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Revista Teias

versão impressa ISSN 1518-5370versão On-line ISSN 1982-0305

Revista Teias vol.23 no.70 Rio de Janeiro jul./aet 2022  Epub 23-Fev-2023

https://doi.org/10.12957/teias.2022.67455 

História de mulheres e educação: transgressões, resistências e empoderamentos

TRAJETÓRIA DE MULHERES GESTORAS UNIVERSITÁRIAS DE IBEROAMERICA: um ensaio sobre a Espanha

TRAJECTORY OF WOMEN UNIVERSITY MANAGERS IN IBEROAMERICA: an essay about Spain

TRAYECTORIA DE LAS MUJERES DIRECTIVAS UNIVERSITARIAS EN IBEROAMÉRICA: un ensayo sobre España

Ángel Baldomero Espina Barrio1 
http://orcid.org/0000-0003-0212-3701; lattes: 8992257174669061

Marlene de Oliveira2 
http://orcid.org/0000-0002-3988-8196; lattes: 9328359774152146

1USAL – Universidade de Salamanca E-mail: espina@usal.es

2IFPR – Instituto Federal do Paraná E-mail: marlene.oliveira@ifpr.edu.br


Resumo

Este ensaio é parte integrante do projeto de tese de doutorado em história da educação e apresenta o resultado do doutorado sanduíche realizado na USAL – Universidade de Salamanca, Espanha. (2021-2022) com a realização de entrevistas com docentes universitárias, que ocupam ou ocuparam cargos de gestão no período de 2010 a 2020 especificamente. O objeto de estudo Mulheres Gestoras Universitárias de Ibero-América pretende conhecer a trajetória de mulheres em cinco países: Brasil, Argentina, Espanha, México e Peru. Para este ensaio, o recorte foi realizado a partir do estudo elaborado no doutorado sanduíche em Salamanca, Espanha, com a aplicação de entrevistas a sete gestoras universitárias. Pretende-se como problema de pesquisa conhecer: como tem sido a trajetória de mulheres gestoras universitárias de Ibero-América de Espanha, no período de 2010 a 2020? A concepção teórica é baseada em Bourdieu (1996), que define a trajetória social como o movimento dentro de um campo de possíveis definido estruturalmente. O aporte metodológico é o da pesquisa qualitativa com narrativa oral, baseada em categorias segundo Bardin (2016). O tratamento desses dados foi realizado através das TICs (Tecnologia de Informação e Comunicação), com a utilização do software IRAMUTEQ. Observamos que as mulheres gestoras universitárias possuem alta capacitação e que, apesar de estarem em um número equilibrado em relação aos homens, os altos cargos de gestão continuam a ser ocupados por homens.

Palavras-chave: trajetória; mulheres; gestão universitária; Ibero-América; IRAMUTEQ

Abstract

This essay is part of the project of a doctoral thesis in History of Education and presents the results of the sandwich doctorate conducted at USAL - University of Salamanca, Spain (2021-2022). Interviews were carried out with female university professors, who occupy or have occupied management positions from 2010 to 2020 specifically. The object of study Women University Managers of Ibero-America intends to get to know the trajectory of women in five countries: Brazil, Argentina, Spain, Mexico, and Peru. For this essay, the framing was made from the study carried out during the sandwich doctorate in Salamanca, Spain, with the application of interviews with seven female university managers. The research problem intends to know: How has the trajectory of women university managers in Ibero-America of Spain, from 2010 to 2020, been? The theoretical conception is based on Bourdieu (1996), who defines the social trajectory as the movement within a field of possible, structurally defined. The methodological contribution is that of qualitative research with oral narrative, based on categories, according to Bardin (2016). The treatment of these data was performed through the TICs (Information and Communication Technology), with the use of IRAMUTEQ software. We observe that female university managers are highly qualified and that, although they are in a balanced number in relation to men, the top management positions are still occupied by men.

Keywords: trajectory; women; university management; Ibero-America; IRAMUTEQ

Resumen

Este ensayo forma parte del proyecto de tesis doctoral en historia de la educación y presenta el resultado del doctorado sándwich realizado en la USAL - Universidad de Salamanca, España (2021-2022), con la realización de entrevistas a profesoras universitarias que ocupan o han ocupado puestos de dirección en el periodo comprendido entre 2010 y 2020 concretamente. El objeto de estudio Mujeres Directivas Universitarias de Iberoamérica pretende conocer la trayectoria de las mujeres en cinco países: Brasil, Argentina, España, México y Perú. Para este ensayo, se ha hecho un recorte del estudio realizado en el doctorado en alternancia de Salamanca, España, con la aplicación de entrevistas a siete directivos universitarios. Se trata de un problema de investigación para conocer: ¿Cómo ha sido la trayectoria de las mujeres directivas universitarias en Iberoamérica de España, en el periodo de 2010 a 2020? La concepción teórica se basa en Bourdieu (1996), que define la trayectoria social como el movimiento dentro de un campo de posibles, estructuralmente definido. El aporte metodológico es el de una investigación cualitativa con narrativa oral, basada en categorías según Bardin (2016). El tratamiento de estos datos se realizó a través de las TICs (Tecnologías de la Información y la Comunicación), con el uso del software IRAMUTEQ. Hemos observado que las mujeres directivas universitarias están altamente cualificadas por su formación académica y, a pesar de estar en un número equilibrado en relación con los hombres, los puestos de alta dirección siguen siendo ocupados por hombres.

Palavras chave: trayectoria; mujeres; gestión universitaria; Iberoamérica; IRAMUTEQ

INTRODUÇÃO

Este ensaio é parte integrante do projeto de tese de doutorado em história da educação e apresenta o resultado do doutorado sanduíche realizado na USAL – Universidade de Salamanca, Espanha (2021-2022), com a realização de entrevistas com docentes universitárias, que ocupam ou ocuparam cargos de gestão no período de 2010 a 2020 especificamente.

O objeto de estudo Mulheres Gestoras Universitárias de Ibero-América1 pretende conhecer a trajetória de mulheres em cinco países: Brasil, Argentina, Espanha, México e Peru. Para este ensaio, o recorte foi realizado a partir do estudo elaborado no doutorado sanduíche em Salamanca, Espanha, com a aplicação de entrevistas a sete gestoras universitárias. Este ensaio se situa no âmbito da História da Educação, com abordagem da nova História Cultural (CHARTIER, 2002).

O aporte metodológico é o da pesquisa qualitativa com narrativa oral, baseada em categorias que segundo Bardin (2016, p. 4), são elementos de um “conjunto por diferenciação ou agrupamento e podem ser temáticas sob um título em razão das características do que se pretende pesquisar." Pretende-se como problema de pesquisa conhecer: como tem sido a trajetória de Mulheres Gestoras Universitárias da Ibero-América, especificamente na Espanha, no período de 2010 a 2020?

A MULHER GESTORA UNIVERSITÁRIA NA ESPANHA

A educação feminina é um acontecimento muito recente na História da Educação. O século XIX, em meio às transformações decorrentes desse tempo histórico, sobretudo a industrialização e a urbanização presentes na Europa e nos Estadas Unidos, permeia ideias civilizadoras fomentadas por grupos sociais que idealizavam a educação e a religião como estratégias nas relações de poder.Constatamos, no seio de congregações religiosas, que as mulheres exerceram funções gestoras na condução de estabelecimentos educativos femininos ao longo de séculos. Por exemplo, a gestão de escolas primárias foi uma tarefa exclusivamente gerida por mulheres durante muito tempo.

A partir do século XIX, as mulheres migraram tanto quanto os homens, devido ao mercado de trabalho. Enquanto as de classes simples tinham a liberdade de circular pelas ruas, mercados e lavanderias, as de classe social elevada somente podiam frequentar salões de chá, magazines e igrejas como locais de sociabilidade, buscando a construção dessa representatividade feminina através de atividades sociais.

Em contrapartida, a atividade docente no Brasil, como em muitas outras sociedades, havia sido iniciada por homens em nosso país, por religiosos, especialmente jesuítas, no período compreendido entre 1549 e 1759.Ao serem criadas as Escolas Normais2, a pretensão era formar professores e professoras que pudessem atender a um esperado aumento na demanda escolar.Na Ibero-América, o acesso às instituições de ensino superior publicas dá-se pelo concurso público, e muitas mulheres em diversos países procuram pela oportunidade de estudar. Podemos ressaltar que:

Históricamente las mujeres estuvieron excluidas de los centros de producción del conocimiento, lo que, además de dejar fuera la experiencia femenina de la producción de conocimiento y del conocimiento mismo, produce y reproduce lógicas y prácticas que enmarcan la participación de los sujetos en la institución. El espacio de generación de conocimiento, es un espacio donde cotidianamente se vive una lucha simbólica por el reconocimiento y valía definida en términos masculinos. (CASTAÑEDA-RENTERÍA, 2019, p. 62).

Mesmo tendo muitas mulheres nos cursos superiores, as instituições de ensino superior reproduzem as condições patriarcais de estruturas e oportunidades. Comenta-se que há uma ausência de dados e indicadores sobre a proporção das mulheres que são investigadas e uma monitoração da sua contribuição para a produção do conhecimento e da ciência. Dessa forma, diminui-se a capacidade de comparabilidade na região Ibero-Americana. A I Conferência Ibero-Americana sobre Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, realizada em junho de 2018 em Salamanca, Espanha, defendeu que é necessário eliminar a desigualdade de gênero no mundo para cumprir os objetivos da agenda 2030: “[...] para além do argumento ético a favor da igualdade de género ou das abundantes evidências empíricas sobre o custo da desigualdade, permitam-me salientar o argumento aritmético a favor do empoderamento das mulheres.” (CARVALHO, 2018, p. 10).

Na perspectiva histórica para as mulheres na Espanha, um evento importante foi a instauração da República, em 14 de abril de 1931, que trouxe grandes consequências, como a implementação do direito ao voto feminino. Anteriormente, além da falta de tal direito, as mulheres enfrentavam a inexistência de outros direitos voltados para elas e o alto índice de analfabetismo.

Os novos governantes, mesmo que provisórios, instauraram a separação entre Igreja e Estado, intencionando reparar as injustiças da monarquia e emitindo uma série de decretos em relação às condições das mulheres, com o reconhecimento do casamento civil e do divórcio. Destacam-se as mulheres que foram admitidas no tribunal de Madrid, com a vitória de Clara Campoamor,3sobre a reivindicação do direito à igualdade. Infelizmente, o golpe de 1936 contra a República relega as mulheres da Espanha ao quarto dos filhos, exclusivamente, considerado o seu lugar na sociedade espanhola.

Em 1936, através de decreto, a escola mista é suprimida. Em março de 1938, ocorre a libertação da mulher casada da oficina de trabalho, através de incentivos à maternidade por meio de prêmios, juntamente à interdição das profissões liberais. Revoga-se também a lei do casamento civil e do divórcio, e insere-se inscrições penais para o aborto e o adultério, com pesadas penas para a mulher. (BUSSY 4,1991).

O retorno do ensino à Igreja torna-se obrigatório, com a diferenciação por sexo, bem como temas referentes ao dogma e à moral católica. Além disso, exigia-se a permanência das mulheres na casa paterna até os vinte e cinco anos ou até o casamento ou a entrada para o convento, uma vez que a maioridade foi elevada através do Código Civil.

As mulheres espanholas percorreram um longo caminho em anos de sua história, que se caracterizou pela redescoberta, em virtude das dificuldades para a pesquisa e da dissimulação e reconstrução constantes de seu legado. Com a promulgação da Constituição de 1978, as feministas, já organizadas, reatam, o fio de suas experiências após quarenta anos, continuando na busca pelos seus direitos não completamente sanados, mas já tendo percorrido uma grande parte do caminho. Na época, as mulheres de direita atuavam como deputadas, engenheiras e professoras primárias. Huerta (2020, p. 15) menciona que:

La profesión docente es una de las más feminizadas, porque la enseñanza ha tenido para las mujeres un tradicional enclave laboral. Las tareas educativas de la escuela han supuesto un espacio de trabajo para las mujeres durante generaciones. La evolución del papel de las docentes está en relación con los comportamientos sociales, familiares y personales, pero han de ser ellas quienes promuevan los cambios decisivos, investigando sus propias narrativas.

De docentes a gestoras, outro longo caminho está sendo percorrido atualmente. Em vista disso, é fundamental que se invista na capacidade estatística nacional de cada país com o objetivo de melhorar a cobertura, qualidade e periodicidade dos dados sobre a questão da mulher, principalmente sobre o acesso ao ensino superior e a cargos de gestão. Além disso, é necessário que a pesquisa sobre este tema seja incentivada.

O ensaio com gestoras da universidade de Salamanca – USAL

Este ensaio deu-se através da pesquisa com sete5 mulheres gestoras universitárias, com o levantamento do perfil profissiográfico6 em um primeiro momento, e posterior entrevista pessoal sobre a sua trajetória de vida pessoal e acadêmica. Essas mulheres, para participarem do processo, deveriam exercer ou ter exercido cargo de gestão universitária no período de 2010 a 2020.

As entrevistas seguiram todo o procedimento recomendado e aprovado pelo Comitê de Ética, com o cumprimento dos protocolos de segurança e biodiversidade, em virtude da situação da pandemia de COVID-19. As entrevistas semiestruturadas e abertas à narrativa oral receberam a análise de conteúdo sob a ótica de Bardin (2016), que tem como objetivo compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou ocultas.

Este ensaio se situa no âmbito da História da Educação, com abordagem da nova História Cultural. Para Chartier (2002, p. 16), a História Cultural7, “[...] tem por principal objeto identificar o modo como em diferentes lugares e que momentos uma determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler”. A História Cultural8 nessa investigação é dada a pensar no tempo contemporâneo caracterizado por aspectos de trajetórias de mulheres gestoras, protagonistas de histórias vividas marcando um tempo por um tipo de atuação feminina e suas peculiaridades.

Para Bourdieu (1996), as experiências de vida dos sujeitos, através da sua trajetória, não ocorrem no vácuo, mas são incrustadas em estruturas sociais. O aporte metodológico é o da pesquisa qualitativa e das narrativas orais de História de Vida que Perazzo (2015, p. 123) descreve como:

[...] cada sujeito, ao narrar sua trajetória de vida, se revela uma testemunha e um artífice da história. Essas narrativas orais não são menos verdadeiras,nem menos ficcionais do que muitas histórias oficiais. Não se busca a verdade, já que cada sujeito narra a partir de sua subjetividade, uma vez que cada um vê o objeto a partir do seu lugar no mundo e constrói sua narrativa de forma seletiva, marcando sua trajetória de acordo com sua concepção de mundo e sua percepção de si mesmo.

Em vista disso, as narrativas orais de cada gestora entrevistada, além de marcar a sua trajetória e seu olhar diante do que já está estabelecido nesse campo, trazem as evidências de resistência contra as relações de poder.

Coleta e tratamento dos dados

As entrevistas de sete gestoras universitárias da Espanha foram gravadas, através da plataforma do Google Meet, mediante consentimento autorizado, com duração de 30 minutos, mantido o sigilo da identificação, utilizando somente os dados relevantes para a realização da pesquisa, não sendo necessária a identificação do entrevistado. Nelas, foi feita a seguinte pergunta qualitativa: Trayectoria de vida. Cómo llegó a ser gerente, trayectoria personal y profesional, estudios y actividades realizadas. (Narrar cómo inició su carrera en la universidad, éxitos y fracasos. Etapas vencidas),

Após o levantamento do perfil profissiográfico, foi realizada a entrevista qualitativa através da narrativa oral, pois “[...] cada sujeito, ao narrar sua trajetória de vida, se revela uma testemunha e um artífice da história. Essas narrativas orais não são menos verdadeiras, nem menos ficcionais do que muitas histórias oficiais” (PERAZZO, 2015, p. 123). O tratamento desses dados foi realizado através das TICs (Tecnologia de Informação e Comunicação), nas quais, segundo Bardin (2011), o computador apresenta a ferramenta tecnológica para análise profunda dos dados, pois é capaz de realizar tarefas que o ser humano, algumas vezes, não consegue esgotar.

A análise de conteúdo, segundo a autora, compõe-se das etapas: 1) pré-análise; 2) exploração do material; 3) tratamento dos resultados, as inferências e interpretação. Dentro desta análise, optou-se pela categorização que conforme Bardin (2010, p. 145):

É uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com os critérios previamente definidos. As categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos (unidades de registro, no caso da análise de conteúdo) sob um título genérico, agrupamento esse efetuado em razão das características comuns destes elementos.

O software utilizado para o tratamento desses dados foi o IRAMUTEQ, que de acordo com Camargo e Justo (2013), foi desenvolvido por Pierre Ratinaud (2009) e configura-se como um programa gratuito que oferece inúmeras análises estatísticas sobre corpus textuais, podendo trazer muitas contribuições aos estudos em Ciências Humanas e Sociais, as quais têm o conteúdo simbólico proveniente dos materiais textuais como uma fonte importante de dados de pesquisa.

Neste caso, além de realizarmos a leitura e tratamento dos dados manualmente, utilizamos o software IRAMUTEQ, com o método da Classificação Hierárquica Descendente (CHD), o qual classifica os segmentos de texto em função dos seus respectivos vocabulários, e o conjunto deles é repartido com base na frequência das formas reduzidas (palavras já lematizadas). Aplicamos nas narrativas orais das entrevistas a Classificação Hierárquica Descendente (CHD), para o reconhecimento do dendrograma com classes emergentes, no qual quanto maior o χ², mais associada está a palavra com a classe, e desconsiderando as palavras com χ² < 3,80 (p < 0,05). O corpus foi constituído por 7 textos, separados em 1.150 segmentos de texto (ST), com aproveitamento de 765 ST (87,50%).

Emergiram 3.640 ocorrências (palavras, formas ou vocábulos), sendo 100 palavras distintas e 7 com uma única ocorrência. O conteúdo analisado foi categorizado em seis classes conforme nos apresenta o dendrograma.

Fonte: Elaborado pela autora, com utilização do software IRAMUTEQ, 2022.

Figura1 Dendrograma de Classes – CHD 

Entre as categorias elencadas, analisaremos a da classe 2 que aborda o acesso ao cargo de gestão universitária.

O acesso à gestão universitária

A classe 2, Acesso à gestão, representa 19,75% (dezenove e setenta e cinco por cento), (f = 209 ST) do corpus total analisado com 50 ST. Esta classe apresenta as palavras “poder” seis vezes, “professor” quatorze vezes, “investigador” sete vezes, “acadêmico” nove vezes, “universidade” vinte e nove vezes, entre as que se destacaram. Esta classe representa o relato de como as docentes ingressaram na universidade para a carreira que as levou ao cargo de gestão atualmente. Observamos em algumas narrativas os procesos envueltos nesse acesso:

E2 - cuando asumí la dirección de la institución, lo hice pensando que podía aportar a su consolidación y sostenibilidad. Era la institución donde desarrollé mi carrera académica desde mis estudios de postgrado. E2 - En un ambiente competitivo esto es difícil. También tuve que trabajar para generar un sentimiento de pertenencia entre los investigadores que permitiera hacer ver a la institución como suya. E3 - Era la primera vez que una mujer ocupaba este cargo, lo que produjo, para mi sorpresa, muchas gratuitas y poco agradables elucubraciones y alguna grosera insinuación machista.E4 - la accesión como decana ha venido de un proceso electoral a selecciones a las que yo concurro y acepto la condición de decana previamente por lo que se refiera a la gestión que había ocupado en la misma facultad de Ciencias Sociales, el cargo de vicedecana. E6 - me ha animado a someter una propuesta de participación en la competencia para gestionar la Asociación de estudiantes Brasileños ABS-USAL. E7 - yo soy catedrática en el área de métodos de investigación y diagnóstico en educación y desde el 2006 hasta la actualidad sigue siendo directora de un grupo de investigación.

Bourdieu (1996) aponta que a trajetória é a objetivação das relações entre os agentes e as forças presentes no campo. Se o campo está em permanente mudança, a trajetória social é o movimento dentro de um campo de possíveis definido estruturalmente. Para Bourdieu, toda trajetória social deve ser compreendida como uma maneira singular de percorrer o espaço social, onde se exprimem as disposições do habitus e se reconstitui a série das posições sucessivamente ocupadas por um mesmo agente ou por um mesmo grupo de agentes em espaços sucessivos.

O habitus como princípio, ativo, irredutível às percepções passivas, da unificação das práticas e das representações que nos são historicamente constituídas, ainda se faz presente, como observamos nas narrativas orais das gestoras universitárias pesquisadas. Cada campo possui seu próprio habitus e seu modus operandi e somente quando ocorre essa apropriação se pode jogar este jogo de poder. Observamos que as gestoras universitárias se condicionam às regras e limitações estruturais exercidas.

Perseguir uma trajetóriasignifica acompanhar o desenrolar histórico de grupos sociais concretos, em um espaço social definido por esses mesmos grupos, em suas batalhas pela definição dos limites e da legitimidade dentro do campo em que se inserem (BOURDIEU, 1996).

Conforme mencionado é significativo que através das narrativas, as gestoras universitárias entrevistas atuam há um bom tempo na área mas,demonstram que o acesso de mulheres nos cargos da gestão universitárias é um processo recente na história da universidade, não tendo nenhuma gestora com atuação acima de dez anos.

CONSIDERAÇÕES

Apesar de a Universidade de Salamanca - USAL ter completado em 2018, 803 anos, ainda não há mulheres ocupando o cargo de reitora. As gestoras universitárias da Espanha, através da narrativa oral de sua trajetória, nos fizeram perceber que mesmo estando preparadas e atuando há um bom tempo, ainda há obstáculo para o acesso aos mais altos cargos, permanecendo a luta e identidade.

Nos cargos de gestão entre os anos 2016-2017, as mulheres ocupam somente 38% dos postos de secretaria acadêmica e nos postos de subdireção ou gestão 58%, somente 26,92% dos cargos de gestão na alta direção (MONTEZ-LOPEZ, 2017, p. 99). Isso ocorre apesar de a proporção entre homens e mulheres que trabalham na universidade ser equilibrada.

Observamos que, mesmo tendo o acesso à gestão universitárias em diversos cargos, os procedimentos técnicos-administrativos que desenham, sistematizam e controlam suas interações produtivas, assim como o acesso aos altos cargos de gestão universitária, continuam limitados.

Este ensaio representa um recorte da pesquisa que envolve cinco países e nos dá uma amostra do que poderemos encontrar nas análises dos países que compõem a Ibero-América.

As mulheres estão em número equilibrado em relação aos homens, são altamente capacitadas e comprometidas com o processo, mas ainda são minorias nos postos de decisões. É de grande importância a continuidade dos estudos e da divulgação dos resultados sobre a pesquisa do acesso e inserção das mulheres como gestoras universitárias, em virtude dos poucos dados divulgados pelos países e instituições.

1Este projeto foi submetido ao Comitê de Ética da PUCPR – Pontifícia Universidade Católica do Paraná e recebeu a aprovação sob Nº CAAE 45089121.7.0000.0020, com data de início prevista para 29/03/2021, tendo como compromisso deste pesquisador a ética, que não deve ser apenas conceitual e sim um compromisso que influencia constantemente seus pensamentos e que esteja sempre presente em suas ações. (BONIS & COSTA, 2007).

2A primeira escola normal para treinamento de professoras primárias, uma ideia europeia, tinha surgido em Niterói, em 1835, numa tentativa de melhorar o padrão de ensino, seguida por outras em várias províncias e na Corte,embora as primeiras escolas normais fossem destinadas só para homens. No Rio de Janeiro e em São Paulo, por exemplo, onde seções para mulheres foram estabelecidas na década de 1870, as escolas normais fecharam e só reabririam em 1880, depois da Reforma Leôncio de Carvalho, como escolas mistas. (Leonor Maria TANURI, 1979. BRAZIL, 1880a, p. 25-28).)

3La vida de Clara Campoamor fue, de principio a fin, un fiel reflejo de sus ideales, una luchadora incansable por la defensa de los derechos de los más débiles. Nació en Madrid el 12 de febrero de 1888 en el seno de una familia trabajadora. Huérfana de padre a los 13 años, tuvo que ponerse a trabajar para ayudar al sustento familiar. Sin embargo, los problemas económicos no impidieron a Clara estudiar derecho y, en 1924, conseguir su sueño: el título de abogada y al poco tiempo la inscripción en el Colegio de Abogados de Madrid. (SOLIANO,2018, p.5).

4Bussy, Genevois, Danièle in Mulheres de Espanha, da República ao Franquismo. (PERROT, BUSSY, 1991 p.221-241)

5A proposta da tese de doutorado, aprovada pelo Comitê de Ética, envolvem sete mulheres gestoras da Espanha, duas mulheres gestoras da Argentina, duas mulheres gestoras do México, duas mulheres gestoras do Peru e quinze mulheres gestoras do Brasil. Este número foi definido pela plataforma. As mulheres gestoras da Espanha foram indicadas pelo orientador do doutorado sanduíche, por se enquadrarem no perfil definido no projeto.

6O questionário do perfil profissiográfico é composto por 10 perguntas, sendo 7 semiestruturada e 3 perguntas abertas, que foram aplicadas primeiramente, através de link do Google Meet antecipadamente à entrevista pessoal. A maioria das entrevistadas atuam nos cargos de decanas e vice-decanas (que são diretoras gerais das faculdades, inseridas na universidade). Apenas uma atua no cargo de vice-reitora, já que não conseguiu chegar ao reitorado. Observamos também que a média de idade das gestoras encontra-se entre 45 a 55 anos, com quatro respondentes, e três respondentes acima de 65 anos, demonstrando um longo percurso decorrido desde a formação universitária até o acesso às atividades de gestoras da universidade. Ademais, percebemos outro aspecto interessante acerca do tempo de atuação como gestora: três respondentes apresentam o tempo de 0 a 5 anos e 4 respondentes, o tempo de 5 a 10 anos, demonstrando que a inserção das mulheres como gestoras universitárias é um processo recente na história da universidade, visto que nenhuma entrevistada tem atuação acima de dez anos na gestão universitária da USAL – Universidade de Salamanca. As áreas de formação apresentam-se bem diversificadas, sendo que duas respondentes são da área de humanas, três das ciências sociais aplicadas, uma da área de exatas e uma da área de saúde. Na área de atuação, temos três como gestoras de campus ou faculdade, uma como vice-reitora, duas como diretora de campus e uma como gerente de área ou setor.

7Uma das intenções de Lynn Hunt com a apresentação da “A Nova História Cultural” era a demostrar como o avanço dos estudos na história da cultura acabou induzindo os historiadores a penetrarem em outros campos do conhecimento humano, como a linguística e a antropologia.

8Roger Chartier interessa-se, por exemplo, pelas transferências entre a cultura oral e cultura escrita, mostrando como indivíduos não-letrados podem participar da cultura letrada através de práticas culturais diversas (leitura coletiva, literatura de cordel) e dá-se a difusão de conteúdos veiculados através da oralidade para o registro escrito. (BARROS, 2005, p.131).

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Recebido: Maio de 2022; Aceito: Junho de 2022

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