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Educação: Teoria e Prática

versão impressa ISSN 1993-2010versão On-line ISSN 1981-8106

Educ. Teoria Prática vol.32 no.65 Rio Claro  2022

https://doi.org/10.18675/1981-8106.v32.n.65.s15699 

Artigos

O papel do professor formador na consolidação da escolha profissional pela docência durante a formação inicial

The role of professor/trainer in consolidating the professional choice for teaching during initial training

El papel del profesor formador en la consolidación de la elección profesional para la docencia durante la formación inicial

Alvanize Valente Fernandes Ferenc1 
http://orcid.org/0000-0001-7821-4023

Lucíola Licínio de Castro Paixão Santos2 
http://orcid.org/0000-0002-9816-2440

Tarcísia Carolina Roberto Silva Duarte3 
http://orcid.org/0000-0003-4971-6088

Renata Veiga de Miranda4 
http://orcid.org/0000-0001-5792-4982

1Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, Minas Gerais – Brasil. E-mail: avalente@ufv.br.

2Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais – Brasil. E-mail: luciolaufmg@yahoo.com.br.

3Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais – Brasil. E-mail: tarcisia.carol@gmail.com.

4Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, Minas Gerais – Brasil. E-mail: renataveigam@gmail.com


Resumo

Este artigo tem duplo propósito: analisar a razão da escolha pelo curso de licenciatura em dois momentos distintos e o papel que os professores formadores da licenciatura exercem na consolidação da escolha pela docência. Para o alcance desses objetivos foi realizada uma pesquisa exploratória com estudantes do curso de Ciências Biológicas de uma universidade pública, utilizando-se questionário e entrevista como instrumentos de coleta de dados. Cinquenta e sete estudantes responderam a um questionário sobre suas características sociais e escolares e sobre os motivos da escolha profissional, e 8 deles participaram de entrevistas semiestruturadas. Os dados evidenciaram uma alteração na quantidade de estudantes que afirmavam não desejar ser professor: ao ingressar no curso, 28, e no momento da realização do questionário apenas 3 afirmaram não terem o magistério como perspectiva profissional, enquanto 21 ainda estavam indecisos a esse respeito. A pesquisa mostrou que 7 dos 8 entrevistados defenderam a importância do papel do professor universitário, de suas práticas pedagógicas e da relação com os alunos na consolidação da escolha pela docência no decorrer do curso de licenciatura. A conclusão é que as ações dos professores exercem forte influência na consolidação de uma escolha pelo magistério, mesmo quando a escolha inicial foi apenas uma estratégia de acesso ao ensino superior.

Palavras-chave Formação inicial; Papel do professor formador; Consolidação da escolha profissional; Pedagogia universitária

Abstract

This article aims to analyze the reasons underlying the choice of teaching qualification in two different moments, as well as the role of university professors in consolidating the choice for teaching. This study consists of an exploratory research conducted with undergraduate students in Biological Sciences from a public university. Data were collected by means of a questionnaire applied to 57 students, addressing their social and educational characteristics and the reasons for their professional choice, and by a semi-structured interview with eight of these students. The results indicate that 28 students stated not wanting to be a teacher at admission, decreasing to three at the time of the questionnaire application; 21 were still unsure about it. Seven of the eight interviewees defended the importance of the professor, their pedagogical practices, and the relationship with students in the consolidation of the choice during teaching qualification. Professors’ actions have a strong influence on students’ will for teaching, even when the initial choice for the course was only a strategy for accessing higher education.

Keywords Initial training; Role of the trainer professor; Consolidation of professional choice; University pedagogy

Resumen

Este artículo tiene como propósitos: analizar el motivo de la elección por la carrera de profesorado en dos momentos distintos e identificar el papel que desempeñan los profesores formadores del profesorado en la consolidación de las elecciones para la docencia. Para lograr estos objetivos, se realizó una investigación exploratoria con estudiantes de la carrera de ciencias biológicas de una universidad pública brasileña, utilizando un cuestionario y una entrevista como instrumentos de recolección de datos. Los 57 estudiantes respondieron un cuestionario sobre sus características sociales, escolares y los motivos de su elección profesional, y 08 (ocho) de estos participaron en entrevistas semiestructuradas. Los datos mostraron un cambio en el número de estudiantes que manifestaron no querer ser docentes: cuando ingresaron al curso 28 y en la aplicación del cuestionario, solo 3 dijeron no tener la docencia como perspectiva profesional, mientras que 21 aún estaban indecisos al respecto. La investigación mostró que 07 (siete) de los 08 (ocho) entrevistados defendieron la importancia del papel del profesor universitario, de sus prácticas pedagógicas y de la relación con los estudiantes en la consolidación de la elección por la docencia durante la carrera. La conclusión es que las acciones de los docentes influyen mucho en la consolidación de una elección por la enseñanza, incluso cuando la elección inicial fue solo una estrategia de acceso a la educación superior.

Palabras clave Formación inicial; Papel del profesor formador; Consolidación de la elección profesional; Pedagogía universitaria

1 Introdução

Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa1 que teve como objetivo analisar a razão da escolha pelo curso de licenciatura em dois momentos distintos e o papel do professor formador na consolidação da escolha profissional pela docência durante o curso. A despeito de haver certo “consenso” sobre a influência do professor formador “na qualidade da formação inicial e continuada dos professores da educação”, esse é também um campo controverso, que apresenta dificuldade de se conceber a função desse profissional em uma perspectiva “bem identificada e homogênea” (GATTI et al., 2019, p. 271).

A justificativa para este estudo encontra respaldo em trabalhos como o relatório apresentado pela Associação Americana de Pesquisa Educacional sobre a formação de professores, no qual se afirma que “em todas as nações existe um consenso emergente de que os professores influem de maneira significativa na aprendizagem dos alunos e na eficácia da escola” (COCHRAN-SMITH; FRIES, 2005 apudMARCELO, 2009, p. 9). Estudos sobre o efeito-professor têm mostrado que os “efeitos sala de aula ou efeitos mestre são geralmente mais importantes que o efeito escola” (LAFONTAINE, 2011, p. 279). Esses trabalhos evidenciam que o “efeito-escola”, quando vinculado ao efeito-professor, é significativo, e comprovam a importância do professor no desempenho do aluno (DARLING-HAMMOND; HYLER; GARDNER, 2017), pois a “aprendizagem dos alunos depende principalmente daquilo que os professores sabem e do que podem fazer” (DARLING-HAMMOND, 2000, p. 10, tradução nossa). Ao lado disso, os estudos mostram a influência de professores na vida profissional de seus ex-alunos.

Dada a importância atribuída ao professor, desenvolvemos este estudo para entender o papel do professor universitário na concretização de uma opção profissional. Buscamos focalizar os processos de formação, de aprendizagem e de atuação profissional desse docente e a possibilidade de o professor formador despertar o interesse e o gosto pela docência nos licenciandos.

Já se sabe, por meio de pesquisas (LORTIE, 1975; PIMENTA; ANASTASIOU, 2014), que muito cedo, ainda na condição de estudante, parte significativa de alunos da licenciatura é inserida na profissão docente. Entretanto, esse estudante-professor ainda não se identifica como educador, pois “o processo de construção da identidade docente decorre dos significados sociais da profissão, da revisão das tradições aí presentes, das relações com a ciência, o conhecimento, os saberes, dos significados que cada professor confere ao seu próprio fazer cotidiano” (ALMEIDA, 2012, p. 3). O aluno-professor se percebe, na maioria das vezes, mais como estudante, uma vez que a identidade docente é construída em um processo mais longo e complexo.

Os professores universitários, na maior parte das vezes, não têm uma formação voltada para o processo de ensino-aprendizagem. Segundo Almeida e Pimenta (2011, p. 19), “a formação dos professores para o ensino superior vem ganhando relevância mundial”, provocada pelo lugar importante “ocupado pelo ensino nos cursos de graduação e o frequente despreparo dos docentes para essa atividade”. Nesse contexto, o domínio na área pedagógica é exigido pela docência do ensino superior, porém este é o ponto mais frágil dos professores universitários brasileiros quando se fala em profissionalismo da docência (MASETTO, 2012). Acrescenta-se a isso o fato de que grande parte desses docentes não teve ou teve apenas uma limitada experiência com o magistério da educação básica. Essa experiência é importante, mas ela “não é ressignificada, não lhe é atribuído o valor necessário para caracterizá-la como parte constituinte da docência” (FRAGELLI, 2016, p. 140). Ao lado disso, tem sido criticado o currículo dos cursos de licenciatura, que apesar das diferentes reformas, que atenuaram, em parte, a dicotomia teoria-prática, ainda privilegia as experiências pedagógicas mais ao final do curso.

Nesse sentido, há uma vasta literatura (ANDRÉ et al., 2012; GATTI, 2010, 2014; GATTI et al., 2019; PIMENTA; ANASTASIOU, 2014; entre outros) que enfatiza a precária formação dada ao estudante na fase de preparação para o ofício de professor. Essa situação pode provocar, nesse professor no início da carreira, sentimentos de angústia, dúvida e receio. É que mesmo tendo sido aluno e assistido a aulas de professores por vários anos, ele sabe que “não dispõe de experiência docente que lhe permita atuar com confiança e desenvoltura” (GAETA; MASETTO, 2019, p. 18-19).

Dada essa realidade, se impõe a necessidade de uma pedagogia universitária que evidencie a preocupação com aulas que favoreçam a aprendizagem dos alunos, de modo geral, e com uma formação que promova o “engajamento dos estudantes num processo” que favoreçam o questionamento do conhecimento elaborado, em perspectiva crítica. Além disso, uma pedagogia que propicie experiências de “resolução de problemas”, de discussões, por meio de metodologias que agreguem o ensino à pesquisa, a partir da construção do conhecimento, em perspectiva interdisciplinar (ALMEIDA; PIMENTA, 2011, p. 22-23). Uma pedagogia que propicie experiências de aulas centradas na aprendizagem, pois essas serão fontes importantes para os alunos da licenciatura na constituição de um repertório rico de experiências que poderão ajudá-los quando se tornarem professores.

Pesquisas indicam que, além da aprendizagem por observação ao longo da escolarização, boa parcela de futuros professores traz como aprendizagem para o exercício profissional as experiências de práticas de ensino (no caso daqueles que fizeram a licenciatura), momento em que, com todos os limites e críticas, se encontram envolvidos no exercício do ensinar (ANDRÉ, 2018; PIMENTA; ANASTASIOU, 2014).

A compreensão de que os docentes que atuam com os conteúdos específicos dos cursos de licenciatura são formadores de futuros professores nos instigaram a pesquisar: qual é o papel desses professores em relação à consolidação das escolhas profissionais pela docência?

Baseando-se nos estudos do efeito-professor e considerando que a escolha pelo magistério se estrutura ou se fortalece durante o curso de licenciatura, é importante investigar como a prática dos professores no início do curso influencia os estudantes na escolha pela carreira do magistério.

Para responder às questões da pesquisa, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Caae nº 22886614.4.0000.5153), buscamos ouvir estudantes universitários matriculados em curso de licenciatura em Ciências Biológicas de uma universidade pública do estado de Minas Gerais. A escolha desse curso ocorreu devido à sua ampliação no contexto de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni)2 e também porque esses cursos apresentam uma crescente demanda social por profissionais, especialmente no ensino médio nas redes públicas de ensino e nas regiões brasileiras Nordeste e Centro-Oeste (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020a). A opção por explorar os dados de um só curso se ancora na ideia de que “não é possível falar genericamente em uma pedagogia universitária como se todos os cursos da universidade fossem regidos pela mesma lógica” (CUNHA; LEITE, 1996, p. 85).

2 Procedimentos metodológicos

Esta pesquisa caracteriza-se como um estudo exploratório capaz de “proporcionar, através da imersão do pesquisador no contexto, uma visão geral do problema considerado, contribuindo para a focalização das questões e a identificação de informantes e outras fontes de dados” (ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 1999, p. 161). Quanto aos procedimentos adotados na pesquisa de campo, foram utilizados um questionário de 48 questões fechadas e 2 questões abertas e entrevista semiestruturada. Foram adotados métodos qualitativos e quantitativos, partindo da perspectiva de que estes não se opõem, mas se complementam, uma vez que são igualmente legítimos e contribuem de forma diferente para a coleta e análise dos dados (SOUZA; KERBAUY, 2017).

Inicialmente, um total de 57 estudantes de licenciatura em Ciências Biológicas, que se encontravam do 4º período em diante, responderam a um questionário disponibilizado por meio da plataforma on-line Google Docs. O questionário foi composto por perguntas de múltipla escolha e dissertativas, e nele foram abordadas as características sociais e escolares dos respondentes, bem como os motivos de sua escolha profissional. Foi realizada uma análise estatística descritiva dos dados, que consiste na organização, no resumo e na descrição de dados estatísticos para, posteriormente, se fazer inferências sobre eles (REIS; REIS, 2002). Os dados do questionário foram analisados por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), considerado “um dos aplicativos mais utilizados para a análise estatística em Ciências Sociais no mundo inteiro” (FERREIRA, 2009, p. 1).

Dos 57 estudantes que responderam ao questionário, 8 se dispuseram a participar de entrevistas semiestruturadas para aprofundamento das questões. O roteiro da entrevista se encontrava dividido em dois blocos temáticos: o primeiro explorava questões relacionadas às características dos estudantes e às motivações sobre a escolha pela licenciatura; o segundo trazia questões referentes às práticas pedagógicas dos professores, do curso de licenciatura e sua relação com a consolidação dessa escolha pelo curso.

As entrevistas foram estudadas por meio da análise temática de conteúdo, constituída de pré-análise, exploração do material ou codificação e tratamento dos resultados obtidos/interpretação (BARDIN, 2009). Os estudantes entrevistados se encontravam em diversos períodos de seu curso, sendo 1 do quarto período, 2 do sexto período, 2 do oitavo período, 2 do nono período e 1 do décimo período da graduação. Tais estudantes, com idade entre 21 e 25 anos, encontram-se matriculados em turno integral (50%) e em período noturno (50%), representando duas modalidades da licenciatura em Ciências Biológicas dessa universidade.

3 Perfil dos sujeitos e a escolha pelo curso de licenciatura em dois momentos distintos

Inicialmente, investigamos a escolha pelo curso de licenciatura, tendo em vista que este é intermediado por “um conjunto de informações ou representações socialmente definidas” (NOGUEIRA, 2004). Buscamos, então, ordenar os motivos que levaram os estudantes a escolher o curso em relação ao fator de maior influência. Além disso, foram identificadas as características sociais e escolares dos alunos participantes da pesquisa e, por fim, examinamos a existência da relação entre a prática pedagógica dos professores dos períodos iniciais do curso de licenciatura, as metodologias de ensino utilizadas, as formas de avaliação e o interesse e o desejo de ser professor pelo licenciando em dois momentos do curso – no ingresso na licenciatura e durante o preenchimento do questionário.

Os dados do questionário mostram que a maior parte dos estudantes da licenciatura em Ciências Biológicas se autodeclararam brancos. Nogueira (2004, p.14), baseado em diversos estudos (BRAGA et al., 2001; DURU-BELLAT, 1995; GOUVEIA, 1970; REAY et al., 2001), aponta que “os indivíduos se auto-selecionam com base em gênero e etnia”, de maneira que grupos étnicos minoritários – neste caso, pretos (9), pardos (19) e amarelos (2) – distanciam-se das universidades por temerem sentirem-se desconfortáveis e isolados diante da maioria branca (27).

Quanto ao gênero, os dados obtidos indicaram que 40 estudantes da licenciatura em Ciências Biológicas são do sexo feminino, evidenciando a preponderância de mulheres nesse curso. Como apontam os dados do Censo da Educação Superior 2019 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020b) e as pesquisas anteriormente citadas, o público feminino tende a “optar por cursos nas áreas de letras e ciências humanas, costumando evitar as áreas exatas, com exceção de cursos voltados para o magistério” (NOGUEIRA, 2004, p. 9).

Outro dado explorado diz respeito ao tipo de estabelecimento em que os estudantes cursaram o ensino médio, o que pode informar sobre as características das instituições e a possibilidade de estas contribuírem para o sucesso ou insucesso na escolha do curso (CHARLOT, 2000). A pesquisa apontou que 34 estudantes cursaram o ensino médio integralmente em escola pública, e 17 o fizeram em escola particular.

As razões de escolha pelo curso de licenciatura estão ligadas ao interesse pela docência e incluem processos de identificação e socialização primária. Dentre essas razões estão o fato de querer ser professor (13), de gostar da área de ensino e da educação (11), de ter tido um bom professor que os inspiraram a serem professores (5), de fazer parte de uma família de professores (2), de ter recebido influência da família ou de professores (1) e de ser o único curso do qual gostavam (3). Somando todos esses motivos, temos um total de 35 estudantes, o que representa 61,4% da amostra.

Verificamos, no entanto, uma quantidade notável de estudantes que optaram pela licenciatura por razões diversas e não diretamente ligadas ao exercício da docência. Dentre os motivos apontados por esta parcela de estudantes estão: obter uma formação mais ampla (1), enfrentar uma concorrência menor em relação ao bacharelado (1), encontrar possibilidade de conciliação do curso com o trabalho (2), ser um curso menos concorrido no vestibular (12), ter uma formação mais ampla que o bacharelado e uma segurança maior para conseguir um emprego (1), acreditar que pode mudar o mundo por meio da educação (1) ou ter outra opção se não conseguir exercer outro tipo de atividade (3). Quando somados, temos um total de 21 estudantes, o que representa 36,8% da amostra. Esse dado reforça a necessidade de investigar o papel do formador de professores diante dessa situação, tendo em vista que ele pode contribuir tanto para consolidar estas escolhas quanto para produzir o efeito inverso, o que pode resultar em evasões e em retenções ao longo do curso. Apenas um estudante optou por não responder a essa questão.

No intuito de esclarecer melhor este processo de escolha, perguntamos aos estudantes se, no momento de ingresso no curso, eles queriam ser professores. Desta vez, 28 (49,1%) discentes disseram que queriam ser docentes naquele momento; 28 (49,1%) disseram que não queriam e 1 (1,8%) estudante não respondeu a esta questão.

Nogueira (2004) e Valle (2006) mostraram que as escolhas pelo magistério se dão, muitas vezes, por razões econômicas ou por ser uma das poucas possibilidades para alunos de baixo desempenho na educação básica conquistarem um espaço no ensino superior. Como já foi indicado no estudo de Braga, Peixoto e Bogutchi (2001) e em pesquisas mais atuais, como as de Li (2016) e de Ariovaldo (2018), muitos desses estudantes migram para outros cursos depois do ingresso na universidade.

Para explorar melhor este processo de escolha do magistério como futura profissão, fizemos uma pergunta voltada ao momento presente, aquele da resposta ao questionário e não mais do ingresso no curso. Dessa vez, obtivemos um resultado um pouco mais otimista com relação ao desejo de ser professor por parte dos estudantes. Perguntamos a eles se, naquele exato momento – lembrando que todos já cursavam do 4º período em diante – eles gostariam de ser professores. O número de estudantes que responderam positivamente aumentou para 33 (57,8%), um crescimento de 8,7% em relação à pergunta anterior. Por sua vez, o número de estudantes que responderam negativamente caiu acentuadamente: apenas 3 (5,3%) estudantes, o que demonstra uma queda de 43,8% com relação àqueles que disseram não querer ser professores no início do curso. Surgiram, desta vez, estudantes indecisos quanto a essa escolha profissional: 21 (36,8%) respondentes.

É interessante observar que os estudantes que ingressaram na universidade em cursos de licenciatura por razões práticas e não por interesse pelo magistério terminam construindo o “gosto” por esses cursos. Assim, consolida-se para alguns durante o curso uma escolha que inicialmente foi feita estrategicamente, apenas para garantir um lugar no ensino superior. É preciso também considerar que a indecisão de 21 estudantes quanto à escolha do magistério como profissão é um avanço em relação à posição taxativa de não querer ser professor, apresentada no início do curso por 28 alunos.

Pode-se concluir que houve uma diferença entre as respostas dadas, quanto ao momento do ingresso e durante o curso, sobre a escolha pelo magistério. Diante de tal resultado, coube-nos indagar: quais fatores determinam a continuidade em um curso de licenciatura em uma situação de indecisão da escolha pela profissão docente? Qual é o papel do professor universitário na consolidação da escolha pela docência durante a formação inicial destes possíveis futuros professores? Essas questões são analisadas na próxima seção e foram exploradas na entrevista.

4 Influência da prática dos professores universitários na consolidação da escolha profissional dos estudantes

O contexto de prática docente na educação básica é marcado por precárias condições de trabalho, por salários desanimadores (BARBOSA, 2014; GATTI; BARRETO, 2009), pela falta de infraestrutura, pelos baixos resultados obtidos pelos estudantes nos exames nacionais. Esses são alguns fatores que justificam o baixo interesse pela docência. A despeito disso, há um aumento no número de matrículas em cursos de licenciatura desde a sua expansão a partir do Reuni. Dados do Censo da Educação Superior 2019 mostram que, de 2009 a 2019, o aumento no número de matrículas em cursos de licenciatura no Brasil foi de 41,6% (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020b). Em contrapartida, no Brasil há dados que indicam a falta de professores qualificados na educação básica (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020a).

Em cursos que oferecem a possibilidade de fazer a licenciatura e o bacharelado, como é o caso de matemática, química e biologia, os egressos têm a opção de atuar em empresas e, assim, obter acesso a ocupações de maior prestígio e de maiores salários. Há, então, uma demanda real e outra potencial de profissionais para a educação básica em determinados campos disciplinares. Neste sentido, a atuação dos professores universitários é um ponto a se observar, uma vez que “o entusiasmo e a moral dessa força de trabalho atual são importantes fatores no provimento dos próximos grupos de profissionais do ensino” (ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT, 2005, p. 2, tradução nossa).

Assim, buscamos compreender o papel do professor universitário, imbuído de suas práticas pedagógicas, na consolidação da escolha pela docência por parte dos licenciandos por meio das entrevistas realizadas com oito estudantes respondentes do questionário.

Inicialmente, buscamos aprofundar a compreensão sobre o processo de escolha do curso por parte destes estudantes para, depois, os questionarmos sobre o papel dos professores na consolidação desta opção. Denominamos os estudantes de E1 (Estudante 1) a E8 (Estudante 8), no intuito de preservar suas identidades.

Ao serem indagados a respeito das suas expectativas quando da escolha pela licenciatura, os estudantes evidenciaram as incertezas daquele momento, com exceção de E8. Um fator comum sobre o processo de escolha da licenciatura foi a influência dos docentes que tiveram ao longo de sua trajetória de escolarização, como é evidenciado a seguir:

Eu optei pela licenciatura porque é mais fácil de entrar. E consegui entrar. Mas depois eu percebi que tinha sido a melhor coisa que tinha acontecido para mim […]. Primeiro, baseado nos professores. Porque eu acho que todo mundo, ou quase todo mundo, sempre vai ter aquele professor […] que até hoje eu lembro da voz dele explicando a matéria; de tão bom professor que ele era. Então isso me motivou e me motiva até hoje! Toda vez que, assim, eu me sinto um pouco desanimada, eu penso: nossa, eu ainda quero ser igual aquele professor.

(E1)

Os respondentes E2, E3, E4, E5, E6 e E7 também ingressaram no curso de Biologia incertos de sua escolha, apesar das influências dos docentes da educação básica e do interesse pelo campo de estudo. Contudo, ao longo do curso, foram descobrindo o prazer de aprender a ensinar e a responsabilidade de ser docente. Observou-se na fala dos estudantes a influência dos professores universitários e de suas práticas pedagógicas na consolidação das escolhas pelo magistério. Essas práticas docentes são carregadas de intencionalidade, com um professor que compreende o sentido de sua aula e do significado de sua ação para a aprendizagem e para a formação do aluno (FRANCO, 2012).

Os alunos mostraram-se críticos em relação à prática de alguns docentes, mas também destacaram o papel positivo de professores ligados às disciplinas pedagógicas para a consolidação de suas escolhas pelo magistério. A fala de E6, a seguir, ilustra essa posição:

No início eu fiquei na expectativa das disciplinas; qual seria o nível. […]. Mas quando eu cheguei em algumas disciplinas de estágio mesmo, algumas disciplinas de didática, prática, que a gente tem na biologia, eu gostei muito. Eu falo com as meninas que se eu não tivesse feito a licenciatura eu não teria sido o mesmo. […] A licenciatura me permitiu contato humano, conhecer professores humanos, que lidam com as pessoas de forma direta, com uma amizade, que têm uma relação direta com o aluno. Então eu acho que durante toda a graduação, toda a licenciatura, eu pude ver isso: que é possível ser um professor que se relaciona diretamente com o aluno de igual para igual.

(E6)

Para os discentes, a mesma disciplina pode proporcionar prazer em aprender e despertar o desejo de ensinar determinado conteúdo ou pode produzir o efeito contrário, dependendo da maneira de o professor ministrá-la, de suas práticas pedagógicas em sala de aula e de sua forma de se relacionar com os estudantes. Segundo Charlot (2000), o prazer de aprender, no ensino superior, é importante, uma vez que, ao se relacionarem com o saber de forma prazerosa, estudantes de origens sociais diversas podem superar situações de fracasso.

Por outro lado, houve constantes críticas direcionadas às práticas pedagógicas de professores de disciplinas não relacionadas ao ensino. Para os estudantes, ao demonstrarem ausência de metodologias contextualizadas ao curso de licenciatura e baixa qualidade da prática pedagógica, alguns docentes muitas vezes contribuem para o aumento do índice de repetências e de desinteresse, especialmente nos períodos iniciais do curso, quando ainda não constam na grade disciplinas voltadas para o ensino. Desta maneira, reforçamos o argumento de que a prática pedagógica dos professores, as metodologias por eles utilizadas e a relação que mantêm com os alunos influenciam de maneira positiva ou negativa a consolidação da escolha pela licenciatura durante a formação inicial desses estudantes. Nessa última situação, constituem-se em “modelos pelo avesso”, “exemplos de como não deve ser o trabalho do formador” (ANDRÉ et al., 2012, p. 113).

Uma das estratégias didáticas que promove a inclusão e dialogicidade e, ao mesmo tempo, oferece elementos para a futura prática docente dos estudantes em formação é a de iniciar o conteúdo partindo das experiências dos alunos. Contudo, os estudantes entrevistados sinalizaram a carência dessa prática na maioria das disciplinas. Segundo eles, o diálogo, quando ocorre, é somente nas disciplinas ofertadas pelos professores do Departamento de Educação ou do Departamento de Biologia que compõem um núcleo docente com foco no ensino. A prática desses professores foi recorrentemente citada como positiva e motivadora, em detrimento da dos demais docentes, havendo poucas exceções.

Estudos recentes sobre a prática pedagógica no ensino superior mostram que o uso de metodologias ativas3 constitui uma estratégia didática que facilita a aprendizagem em tempos de constante inovação na educação e de mudanças no meio social dos estudantes (ALTHAUS; BAGIO, 2017). No entanto, no que tange às estratégias de ensino que facilitam a aprendizagem dos estudantes, como o uso de metodologias ativas, novamente se observou um hiato nas práticas pedagógicas da maior parte dos professores. Notamos que, em um curso de formação inicial de professores, persistem as aulas tradicionais com ênfase na transmissão de conteúdo. A exceção novamente é representada pelos docentes dedicados à instrumentalização do ensino de biologia ou às disciplinas de educação:

São poucos que fazem isso. Geralmente, nas disciplinas de massa a gente não tem isso, não. É data show e o professor falando. Muitas vezes é uma aula corrida e você tem que ser autodidata. Você tem que sentar, estudar por sua conta, ir nas monitorias. […] Os professores, que eu estou lembrando, que fizeram isso [utilizar estratégias de ensino que facilitam a aprendizagem], foram os professores do Departamento de Biologia ligados à educação.

(E7)

Uma consequência das predominantes aulas tradicionais é a pouca participação dos alunos, o que demonstra uma baixa integração acadêmica ao curso. Para Tinto (2002), a integração do estudante ao universo acadêmico é um importante fator para o sucesso escolar. Quando indagados a respeito dessa participação, os estudantes dizem se sentir pouco ativos no processo de aprendizagem e raramente sentem-se partícipes da construção do conhecimento.

Outro aspecto abordado pelos estudantes se refere à carência de avaliações com caráter formativo, como propõe Perrenoud (1999). Segundo o autor, neste modelo de avaliação o objetivo é regular a aprendizagem de maneira individualizada, partindo da concepção de que o diagnóstico se faz inútil se não der lugar a uma ação apropriada no que tange aos meios de ensino, à organização dos horários e dos espaços, à estrutura curricular e ao acompanhamento de cada aluno.

Os estudantes alegam que suas avaliações, em geral, servem exclusivamente à testagem dos conhecimentos que necessitam ser decorados. Seus erros raramente são vistos como parte da aprendizagem e nem sempre há coerência entre o que é ensinado e o que é avaliado. Quando indagado se seus erros têm sido vistos como parte da aprendizagem e se há coerência no processo avaliativo, E8 respondeu: “Por exemplo, nas matérias de educação a gente vê isso sim, mas nas outras matérias…”.

A próxima questão se refere ao currículo do curso. Os estudantes destacaram a falta de contextualização para a licenciatura no que se refere ao conteúdo ministrado em disciplinas oferecidas, em geral, por departamentos da área de exatas. Embora os estudantes considerem o currículo rico, eles destacaram a necessidade de incluir mais disciplinas com ênfase em prática, didática e instrumentalização para o ensino, e recontextualizar o conteúdo das demais para o foco a que se pretende o curso de licenciatura: formação inicial de professores para a educação básica. Sobre essa questão, Severino (2008) defende a articulação de todas as disciplinas do curso a fim de que ocorra envolvimento de todos os docentes, numa postura coletiva de trabalho acadêmico.

Quando os alunos foram questionados sobre os aspectos positivos do currículo do curso, obtivemos respostas como: “Tem muitas matérias que embasam e que te motivam muito a fazer licenciatura e que te ajudam não só na licenciatura, mas também no bacharelado (E5)”; “A prática dos professores da licenciatura, a proximidade. Eles são muito dedicados, muito responsáveis no que fazem (E6)”. Observa-se, novamente, a relação entre as práticas dos professores em sala de aula e a motivação em iniciar ou permanecer no curso de licenciatura, consolidando a escolha pela docência.

Para os estudantes, as práticas pedagógicas dos professores têm relação com o desejo de se tornarem professores. Essas práticas, quando boas, isto é, quando baseadas em metodologias ativas, voltadas para a aprendizagem dos alunos, influenciam positivamente a consolidação da escolha do aluno pela profissão de professor. Nessa questão, observamos novamente o que vem sendo demonstrado no estudo: geralmente os professores das matérias específicas da licenciatura inspiram positivamente seus alunos devido às suas práticas pedagógicas diferenciadas. Diz E6: “mas eu acho que o que me fez ter certeza de que eu gosto de dar aula e que eu deveria me aperfeiçoar nisso foi quando eu fiz as disciplinas de estágio”.

Os estudantes foram também inquiridos se percebiam alguma relação entre as práticas pedagógicas de seus professores e o desejo de serem docentes. Em suas respostas, os estudantes citaram os mesmos professores já destacados ao longo da entrevista, ressaltando como positivas suas experiências com as práticas pedagógicas dialógicas, com características humanísticas envolvendo utilização de metodologias diferenciadas e contextualizadas para o ensino, bem como a empatia com os alunos. Segundo os entrevistados, estes professores os fazem aprender com prazer, levando-os a admirá-los como pessoas e profissionais, despertando neles o desejo de serem como eles ao se graduarem.

Perguntamos aos estudantes o que recomendavam para que o curso conduzisse os alunos para o exercício do magistério. Em suas falas, eles sinalizaram a necessidade de haver, desde o início da graduação, metodologias que direcionem o aluno à “instrumentação” do ensino do conteúdo aprendido por meio de simulações de aula, debates, trabalhos em grupo, pesquisa em ensino ou de uma maior aproximação do contexto escolar. É recorrente na fala dos estudantes que essas práticas contribuem para a consolidação de suas escolhas pela docência, pois lhes transmitem segurança em ensinar e despertam o prazer em aprender.

Os estudantes foram perguntados se as práticas pedagógicas dos seus professores influenciaram seu desejo de continuar na licenciatura. Sete dos oito entrevistados responderam positivamente a essa questão. Além disso, todos destacaram a figura do professor, incluindo os do ensino médio, um familiar ou o professor universitário, como um fator de influência na escolha pela licenciatura, salientando a relação destes com os alunos por meio de suas práticas pedagógicas. Também houve menção aos professores universitários que direcionavam seu trabalho para o âmbito do ensino, incentivando e inspirando os alunos a trilharem o caminho da docência.

Diante das análises feitas até o momento, indagamos a estes estudantes qual era o papel dos professores em relação à consolidação da escolha pela profissão docente. A fala de E6 representa a dos demais graduandos:

Eu acho que se eu estivesse na dúvida, se eu gosto ou não, e eu tivesse feito disciplinas de estágio com outros professores, incoerentes com aquilo que falam – que falam que tem que mudar a prática e dão uma aula tradicional; que tem que avaliar ao longo do tempo e dão uma prova só no final do período –, eu acho que isso seria desconstruído. […]. Então, os professores, eles são essenciais. Primeiro você gosta da pessoa, você gosta do professor. […] quando a gente vê exemplos desse nível em lugares tão altos e tratando a gente de forma tão igual, a gente se apaixona pela pessoa, pela matéria da pessoa, por aquilo que ela faz. A gente gosta do todo e isso nos faz ter certeza de que é possível chegar. […]. Ali, dentro da licenciatura, para convencer os alunos de que é bom dar aula, ou para descobrir isso em alguns alunos e dar coragem para eles, porque, às vezes, a gente precisa que as pessoas descubram em nós, que digam “você consegue”. E isso só vai ser depois que a gente tiver o contato com esses professores. E então, isso nos faz querer crescer iguais a eles e atuar dessa forma na escola, de, como professor, fazer diferença na vida do aluno […]. E é isso que acontece na licenciatura, a gente gostou dos professores, a gente se apaixonou pela licenciatura por causa também dos professores, porque eles fazem a matéria ficar ótima, ficar gostosa, ficar leve. […]. O professor tem papel essencial na escolha do aluno, na decisão.

(E6)

De oito, apenas um estudante alegou não crer na influência da docência nesse processo e se mostrou desanimado em insistir na carreira do magistério, dadas as circunstâncias econômicas, políticas e sociais pouco promissoras que a cercam.

5 Considerações finais

A escolha do curso por razões como a menor concorrência em relação ao bacharelado, a busca por um curso menos almejado no vestibular ou a possibilidade de ter outra opção de trabalho foi bastante significativa neste estudo. Diversas pesquisas já mostraram, como foi visto, que as escolhas pelo magistério ocorrem, muitas vezes, por razões econômicas ou por ser uma das poucas possibilidades para alunos de baixo desempenho na educação básica conquistarem uma vaga no ensino superior. Muitos desses estudantes migram para outros cursos depois do ingresso na universidade; porém, outros terminam gostando desses cursos, o que foi comprovado observando as análises dos dados do questionário e das repostas dadas pelos estudantes entrevistados.

Os dados coletados no questionário mostram que houve mudanças na opção pela docência entre o momento de ingresso e durante o curso. Com o objetivo de aprofundar as razões dessas mudanças, essa questão foi bem explorada nas entrevistas. Ficou evidenciado pelas respostas dos entrevistados que as ações dos professores, suas práticas pedagógicas e sua relação com os alunos são aspectos que influenciam a consolidação de uma escolha feita, inicialmente, como estratégia de acesso ao ensino superior. Fica então ressaltada a importância do professor universitário na formação desses futuros docentes, de modo a suprir pedagogicamente as suas necessidades formativas e motivá-los ao exercício da docência.

Há que se investigar as formações dos bons professores recorrentemente citados. Para falar deles, os estudantes se utilizam de palavras como “admiração”, “inspiração”, “incentivo”, “ânimo”, “encorajamento”, “domínio” e “estímulo”. Diferenciam-se de outros considerados desestimuladores e pouco instrumentalizados para o ensino.

Essa investigação torna-se relevante uma vez que ainda são escassas as pesquisas sobre a pedagogia que sustenta o ensino superior e que influencia diretamente a formação da futura geração de professores. Este estudo evidenciou o claro papel do professor universitário na consolidação da escolha pela docência durante a formação inicial dos licenciandos. Ficou claro que boas aulas, incentivo ao ensino, instrumentações e experiências práticas influenciam a definição dos estudantes pela escolha da profissão docente.

Por fim, reiteramos a importância do estudo da pedagogia universitária, principalmente no âmbito da formação de professores, tendo em vista que a ampliação da consistência teórica deste campo de pesquisa e a afirmação do seu sentido social e prático, como aponta Soares (2009), poderão contribuir para sensibilizar o campo acadêmico a respeito de sua relevância para a sociedade.

1Esta pesquisa teve início com o pós-doutorado de um dos autores e foi desenvolvida em uma instituição federal no período de 2013 a 2014. O projeto contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais- FAPEMIG- de 2015 a 2018. Dados da investigação foram apresentados em trabalhos de congressos e em um capítulo de livro.

2O Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, instituído em 2007 e encerrado em 2012, buscou “ampliar o acesso e a permanência de estudantes nas Ifes” (GILLIOLI, 2016, p. 6).

3As metodologias ativas estão centradas no processo de aprendizagem dos alunos concebidos como construtores de seus próprios conhecimentos. Para isso, utilizam estratégias e recursos de ensino que estimulam a interação dos estudantes com seus pares, com os professores e com materiais disponíveis em seu entorno.

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Recebido: 26 de Fevereiro de 2021; Revisado: 28 de Julho de 2021; Aceito: 15 de Agosto de 2021

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