INTRODUÇÃO
A dinâmica da migração - forçada ou voluntária - passou a sofrer importantes transformações no que diz respeito ao perfil do imigrante, devido às mudanças econômicas no atual cenário mundial. Muitos nativos precisam deixar seus países devido a problemas políticos, econômicos e ambientais.
As duas últimas décadas do século XX foram genericamente chamadas de “a era da migração”, com dinâmicas migratórias que remodelaram as sociedades e a política ao redor do globo” (CASTELLS; MILLER, 1993, p. 5). Mas é preciso advertir que essa expressão não está ligada a um aumento numérico de migrantes internacionais nesse ínterim. Na verdade, o apanágio desse período seriam as contradições da globalização capitalista relacionadas às representações sobre a mobilidade transnacional (GUIZARDI, 2019). De todo modo, a questão é que essa “era”, especialmente, a partir da segunda década do século XXI, teria dado lugar ao que Guizardi (2019) designa como a “era da crise migratória”. Conforme esclarece a autora, trata-se de uma mudança no imaginário global compartilhado sobre a migração: “a partir de um discurso que celebrou (muito contraditoriamente) mobilidade transfronteiriça e transnacional, para aquele que fala dela, abertamente, como um mal a ser perseguido e erradicado" (ibid, p. 579, tradução nossa).
Essa mudança seria decorrente - seguindo a análise de Guizardi (ibid), agora baseada em Fischer - pela radicalização do modelo neoliberal, pela ausência de paradigmas alternativos e pela negação de valores humanistas e perspectivas contra hegemônicas. Desse modo, para Wise (2016), não é possível analisar a migração contemporânea sem entender a investida, sem precedentes, do capital contra a classe trabalhadora. O autor entende que a migração em massa tem se apresentado como um deslocamento forçado, ou seja, como processo expulsão, que possui como apanágios a precarização do trabalho, os ataques sistemáticos aos direitos humanos e a criminalização dos imigrantes. Assim, ideias conservadoras, xenófobas e racistas começaram a se consolidar nas políticas de migração.
No Brasil, como em muitos outros países, uma onda ultraneoliberal ganhou fôlego nos últimos anos, aprofundando o processo de “revanche do capital contra o trabalho”1 (FIORI, 1996, p. 40). Com o Golpe de Estado de 2016 (JINKINGS; DORIA; CLETO, 2016), abriu-se espaço para se esfacelarem, vertiginosamente, os pactos sociais consagrados na Constituição de 1988 por meio das contrarreformas (COUTINHO, 2007), as quais, sob o pretexto da estabilidade econômica, atacaram frontalmente os direitos sociais, impactando, por suposto, na situação migratória (QUINTANILHA; SEGURADO, 2020).
Foi nesse contexto de graves retrocessos que foi aprovada a nova Lei de Migração (LDM), Lei n. 13.445/172, substituindo o Estatuto do Estrangeiro3 (Lei n. 6.815/80) (QUINTANILHA; SEGURADO, 2020). Desse modo, embora esse novo marco se fundamente em princípios atinentes aos direitos humanos (art. 3º), existem limites em seu texto que revelam a presença de um “paradigma do controle” (ibid, ibid). Os diversos vetos do então Presidente Michel Temer a dispositivos da LDM, por exemplo, incidiram sobre elementos centrais à garantia de direitos. Podem ser citados ainda outros limites desse documento, como a referência à necessidade de um regulamento para discipliná-lo - causando insegurança jurídica e possibilitando vasto poder ao Presidente da República no controle migratório, via Ministério da Justiça e Segurança Pública e Política Federal - e a definição de uma “participação lateral” da sociedade civil na política migratória (ibid, ibid).
Nos últimos anos, segundo dados do Observatório das Migrações Internacionais - OBMigra (CAVALCANTI; MACEDO, 2020), o número de imigração vem aumentando, de forma significativa, nas diferentes regiões do país. Nesse cenário, é preciso considerar que parte dos imigrantes é de refugiados4, incluindo crianças. De acordo com dados do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE, 2021), ao final de 2020, havia 57.099 pessoas refugiadas reconhecidas. No período de 2011 a 2020, o maior número de refugiados (reconhecidos) era da Venezuela (46.412), Síria (3.594) e Congo (1.050).
A rigor, os deslocamentos, de forma geral, têm sido marcados por uma situação de grande vulnerabilidade dos migrantes, que passam por precariedade de recursos, negação de direitos e consequente situação de injustiça e desigualdade (WOODWARD, 2007; GOLDBERG; MARTIN; SILVEIRA, 2015; MARTIN; GOLDBERG; SILVEIRA, 2018), indicando a fragilidade nas políticas públicas voltadas a esses sujeitos.
A respeito da imigração de famílias de outros países, é válido registrar a experiência vivenciada pela segunda autora deste artigo, como docente, na rede pública de Educação Infantil de Belo Horizonte - MG, com duas crianças (4 e 5 anos) imigrantes. Sem orientações prévias advindas do sistema de ensino, a educadora procurou informações junto às famílias sobre o tempo de chegada ao país, o percurso feito, a constituição familiar, dentre outras questões relevantes. Após um diálogo, em espanhol, com a responsável de uma das estudantes, a professora teve conhecimento de que se tratava de crianças venezuelanas, que chegaram, há cerca de dois anos, em Rondônia, onde permaneceram alguns meses, até migrarem para Belo Horizonte em 2021. Andando pelas redondezas da escola, a docente notou, ainda, famílias imigrantes em situação de mendicância. As reflexões advindas desses fatos e a percepção acerca de lacunas no campo de pesquisa sobre a educação de crianças imigrantes (de até 5 anos) despertaram o interesse pelo estudo do tema, interesse esse que foi compartilhado com as demais autoras do presente texto.
Destarte, a partir da ótica da reafirmação do direito à educação pública de qualidade socialmente referenciada para todos, o estudo em tela se volta ao tema Educação Infantil (primeira etapa da Educação Básica) de crianças imigrantes5 em solo brasileiro. O objetivo é mapear as produções científicas desenvolvidas sobre Educação Infantil e imigração, a fim de tentar compreender o que os pesquisadores e pesquisadoras têm evidenciado em seus estudos, tecendo, pois, estado do conhecimento, no período de 2010 a 2020, com base em repositórios de referência no âmbito acadêmico.
Este trabalho está estruturado em três partes: a primeira aborda a contextualização dos marcos legais vigentes relativos à Educação Infantil de crianças imigrantes; a segunda é destinada a descrever o percurso metodológico para construção do corpus do mapeamento das produções nacionais disponíveis; a terceira apresenta e analisa os dados obtidos. Por fim, são indicadas as considerações finais.
MARCOS LEGAIS E A EDUCAÇÃO INFANTIL DE CRIANÇAS DE FAMÍLIAS IMIGRANTES: UMA BREVE REFLEXÃO
A Constituição de 1988 define a educação como um “direito de todos e dever do Estado e da família [...]” (art. 205) e aponta como um dos seus princípios a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (art. 206, inciso) (BRASIL, 2022b, grifos nossos).
A Educação Infantil é estabelecida, de acordo com esse marco legal, como um dos deveres do Estado, devendo ser oferecida em creches (até 3 anos de idade) e pré-escolas (4 e 5 anos).
Quando promulgada, a Carta Magna definiu apenas o Ensino Fundamental como escolarização obrigatória. Contudo, em 2009, a Emenda Constitucional n. 59 tornou obrigatória e gratuita a educação dos quatro aos dezessete anos de idade.
Em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n. 8.069/90, endossou os princípios constitucionais e reafirmou a educação como um direito.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n. 9.394/96, por sua vez, fixou que a Educação Infantil tem como objetivo o desenvolvimento integral, “em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade” (BRASIL, 2022a).
A despeito de nenhum dos ordenamentos citados fazer referência à situação de crianças imigrantes, a educação, como se viu, é exarada como um direito de todos e tem como um dos seus princípios a igualdade de condições de acesso e permanência nas instituições de ensino. Além disso, o art. 5º da Constituição determina que
[t]odos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]” (BRASIL, 2022b, grifos nossos).
Em 2017, a LDM, a despeito de seus já aludidos limites (QUINTANILHA; SEGURADO, 2020), reafirmou o direito das crianças imigrantes à educação:
Art. 3º A política migratória brasileira rege-se pelos seguintes princípios e diretrizes:
[...] XI - acesso igualitário e livre do migrante a serviços, programas e benefícios sociais, bens públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia, serviço bancário e seguridade social;
[...] Art. 4º Ao migrante é garantida no território nacional, em condição de igualdade com os nacionais, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, bem como são assegurados:
[...] X - direito à educação pública, vedada a discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória;
[...] Art. 77. As políticas públicas para os emigrantes observarão os seguintes princípios e diretrizes:
[...] II - promoção de condições de vida digna, por meio, entre outros, da facilitação do registro consular e da prestação de serviços consulares relativos às áreas de educação, saúde, trabalho, previdência social e cultura (BRASIL, 2022, grifos nossos).
Três anos após a sanção da aludida lei, a Câmara de Educação Básica (CEB) do Conselho Nacional de Educação (CNE), aprovou a Resolução n. 1, de 13 de novembro de 2020, que dispôs “sobre o direito de matrícula de crianças e adolescentes migrantes, refugiados, apátridas e solicitantes de refúgio no sistema público de ensino brasileiro” (BRASIL, 2020). De acordo com o seu art. 2º, “[a] matrícula na etapa da educação infantil e no primeiro ano do ensino fundamental obedecerá apenas ao critério da idade da criança” (ibid, ibid).
Vê-se, assim, que, atualmente, há garantias legais concernentes ao direito de crianças de famílias de imigrantes à educação, em todos os níveis e modalidades. Faz-se necessário, portanto, que ações e políticas públicas sejam desenvolvidas para que, no cotidiano das escolas públicas, essas crianças sejam acolhidas e incluídas, considerando-se suas garantias constitucionais, origens, histórias, identidades e culturas. Nesse sentido, as pesquisas sobre essa temática se tornam fundamentais, pois podem identificar como vêm se dando o acesso e a permanência de crianças de famílias imigrantes nas unidades de ensino, oferecendo subsídios para (re)pensar as políticas públicas educacionais e o cotidiano escolar.
PERCURSO METODOLÓGICO
Para atingir o objetivo proposto, foi realizada uma pesquisa exploratória de abordagem qualitativa de tipo estado do conhecimento, mapeando trabalhos sobre a Educação Infantil de crianças imigrantes.
No intuito de conhecer o que tem sido produzido na comunidade científica sobre o tema a ser desenvolvido, a revisão de literatura é valiosa ferramenta para proporcionar ao pesquisador a identificação de lacunas nas pesquisas, bem como pontos em comum abordados ao longo de dado recorte temporal. Porém, vale ressaltar que, diferentemente dos estudos denominados estado da arte - que abrangem todo um campo do conhecimento - os estudos do “estado do conhecimento”, contemplam um determinado setor das publicações acerca do tema investigado (ROMANOWSKI; ENS, 2006), o qual, no presente artigo, foi o das teses e dissertações.
A revisão de literatura sobre as temáticas educação e imigração já foi feita por outras pesquisas, como em Silva e Braga (2019) - Tabela 1 e Braga (2019) - Tabela 2. Desse modo, parte do mapeamento aqui apresentado teve como base esses estudos. Contudo, considerando o escopo desta investigação, buscou-se localizar, nas pesquisas já mapeadas por esses autores, aqueles trabalhos que abordavam a educação na primeira infância.
Autor (a) | Título | Tipologia | Ano | Relação com a Pesquisa |
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MORAIS, Paulo Tadeu de. |
Fronteiras, idiomas e lousas: dilemas e perspectivas proporcionadas pela educação escolar a um grupo de imigrantes bolivianos instalado na grande São Paulo nas décadas 1990 e 2000. |
Tese | 2007 | A tese aborda os dilemas e perspectivas dos imigrantes bolivianos, sobretudo indocumentados e as dificuldades de inclusão nas escolas brasileiras. |
SILVEIRA JUNIOR, Mesac Roberto. . |
A travessia que mancha o corpo: imagens da imigração e a educação transitória |
Tese | 2008 | Pesquisa etnográfica realizada com imigrantes Bolivianos na cidade de São Paulo. Tem por objetivo reunir argumentos para defender a tese de que a educação é movimento, travessia e intercultura. |
WALDMAN, Tatiana Chang. |
O acesso à educação em São Paulo: a trajetória de um direito | Dissertação. | 2012 | Analisa o quadro normativo brasileiro referente ao acesso ao direito à educação escolar básica por parte de imigrantes que residem no Estado de São Paulo. |
FERNANDES, Valéria de Oliveira. |
A (re) construção de identidades de imigrantes na região de fronteira: um estudo a partir da Escola Árabe de Foz do Iguaçu | Dissertação | 2014 | O estudo compreende e analisa a Escola Árabe Brasileira enquanto um espaço de valorização e (re) construção de identidade da comunidade árabe em Foz do Iguaçu. |
GONÇALVES, Ana Lúcia Novais. |
Interculturalidade na educação brasileira: a inserção de bolivianos em escolas paulistanas | Dissertação | 2014 | Analisa a inserção de bolivianos nas escolas públicas paulistanas, bem como os olhares de gestores e professores para esse público, além de compreender as perspectivas destes imigrantes sobre a educação, o trabalho e as manifestações culturais. |
Autor (a) | Título | Tipologia | Ano | Relação com a Pesquisa |
ALVES, Magda. | A voz de estudantes bolivianos em uma escola pública da cidade de São Paulo. | Dissertação | 2015 | Realiza análise do discurso de alunos bolivianos de escolas públicas da zona leste de São Paulo, buscando compreender seus sentimentos, e manifestações de multiculturalismo por estarem em um país estrangeiro. Busca-se ainda, observar o contexto que esses estudantes estavam inseridos, analisado o tratamento dispensado pelos colegas no contexto escolar. |
MOLINARI, Simone Garbi Santana |
Imigração e alfabetização: alunos bolivianos no município de Guarulhos. | Dissertação. | 2016 | Investiga a escolarização e a alfabetização de crianças imigrantes bolivianas matriculadas em escolas de Guarulhos, município situado na Grande São Paulo, com foco no trabalho pedagógico realizados com crianças cuja língua materna não é o português. |
ROSA, Édina dos Santos. |
A inserção de alunos imigrantes africanos na rede estadual de ensino na cidade de São Paulo (2014 - 2016). | Dissertação | 2016 | Descreve e avalia como se estrutura a inserção dos alunos imigrantes no cotidiano escolar, identificando as relações que se estabelecem entre os alunos imigrantes africanos negros, os outros alunos, os professores, os gestores e os demais funcionários da escola, bem como as relações entre as culturas no ambiente escolar. |
SILVA, Janaína. | Relações interculturais no espaço escolar: estudo etnográfico de alunos bolivianos na rede pública de ensino paulistana. | Dissertação. | 2016 | Visa compreender como se dão as relações interculturais no ambiente escolar a partir da presença de estudantes bolivianos no ciclo de alfabetização de uma escola pública paulistana, tendo como fundamentação a educação intercultural, além das questões da teoria social relacionadas à alteridade e ao processo de construção da identidade. |
Fonte: Silva e Braga (2019, p. 67).
Ano | Nível | Título | Autor/a | Palavras-chave |
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2010 | Mestrado | Fronteiras do direito humano à educação: um estudo sobre os imigrantes bolivianos nas escolas públicas de São Paulo. | MAGALHÃES, Giovanna Modé |
1) Direito Humano à educação; 2) Imigrantes; 3) Bolivianos; 4) Migrações internacionais |
2012 | Mestrado | O acesso à educação escolar de imigrantes em São Paulo: a trajetória de um direito. |
WALDMAN, Tatiana Chang |
1) Conselhos de educação; 2) Direito à educação; 3) Estatuto dos estrangeiros; 4) Imigração; 5) Imigrantes |
2013 | Mestrado | Encontros e confrontos na escola: um estudo sobre as relações sociais entre alunos brasileiros e bolivianos em São Paulo. | OLIVEIRA, Lis Regia Pontedeiro |
1) Alunos bolivianos e brasileiros; 2) Discriminação; 3) Configurações; 4) Classificação e desclassificação |
2014 | Mestrado | ¡No hablamos español! Crianças bolivianas na educação infantil paulistana. | SILVA, Ana Paula |
1) Educação Infantil; 2) Migrações; 3) Crianças; 4) Bolivianos; 5) Segundas Gerações |
2016 | Mestrado | Jogo de espelhos: representações sociais de professores de língua portuguesa e de aprendizes bolivianos em contexto multicultural na rede pública de ensino. | LAZARE- GABRIEL, Ana Katy |
1) Aprendizes bolivianos; 2) Contexto multicultural; 3) Enfoque interculturalista; 4) Português língua estrangeira; 5) Representação social |
2017 | Mestrado | Construções pronominais e verbos existenciais: comparação da escrita de alunos bolivianos e descendentes de primeira geração com a de alunos brasileiros sem nenhuma ascendência hispânica. | ROBIM, Renie | 1) Bolívia; 2) Construções pronominais; 3) Estudos comparados entre espanhol e português brasileiro; 4) Imigração; 5) Verbos existenciais |
Fonte: Braga (2019, p. 5-6, grifos nossos).
Em seguida, buscando ampliar a busca em outros repositórios, assim como o período de revisão, o percurso metodológico explorou repositórios da Universidade de Minas Gerais (UEMG) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), além de recorrer ao Banco digital de Teses e Dissertações (BDTD), focando no período de 2010 a 2020. Inicialmente, as consultas foram feitas a partir de três descritores: “Educação Infantil” família e imigrantes/imigração. Notou-se que a inserção do descritor família não possibilitou a localização de nenhum trabalho. Assim sendo, em seguida, foram usados apenas os verbetes: “Educação Infantil” e imigrantes.
No Repositório Institucional da Universidade Estadual de Minas Gerais - RIUEMG, a busca pelos descritores localizou dois resultados: o catálogo da UEMG e um jornal de Arte e Design, materiais que, ao serem lidos na íntegra, foram descartados por não apresentarem relação com o tema pesquisado. O repositório do programa de pós-graduação da UEMG6 também não apresentou nenhuma dissertação que abordasse essas temáticas nas 147 produções disponíveis.
No repositório da UFMG, quatorze resultados foram encontrados, mas, dentro do recorte temporal especificado, não foi encontrada nenhuma dissertação ou tese que versasse sobre Educação Infantil e imigração, o que fez com que os resultados iniciais também fossem descartados.
No site da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), foram localizados, enfim, quatro trabalhos, apresentados na Tabela 3 e, em seguida, analisados.
N. | Autor(a) | Título | Ano | Tipologia | Estado |
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1 | SANTOS, Solange Estanislau dos. |
As crianças (in)visíveis nos discursos políticos da educação infantil: entre imagens e palavras. | 2014 | Tese | São Paulo |
2 | BERNIERI, Simone Raquel. |
Crenças e atitudes linguísticas em relação a línguas minoritárias: alemão em São Carlos/SC e italiano em Coronel Freitas/SC. |
2017 | Dissertação | Santa Catarina |
3 | SILVA, Naiara Siqueira. |
“Eu falo boliviano e brasileiro": a educação linguística de filhos de imigrantes bolivianos em uma instituição de educação infantil da rede pública do município de Carapicuíba, região metropolitana de São Paulo. | 2018 | Dissertação |
São Paulo |
4 | SANTOS, Priscila da Silva. |
Narrativas silenciosas: identidade e imigração na educação infantil. | 2018 | Tese | São Paulo |
Fonte: Tabela elaborada pelas autoras a partir dos dados da BDTD (2022).
Ao final, foi organizada uma tabela (n. 4) com todas as pesquisas presentes nas Tabelas 1, 2 e 3, no intuito de evidenciar aspectos básicos de uma pesquisa científica (MARCONI; LAKATOS, 1991): autores/títulos, objetivo(s) geral(is), problema(s) de pesquisa(s) e abordagem metodológica/estratégias. A análise dos dados procurou revelar regularidades e singularidades presentes nos trabalhos, salientando as lacunas existentes, as quais suscitam, por sua vez, novas investigações.
MAPEAMENTO DAS PESQUISAS SOBRE EDUCAÇÃO E IMIGRANTES
Perscrutando as pesquisas da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), que abordam as temáticas educação e imigração, no período de 2005 a 2019, Silva e Braga (2019, p. 67) elaboraram a seguinte tabela:
A leitura da Tabela 1 revela que além de serem poucos os estudos relacionados às temáticas educação e imigração - o que leva Silva e Braga (2019) a se referirem a um “silêncio bibliográfico” no campo -, nenhum deles trata, especificamente, das crianças imigrantes na Educação Infantil.
Os trabalhos contemplam os estudantes imigrantes matriculados nos anos iniciais do Ensino Fundamental e os profissionais que atuam nessa etapa.
Em Braga (2019), foi possível encontrar uma tabela relativa às dissertações sobre educação e imigração, elaborado a partir de uma investigação exploratória em repositórios de teses e dissertações de universidades paulistas de 2010 a 2019:
Aqui, novamente, percebem-se poucos trabalhos sobre educação e imigração e menos ainda concernentes à temática Educação Infantil de imigrantes. As crianças desse nível parecem estar (quase) invisibilizadas no cenário geral das pesquisas acadêmicas. Destaca-se aqui, porém, a dissertação de A. P. Silva (2014), que será acrescida à discussão a que se propõe este artigo, como fonte de pesquisa original e fundante.
A partir da revisão de literatura realizada buscando os descritores Educação Infantil e imigração na BDTD, de 2010 a 2020, somente quatro resultados foram encontrados, os quais foram organizados na Tabela 3:
As produções problematizam as seguintes subtemáticas: a invisibilidade de crianças (entre elas, imigrantes) na Educação Infantil (n. 1), questões linguísticas/bilinguismo infantil (n. 2 e n. 3) e identidade de imigrantes na Educação Infantil (n. 4).
A escassez de pesquisas no campo remete à conclusão de A. P. Silva (2014) a respeito da urgência do desenvolvimento de ações formativas que embasem as práticas educativas da educação de imigrantes. De acordo com Braga (2019, p. 13), é preciso se ter um olhar cuidadoso “sobre a presença imigrante na escola, pois, ainda que o fenômeno migratório potencialize o alargamento cultural, ainda se observam situações que negligenciam a humanidade desses estudantes”. Porém, como acenado, é “restrito o número de trabalhos em programas de pós-graduação sobre educação e migração, apesar de este se constituir uma grande área de pesquisa, muitas indagações sobre o tema ainda estão por ser respondidas” (SILVA; BRAGA, 2019, p. 72-73).
Com vistas a aprofundar a análise das dissertações e teses sobre a temática, foi construída a Tabela 4, com o corpus dos trabalhos elencados nas Tabelas 1, 2 e 3, perfazendo o total de dezoito resultados, já que um dos trabalhos (de autoria de Waldman, 2012) coincide nos mapeamentos apresentados nas duas primeiras tabelas. Para diferenciar os três mapeamentos, foram utilizados asteriscos da seguinte forma: (*) produções localizadas por Silva e Braga (2019), (**) produções localizadas por Braga (2019), (***) produção localizadas por Silva e Braga (2019) e Braga (2019) e (****) produções localizadas pelas autoras deste texto.
N. | Autor(a)/ Título | Objetivo(s) Geral(is) | Problema(s) de pesquisa | Abordagem metodológica/estratégias |
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1* | MORAIS, Paulo Tadeu de. Fronteiras, idiomas e lousas: dilemas e perspectivas proporcionadas pela educação escolar a um grupo de imigrantes bolivianos instalado na grande São Paulo nas décadas 1990 e 2000. |
- Construir um entendimento sobre os imigrantes bolivianos, principalmente aqueles que se encontram indocumentados; Identificar práticas cotidianas desses indivíduos que influenciadas pela educação escolar possuída, transformam e constroem seus espaços sociais; Compreender a importância da educação escolar por intermédio dos dilemas e perspectivas presentes na vida desses imigrantes. |
Não identificado. | História oral. |
2* | SILVEIRA JÚNIOR, Mesac Roberto. A travessia que mancha o corpo: imagens da imigração e a educação transitória. | - Apresentar resultado de uma pesquisa de campo realizada com imigrantes bolivianos em São Paulo; Relatar a experiência como imigrante do próprio autor, assim como analisar os registros imagéticos da imigração africana na Europa; Reunir argumentos para defender a tese de que a educação é movimento, travessia. |
Não identificado. | História de vida e análise de imagens, a partir de um estudo etnográfico. |
3*** | WALDMAN, Tatiana Chang. O acesso à educação em São Paulo: a trajetória de um direito. | - Identificar as limitações ao acesso ao direito à educação escolar básica por parte dos imigrantes que residem no Estado de São Paulo e refletir sobre a extensão desse direito universal a essa população específica no país, questão insuficientemente debatida e esclarecida no campo jurídico. | Não identificado. | Investigação bibliográfica interdisciplinar com análise jurisprudencial das três primeiras décadas de vigência do Estatuto do Estrangeiro (1980-2010). |
4* | FERNANDES, Valéria de Oliveira. A (re) construção de identidades de imigrantes na região de fronteira: um estudo a partir da Escola Árabe de Foz do Iguaçu. |
- Compreender e analisar a Escola Árabe Brasileira como um espaço de valorização e (re)construção de identidade da comunidade árabe em Foz do Iguaçu. | Não identificado. | Quatro perspectivas de geração de registros: bibliográfica, documental, fontes orais e observações de campo. |
5* | GONÇALVES, Ana Lúcia Novais. Interculturalidade na educação brasileira: a inserção de bolivianos em escolas paulistanas. |
- Analisar a interculturalidade na educação, a partir da inserção de bolivianos em escolas paulistanas, tendo como referências as propostas de Paulo Freire de uma educação como cultura. | - As escolas com maior número de bolivianos levam em conta a origem cultural desses alunos? Promovem uma educação intercultural? Como os bolivianos veem nossa educação? Valorizam suas culturas no novo contexto? |
Entrevista com 17 alunos bolivianos do Ensino Fundamental I e II. |
6* | ALVES, Magda. A voz de estudantes bolivianos em uma escola pública da cidade de São Paulo. | - Compreender, por meio da voz dos estudantes bolivianos, como se dá a sua inserção na escola brasileira - o seu pertencimento, a sua participação e a sua interação. | Não identificado. | Estudo de caso. |
7* | MOLINARI, Simone Garbi Santana. Imigração e |
- Verificar como se processa a alfabetização de crianças imigrantes bolivianas, sabendo que, muitas vezes, elas não | - Quais as orientações oficiais | Análise documental, revisão de literatura e entrevista |
alfabetização: alunos bolivianos no município de Guarulhos. | falam ou não compreendem a língua portuguesa. | - que possuem da rede de ensino para tratar dessa demanda? Quais as formas diferenciadas ou ações empreendidas pelas unidades escolares para inclusão de alunos imigrantes? Quais as manifestações dos professores e gestores a respeito da escolarização das crianças imigrantes? |
semiestruturada. | |
8* | ROSA, Édina dos Santos. A inserção de alunos imigrantes africanos na rede estadual de ensino na cidade de São Paulo (2014 - 2016). | - Identificar como ocorreu, entre 2014 e 2016, o processo de inserção dos alunos imigrantes africanos negros em uma escola estadual, apresentando os principais problemas, conflitos enfrentados e encaminhamentos. | - Como acontece o processo de inserção do aluno negro imigrante na escola selecionada? | Análise documental e diário de campo. |
9* | SILVA, Janaína. Relações interculturais no espaço escolar: estudo etnográfico de alunos bolivianos na rede pública de ensino paulistana. | - Compreender como se dão as relações interculturais no ambiente escolar a partir da presença de estudantes bolivianos no ciclo de alfabetização de uma escola pública paulistana, tendo como fundamentação os princípios da educação intercultural, além das questões da teoria social relacionadas à alteridade e ao processo de construção da | - Como se dá o processo de escolarização de estudantes imigrantes em uma escola pública | Estudo etnográfico com observação participante. |
identidade. | regular brasileira, principalmente no que tange às relações interculturais que ocorrem nesse ambiente e tendo como fundamentação os princípios da educação intercultural e da teoria social no que se refere à diversidade, interculturalidade e alteridade? |
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10** | MAGALHÃES, Giovanna Modé. Fronteiras do direito humano à educação: um estudo sobre os imigrantes bolivianos nas escolas públicas de São Paulo. | - Entender como está sendo realizado o direito humano à educação para os e as imigrantes da Bolívia que vivem em São Paulo. | Não identificado. | Amplo levantamento bibliográfico e normativo, com observação in loco, visitas de campo e entrevistas. |
11** | OLIVEIRA, Lis Regia Pontedeiro. Encontros e confrontos na escola: um estudo sobre as relações sociais entre alunos | - Investigar as relações entre alunos e alunas bolivianos e os nativos. | - Existiriam apenas relações conflituosas? Em que momentos e em quais situações |
Observação das relações estabelecidas entre alunos brasileiros e bolivianos em uma escola pública no município de São Paulo, as configurações |
brasileiros e bolivianos em São Paulo. |
- essas agressões ocorriam? Seria um fenômeno do mundo contemporâneo marcado pela violência generalizada ou os estudantes bolivianos seriam os alvos preferenciais dessas agressões? O que motivava essas agressões? Quais as explicações possíveis para esse fenômeno? |
intrínsecas à dinâmica das interações sociais entre estes dois grupos. | ||
12** | SILVA, Ana Paula. ¡No hablamos español! Crianças bolivianas na educação infantil paulistana. | - Investigar as formas de acolhimento e socialização oferecidas às crianças imigrantes bolivianas de segunda geração nas escolas de educação infantil da cidade de São Paulo. | - As crianças imigrantes bolivianas são atendidas com equidade? | Pesquisa bibliográfica e pesquisa etnográfica, por meio de entrevistas e observações. |
13** | LAZARE- GABRIEL, Ana Katy. Jogo de espelhos: representações sociais de professores de língua portuguesa e de aprendizes bolivianos em contexto multicultural na rede pública de ensino. |
- Acompanhar e compreender a relação do professor com sua atividade profissional diante das especificidades do ensino de português para aprendizes bolivianos, em contexto multicultural. | Não foi identificado. | Questionários e narrativas de professores polivalentes de Ciclo I, de professores de língua portuguesa de Ciclo II e de aprendizes bolivianos. |
14** | ROBIM, Renie. |
- Apresentar um estudo comparativo de produções textuais escritas por alunos bolivianos ou descendentes de primeira geração e por alunos brasileiros sem nenhuma ascendência hispânica. | - Em torno de quais construções que se encontram em variação no português brasileiro podemos localizar tendências que diferenciem, na escrita, os estudantes bolivianos ou filhos de bolivianos dos estudantes brasileiros que não têm contato com o espanhol no seu entorno familiar? | Técnicas de aplicação de testes, questionário, coleta de dados e observação sistemática. |
15 **** |
SANTOS, Solange Estanislau dos. |
- Problematizar as crianças “(in) visíveis” (crianças negras, indígenas, quilombolas, caiçaras, imigrantes, candomblecistas, homossexuais, transexuais etc.) nos discursos políticos da educação infantil, mais especificamente, nos documentos oficiais que determinam essa etapa da educação básica brasileira, publicados pelo MEC (Ministério da Educação) no período de 2006 a 2014. | - O conceito de infância se referia a todas as crianças? Essa história da infância europeia serve para falar das infâncias vividas no Brasil? Quais crianças estão sendo enquadradas nesse modelo e quais escapam? Por que os problemas sociais são ignorados pelas políticas educacionais quando se fala em aluno? Com a emergência dos estudos da Sociologia da Infância ocorreram mudanças na forma de ver e tratar a criança nas políticas educacionais? |
Investigação bibliográfica e documental, de abordagem qualitativa. |
16 **** |
BERNIERI, Simone Raquel. Crenças e atitudes linguísticas em relação a línguas minoritárias: alemão em São Carlos/SC e italiano em Coronel Freitas/SC. |
- Analisar crenças linguísticas de teuto-brasileiros em relação ao alemão, em São Carlos-SC, e de ítalo-brasileiros em relação ao italiano, em Coronel Freitas-SC. | Não foi identificado. | O instrumento de coleta de dados foi parte do questionário do projeto Atlas das Línguas em Contato na Fronteira- ALCF:OC. Além de oito informantes teuto-brasileiros (São Carlos) e oito ítalobrasileiros (Coronel Freitas), houve um grupo de informantes constituído de quatro docentes, com formação em pedagogia, e atuantes na educação infantil |
em Chapecó. Com este grupo, foram aplicadas cinco questões extraídas do questionário metalinguístico. | ||||
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SILVA, Naiara Siqueira. “Eu falo boliviano e brasileiro": a educação linguística de filhos de imigrantes bolivianos em uma instituição de educação infantil da rede pública do município de Carapicuíba, região metropolitana de São Paulo. |
- Investigar algumas das implicações da inserção de cinco crianças filhas de imigrantes bolivianos matriculadas no Pré II de uma escola da Rede Municipal de Carapicuíba, Região Oeste da Grande São Paulo | Não foi identificado. | Entrevistas semiestruturadas com os pais e as professoras das crianças; gravações em áudio de atividades com essas crianças através de “rodas de conversa” em sala de aula e observações, registradas em diário de campo, de atividades por elas desenvolvidas na escola. |
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SANTOS, Priscila da Silva. Narrativas silenciosas: identidade e imigração na educação infantil. | - Analisar como se dão os processos de hibridização identitária de crianças (bolivianas) em contexto de imigração na Educação Infantil. | Como se dão os processos de hibridização identitária de crianças em contexto de imigração? |
Diário de campo, fotografias, filmagens, entre outros materiais que se revelaram pertinentes à análise constituem o corpus da pesquisa. |
Fonte: Tabela elaborada pelas autoras a partir de Silva e Braga (2019), Braga (2019), dados da BDTD e de consulta à versão online a cada um dos trabalhos em seus respectivos repositórios.
A leitura das colunas destinadas aos objetivos e aos problemas de pesquisa indica que a maioria dos trabalhos (treze) teve como foco estudantes imigrantes bolivianos. Os demais abordam a educação de imigrantes de forma geral (n. 3 e n. 158), bem como a educação de árabes (n. 4), africanos negros (n. 8) e teuto-brasileiros e ítalo-brasileiros (n. 16). Tomando como referência apenas as cinco pesquisas que contemplam, especificamente, a situação de imigrantes na Educação Infantil (n. 12, n. 15, n. 16, n. 17 e n. 18), nota-se também que a maioria (três) foca nos estudantes imigrantes bolivianos. A esse respeito é válido registrar que, segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública (AGÊNCIA BRASIL, 2021), no Brasil, há cerca de 1,3 milhão de imigrantes e, na segunda década deste século, os maiores fluxos vieram da Venezuela, Haiti, Bolívia, Colômbia e Estados Unidos, sendo que o maior número de refugiados, como já aludido, é de venezuelanos, sírios e congoleses. Porém, pesquisas do tipo “estado do conhecimento” mostram que a maioria das teses e dissertações sobre a educação de imigrantes são originárias de São Paulo9, onde aumentou, nas últimas décadas, de forma considerável, o número de imigrantes bolivianos, o que poderia, a princípio, ajudar a entender a preponderância de sujeitos de pesquisa bolivianos. Todavia, considerando a extensão territorial brasileira, onde estariam as produções científicas originárias de outros estados brasileiros, em especial, os estados fronteiriços?
A incipiência de pesquisas sobre estudantes imigrantes de diversas nacionalidades revela a necessidade de investigações que abordem o tema, em especial a situação dos imigrantes refugiados, considerando a maior vulnerabilidade desses sujeitos em termos de garantias sociais, dentre elas, o direito à educação.
Quanto às subtemáticas abordadas, a partir da leitura dos objetivos, podem ser elencadas: (a) influência da educação no cotidiano de imigrantes (n. 1); (b) experiências, inserção e socialização de crianças imigrantes nas escolas (n. 2, n. 6, n. 8, n. 11, n. 12, n. 17 e n. 18); (c) acesso à educação de imigrantes como um direito (n. 1, n. 3 e n. 10); (d) construção identitária dos imigrantes e o contexto escolar (n. 4 e n. 18); (e) interculturalidade e educação de imigrantes (n. 5 e n. 9); (f) alfabetização de imigrantes (n. 7 e n. 9); (g) atuação docente em turmas com imigrantes (n. 13); (h) questões linguísticas/bilinguismo infantil na educação de imigrantes (n. 14 e n. 16); (i) (in)visibilidade de crianças imigrantes (e de outras identidades) em documentos oficiais (n. 15).
Especificamente nos trabalhos atinentes à Educação Infantil, identificou-se as subtemáticas “b” (n. 12, n. 17 e n. 18), “h” (n. 16), “i” (n. 15). Nenhum desses estudos tratou, em específico, do acesso à Educação Infantil. Considerando o contexto de grande iniquidade na situação imigratória e, portanto, de negação de direitos, entende-se que é fundamental o desenvolvimento de pesquisas que contemplem a problemática do acesso a esse nível de ensino (e aos demais, certamente), sobretudo, quando se pensa na situação educacional dos sujeitos indocumentados - item debatido, com acuidade, nos trabalhos n. 1, n. 3 e n. 10. Além disso, diversas outras subtemáticas ainda carecem ser contempladas em estudos envolvendo a Educação Infantil de crianças imigrantes, tais como: políticas públicas, relação família-escola, gestão escolar, projeto político-pedagógico, currículo, práticas pedagógicas, brincadeiras de acordo com as diversas culturas, afetividade, letramento, entre outras.
No que tange à metodologia, predominou a pesquisa de abordagem qualitativa, com investigação de campo (podendo ou não ser acompanhada de estudo documental). Nos trabalhos que trataram da Educação Infantil, as análises sobre o cotidiano escolar dos imigrantes foram feitas a partir de entrevistas (n. 12, n. 17), observação (n. 12, n. 17, n. 18) e questionário (n. 16). Apenas duas pesquisas foram (exclusivamente) documentais - n. 3 e n. 15. A primeira, de autoria de Waldman (2012), versou, em particular, sobre a jurisprudência relativa ao direito à educação básica de imigrantes nas três primeiras décadas de vigência do Estatuto do Estrangeiro (1980-2010) - o qual foi substituído, em 2017, como se viu, pela nova LDM. A segunda, realizada por Santos (2014), debruçou-se sobre os documentos oficiais que tratam da Educação Infantil. Vê-se, pois, a necessidade de ampliação de estudos documentais sobre imigrantes, nesse nível de ensino (e nos demais), que tenham como objeto de análise, por exemplo, ordenamentos jurídicos, planos educacionais e currículos escolares.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema educação de crianças imigrantes vem emergindo como uma temática relevante nas pesquisas, não apenas pelo seu crescimento, mas, como vimos, pela complexidade que envolve o processo migratório, marcado, em geral, por grandes iniquidades - agravadas no Brasil, sobretudo, após o Golpe de Estado de 2016, a partir do qual direitos sociais vêm sendo frontalmente atacados, com sérios impactos na questão migratória (QUINTANILHA; SEGURADO, 2020).
Porém, como o artigo apresenta, ainda é muito incipiente o campo de pesquisas sobre a temática em tela e os trabalhos existentes parecem se concentrar nas regiões sul e sudeste, não contemplando, assim, importantes estados localizados em regiões fronteiriças.
As lacunas parecem ser ainda maiores quando se considera a educação de crianças imigrantes na primeira infância. Como apontado, não foram encontradas pesquisas que contemplassem as temáticas: família, Educação Infantil e migração. Considerando que a família é responsável pela matrícula e a entendendo como primeiro espaço das interações da criança (BOLÍVAR, 2006), pensa-se aqui na necessidade de estudos que versem sobre a questão.
Em que pese os objetivos, percebeu-se um vasto leque de subtemáticas ainda a ser investigado. Em relação às metodologias utilizadas, é necessário ampliar e aprofundar os enfoques das pesquisas de campo, assim como ampliar a investigação documental e seus objetos de análise. E aqui se indica, também, a relevância de pesquisas do tipo estado da arte, as quais, abarcando diferentes tipos de produções acadêmicas (ROMANOWSKI; ENS, 2006), possam apreender melhor o conteúdo dos estudos que vêm sendo realizados.
A leitura do conteúdo das investigações denota, entre outros aspectos, que não há registros de que o país tenha possibilitado a cultura de aprender a língua dos países vizinhos, ou ainda, de outros países de origem dos imigrantes que atualmente residem no Brasil. Ao contrário, a Lei n. 13.415/17 alterou a LDB definindo que a língua estrangeira a ser ensinada a partir do sexto ano do Ensino Fundamental e no Ensino Médio é o inglês, sendo o ensino de outras línguas (como o espanhol) optativo - fato esse preocupante, considerando os dados encontrados sobre a diversidade de país de origem no movimento migratório.
Esperamos que a leitura deste artigo possa contribuir para fomentar o debate na área e a consequente produção de artigos, monografias, dissertações e/ou teses, que tenham como baliza a premissa da educação como um direito de todos, uma educação acolhedora e que respeite as diferenças.