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Revista Teias

versión impresa ISSN 1518-5370versión On-line ISSN 1982-0305

Revista Teias vol.22 no.67 Rio de Janeiro oct./dic 2021  Epub 23-Feb-2023

https://doi.org/10.12957/teias.2021.48333 

Artigo

LEITURA NA TELA POR ESTUDANTES DO 5º ANO: reflexões acerca da constituição de um leitor digital

READING ON THE SCREEN BY STUDENTS OF 5TH YEAR: reflections on the constitution of a digital reader

LECTURA EN LA PANTALLA POR ESTUDIANTES DE 5º AÑO: reflexiones acerca de la constitución de un lector digital

1Universidade de Caxias do Sul E-mail: afboeira@ucs.br

2Universidade de Caxias do Sul E-mail: ramos.fb@gmail.com

3Universidade de Caxias do Sul E-mail: erela@ucs.br


Resumo

Este artigo discute e problematiza o entendimento sobre leitura de estudantes do 5º ano do Ensino Fundamental de uma escola particular, situada no município de Vacaria-RS, bem como apresenta os sites preferidos dos interlocutores, a fim de buscar evidências sobre a constituição de leitores digitais. A investigação apoia-se, em especial, nas reflexões de Larrosa (2002; 2003; 2011), Chartier (1998; 2002; 2002b), Santaella (2014; 2014a; 2014b; 2014c) e Cameira e Cardoso (2015) acerca da leitura e dos leitores. A abordagem metodológica é empírica, de caráter qualitativo, sendo o corpus composto pelos enunciados produzidos, por 20 estudantes do 5º ano do Ensino Fundamental. Aponta-se que a leitura por meio do jogo digital representa um desafio ao leitor e pode-lhe apropriação, invenção, produção de significados e sentidos ao hipertexto.

Palavras-chave: leitor total; leitura; tela; sites

Abstract

The objective of this article is to discuss and problematize the understanding on reading of students of 5th year of Primary Education of a private school, located not in the municipality of Vacaria-RS, as well as to present the preferred sites of the interlocutors, in order to search for evidence on the constitution of digital readers. The research is based, in particular, on the reflections of Larrosa, Chartier, Santaella and Cameira and Cardoso about reading and readers. The methodological approach undertaken is empirical, of a qualitative nature, being the corpus composed of the statements produced by twenty students of 5th year of Basic Education. It is pointed out that reading through digital play represents a challenge to the reader and can enable the appropriation, invention, production of meanings and senses to the hypertext.

Keywords: full reader; reading; screen; sites

Resumen

El objetivo de este artículo es discutir y problematizar el entendimiento sobre lectura de estudiantes de 5º año de Enseñanza Fundamental de una escuela particular, situada no municipio de Vacaria-RS, así como presentar los sitios preferidos de los interlocutores, con la finalidad de buscar evidencias sobre la constitución de lectores digitales. La investigación se apoya, en especial, en las reflexiones de Larrosa, Chartier, Santaella y Cameira y Cardoso acerca de la lectura y de los lectores. El abordaje metodológico emprleado es empírico, de carácter cualitativo, siendo el corpus compuesto por los enunciados producidos, por veinte estudiantes de 5º ano de Enseñanza Fundamental. Se señala que la lectura por medio del juego digital representa un desafío al lector y puede posibilitarle la apropiación, invención, producción de significados y sentidos al hipertexto.

Palabras clave: lector completo; lectura; pantalla; sitios; estudiantes

INTRODUÇÃO

Ler é um processo ativo do leitor diante do texto, e a materialidade é fator a ser considerado nas reflexões acerca da leitura. A discussão sobre leitura ultrapassa questões relacionadas somente aos textos e ao leitor. Lemos em diferentes suportes, pois os textos são veiculados em diversas telas: desktops, notebooks, tablets e smartphones, entre outras, possibilitando a leitura de hipertextos (LÉVY, 1996), os quais são compostos por dados verbais, visuais (imagens estáticas ou em movimento), sonoros e híbridos, que se combinam e se interligam.

O material de leitura tem sido desvendado pelos nativos digitais (PRENSKY, 2001), pela geração denominada Homo Zappiens (VEEN; VRAKKING, 2009), junto do suporte impresso. A leitura por meio das telas integra a leitura do mundo, pois a criança, antes de dominar as letras, pode ter acesso a diversos conteúdos, especialmente aos jogos. Assim, é comum ver crianças, escolarizadas ou não, clicando o mouse ou deslizando seus dedos sobre as telas.

Considerando a importância de explorar as possibilidades de leitura por meio de diferentes suportes, sobretudo a tela, este texto objetiva discutir e problematizar o entendimento sobre leitura de estudantes do 5º ano do Ensino Fundamental de uma escola particular, situada no município de Vacaria-RS, bem como apresentar os sites preferidos dos interlocutores, a fim de buscar evidências sobre a constituição de leitores digitais.

O material empírico foi produzido por meio de um questionário online, respondido no laboratório de informática da escola onde as crianças estudam. O questionário integrou pesquisa maior e tinha como meta identificar comportamentos leitores dos interlocutores bem como seus sites preferidos. A identidade dos 24 estudantes que responderam ao questionário foi preservada e são nomeados, neste estudo, por nome de jogos, grafados em itálico, e voz dos interlocutores está grafada entre aspas. O estudo apresenta-se em dois blocos. No primeiro, são expostos apontamentos dos estudantes sobre a importância da leitura e, no segundo, são discutidos sites eleitos por este público, salientando que a educação na contemporaneidade não pode ignorar o texto disponível nos suportes digitais como possibilidade de leitura.

LEITURA PELA PERCEPÇÃO DOS ESTUDANTES

Nesta parte do artigo, discutimos o entendimento das crianças sobre leitura com base nas respostas dadas no questionário. Afirmam que a leitura é importante e de que gostam de ler. Palavra-Cruzada explica: “quando lemos, podemos ter um grande aprendizado. A leitura é algo que nos faz viajar e se imaginar em diversos lugares: outra época, outro país, outro planeta, outra galáxia… A leitura é um aprendizado para toda vida, é a terra da fantasia”. A postura de Palavra-Cruzada aproxima-se de uma das metáforas sobre leitura presente em estudos de Larrosa (2003); trata a leitura como viagem: “ler é como viajar, como seguir um itinerário por meio de um universo de signos para saber interpretar corretamente se você não quer se perder” (LARROSA, 2003, p. 46, tradução nossa).

Palavra-Cruzada garante: “quando lemos, podemos ter um grande aprendizado”, e Cinco Marias complementa “através da leitura sabemos palavras novas, porque aprendemos coisas novas e aprendemos muito mais”. Os estudantes relacionam a importância da leitura à escola, pois ela “pode orientar na hora de estudar” e “ajuda a tirar melhores notas”, asseguram, respectivamente, Dorminhoco e Palavra-Cruzada, explicitando propósitos da leitura na escola.

Chega à escola a geração denominada Homo Zappiens (VEEN; VRAKKING, 2009), que “cresceu usando múltiplos recursos tecnológicos desde a infância: o controle remoto da televisão, o mouse do computador, o minidisc e, mais recentemente, o telefone celular, o iPod e o aparelho de mp3” (VEEN; VRAKKING, 2009, p. 12), ou seja, “o Homo Zappiens é digital, e a escola analógica”.

Muitas vezes, o acesso ao mundo da leitura na escola é realizado, sobretudo por meio do suporte impresso, da leitura informativa e para fins pragmáticos. Os interlocutores empíricos Trilha e Xadrez pontuam: “devemos ler, pois a leitura nos transmite conhecimento” e “porque assim a gente coleta informações importantes e também conhecimento”. Porém, a leitura “não se reduz a um meio para adquirir conhecimentos” (LARROSA, 2003, p. 26, tradução nossa); é importante não só “porque aumenta os conhecimentos e a linguagem”, conforme assegura Amarelinha. Se “lemos para adquirir conhecimentos, depois da leitura sabemos algo que antes não sabíamos, temos algo que não tínhamos anteriormente, mas nós somos os mesmos que antes, nada foi modificado em nós” (LARROSA, 2003, p. 26, tradução nossa). A leitura ultrapassa a prática de decodificação, compreensão ou de aquisição de conhecimentos ou mesmo o passatempo e coloca-se como formação.

Nessa concepção, “a leitura pode ser uma experiência para o leitor. Uma experiência de linguagem, uma experiência de pensamento, e também uma experiência sensível, emocional, uma experiência em que está em jogo nossa sensibilidade” (LARROSA, 2011, p. 10). Nem toda leitura, entretanto, é experiência. Muitas vezes a prática de leitura resume-se à decodificação, interpretação, compreensão, aquisição de conhecimentos e ao passatempo, não sendo experiência, porque não há formação e transformação do leitor. A experiência é “o que nos passa. Não é o que passa” (LARROSA, 2003, p. 28, tradução nossa); é “o que nos toca” (LARROSA, 2002, p. 21), que possibilita, conforme declaram Dominó e Damas, “sonhar e se aventurar […] como se fosse uma personagem” e “viver os contos” por meio da leitura.

Em outras palavras, “é necessário que exista uma relação íntima entre o texto e a subjetividade. E essa relação poderia ser pensada como experiência” (LARROSA, 2003, p. 28, tradução nossa) que produz sentido. Aliás, “vivemos em um mundo onde muitas coisas passam. […] Mas, ao mesmo tempo, quase nada nos toca” (LARROSA, 2003, p. 28, tradução nossa). Realizamos inúmeras práticas de leitura em diferentes suportes e apenas algumas podem ser consideradas experiências, que nos modificam, nos transformam, nos formam, nos constituem, questionando o que somos.

Os estudantes, pela leitura, podem tornar-se também escritores, uma vez que consideram essa ação importante: “é um jeito de aprender a escrever também”, “nos ajuda a escrever as palavras certas”, “ajuda a interpretar textos, ter uma escrita mais correta e pode ajudar também a fazer textos e reescritas”, declaram Caçador, Stop e Caça-Palavras.

Todo material de leitura necessita de um suporte para chegar até o leitor; pois o “ato de ler concretiza-se a partir da relação que o homem estabelece com textos em diferentes suportes” (RAMOS; FACHINETTO, 2006, p. 2). Os suportes foram se modificando, interferindo no processo de leitura, tornando-se tema de estudo. Afinal, cada suporte tem características peculiares, limitações e contribuições. Ao ler na tela, o sistema de percepção e de manejo é transformado, de modo que a revolução do texto eletrônico envolve três revoluções simultâneas: da técnica de produção dos textos, do suporte do escrito e das práticas de leitura (CHARTIER, 2002).

Os novos suportes tendem a exigir posturas distintas do leitor. Santaella (2004, 2014a, 2014b, 2014c) define quatro tipos principais de leitores, com habilidades perceptivas, sensório-motoras e cognitivas distintas. O contemplativo, que nasce no Renascimento, é o leitor da era do livro impresso e da imagem expositiva, fixa, no desenho, pintura, gravura, fotografia, e caracteriza-se por uma leitura silenciosa, individual e solitária; o movente, filho da Revolução Industrial, tem um ritmo de percepção e atenção adaptado à aceleração dos centros urbanos; é aquele que lê o mundo em movimento, dinâmico, mundo híbrido, de misturas sígnicas, da imagem em movimento, no cinema, televisão e vídeo.

O imersivo é o leitor da tela de desktops, notebooks, tablets e smartphones; e o ubíquo surge da mistura de característica de dois outros leitores – o movente com o imersivo (SANTAELLA, 2004, 2014a, 2014b). A partir do aparecimento das telas de tablets e, sobretudo smartphones, que permitem a leitura em qualquer lugar, onde estiverem, e em qualquer momento, inclusive durante o deslocamento desses leitores. O leitor das diferentes telas, imersivo e ubíquo (SANTAELLA, 2004, 2014a, 2014b) é precedido de outros leitores, pois, antes do surgimento desse suporte, utilizavam outros; entre eles, o leitor da imagem de jornal, de revistas; o leitor espectador da imagem em movimento e o leitor do texto escrito no papel (SANTAELLA, 2014a, 2014b). O aparecimento de um tipo de leitor, assim como a aparição de um suporte de leitura, não leva ao desaparecimento do outro; os quatro tipos, contemplativo, movente, imersivo e ubíquo coexistem, complementam-se e se completam (SANTAELLA, 2014a, 2014b). Dessa forma, o leitor imersivo e ubíquo lê por meio da tela de desktops, notebooks, tablets e smartphones, mas não abandona a leitura em outros suportes, em papel, por exemplo.

Enquanto Santaella categoriza os tipos de leitores, historicamente contextualizados, Cameira e Cardoso (2015, p. 15) propõem identificação provisória de tipos de leitores digitais: um leitor total e um leitor parcelar. Os pesquisadores descrevem o leitor total como o que lê desde mídias sociais, passando por e-books, e-mails e, explora as possibilidades das redes. O leitor parcelar, por sua vez, faz a leitura recorrente, mas restrita a um conjunto de publicações, quer dizer, não apresenta práticas de leitura combinadas. Os pesquisadores ainda chamam a atenção para uma tipificação a qual denominam de proto leitor que “por força de incipientes competências de literacia digital ou tecnológica se mostra alheado ou afastado das práticas de leitura acima discriminadas (somente fazendo uso pragmático do SMS ou do e-mail por exemplo). (CAMEIRA e CARDOSO, 2015, p. 16)

Por meio das telas, os leitores encontram e manipulam diversos tópicos de leitura; estes compõem o hipertexto, definido por Lévy (1996, p. 45), “como um espaço de percursos de leitura possíveis”, que:

[…] não exclui nem os sons nem as imagens […]. O hipertexto seria constituído de nós (os elementos informação, parágrafos, páginas, imagens, sequencias musicais etc.) e de ligações entre esses nós (referências, notas, indicadores, “botões” que efetuam a passagem de um nó a outro). (LÉVY, 1996, p. 44).

Os dados empíricos alertam que os estudantes têm dedicado bastante tempo para “ler”, mas, principalmente, para “assistir televisão, […] jogar no computador”, destaca Palavra-Cruzada. Em geral, eles assistem à TV diariamente (80%); e há uma diferença de 10% entre o número de daqueles que ficam no computador (desktop/notebook) diariamente (40%) e o número dos que leem todos os dias (30%), conforme Tabela 1.

Tabela 1 Quantas vezes por semana você? 

Assiste TV Fica no computador (desktop/notebook)
Todos os dias da semana 6 30% 16 80% 8 40%
Nenhum dia da semana 0 0% 0 0% 0 0%
1 vez por semana 0 0% 0 0% 0 0%
2 vezes por semana 2 10% 0 0% 2 10%
3 vezes por semana 3 15% 1 5% 5 25%
4 vezes por semana 7 35% 1 5% 2 10%
5 vezes por semana 2 10% 1 5% 3 15%
6 vezes por semana 0 0% 1 5% 0 0%
TOTAL 20 20 20

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

O tempo atribuído a essas atividades, 1 hora a 3 horas, é aproximado entre 35% assistir à TV e 30% ficar no computador (desktop/notebook); da mesma forma, quando é considerado como tempo da atividade, mais de 3 horas, 25% assistir à TV e ficar no computador (desktop/notebook). A maioria dos estudantes dedica menos tempo à leitura, 75% leem de meia hora a 1h30, conforme Tabela 2.

Tabela 2 Tempo (leitura/TV/computador) 

Assiste TV Fica no computador (desktop/notebook)
De meia hora a 1h30 15 75% 8 40% 9 45%
De 1h30 a 3 horas 3 15% 7 35% 6 30%
Mais de 3 horas 2 10% 5 25% 5 25%
TOTAL 20 20 20

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Assistir à TV, utilizar o desktop e notebook, principalmente, ler, são ações que podem ser realizadas com diferentes objetivos e frequência. A leitura, especialmente, não se inicia ou é exclusividade da escola, pois todos os participantes da pesquisa declararam que costumam ler, principalmente, em casa. Palavra-Cruzada revelou que também lê em “viagens, na casa dos amigos e nos lugares que frequenta” e Stop prefere ler em “lugar calmo, sem barulho”. Quanto à leitura da escola, os estudantes do 5º ano afirmaram que leem antes de iniciar a aula (9), durante a aula (13), durante o recreio (9) e após o término da aula (6). Eles leem em sala de aula (15), na biblioteca (15), no pátio (5), no laboratório de informática (1). Já a leitura realizada em casa é realizada à noite (19), de manhã (10) e à tarde (9). O local preferido para a leitura em casa é a sala (11), seguido do quarto (6), quando leem “antes de dormir”, revela Caçador, cozinha (4), pátio (1) e sacada (1). Os interlocutores preferem ler no quarto “porque não tem muito barulho”, é “um lugar calmo e com paz para ler”, “mais tranquilo”, destacam Gamão, Palavra-Cruzada e Cinco Marias; é “confortável, onde podem ler à vontade”, se “concentrar mais” e, “quando eu leio na cama, fico com sono e já durmo”, completam Tangram, Pega-Varetas e Caçador.

A preferência pelo quarto justifica-se “pois tem mais silêncio e na sala porque tem mais claridade”, revela Caça-Palavras. Ainda, para Palavra-Cruzada, na sala “posso estar cercada de pessoas que gosto, no caso, minha família”; quarto e sala “são locais calmos onde posso ler com mais facilidade, onde tenho uma leitura melhor”, garante Trilha. Memória avalia que a sala ou quarto é o “lugar calmo e adequado para […] ler e para […] estudo diário”, porque nesses locais é possível ficar “concentrado”, completa Dominó. A maioria entende que leitura pressupõe condições favoráveis, no caso, silêncio.

Apesar de o tempo diário dos estudantes dedicado à leitura ser inferior ao destinado para assistir TV e ficar no desktop/notebook, consideramos que, ao realizar, especialmente, esta última, eles também podem estar realizando diversas atividades, entre elas, ler. Diante da coexistência dos suportes de leitura, tanto a tela, principalmente, por meio dos aparelhos móveis, que oferece aos leitores os materiais verbais, visuais (imagens estáticas ou em movimento) e sonoros, os hipertextos (LÉVY, 1996), quanto o papel, que traz textos verbais e visuais (imagens estáticas), são portáteis; os leitores podem levá-los consigo.

Consequentemente, podem ter acesso aos registros de leitura, onde estiverem. A tela se diferencia do papel, porque na primeira o “lugar do texto e do leitor podem então estar separados” (CHARTIER, 1998, p. 119), já que o leitor pode acessar dados armazenados em diferentes sítios, por exemplo; textos e leitor não precisam necessariamente estar no mesmo espaço físico, como no suporte impresso. Ainda, em um único suporte, a tela, os leitores têm acesso há muitos e diferentes gêneros (notícias, receitas, contos, entre outros) e também, esses hipertextos (LÉVY, 1996) são apresentados em diferentes formatos, verbais, visuais e sonoros, como eram “tradicionalmente distribuídos entre objetos diferentes” (CHARTIER, 2002b, p. 23).

Embora o papel e a tela possam ser portáteis, Palavra-Cruzada assegura que o primeiro “posso sempre levar comigo, o computador não é sempre permitido nos lugares”; o papel é “mais fácil de levar de um lado para o outro”, “é mais fácil de carregar para ler em outros lugares”, reiteram Dominó e Caçador. Assim, os registros em papel podem ser lidos em “qualquer lugar”, diz Caça-Palavras, ao contrário dos disponíveis por meio das telas do desktop, notebook, tablet e smartphone, que, em alguns momentos, precisam estar conectados a energia elétrica, ou dependem de conexões, para que os leitores tenham acesso aos apontamentos de leitura.

Observamos também que os interlocutores preferem ler em papel (17) à tela (3). Eles expõem outras razões: “prefiro no modo tradicional, onde (sic) podemos pegar o livro, sem falar que, se você ler no computador, muitas vezes dá bastante dor de cabeça e dor nos olhos, e acho bem mais interessante quando folheamos o livro de verdade”, afirma Amarelinha; “pois gosto de fazer as coisas de antigamente” e “no monitor do computador eu me distraio muito”, enfatizam Pega-Varetas e Pontinho. Para Xadrez, em papel “é mais divertido e tem algumas figuras”.

A minoria que prefere ler em telas justifica por - “não ter que comprar os livros” e ser “muito mais prático, pois podemos ler de tudo em apenas um só lugar, o computador”, citam Gamão e Trilha. Deste modo, conforme os participantes, os diferentes suportes de leitura, papel ou tela, evidenciam características distintas, vantagens e desvantagens, se comparados. Entre os apontamentos de leitura que os estudantes podem acessar por meio das telas do desktop, notebook, tablet e smartphone, estão os disponíveis em sites. Palavra-Cruzada, Dominó e Caçador informam a preferência pelo suporte papel e Caça-Palavras manifestando predileção pela leitura a partir das telas do desktop, notebook, tablet e smartphone, indica a presença das categorias de leitores sugeridos por Santaella: o ubíquo (Palavra-Cruzada, Dominó e Caçador) e o imersivo (Caça-Palavras).

Xadrez explica que site é “um lugar onde há conhecimento, como se fosse um livro”; “alguma coisa que acessamos na Internet, que tem um tema e que pode nos informar de algo ou nos divertir com algo. Podemos gostar ou não”, define Palavra-Cruzada; mas é possível “navegar e olhar alguma coisa que nos agrade”, completa Amarelinha. Trilha destaca que “existem vários tipos de sites, alguns são de empresas, outros são lojas virtuais, de notícias, cada um transmite algo para as pessoas”, pois eles possuem diversos e distintos conteúdos. Além dos sites institucionais, comerciais e informativos, há os educacionais, governamentais e pessoais, cujo material é específico para determinado público.

Redes sociais alocadas em sites são acessadas pelos estudantes. Dominó conceitua tais sites como “um lugar em que poucas ou muitas pessoas estão conectadas ao mesmo tempo”, podendo compartilhar informações e, “em particular”, “conversar com os amigos”, utilizando os chats para a troca de mensagens, completam Caça-Palavras e Dorminhoco. A leitura está relacionada à troca de mensagens por meio do chat do site, embora apenas Dorminhoco tenha manifestado que uma das atividades realizadas no site é “ler”; ainda, a leitura é efetivada por Damas quando explora os sites de busca para “pesquisar o que precisa e saber das notícias novas” e por Caçador para “se informar das notícias do mundo” nos sites de revistas e jornais. As crianças também utilizam as telas e a Internet para “jogar”, por meio dos jogos digitais online “que nos fazem desafios e nos divertem”, declara Pega-Varetas.

Diante do número de usuários das telas neste segmento, especialmente da Internet, surgem os sites específicos para este público, denominados sites infantis. Questionamos se esses espaços atendem aos interesses do público visado. Neste sentido, segundo Pega-Varetas, o “site infantil é onde podemos navegar em coisas de crianças”, pois “são sites para crianças, têm jogos”, “desenhos”, “histórias, clipes infantis, brincadeiras e muita diversão”, complementam Trilha, Dominó e Caçador. Ainda, de acordo com Stop e Dorminhoco, é possível “ver filmes infantis” e “ler histórias”, pois alguns sites têm “desenhos animados”, “livro”, “minilivros para as crianças que aprenderam a ler há pouco tempo”, “vídeos, tirinhas de gibi para ler e muitas outras coisas”, completam Palavra-Cruzada, Sete Erros, Xadrez e Caça-Palavras, entre elas, passatempos para imprimir, histórias, charadas, adivinhas, animações, dicas de leitura e conteúdos escolares.

São oferecidos ao público infantil sites com temas dos personagens e de obras consagradas por estes leitores em outros suportes, livros em papel e desenhos animados da TV. Um exemplo são as personagens da obra de Monteiro Lobato, originalmente disponibilizados ao público por meio do papel e depois, transformados, adaptados à TV; agora, disponíveis em telas de desktops, notebooks, tablets, smartphones, quando eles navegam no site infantil “Sítio do Pica-pau Amarelo” ou “Mundo do sítio”. Os quadrinhos de Maurício de Souza, do mesmo modo, originalmente foram revelados ao público infantil por meio do papel, após por desenhos animados da TV, agora, também em tela, no site “Turma da Mônica”. Ainda, é possível que o primeiro contato realizado por alguns com as personagens da “Turma da Mônica” e “Sítio do Pica-pau Amarelo” tenha ocorrido por meio das telas e depois no suporte impresso.

Esses sites oferecem textos como narrativas, contos, histórias em quadrinhos, já conhecidos pelos leitores em outros suportes; ao mesmo tempo, proporcionam outros dados de leitura, que, além de verbal e visual, são também sonoros, tais como jogos digitais online e vídeos, por exemplo. Para Tangram, o site é considerado infantil também quando esse “não tenha nada impróprio, seja de um jeito infantil, de joguinhos e o que uma criança deve gostar”. Assim, ele veicula conteúdo ou “um tema proposto mais para crianças, mas nada impede que um adulto ou um adolescente navegue no site”, alerta Palavra-Cruzada.

No contexto dos dados apresentados, observamos que os estudantes combinam práticas de leitura, sendo o tempo dedicado à leitura em suporte papel inferior ao tempo para assistir TV e ficar no desktop/notebook. No entanto, os interlocutores informam que preferem ler em papel (17) à tela (3). Tais práticas indicam possibilidades no processo de constituição de um novo leitor, que transita entre diferentes suportes de leitura, que escolhe preferencialmente jogos online e sites com vídeos, que se apropria de uma prática de leitura muito particular que é a do hipertexto, evidenciando a categoria de leitor total proposta por Cameira e Cardoso (2015, p.15). Essa prática constitui também no modo de perceber a construção de conhecimento, que passa de um entendimento linear para a construção em rede.

SITES DE INTERESSE DOS ESTUDANTES DO 5º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Nesta seção, trazemos os sites que as crianças mais acessam. Contudo, alertamos que os dados levantados podem estar relacionados ao fato de a pesquisa ter sido realizada em ambiente escolar; e a investigadora ser uma profissional que atuava na escola.

A totalidade dos estudantes acessa sites, sobretudo por meio das telas dos desktops nas suas casas (20), seguido das telas do seu smartphone (16) e tablet (12). Os estudantes acessam o Facebook 15 (75%) e o site do Colégio X 18 (90%), sendo que a frequência diária e o tempo de permanência ao primeiro são maiores, conforme tabelas 3 e 4.

Tabela 3 Acesso ao Facebook e site do ColégioX 

Facebook Site do Colégio X
Todos os dias da semana 6 30% 0 0%
1 vez por semana 1 5% 11 55%
2 vezes por semana 0 0% 3 15%
3 vezes por semana 7 35% 4 20%
4 vezes por semana 0 0% 0 0%
5 vezes por semana 0 0% 0 0%
6 vezes por semana 1 5% 0 0%
Não acessam 5 25% 2 10%
TOTAL 20 20

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Tabela 4 Tempo de acesso ao Facebook e site do Colégio X 

Facebook Site do Colégio X
Menos de meia hora 4 20% 8 40%
De meia hora a 1h30 6 30% 7 35%
De 1h30 a 3 horas 0 0% 3 15%
Mais de 3 horas 5 25% 0 0%
Não acessam 5 25% 2 10%
TOTAL 20 20

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Enquanto a maioria acessa o site do Colégio X apenas uma vez por semana (55%), a entrada no Facebook é realizada, predominantemente, três vezes por semana (35%) e todos os dias (30%); sobretudo, com o usuário e senha do próprio estudante, 13 (65%) e 2 estudantes (10%) com usuário e senha da mãe, do pai, e primo(as). O acesso a esse ambiente, entretanto, é indicado para usuários que tenham a partir de 13 anos. Na declaração de direitos e responsabilidadesi do Facebook, está explícito o alerta de que, se o usuário for menor de 13 anos, não deve usá-lo.

Os estudantes têm utilizado o Facebook, principalmente, para aceitar os convites, adicionar e enviar mensagens somente de pessoas que conhecem (14) 70%; seguido de enviar solicitações de amizade, também, às pessoas que conhecem (13) 65%; ver páginas, informações, fotos, vídeos somente de pessoas que conhecem (12) 60%; publicar fotos (11) 55%; curtir vídeos publicados (10) 50%; compartilhar vídeos publicados (9) 45%; curtir fotos publicadas e comentar os vídeos publicados (8) 40%; comentar e compartilhar as fotos publicadas (7) 35%; publicar e digitar frases (6) 30%; publicar vídeos e curtir as frases publicadas (5) 25%; comentar e compartilhar as frases publicadas (3) 15% e ver páginas, informações, fotos, vídeos de pessoas que não conhecem (1) 5%. As crianças afirmaram que não enviam solicitações de amizade, não aceitam convites, não adicionam ou enviam mensagens às pessoas que não conhecem.

Concomitante a preocupação envolvendo os dados idade média dos alunos participantes da pesquisa e idade sugerida pela rede social, observamos que as redes sociais abrem as portas para massificação da leitura digital.

Esse fenômeno social cada vez mais significativo e penetrante que se baseia na rápida circulação dos mais variados tipos de texto (ao limite, é incontrolável onde vai parar o que se escreve, alvo de sucessivas partilhas ou redistribuições por diferentes grupos de internautas) permite assim levantar a hipótese de que as redes sociais abrem as portas para a massificação da leitura digital. (CAMEIRA e CARDOSO, 2015, p. 16)

Os participantes entram o site do Colégio X principalmente para ver as fotos da escola (13) 65%, ter acesso à área restrita (12) 60% e ler as notícias (9) 45%. Nesse espaço, conforme afirmam Amarelinha, Cinco Marias e Damas, “olho as minhas notas”, “vejo o boletim” e “as tarefas”.

Porém, além das atividades citadas, no Facebook e no acesso restrito do site do Colégio X, há diversos jogos digitais online, sendo este um dos principais interesses dos estudantes; Palavra-Cruzada acessa “os jogos para estudar”. Assim, eles têm utilizado o computador para realizar diversas atividades; a mais reiterada, quando questionados sobre aquelas que já fizeram usando o computador, é assistir a vídeos (19) 95%, seguido de jogar (17) 85% e escutar músicas (16) 80%, conforme Gráfico 1.

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Gráfico 1 Estudantes do 5º ano do EF – atividades usando o computador 

Embora as atividades sejam categorizadas, elas estão diretamente relacionadas. Enquanto assistem ou jogam, em telas de desktops, notebooks, tablets, smartphones, os estudantes não fazem um tipo de leitura? Para realizar todas as outras atividades mencionadas, especialmente, jogar, é necessário ler.

Diante da hipótese confirmada de que muitos estudantes utilizavam o Facebook, 75%, e por este não ser indicado para a faixa etária dos participantes da pesquisa, questionamos: sem contar o Facebook, qual é o seu site preferido, aquele que você mais acessa? Por que você prefere esse site? E que atividades você gosta de fazer nesse site?

Em geral, os participantes responderam ao questionário com informações sobre o nome do site, sem especificar o seu endereço; sete indicaram o endereço do site: cinco digitaram os endereços corretos e dois, os endereços aproximados. O fato de eles nem sempre saberem o endereço de seus sites preferidos e mais acessados, pode ser justificado: eles conseguem utilizar a estratégia de inserir o site na lista dos seus favoritos do navegador; também, são capazes de ter deixado o site preferido como página principal do seu navegador, não precisando digitar o endereço. Somente Buraco, não especificou o endereço, apenas mencionou que navegava no “site de pesquisa de animais”, provavelmente, por meio dos sites de busca.

Ao analisar as atividades realizadas por meio das telas do desktop, notebook, é possível prever quais são os seus sites preferidos. Revelaram que a atividade mais corrente é assistir a vídeos, referido por 19 estudantes (95%), seguido de jogar, citado por 17 (85%). Os sites mais buscados pelos participantes são aqueles que oferecem vídeos e jogos digitais online. Reunindo todos os sites citados, YouTube é o mais indicado; dos 20 participantes questionados, 12 responderam acessá-lo (10 meninos e duas meninas), conforme Gráfico 2.

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Gráfico 2 Sites acessados pelos estudantes do 5º ano do EF 

Esse é o preferido “porque lá tem vídeos engraçados e músicas”, permite “olhar vídeos, ouvir músicas e ver filmes”, anunciam Xadrez e Quebra-cabeça. Além disso, é possível “compartilhar vídeos e curtir vídeos” publicados por outras pessoas e “publicar vídeos” sobre qualquer assunto, completam Gamão e Xadrez. Esse “site mostra as novidades, tem de todos os gêneros, o que você pesquisar”, assegura Tangram, referindo-se à atualidade e à diversidade de conteúdo dos vídeos. Os interlocutores realizam todas as atividades possíveis nesse site, entre elas, a publicação de seus próprios vídeos. Para publicá-los, precisam ter criado uma conta.

Apesar de o YouTube ser o mais referido pelos participantes, a categoria dos sites mais acionados, citados por 19 vezes, são os relacionados a jogos digitais online, Gráfico 3, que oferecem jogos digitais online ou informações sobre determinado jogo.

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Gráfico 3 Categorias dos sites acessados pelos estudantes do 5º ano do EF 

Embora o emprego deste site esteja relacionado aos jogos digitais online, de expor diversos vídeos, músicas, canais infantis e jogos digitais online apropriados para crianças e adolescentes, nos termos, fica claro que a visitação e o uso do site não são indicados para aqueles com idade inferior a 18 anos.

Da mesma forma, o Instagram, segundo mais citado, exige que os usuários tenham, no mínimo, 13 anos, idade superior a idade dos sujeitos da pesquisa. Ele é favorito de Caça-Palavras, “pois você pode ter muitos seguidores e porque as pessoas curtem suas fotos”, é possível compartilhar, “ver fotos, comentar fotos, curtir fotos”, vídeos de sua autoria ou de outras “pessoas famosas e pessoas que você conhece”, conforme assegura Pega-Varetas. Ainda, não há unanimidade na preferência a um único site de jogos digitais online pelos estudantes, pois foram citados, por eles, 12 diferentes. Porém, mencionou-se mais vezes o Click Jogos, por cinco estudantes (três meninos e duas meninas).

Apesar de tentar usar uma categorização de acordo com o conteúdo predominante nos sites, é difícil classificá-los, pois eles veiculam diversos recursos e informações. Desse modo, embora o YouTube exiba, sobretudo vídeos, também oferece jogos digitais online; igualmente, os sites de TV expõem vídeos e jogos digitais online. Neste caso, o interesse dos estudantes por sites de outras categorias, tais como TV, vídeos e filmes, está diretamente relacionado à possibilidade de aproveitar os jogos digitais online dos sites dessas categorias.

Portanto, o interesse pelo site de vídeo do YouTube justifica-se também, porque “há vídeos nele de jogos”, como afirma Sete Erros. Da mesma forma, a busca pelos sites de canal de TV Globo e, principalmente, o Mundo Nick, além dos episódios, extensão da programação da TV, é usado “porque tem jogos muito legais e muita diversão”, conforme destaca Palavra-Cruzada, que o usufrui frequentemente.

A partir dos sites citados, como se alertou sobre o fato de os estudantes navegarem no Facebook, 15 estudantes navegam em ambientes com conteúdos para adolescentes e adultos, sendo que oito estudantes meninos preferem sites de vídeos e filmes (YouTube e Mega Filme) e um dos estudantes, site relacionado a esporte (FIFA), enquanto que seis estudantes meninas preferem os que tratam de entretenimento, jornalismo, notícias sobre programação da TV, rede social de fotos (Globo, Capricho, Mundo Nick, Instagram).

Os interlocutores não relacionam o ato de ler às atividades realizadas em telas do desktop, notebook, tablet e smartphone, pois, quando questionados sobre o que mais gostam de ler, evidenciaram que a leitura está diretamente vinculada a livros em papel.

A preferência por “livros infantis que falam coisas engraçadas e sobre a vida de crianças e/ou adolescentes”, declara Palavra-Cruzada. Oito estudantes referiram-se a livros da coleção “Diário de um Banana”, duas a “Diário de uma garota nada popular” e três a “Querido Diário Otário”. Apesar de os estudantes indicarem os livros do “Diário de um Banana” como leitura preferida, em nenhum momento do questionário eles mencionaram o acesso à página <http://www.diariodeumbanana.com.br/> como sendo uma das suas favoritas. Na página “Diário de um Banana”, os usuários podem também ler as histórias na tela.

Ainda, os participantes garantiram que realizam a leitura de outros materiais impressos, entre eles, revistas, jornais e gibis, conforme Tabela 5.

Tabela 5 O que você lê? 

Na escola Em casa
Livros 17 85% 19 95%
Gibis 15 75% 14 70%
Sites 1 5% 13 65%
Jornais 0 0% 3 15%
Revistas 2 10% 10 50%
Outro(a) 0 0% 0 0%

Fonte: Questionário da pesquisa “Ler e jogar ou jogar e ler? estratégias de leitura empregadas por estudantes do 5º ano do ensino fundamental ao jogar no click jogos”.

Sobre o tipo de livro, três estudantes citaram contos de fadas e três, os livros de aventura e suspense. Os estudantes leem, tanto em casa quanto na escola, 95% e 85%, mais livros impressos do que outros tipos de materiais. Os dados sobre a leitura de gibis em casa e na escola são próximos, 70% e 75%; enquanto que eles indicaram ler em casa muito mais sites, revistas e jornais, respectivamente, (13) 65%, (10) 50% e (3) 15%, do que na escola. Sites destinados aos jogos, predominantemente, são os eleitos por esse público, pois citaram 12 diferentes sites de jogos, e não os que oferecem histórias ou livros para leitura.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo objetivou discutir e problematizar a leitura na tela por estudantes do 5º ano do Ensino Fundamental. Como parte da problematização foi necessário tangenciar a temática sobre o atual leitor, em especial o leitor digital. O pensamento de Santaella (2014a, 2014b, 2015) e os estudos de Cameira e Cardoso (2015) possibilitaram chave de leitura para os dados obtidos, isto é, compreender as categorias de leitores, apresentados por Santaella - o contemplativo, o movente, o imersivo e o ubíquo – e, as características do leitor total e do leitor parcelar, propostas por Cameira e Cardoso (2015).

Os interlocutores dizem gostar de ler e consideram a leitura importante; são leitores infantis contemporâneos, que utilizam dois suportes de leitura: papel e tela. Para eles, os hipertextos exibidos na tela são desvendados antes, ou simultaneamente, aos impressos. Aqui, os dados da pesquisa indicam leitores ubíquos, os quais leem na tela de desktops, notebooks, tablets e smartphones e, concomitantemente, os alunos demonstraram não relacionar o ato de ler às atividades realizadas em telas, e evidenciaram que a leitura está diretamente vinculada ao impresso no papel, corroborando Santaella ao definir o leitor ubíquo.

Quanto ao hipertexto, como leitura preferida ao utilizar as telas, elegem o jogo digital. Os jogos digitais provocam a incerteza e representam um desafio aos leitores. Ler o texto dos jogos digitais implica desvendar o que não está posto explicitamente e lançar-se aos seus diferentes dados, agindo também fisicamente, pois os hipertextos, para se realizarem, devem ser acionados pelos leitores e dependem de escolhas desses sujeitos, que utilizam as mãos e os dedos para tomarem as suas decisões, do início ao fim do jogo, movimentando o cursor do mouse e clicando. Se os leitores não realizarem essa ação física, não conseguem ler e jogar. Os dados levantados pelo estudo e postos em relação com a provisória tipificação proposta por Cameira e Cardoso (2015) possibilita refletir sobre as competências para a leitura digital. As inferências dos alunos evidenciam traços do leitor total, pois leem desde mídias sociais, passando por sites com arquivos (páginas com conteúdo infantil) e exploram as possibilidades das redes, como aquelas dos jogos digitais.

Os jogos digitais são tratados como enunciados; jogar é uma forma de ler, pois, ao jogar por meio das telas, os estudantes vão além da decodificação de letras e palavras, ultrapassando práticas de leitura que privilegiam apenas a informação verbal impressa. Ainda, que os estudantes são mais do que usuários passivos, são leitores das telas, quando elegem os jogos digitais, pois se põem no texto, agindo e produzindo sentido, configurando faceta do leitor infantil contemporâneo. São leitores, todavia, que percorrem sites não recomendados para a sua idade, como redes sociais indicadas. O percentual de alunos usuários das redes (40%) corrobora o pensamento de Cameira e Cardoso (2015), quando atribuem a elas uma porta de acesso para a massificação da leitura digital.

Para ler e decifrar os hipertextos, compostos de elementos verbais (em Língua Portuguesa e Inglesa), visuais (imagens estáticas ou em movimento), sonoros e híbridos, que combine diferentes recursos, tais como os vídeos, utilizam estratégias de leitura e navegação: escaneiam a tela, navegam, buscam o seu alvo e se detêm nos seus registros de leitura; também selecionam, antecipam, inferem e controlam o que leem. Portanto, promover a leitura por meio dos jogos digitais ajuda na aquisição dessas competências leitoras.

A leitura por meio dos jogos digitais, em virtude do interesse dos estudantes sobre eles e da possibilidade de promoção da posição responsiva, pode ser importante para a formação de leitores; não privilegiando, conforme suas características, unicamente a leitura de enunciados verbais, mas também daqueles visuais (estáticos ou em movimento), sonoros e híbridos.

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Recebido: Setembro de 2020; Aceito: Outubro de 2021

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