemente, entre outras coisas, dominem também como pensadores, como produtores de ideias; que regulem a produção e distribuição das ideias de seu tempo e que suas ideias sejam, por isso mesmo, as ideias dominantes

(MARX, 1987, p. 72).

Compreender historicamente a hegemonia exercida pela classe dominante torna-se essencial para compreender o porquê de a Arte ser considerada ainda como privilégio de poucos, já que, segundo discursos recorrentes, apresenta códigos apenas decifráveis por essa classe. Essa reflexão traz rebatimentos também para o Ensino da Arte e elucida a compreensão de como ele se deu ao longo da história no Brasil, conforme será explicitado posteriormente.

Os estudos de Marx estão fundamentados na crítica ao capitalismo como sendo esse o causador de toda desorientação humana e alienação. Sobre isso Viana (2007, p. 61) esclarece que “o objetivo último da obra de Marx é contribuir com o processo de emancipação humana”.

Vê-se que em Marx já existia uma inquietação sobre Educação. Ao percebê-la como um dos elementos responsáveis pela hierarquia social, passa a questionar o sistema de ensino, uma vez que, para ele, pelo ensino se transforma a sociedade e, consequentemente, o mundo. Essa transformação exige, contudo, um olhar crítico sobre o próprio sistema de ensino, quando, no Congresso da Associação Internacional dos Trabalhadores, afirma que, por um lado, “é necessário modificar as condições sociais para criar um novo sistema de ensino; por outro, falta um sistema de ensino novo para poder modificar as condições sociais”. Esse autor nos deixa pistas para olharmos criticamente o campo educacional (MARX, 2004, p. 107).

O pensamento de Marx contribui para a mudança da consciência dos indivíduos, e isso se dá também pela socialização enquanto processo de escolarização. Por meio das vivências, trocas de experiências e oportunidades de leitura do mundo e de si, na qualidade de ser social, a educação contribui com o processo de conscientização ou de mudança de consciência, uma vez que essas são, também, construídas socialmente, conforme afirma Marx (1987, p. 43): “a consciência, portanto, é desde o início um produto social, e continuará sendo enquanto existirem homens”.

A mudança de consciência sugerida pelo filósofo implica, no entanto, mudanças nos contextos sociais e também na estrutura dos sistemas de educação, inclusive no próprio educador. Marx (1987, p. 12), em suas teses sobre Feuerbach, diz “que o próprio educador deve ser educado” e que a consciência da necessidade de mudanças, do meio e de si, compreende uma “práxis revolucionária”. Mais especificamente, essa práxis se dá pela reflexão entre teoria e prática. É na relação entre o trabalho e a atividade intelectual que o homem constrói sua consciência, como declara:

[...] a consciência jamais pode ser outra coisa do que o ser consciente, e o ser dos homens é o seu processo de vida real. [...] Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência. Na primeira maneira de considerar as coisas, parte-se da consciência como do próprio indivíduo vivo; na segunda, que é a que corresponde à vida real, parte-se dos próprios indivíduos reais e vivos, e se considera a consciência unicamente como sua consciência.

(MARX, 1987, p. 37)

Ainda, Marx, em A Ideologia Alemã, complementa: “não é a consciência dos homens que determina a vida, mas a vida que determina sua consciência” (MARX e ENGELS, 1987, p. 37). Ao trazer essa reflexão para o campo da Educação e, mais especificamente do Ensino da Arte, importa em pensar que os modos como cada sujeito acessa a Educação e a Arte, ou, ainda, como isso lhe é oferecido ou negado, faz que tenhamos ou não sujeitos críticos(as) do mundo, conhecedores(as) das questões culturais que fazem parte das suas vivências pessoais, do contexto cultural que os(as) cerca e das imposições culturais que lhes são oferecidas.

Em síntese, as ideias apresentadas trazem reflexões atuais para pensar a Educação e o Ensino da Arte no sentido de serem elementos reais de inclusão dos sujeitos na sociedade, reconhecendo-se como parte dela. Por sua vez, o Ensino da Arte discutido na contemporaneidade traz como pressuposto o acesso à Arte enquanto campo expandido – para além da visão de Arte como algo exclusivo de museus, grandes galerias, gerenciada por critérios elitistas – por meio do fazer artístico, da contextualização e da leitura de imagens e produções artísticas como sendo um dos elementos para a inclusão, para os processos de socialização e humanização, para a ampliação dos modos de compreensão crítica do mundo.

3 As contribuições de Bourdieu

No cerne dos debates críticos de Pierre Bourdieu estão a relação do contato com a Arte, os processos de hierarquização e de dominação dos indivíduos e dos grupos sociais, que ainda hoje reverberam em muitos discursos e práticas, necessitando de um olhar atento para o poder desses discursos, além das categorizações e exclusões que se evidenciam.

Bourdieu, estudioso considerado neomarxista, trouxe grandes contribuições à Educação e à Sociologia ao pensar a escola criticamente, vendo-a como espaço de reprodução e de legitimação das desigualdades sociais. Também trouxe aportes para se pensar a Arte que se aproximam das ideias de Marx e que são transpostos, no presente estudo, para tecer reflexões acerca do Ensino da Arte na contemporaneidade.

Em sua crítica à escola, Bourdieu (2007a, p. 59) ressalta a problemática da ideologia do dom quando diz que essa “chave do sistema escolar e do sistema social contribui para encerrar os membros das classes desfavorecidas no destino que a sociedade lhes assinala”. Seu rompimento com a ideologia da classe dominante, historicamente considerada culturalmente superior, e suas reflexões sobre a ideologia do dom dialogam com os pressupostos teóricos contemporâneos para o Ensino da Arte quando sugerem que cultura não é um privilégio natural, que todos podem ser culturalmente incluídos, desde que tenham acesso e formação. Sobre isso, Vidal (2016, p. 109-110) também acrescenta que “a ideologia do dom apoia-se na ideia de que o(a) artista é considerado(a) um ser supremo, divino, dotado de um saber que o(a) torna diferenciado(a), aspecto que se distancia dos debates contemporâneos” do campo da Arte e da Arte/Educação.

Nessa mesma perspectiva, Viana (2007, p. 86) afirma:

A ideia de que para produzir uma obra de arte é necessária uma sensibilidade estética ou um dom não passa de uma representação ilusória que apenas visa sublimizar algo prosaico e colocar como privilégio de alguns poucos uma capacidade que existe potencialmente em todo ser humano.

Ainda sobre a ideologia da classe dominante, Nogueira e Nogueira, estudiosos do pensamento bourdieusiano, complementam afirmando que “a tese central de Bourdieu é a de que os indivíduos normalmente não percebem que a cultura dominante é a cultura das classes dominantes e, mais do que isso, que ela ocupa posição de destaque justamente por representar os grupos dominantes” (2009, p. 39). Nas palavras de Bourdieu (2007a, p. 64), existe uma “ordem social que autoriza as classes sociais mais favorecidas a monopolizar a utilização da instituição escolar, detentora, como diz Max Weber, do monopólio da manipulação dos bens culturais e dos signos institucionais da salvação cultural”.

Para Bourdieu (2005, p. 218), “a relação que um indivíduo mantém com sua cultura depende, fundamentalmente, das condições nas quais ele a adquiriu, mormente porque o ato de transmissão cultural é, enquanto tal, a atualização exemplar de um certo tipo de relação com a cultura”. Isso nos leva a compreender o quão são importantes o acesso e a ampliação da formação cultural dos sujeitos, para além das vivências culturais que os(as) rodeiam, sem, contudo, aproximando-se da perspectiva contemporânea para o Ensino da Arte, desconsiderar suas vivências culturais. Nessa direção, os processos de escolarização e de formação de professores(as) oferecem significativos subsídios quando abrem espaço para as formações estéticas e culturais dos(as) estudantes, o que está na base das contribuições do ensino da Arte na contemporaneidade.

São três as formas de se conhecer o mundo social na visão de Bourdieu. Entre elas destaco a denominada conhecimento praxiológico por compreender que este busca investigar como as estruturas externas ao indivíduo encontram-se interiorizadas nos mesmos e, por sua vez, como determinam suas práticas. Ao tentar alcançar a perspectiva praxiológica, é necessário compreender também o habitus. Segundo Nogueira e Nogueira (2009, p. 24), é “a ponte, a mediação entre as dimensões objetiva e subjetiva do mundo social, ou, simplesmente, entre a estrutura e a prática”. Já Viana (2007) contribui afirmando que o habitus orienta as práticas individuais e coletivas, sendo essas práticas resultado da mediação entre o habitus herdado da formação familiar e educacional e o habitus do campo no qual o indivíduo está inserido.

O habitus reflete o universo social do indivíduo e não constitui um conjunto de regras fixas; ele é passível de modificações que permitem ao indivíduo se adaptar e improvisar diante de novas situações. Na formação de sujeitos, seja na educação básica ou na formação superior, implica pensar caminhos para a atuação pedagógica que possibilitem ampliar a visão de mundo com o compromisso de olhar criticamente e enfrentar as diferenças, lacunas e disparidades das questões sociais. Sobre esse aspecto, Nogueira e Nogueira (2009, p. 98) destacam que Bourdieu:

[...] não descartava a possibilidade de a escola exercer papel ativo na reversão do processo de reprodução das desigualdades sociais. Para isso, seria necessária, segundo ele, uma transformação profunda dos procedimentos didáticos e métodos de avaliação utilizados.

Refletir sobre a escola como espaço de formação e sobre Arte como área do conhecimento é se aproximar do que Bourdieu denominou de campo. Conhecer historicamente como se deu a relação entre os campos Educação e Ensino da Arte torna-se essencial para compreender as relações de interesses, os distanciamentos e silenciamentos sofridos por essa área do conhecimento.

A partir de Viana (2007) é possível entender que existe uma aproximação entre Bourdieu e Marx, quando ele sugere que não existe uma autonomia do campo artístico em função da existência de regras, ordens e leis específicas entrelaçadas que perpassam o campo da Arte. Além desse aspecto, convém entender o valor que é produto do próprio campo, salientando que arte, enquanto produto especializado, é fruto da esfera artística.

Compreender arte para Bourdieu, como sendo um sistema simbólico, é considerar as produções decorrentes desse sistema, fundamentais para a organização da percepção dos indivíduos e para a comunicação desses. Segundo Nogueira e Nogueira (2009, p. 30), “os sistemas simbólicos seriam, autenticamente, sistemas de percepção, pensamento e comunicação” produzidos em determinado campo, a exemplo do artístico. Sobre esse campo, Bourdieu (1989, p. 286) afirma que o mesmo é responsável por criar a “atitude estética” que lhe possibilita funcionar a partir de um conjunto de agentes que interagem de diferentes maneiras, entre eles(as), produtores(as), escolas, instituições próprias da arte, críticos(as), apreciadores(as), colecionadores(as), pesquisadores(as), professores(as), indivíduos envolvidos(as) com interesses variados, todos(as) disputando espaço no campo da arte e do seu ensino. Nesse sentido, Bourdieu se aproxima do que Marx denominou de camada de especialistas do campo da Arte.

O acesso à Arte por meio do seu ensino nas escolas seria uma das formas de aumentar o capital cultural, que, segundo Bourdieu (2007b, p. 74), pode se apresentar de três maneiras: estado objetivado, estado incorporado ou habitus cultural e estado institucionalizado, tendo o primeiro deles uma relação direta com o capital econômico e apresentando-se “sob a forma de bens culturais – quadros, livros, dicionários, instrumentos, máquinas”. O segundo manifesta-se a partir de uma relação com as culturas internalizadas pelo indivíduo, que vão sendo coladas e acumuladas no sujeito a partir das experiências vividas, e, no terceiro estado, o capital cultural se materializa por meio de certificados e diplomas advindos dos processos de escolarização/formação.

De modo específico, o investimento no capital cultural favorece o desempenho nos processos de formação dos sujeitos, na medida em que facilita a aprendizagem dos conteúdos e dos códigos que a escola divulga e aprova. No campo do Ensino da Arte na contemporaneidade, implica o empoderamento e a apropriação de códigos, discursos e modos de ler, antes destinados a um grupo de pessoas privilegiadas e pertencentes às classes dominantes.

Ao olhar criticamente para o campo educacional, Bourdieu (2007a) não vê a escola como instituição neutra; para ele, a escola é uma instituição a serviço da reprodução e da legitimação da cultura das classes dominantes, e essa legitimação se configura também pela disposição dos saberes escolares. Segundo a visão bourdieusiana, Nogueira e Nogueira (2009, p. 80) afirmam que existe uma hierarquia entre as disciplinas/matérias que vai desde as “disciplinas canônicas até as disciplinas marginais, passando pelas disciplinas secundárias que ocupam uma posição intermediária” e que, entre as disciplinas marginais, estão as ligadas ao Ensino da Arte, como o desenho e a música, aspectos que, ao se olhar criticamente o debate sobre a historicidade desse campo, tratado a seguir, poderão fomentar maiores reflexões.

Destarte, pode-se dizer que Bourdieu revela questões delicadas e ainda pertinentes no que se refere à Educação e à Arte, o que vem a corroborar a atualidade de suas contribuições para pensar o Ensino da Arte, dialogando com os pressupostos contemporâneos para essa área do conhecimento.

4 O Ensino da Arte no Brasil: percurso de enfrentamentos e resistências

O Ensino da Arte no Brasil está marcado historicamente por lutas políticas. Ainda hoje, conforme afirma Luckesi (1993), é possível ver, na escola, uma mescla de tendências pedagógicas, e o Ensino da Arte vem a reboque dessas tendências. Ao se tentar compreender os pressupostos teóricos para essa área do conhecimento discutidos na contemporaneidade, é preciso conhecer como esse ensino se deu ao longo da história.

Por muito tempo vigoraram as ideias rousseaunianas de educação ligada ao desenvolvimento natural, das sensações e do pensamento. Já em 1855, na Academia Imperial de Belas Artes, sob o título de uma educação liberal – enfatiza o aspecto cultural, mas esconde as diferenças de classe e desconsidera as desigualdades de condições –, esse ensino se divide entre Artes Mecânicas e Belas Artes, ou seja, arte para o povo e arte para as elites.

No final do século XIX surgia, na Europa e nos Estados Unidos, o Movimento Escola Nova, opondo-se à tendência pedagógica tradicional. No Brasil, essa tendência pedagógica repercute por volta de 1930 até a era Vargas, contudo adquiriu novas roupagens e trouxe para o Ensino da Arte a concepção moderna da livre expressão, criatividade, inspiração e sensibilidade.

Por um longo período, conforme afirma Schramm (2001), o Ensino da Arte ficou adormecido até surgir o Movimento de Educação pela Arte, criado por Augusto Rodrigues em 1948, mas ainda restrito ao ensino não formal.

Apenas entre as décadas de 1960 e 1970, período do regime militar, em decorrência da necessidade de preparar mão de obra para o mercado de trabalho e responder à sociedade industrial, é que o ensino da Arte, livre de qualquer espírito crítico e reflexivo, voltou às escolas sob a tendência tecnicista.

Com a Lei de Diretrizes e Bases nº 5.692/71, este ensino se reduziu a técnicas e habilidades, fragmentou-se e recebeu o nome de Educação Artística, mas ainda não era considerado matéria, dando margem a várias tendências pedagógicas.

Em resposta a todo o quadro instalado na Educação pelas tendências liberais surgiram, paralelamente, as Pedagogias Progressistas, a partir da década de 1960. Segundo Libâneo (1989, p. 32), a Pedagogia Progressista é marcada pelo seu caráter de educação conscientizadora e é um “instrumento de luta dos professores ao lado de outras práticas sociais”. Na perspectiva progressista, a escola é o espaço de lutas, de poder, de conflitos e de criticidade com relação à cultura.

Sob a égide da Pedagogia Progressista surge o trabalho do educador Paulo Freire, com as ideias de uma Pedagogia Crítica e sua incansável luta em favor da escola como instrumento de luta das camadas populares e como lugar para elevar a consciência crítica do educando, a fim de que o mesmo busque sua independência política, econômica, social e cultural.

A partir dos anos 1980 e na contemporaneidade, o Ensino da Arte dialoga com os ideais freireanos, com o vigoroso trabalho da educadora Ana Mae Barbosa, atuante e conhecida no cenário brasileiro de lutas em favor deste campo enquanto área do conhecimento,. Essa estudiosa sistematizou, por volta de 1983, no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC/USP) e na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, sob a direção de Paulo Freire, a Abordagem Triangular.

A Abordagem Triangular, na qualidade de epistemologia da Arte, está diretamente ligada à relação existente entre três pontos basilares, não hierárquicos, a saber: leitura de imagens, produção artística e contextualização. Barbosa (1998, p. 41) sintetiza seu pensamento sobre a Abordagem Triangular quando diz que ela é

Construtivista, interacionista, dialogal, multiculturalista e é pós-moderna por tudo isto e por articular arte como expressão e como cultura na sala de aula, sendo esta articulação o denominador comum de todas as propostas pós-modernas do ensino da arte que circulam internacionalmente na contemporaneidade.

Em suas pesquisas, essa autora contribuiu para que o Ensino da Arte fosse reconhecido como área do conhecimento e reforçou a importância da Arte na Educação como recurso para a identificação cultural e o desenvolvimento de um povo. Partilhando dessa visão pós-moderna, Efland (2008) afirma que o ensino da Arte contribui para o entendimento do mundo social e cultural do indivíduo, no qual o(a) professor(a) é desafiado(a) a enfatizar a habilidade de ler e interpretar imagens sob o aspecto do seu contexto sociocultural.

Colaborando para formar a consciência da importância do Ensino da Arte na escola, Barbosa (2005) afirma que uma de suas funções é formar apreciadores, fruidores, decodificadores, a fim de construir uma sociedade artisticamente desenvolvida.

É na direção das conquistas já alcançadas que o Ensino da Arte, a partir das quatro linguagens artísticas que o compõem– Artes Visuais, Dança, Música e Teatro, após ter conseguido seu espaço na legislação – com a implantação da LDB nº 9.394/96, atualizada pela redação da Lei nº 13.278/16 – e enquanto área do conhecimento, e, sendo assim, portadora de saberes específicos, conceitos e finalidades, pode contribuir para novos direcionamentos, formas de pensar e agir nas práticas que envolvem essa área.

5 Considerações finais: Marx, Bourdieu e o Ensino da Arte

Conforme discutido na seção anterior, por muito tempo o Ensino da Arte esteve ancorado em interesses políticos de permanência do estado acrítico nos indivíduos. Sob a ótica bourdieusiana, podem-se denominar esses interesses de violência simbólica. Segundo Nogueira e Nogueira (2009, p. 33), é “a imposição da cultura de um grupo como a verdadeira ou única forma cultural existente” em que os membros dos grupos dominantes seriam socializados pela cultura dominante e os demais não se apropriariam totalmente dela, mas a reconheceriam e a valorizariam. Na perspectiva contemporânea para o Ensino da Arte, seriam os(as) professores(as) grandes contribuidores(as) para a redução dessa violência, a partir do momento em que elegem conteúdos, conceitos, movimentos, temáticas – muitas vezes negadas ou silenciadas – que se aproximam da realidade dos(as) estudantes e que os(as) instigam a uma leitura crítica de si e do mundo.

De acordo com Nogueira e Nogueira (2009), os indivíduos possuem competência para produzir ou reconhecer, apreciar e fruir as produções artísticas, o que, para Bourdieu, contribui para aumentar/acumular o capital cultural. Nesse sentido a escola é o espaço para as apropriações dessas produções e para a leitura da Arte de modo ampliado, da ideia de arte horizontal, não hierarquizada, aberta a diferentes estéticas e provocadora de leituras do mundo. Nessa mesma perspectiva, Bourdieu (2005, p. 211) esclarece que, como formadora de hábitos, a escola propicia espaços de reflexões a serem aplicadas em diferentes campos do pensamento e da ação, e a isso denominou de “habitus cultivado”.

O Ensino da Arte na perspectiva contemporânea rechaça a concepção modernista que marcou a educação brasileira pelo tecnicismo e pelo laissez-faire por acreditar que ela mina o caráter reflexivo do indivíduo. Conforme citado anteriormente, a Abordagem Triangular, enquanto epistemologia do Ensino da Arte, por meio das três ações não hierárquicas e dialogantes que propõe, constitui-se em elemento significativo para nortear os processos de ensino/aprendizagem nesse campo que, ao estabelecer um estreito diálogo com as perspectivas críticas e pós-críticas de currículo, contribui para elevar o pertencimento do indivíduo no campo social, tornando-o capaz de reconhecer a cultura à qual pertence e de olhar criticamente para as imposições culturais, aumentando, ao mesmo tempo, a noção de pertencimento e o capital cultural e levando os sujeitos a olharem criticamente o mundo, fazendo parte dele.

Ao considerar a leitura de imagens, Barbosa (2005, p. 286) sugere uma aproximação da arte com o público e dialoga com Bourdieu quando este afirma que a obra de arte não existe, a não ser para quem detém os meios de apropriar-se dela; e diz também que “toda obra de arte é, de algum modo, feita duas vezes, primeiro pelo produtor e depois pelo consumidor, ou melhor, pelo grupo a que pertence o consumidor”. Nesse sentido, dialoga também com Marx quando afirma em seus Manuscritos Econômico-Filosóficos: “se alguém deseja apreciar a arte, será preciso tornar-se uma pessoa artisticamente educada” (2006, p. 171). Na direção dessas discussões, seria possibilitar formação para a apropriação dos códigos historicamente reservados para determinadas classes, evitando a fragmentação da percepção estética, a inclusão e a ampliação dos modos críticos de ver e ler o mundo, as coisas do mundo.

Soma-se às questões supracitadas a reflexão de Bourdieu e Darbel (2003) quando apresentam que o prazer estético advém da aprendizagem familiar e do exercício. Esse elemento vai ao encontro da perspectiva contemporânea para o Ensino da Arte, uma vez que contribui também para reduzir as desigualdades que persistem em manter o discurso de arte e de prazer estético como elemento exclusivo de determinados grupos, minando o que é tratado como dons ou aptidões para ler, fruir e criar, no momento em que abre espaço para a Arte, para a formação artística e a estética de todos(as).

Segundo Nogueira e Nogueira (2009), Bourdieu sugere a forte ligação entre a cultura escolar e a cultura dominante, nesse ponto convergindo com o pensamento crítico de Marx, e propõe uma análise crítica do currículo, dos métodos pedagógicos e dos processos avaliativos. Nesse sentido, tornam-se pertinentes os questionamentos que permearam e permeiam o Ensino da Arte: por que por tantos anos o Ensino da Arte teve um papel secundário na Educação? Seriam esses interesses da classe dominante? Ainda que tenhamos os avanços da legislação vigente, sabemos que o campo da arte ainda é considerado, nas escolas e nos cursos de formação de professores(as), uma disciplina marginal ou complementar. Então, as percepções bourdieusiana e marxista discutidas no presente artigo ainda são pertinentes nos dias atuais?

Para Barbosa (2008, p. 16):

através das artes é possível desenvolver a percepção e imaginação, apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a criatividade de maneira a mudar a realidade que foi analisada.

Esta autora complementa afirmando que a arte nos capacita a não ser estranhos em nosso meio, nem estrangeiros em nosso país, “ela supera o estado de despersonalização, inserindo o indivíduo no lugar ao qual pertence”. Perceber-se como ser social, como propõe Barbosa, se complementa com as ideias de Marx (1987, p. 116) quando afirma que “apenas na coletividade [de uns e outros] é que cada indivíduo encontra os meios de desenvolver suas capacidades em todos os sentidos; somente na coletividade, portanto, torna-se possível a liberdade pessoal”.

Marx já olhava criticamente sobre a hostilidade da classe dominante para alguns aspectos da produção intelectual. Quando reconhece apenas a produção enquanto mercadoria, a classe dominante mercantiliza a própria obra de arte e descarta a possibilidade do acesso aos que não integram essa classe.

Por fim, encerro as reflexões trazidas no presente artigo quando aproximo a ótica marxista do pensamento bourdieusiano para afirmar que o Ensino da Arte, na perspectiva discutida na contemporaneidade, valoriza a produção intelectual, estética e artística, sem distinção de classes, por acreditar que todos(as) são humanamente capazes de conhecer, fruir, ler, produzir arte, perceber criticamente o mundo e as coisas do mundo para nele intervir, e, para tanto, devem ter acesso a esse campo de conhecimento em todos os níveis de formação.

Referências

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BARBOSA, A. M. Ensino da Arte: Memória e História. São Paulo: Perspectiva, 2008. [ Links ]

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Recebido: 04 de Agosto de 2018; Revisado: 01 de Outubro de 2019; Aceito: 07 de Novembro de 2019; Publicado: 28 de Agosto de 2020

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