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Revista Teias

versão impressa ISSN 1518-5370versão On-line ISSN 1982-0305

Revista Teias vol.19 no.53 Rio de Janeiro abr./jun 2018  Epub 19-Fev-2020

https://doi.org/10.12957/teias.2018.33513 

Imagens e sons para além das escolas

O FESTEJO INTERCULTURAL DO CANAUANIM Um veículo de divulgação, fortalecimento e manutenção da cultura Wapixana em Roraima

Abraão Jacinto Pereira(*) 

Roseli Bernardes, Dra.(*) 

(*)Abraão Jacinto Pereira. Aluno do Programa de Mestrado em Educação PPGE. UERR/IFRR.

(*)Dra. Roseli Bernardes. Professora doutora no Programa de Mestrado em Educação PPEG - IFRR.


RESUMO

O povo roraimense abriga diversas etnias devido ao grande número de povos indígenas e as três fronteiras com países de línguas diferentes (Venezuela - espanhol e Guiana - inglês) que os coloca o povo de Roraima em contato com uma grande variedade de características culturais. A globalização e o constante avanço tecnológico e de mídias pode ser um grande vilão dessas culturas milenares que mantem costumes e crenças tradicionais. Reavivar a cada dia esses costumes e crenças dentro da comunidade e divulgá-los é uma forma de manter a cultura na sua forma original sem perder suas essências. O Festejo Intercultural do Canauanim tem esse propósito de manter viva sua cultura por meio de atividades educativas, sociais, culturais, religiosas e econômicas o modo de vida com base nos ancestrais da cultura Wapixana. A intenção desse trabalho é expor como acontece esse festival e analisar do ponto de vista sociológico com o intuito de alcançar dimensões reflexiva sobre como os povos indígenas sobreviverão ao avanço tecnológico não no quesito de sobrevivência biológica e sim no que tange ao social, sem perder a essência nas suas diversas formas de manifestação, seja, de danças, jogos e lutas, e outras maneiras de expressão. Assim sendo proporcionar a comunidade acadêmica através deste artigo a oportunidade de conhecimento e valorização da cultura Wapixana como brasileiros e como atores numa luta pela proteção de sua cultura. Por meio da participação no XIII Festejo Intercultural do Canauanim e dos registo que fizemos, possibilitou a nos participantes novos saberes e vivências que contribuíram para o inter e multiculturalismo entre nos não-indígena e os indígenas.

Palavras-chave: Educação Intercultural; escolas; etnias; educação indígena

RESUMEN

El pueblo roraimense alberga diversas etnias debido al gran número de pueblos indígenas y las tres fronteras con países de lenguas diferentes (Venezuela - español y Guyana - inglés) que los coloca al pueblo de Roraima en contacto con una gran variedad de características culturales. La globalización y el constante avance tecnológico y de medios puede ser un gran villano de esas culturas milenarias que mantienen costumbres y creencias tradicionales. Reavivar cada día esas costumbres y creencias dentro de la comunidad y divulgarlos es una forma de mantener la cultura en su forma original sin perder sus esencias. El Festejo Intercultural del Canauanim tiene ese propósito de mantener viva su cultura a través de actividades educativas, sociales, culturales, religiosas y económicas, el modo de vida con base en los ancestros de la cultura Wapixana. La intención de este trabajo es exponer cómo sucede ese festival y analizar desde el punto de vista sociológico con el objetivo de alcanzar dimensiones reflexivas sobre cómo los pueblos indígenas sobrevivir al avance tecnológico no en lo que se refiere a la supervivencia biológica sino en lo que se refiere al social, esencia en sus diversas formas de manifestación, sea, de danzas, juegos y luchas, y otras formas de expresión. Así pues, proporcionar a la comunidad académica a través de este artículo la oportunidad de conocimiento y valorización de la cultura Wapixana como brasileños y como actores en una lucha por la protección de su cultura. Por medio de la participación en el XIII Festejo Intercultural del Canauanim y de los registros que hicimos, posibilitó a los participantes nuevos saberes y vivencias que contribuyeron al inter y multiculturalismo entre los no-indigena y los índigenas.

Palabras-clave: Educación intercultural; escuelas; etnias; educación indígena

1. INTRODUÇÃO

Quando falamos em Interculturalidade, a ideia que vem a nossa mente é de que mais de uma cultura estão se relacionando em alguma dimensão. A escola em uma comunidade indígena em si já é uma contradição à cultura, tendo em vista que a escola é inserida na comunidade com o intuito de adaptar o índio a vida na sociedade ocidental. Adequar essa escola a cultura, de tal forma, que possa servir como ferramenta para a promoção da interculturalidade é um grande desafio para os professores e a comunidade.

A dimensão da interculturalidade está hoje colocada como um dos aspectos desejáveis para uma escola indígena, tida mesmo como uma das condições necessárias para que seja respeitada a especificidade da educação escolar indígena, como transparece nitidamente numa das metas elaboradas recentemente para o Plano Nacional de Educação: “Criar, dentro de um ano, a categoria oficial de ‘escola bilíngue’, para que a especificidade do modelo de educação intercultural e bilíngue seja assegurada.”

O presente artigo tem como objetivo descrever a relevância do Festejo Intercultural do Canauanim para a valorização e manutenção da cultura Wapixana na comunidade indígena Canauanim, a partir de pesquisas bibliográfica e da observação realizada durante o 13º Festejo realizado no ano de 2017.

O Festejo Intercultural da Comunidade Indígena Canauanim é realizada sempre no mês de Setembro de cada ano, a festa começou em 2004, quando lideranças da comunidade resolveram fazer uma festa para apresentar todos os produtos produzidos dentro da comunidade, e a festa foi chamada de “festa da fartura”. Porém, anos depois o nome da festa mudou para “festa intercultural”, onde todos pudessem participar, as comunidades vizinhas como Malacacheta e Tabalascada participam todos os anos e festa ganhou proporções maiores a cada ano, e hoje tem o objetivo de divulgar a cultura indígena, com danças, comidas e costumes tradicionais, defumações com o Maruai e disputas e competições entre indígenas como: arco e flecha, fiar algodão, trançar darruana, beber mais caxiri.

Em um estado onde há uma grande distinção racial, e que como em todo o Brasil apresenta uma lacuna nos programas escolares, relacionados ao estudo da pluralidade cultural. O Festejo Intercultural busca na preencher essa lacuna dentro da comunidade e da realidade daqueles povos, a participação de outras comunidades e outras etnias demostram não somente o interesse pelo evento, como também a relevância deste para a cultura. A presença de autoridades tanto das organizações indígenas quantos dos organismos governamentais demonstra a importância do festejo no contexto regional.

TERRA INDÍGENA WAPIXANA CANAUANIM

A TI (Terra Indígena Canauanim) está localizada na região leste de Roraima, no município de Cantá, a área da TI corresponde a 1,49% do município. Canauanim foi declarada Terra indígena através de uma portaria ministerial de 1982 e somente quatorze anos mais tarde foi homologada em um decreto s/n de 1996. Segundo o (CIR-Conselho Indígena de Roraima 2015), novecentos e oitenta e dois índios dos povos Macuxi e Wapixana habitam as três ‘malocas’ da TI.

(Fonte: ISA 2013)

Mapa da TI Canauanim 

Na comunidade acontece um Festejo Intercultural sempre no mês de Setembro de cada ano, essa festa teve inicio em 2004, com uma reunião do conselho da comunidade em que foi decidido que seria realizado uma festa para apresentar todos os produtos produzidos na da comunidade, sendo a sim a primeira festa foi chamada de “festa da fartura”. Com o passar dos anos o nome mudou para o atual “festejo intercultural”, onde todos pudessem participar, não apenas comunidades da TI Canauanim como também as comunidade das TI vizinhas como Malacacheta e Tabalascada, e atualmente a participação de comunidades mais longínquas bem como de vários povos indígenas do estado fazendo a festa ganhar proporções maiores a cada ano, e tem o objetivo de divulgar a cultura indígena, com danças, comidas e costumes tradicionais, defumações com o Maruai e disputas e competições entre indígenas.

O festejo oferece e aos alunos, aos professores e aos visitantes a oportunidade de conhecer melhor a cultura Wapixana bem como dos outros povos que participa. Valorizar as diversas culturas presentes na região, propicia ao aluno e ao público a compreensão do valor cultural, e promove a autoestima como ser humano pleno de dignidade, com isso contribuir na formação de autodefesas contra expectativas indevidas que lhe poderiam ser prejudiciais. Por meio do convívio escolar, no qual se valorize seus conhecimentos e suas vivências que cooperam para que se apure sua percepção de injustiças e manifestações de preconceito e discriminação que recaiam sobre si mesmo, ou que venha a testemunhar e para que desenvolva atitudes de repúdio a esses tipos de práticas.

2. METODOLOGIA

A observação não-participante, enquanto técnica qualitativa de investigar uma realidade, objetiva observar as atitudes e ações diversas dos sujeitos que estão sendo alvo de investigação para compreender determinada temática ou esclarecer pontos obscuros.

Na observação participante, o observador torna-se parte da situação a observar. O pesquisador parte das observações do comportamento verbal e não verbal dos participantes, de seu meio ambiente, das anotações que ele mesmo fez quando no campo, de áudio e vídeo tapes disponíveis, entre outros (MOREIRA, 2004).

Nesse tipo de pesquisa o investigador não participa ativamente da situação, apenas “assiste” as ações dos sujeitos para desvelar e permitir que estes tomem consciência de suas práticas individuais e sociais. É um tipo de investigação que leva ao questionamento da realidade, onde o sujeito investigado constrói seus conhecimentos coletivos.

O campo de investigação foi o Festejo Intercultural do Canauanim, na “maloca” Canauanim, localizado na região da Serra da Lua município do Cantá -Roraima. Esse festejo é organizado pela comunidade com participação das escolas estaduais e municipais e de todas as comunidades da circunvizinhança.

O alvo da pesquisa foi as atividades desenvolvidas durante o festejo, bem como a participação da comunidade escolar e a identificação de ações que caracterizassem a interculturalidade no decorrer do evento, observando-as criteriosamente e descrevendo cada uma.

A observação foi estruturada de forma a permitir perceber como se dá a prática pedagógica dentro do evento e como expressa o sentido da interculturalidade nas ações desenvolvidas. As categorias de análise vão surgindo no processo da investigação e observação. Fomos à campo com algumas e amplas categorias.

Essa pesquisa é parte das atividades facultativas desenvolvidas na disciplina de Fundamentos Filosóficos, Antropológicos e Sociológicos da Educação Intercultural do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual de Roraima, que estuda a questão da interculturalidade como problema humano e analisa as questões éticas, políticas e estéticas da educação intercultural.

Com intuito de contemplar os estudos e visando melhorar as práticas pedagógicas no ensino da educação intercultural, relacionando o conteúdo teórico trabalhado na disciplina com as observações de campo, buscamos compreender interculturalidade, bem como aprimorar nossa consciência crítica como professor-pesquisador e aluno. Dividi a análise em subitens para fazer em cada um, uma reflexão de cada manifestação observada.

FESTEJO INTECULTURAL DO CANAUNIN

Interculturalidade

Sabemos que alguns grupos não possuem as mesmas oportunidades que os outros. E são essas desigualdades de oportunidades que esse evento tenta minimizar ao fazer do festejo, um momento de apresentação das culturas, costumes, tradições e produtos das atividades econômicas.

A problemática da interculturalidade contribui para a produção de um pensamento-ação da diversidade e visa proporcionar momentos às forças e formas residuais mais embrionárias de resistência ao sistema capitalista. Pretendemos percorrer caminhos da interculturalidade como práxis e com isso fornecer pistas para que se acompanhe alguns momentos de comunidade. (OZORIO, 2005. Pag. 1).

A educação escola intercultural está aberta à diversidade e ao respeito, assim sendo, busca o desenvolvimento de todas as culturas, nelas coexistem na transmissão da pluralidade de culturas para construir uma cultura em comum com a diversidade desse país.

Algumas atividades desenvolvidas pelos alunos vão além da própria cultura e demonstra nitidamente o impacto da educação ocidental no seio da cultura local. O futebol, as caricaturas, pinturas em tela e instrumentos musicas eletrônicos são objetos da cultura não-indígena mais que estão presente no festejo através dos próprios indígena, daí a reflexão sobre a nomenclatura “interculturalidade.”

Parceria Escola e Comunidade

O evento é realizado em conjunto com as escolas municipais e estaduais das região e a comunidade em geral, é nítido a participação em massa dos professores e alunos e sua significativa contribuição para a realização do evento. Não há uma desconexão entre os entes da comunidade, a participação vai desde as crianças aos idosos, incluindo todos os movimentos e órgãos governamentais que atende a localidade.

A escola contribui em praticamente todas as etapas do evento e a comunidade corresponde com a participação em massa nas atividades co-organizadas pela escola. A participação de outros povos além dos Wapixana e de outras comunidades da mesma etnia faz do evento um oásis de cultura, uma mistura de manifestações e compartilhamento de conhecimento.

ARTE, ARTESANATO, MÚSICA, DANÇA E CERÂMICA

A arte de uma maneira generalizada não pode ser classificada como uma atividade individualizada. Visto que, quando tratamos de arte indígena sempre ela terá ligação direta com a vida cotidiana e com alguns elementos específicos de cada comunidade, todas as peças fabricadas por eles são relacionadas ao seu passado, baseadas no que acreditam e remetem as suas tradições. Para o índio, fazer arte é praticar, exercitar e experimentar o espírito coletivo. Na sua concepção, o artesanato é fundamentado na coletividade e na união das pessoas em torno de algo imaterial que podemos chamar de princípios da cultura.

Portanto, o artesanato indígena não se deu de um momento para outro, foi se desenvolvendo ao longo dos tempos a partir das necessidades de adaptação, caça, coleta e também dos ritos cerimoniais. Os objetos, as pinturas, os enfeites foram fabricados e introduzidos no cotidiano a partir dessas necessidade, seja nos momentos espirituais e ou, no trabalho doméstico. Dessa forma, os Wapixana desenvolveram o seu estilo de arte.

Compõe a arte dos Wapixana os artefatos decorativos produzidos fibras de Buriti, de cipó e de Arumã, os utensílios de barro, as bijuterias feitas de sementes e de pedras, e redes, os vestuários os artesanatos e as pinturas que utiliza tintas extraídas na flora regional de forma sustentável.

Características da arte Wapixana

A arte indígena é anterior à colonização dos portugueses na América. E por oferecer uma diversidade de simbologias, que abrangem tanto os aspectos de cunho social quanto o ritual, entre o sagrado e sobrenatural, esse tipo de trabalho tem encantado admiradores. Essa artesania é dotada de muito fascínio, originalidade, mistério e exotismo. Tem costume extremamente tradicional, ou seja, é praticado e ensinado entre as várias gerações.

No que se refere à arte indígena Wapixana, esta é constituída a partir das suas próprias tradições e crença. O que realmente importa no artesanato indígena é permanecer com os mesmos pensamentos e costumes herdados, bem como toda a simbologia enraizada em cada peça e reconhecida através das marcas profundas deixadas nessas obras. É essa característica que dá ao Festejo, o sentido de um movimento intercultural, onde a exposição artística vai além do sentido expositivo e comercial. Busca-se o sentido de manutenção dos costumes, bem como, sua valorização não apenas diante do visitante mais também, para os indígenas mais novos que estão vivendo um mundo tecnológico entre a sua cultura e o bombardeamento de informação de uma midiática sem censura exposta através das redes sociais.

Os Wapixanas ao trabalhar a arte eles deixam transparecer todos seus sentimentos e toda sua sensibilidade a partir das cestarias e tudo ou mais que distingue a sua arte e artesania. A principal função é, sobretudo, a comunicação, de cada trabalho em cada obra seja muito bem definida e compartilhada por todos dentro da comunidade.

Esporte e Lazer

Durante o Festejo são desenvolvidas diversas atividades esportivas, lutas e Jogos de diferentes modalidades, em geral as lutas são de origem tradicional da comunidade, já os jogos são na sua maioria atividades esportivas ocidentais, como futebol, voleibol e outros. Além de ser um componente das atividades já desenvolvidas nas escolas da comunidade, também funciona no Festejo como um atrativo para as pessoas visitantes que desfrutam do momento de lazer proporcionado pelo Festejo.

Outras atividades de lazer também são desenvolvidas, a exemplo as danças que tem nos estilo indígena (parixara) e não indígena (forró) durante o evento as noites são de muita música, comida e dança o que leva um maior número de pessoas até a comunidade para participar desses momentos de descontração e lazer.

Nessas última atividade música e dança além da presença dos instrumentos da arte indígena foi possível observar modernos equipamentos de sons que deixa visível o uso de objetos da nossa cultura para promover e ampliar a visibilidade do evento, isso leva o conceito de interculturalidade usado na nomenclatura do evento a um sentido além do “inter” entre as cultura dos povos índigenas de Roraima, ou seja, esse “inter” navega não apenas entre as culturas indígenas, mas também entre as não-indígenas presente no território. Visto que, as bandas que tocam nesses eventos não são apenas de origem das comunidade. A amplitude da interculturalidade não empobrece o sentido de cultura do evento ela enriquece e traz a frase “ninguém deixa sua identidade por conhecer uma nova cultura” para o debate.

Tema: Culinária e Bebidas

O Festejo como já mencionado nasceu para promover a cultura local e os produtos produzidos pela população, como artesanato, produtos agrícolas e a culinária, dentre os produtos podemos destacar as paçocas que são tradicionalmente feitas por essas populações, a base de farinha da mandioca um produto base de toda culinária indígena no Brasil e carnes de animais silvestres com acompanhamento de uma banana.

Outro produto que é o cartão postal na maioria das comunidades indígenas do nosso estado é o Caxiri, uma é uma bebida fermentada à base de macaxeira (mandioca), utilizada em comemorações nas tribos indígenas. E como toda comemoração não poderia faltar no festejo, o Caxiri é parte do ritual de todas recepções e abertura de eventos, pode dizer que é algo “sagrado” na cultura indígena na Amazônia.

Tema: Consciência Ambiental

Um das coisas que me chamou muito atenção foi as diversas placas que alertavam sobre a preservação do meio ambiente. Sabemos historicamente que os indígenas sempre foram ambientalmente sustentáveis em suas práticas ambientais, porém, o que me chamou atenção nas placas foi que ao usar a imagem como veículo de comunicação retrataram um personagem da cultura não indígena, isso me fez refletir sobre os recursos pedagógicos na educação básica.

Se a imagem acima consegue transmitir uma mensagem a essas crianças e jovens da comunidade significa que pode existir uma sobreposição de conhecimentos culturais da cultura não indígena na indígena, onde os personagens da TV tem mais influencia que as entidades da cultura indígena.

Essa observação não afirma e sim abre uma debate sobre o assunto, tendo em vista que, a comunidade que decide até onde podem ser influenciados por outras culturas. Como o próprio nome do Festejo afirma “intercultural” - não da pra discutir o tema interculturalidade sendo monoculturalista na essência. Ou seja falamos de diversidade, num debate amplo com total liberdade de pensamento, ninguém vira índio por dançar parixara e nenhum Macuxi deixará de ser índio por que dança funk.

Religiosidade

Para os Wapixanas a noção de sagrado percorre cada palavra ou gesto, cada detalhe e manifestação da vida natural, humana e social. A religiosidade indígena está intimamente ligada à própria cultura e, como tal, os povos indígenas Wapixanas tem sua forma particular de reverenciar o transcendente.

Para eles, a terra é um espaço de vida, um lugar para viver bem. Eles não veem a terra como algo que precisa ser explorado para que eles sobrevivam, ao contrário eles veem na preservação e na conservação uma forma de manter vivo o espaço e a própria vida, tendo em vista que, esse espaço deve ser respeitado para que eles vivam.

Na comunidade, os anciães são os quem fazem a ligação entre os seres sobrenaturais e as pessoas. Ele é o guia da comunidade, é responsável pelos enfermos, pela organização dos rituais, que no caso do evento uma senhora participou da defumação, e também são os que prepara para a guerra. Problemas de toda ordem podem ser atribuídos à magia negativa de espíritos malévolos. Neste caso, chefe espiritual pode diagnosticar e ver o agente causador do mal.

Na visão da cosmológica Wapixana: No começo quando o céu era perto, tudo falava, era puri”, magia. Céu e terra eram então indiferenciados, bem como indiferenciados eram os seres que os habitavam, porque sua fala era uma só.(ISA, 2017). Uma visão diferente da cristã porém, que deve ser respeitada, visto que, não é um mito e sim a história daquele povo, como tem a história judaico-cristã e as de tantos outros povos.

LUTA DE CLASSE E MOVIMENTOS SOCIAIS

A luta dos povos indígenas de Roraima inicia com as primeiras tentativas dos Portugueses em conquistar o Planalto das Guianas, desde esses tempo que os Wapixanas lutam por território e sua sobrevivência, vários foram os agentes que atacaram a soberania desse povo, dentre eles a politica de aldeamento, a expansão da pecuária, o garimpo e tantos outros.

Atualmente esses povos engajaram em outras lutas, nas quais podemos reconhecer como lutas de Classe, que é o caso do Movimentos das Mulheres, e dos professores indígenas. Esse novos movimentos que atuam de forma institucionalizada usam armas diferentes das usadas pelos antigos guerreiros das tribos e lutam com um inimigo que também atua com novas táticas.

A homologação da terra indígena não significa que esse povo está imune a ataques de agentes exterior, eles continuam sofrendo com incêndios que iniciam em propriedades vizinhas ou são criminalmente provocados para atingi-los, aguas de seus igarapés que podem serem contaminadas, questões de cunho pedagógico e curricular bem como outras políticas públicas de acesso a comunidade, energia, abastecimento, saúde e outras áreas que sofrem com abandono por parte do Estado, sendo que tudo tem suas intencionalidade, e não deve ser visto com resquício de um fenômeno nacional e sim estudado como um fato relacional entre o Estado e o índio.

CONSIDERAÇÃO FINAIS

A análise foi dividida em duas etapas, primeiro na análise do material com as anotações sobre o que foi observado (visto e ouvido) e a segunda foi rever todas as imagens feitas durante o evento, e a descrição de fatos retratados nas imagens. Fatos esses importante para o entendimento do evento.

Para superarmos o euro centrismo, ou seja, superar os conceitos da educação ocidental tradicional em que se dá a mais importância a história a partir da visão eurocêntrica, foi preciso fazer a analise da observação respeitando a cultura Wapixana e considerando ela algo imaterial vivo e não como um simples. Respeitar as diferenças é expandir o potencial da vida humana e as possibilidades democráticas (GIROUX, 1999).

A autora Malluh Praxedes descreve que a educação não-eurocêntrica [...] é aquela em que as culturas das populações de todas as regiões do mundo não são vistas como das primitivas, atrasadas, exóticas, ignorantes e inferiores (PRAXEDES, 2010. p.52).

Esse evento teve a participação de diversas comunidades da região da serra da lua, ampla participação da comunidade local e das escolas, bem como a participação de um público externo e também de autoridades representantes de diversos órgãos do estado. Todos tiveram a oportunidade de vivenciar a cultura Wapixana.

A observação esse evento foi uma experiência onde foi possível vivenciar a interculturalidade além da discussão e leitura em sala de aula, foi ver na prática uma forma de demonstrar interculturalidade, não cabe a esse trabalho definir até onde ela está presente naquele evento, porem desperta uma nova visão do intercultural, tendo em vista que, cada uma das manifestações reflete um momento de determinada cultura.

Vivemos um determinado momento na cultura nossa e os indígenas também vivem um determinado momento na cultura deles, não podemos julgá-los partindo dos fatos narrados sobre a cultura deles quando os Europeus aqui chegaram, eles vivem o mesmo território porém, não é mais o mesmo ambiente, as mudanças tecnológicas da nossa cultura impacta fortemente no dia-a-dia deles e tudo isso deve ser considerado quando estamos analisando a interculturalidade nesse contexto.

Entretanto, não basta apenas observar e vivenciar estas diferentes manifestações culturais, é preciso estudar, questionar e discutir as raízes condicionamentos históricos. Buscando ancorar socialmente a questão, ou seja, explicar as origens e construções dos conceitos.

REFERÊNCIAS

GIROUX, Henry A. Cruzando as fronteiras do discurso educacional: novas políticas em educação. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. [ Links ]

IBGE-Instituto Brasileiro Geografia e Estatística. Tabulação avançada do censo demográfico 2000: resultados preliminares da amostra. Rio de Janeiro, 2000. [ Links ]

ISA, Equipe de edição da Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil, Fonte: Instituto Socioambiental | Povos Indígenas no Brasil/Wapixanas, Acessado em: 03/01/2018. [ Links ]

SOIHET, Rachel. O drama da conquista na festa: reflexões sobre resistência indígena e circularidade cultural. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 5, n. 9, p. 44-59, jul. 1992. ISSN 2178-1494. Disponível em: < http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/2332/1471 >. Acesso em: 05 Jan. 2018. [ Links ]

PRAXEDES, Malluh. Aquele olhar fora do corpo. Belo Horizonte: Formato, 2010 [ Links ]

MOREIRA, D. A. Pesquisa em Administração: Origens, usos e variantes dos métodos. Revista de Administração e Inovação, v. 1, n. 1, 2004. [ Links ]

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