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Revista Teias

versão impressa ISSN 1518-5370versão On-line ISSN 1982-0305

Revista Teias vol.24 no.73 Rio de Janeiro abr./jun 2023  Epub 24-Ago-2023

https://doi.org/10.12957/teias.2023.70010 

Artigos de Demanda Contínua

EU BRINCO, TU BRINCAS, NÓS BRINCAMOS: o corpo e o movimento na formação de professores para a educação infantil

I PLAY, YOU PLAY, WE PLAY: the body and the movement in teacher education for child education

YO JUEGO, TU JUGAS, NOSOTROS JUGAMOS: el cuerpo y el movimiento en la formación docente para la educación infantil

1Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) E-mail: camargo.daiana@hotmail.com

2Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) E-mail: lvdornelles@gmail.com


Resumo

Tomamos como ponto de partida as inquietações acerca do brincar no cotidiano da educação infantil, considerando que a formação do professor é um importante elemento para a valorização e o redimensionamento do brincar. Nesta perspectiva, nos propusemos a investigar e discutir o brincar na formação de professores para a EI, permeado por uma compreensão das crianças, de suas infâncias e das instituições de ensino a elas destinadas. Trazemos uma discussão teórica sobre a temática, apresentando abordagens de estudiosos do brincar, do corpo em movimento e da formação de professores, articuladas a algumas falas de acadêmicos de pedagogia sobre brincar, o corpo e o movimento na sua formação, no curso superior. Neste emaranhado de falas, referências e análises, tratamos do brincar, do corpo e da acrobacia cotidiana que é educar e aprender com as crianças, considerando que a formação de professores de EI precisa estar vinculada ao movimento, à vivência estética e à compreensão da arte e das culturas infantis.

Palavras-chave: brincar; movimento; pedagogia; formação de professores

Abstract

We take as a starting point the concerns about playing in the daily life of early childhood education, considering that teacher training is an important element for the appreciation and resizing of play. In this perspective, we set out to investigate and discuss playing in the training of teachers for EI, permeated by an understanding of children, their childhoods and the educational institutions intended for them. We bring a theoretical discussion on the subject, presenting approaches by scholars of play, the body in movement and teacher training, articulated with some speeches by pedagogy academics about playing, the body, and movement in their training, in higher education. In this tangle of speeches, references and analyses, we deal with playing, the body and the daily acrobatics that is to educate and learn with children, considering that the training of early childhood education teachers needs to be linked to movement, aesthetic experience and understanding of children's art and cultures.

Keywords: play; movement; pedagogy; teacher training

Resumen

Tomamos como punto de partida las preocupaciones sobre el juego en el cotidiano de la educación infantil, considerando que la formación docente es un elemento importante para la apreciación y redimensionamiento del juego. En esta perspectiva, nos propusimos investigar y discutir el juego en la formación de profesores para la EI, permeada por una comprensión de los ninos, de sus infancias y de las instituciones educativas a ellos destinadas. Traemos una discusión teórica sobre el tema, presentando abordajes de estudiosos del juego, el cuerpo en movimiento y la formación de profesores, articulados con algunos discursos de estudiantes de pedagogía sobre el juego, el cuerpo, y el movimiento en su formación de enseñanza superior. En esta maraña de discursos, referencias y análisis, abordamos el juego, el cuerpo y la acrobacia cotidiana que es educar y aprender con los niños, considerando que la formación de los docentes de EI debe estar ligada al movimiento, la experiencia estética y la comprensión del arte y las culturas de los niños.

Palabras clave ludicidad; cuerpo; curso de pedagogía; formación de profesores

BRINCAR, CORPO E MOVIMENTO: CONHECER AS CRIANÇAS E SUAS INFÂNCIAS

Amparados por autores que defendem o brincar como expressão da inteireza da criança e pelos saberes da prática que nos indagam e impulsionam, lançamo-nos ao propósito de investigar e discutir o brincar na formação de professores para a Educação Infantil (EI). Entendemos que este é um tema complexo, carregado de diferentes entendimentos e que vem acompanhando a maneira de compreender as crianças, as suas infâncias e as instituições educacionais a elas destinadas.

Ao discorrermos sobre o processo de formação de professores para a EI, temos duas intenções: a abordagem da necessidade de uma formação consistente e coerente do professor que vai atuar com a criança pequena e, em específico, pensar como este professor em formação se apropria/constrói e reconstrói conhecimentos sobre as crianças e suas infâncias na perspectiva do brincar, do corpo e do movimento.

Este texto decorre de um estudo de cunho qualitativo, para o qual propomos a utilização das falas e reflexões dos acadêmicos de pedagogia, obtidos a partir de questionário e diário de bordo. Nos dedicamos a apreciação dos dados gerados, dialogando com o referencial teórico delimitado para a pesquisa, visando a construção de outros olhares sobre a formação de professores de educação infantil diante da especificidade do brincar, do corpo e do movimento. Ao traçarmos a rota deste estudo, optamos por seguir com Foucault (2005) para quem não há diálogo, nem outras formas de discurso, que estejam imunes às relações de poder. Portanto, as possibilidades metodológicas que os escritos deste autor nos ensinam permitem olhar as relações de poder imbricadas nos ditos e escritos dos acadêmicos de pedagogia, com a finalidade de analisar e compreender a formação do professor, quanto à relação brincar/corpo/movimento e suas implicações na prática pedagógica.

Entendemos que o brincar é um eixo fundamental da educação infantil. É expressão, cultura, exploração de si e dos espaços e, portanto, construção de conhecimentos. As pesquisas realizadas por Camargo (2011) apontam para uma distorção entre a compreensão do brincar presente nas falas das professoras e as práticas observadas nos espaços de educação infantil. Os dados e as reflexões nos instigam a retomar a temática com o olhar voltado à formação de professores.

Para além do brincar, buscamos identificar elementos relacionados ao corpo em movimento enquanto componente do brincar, tendo em vista as especificidades das instituições de educação infantil. Tais instituições, em sua maioria, entende a prática cotidiana por responsabilidade do professor/a (pedagogo/a), ao qual cabe inter-relacionar conteúdos/conhecimentos das diferentes áreas, num espaço de cultura, de criatividade, no qual o brincar e o corpo não podem passar desapercebidos ou ficar restritos a atividades sem planejamento, estudo e organização. O corpo da criança ainda é visto como “[...] um corpo que insiste em viver num mundo carregado da soberba de, em nome da preservação da vida, dizer e controlar a partir de uma perspectiva adultocentrada, que o percebe como carente de tudo. (FRASSÃO, apud ABREU; DORNELLES, 2021, p. 13)

Entendemos que os recentes impulsos das discussões acerca da educação infantil, bem como as políticas para a ampliação do atendimento à criança pequena em espaços especializados, dão margem ao fortalecimento de estudos da criança que se referem à pedagogia da infância em suas diversas nuances. Defendemos que estas abordagens devem permear os cursos de formação de professores, em especial o curso de pedagogia, com vistas a constituir um movimento amplo e fortalecido em prol dos conhecimentos sobre crianças, infâncias e práticas pedagógicas para a EI.

Falar de corpo em movimento é falar das culturas, da superação, da naturalização das práticas restritivas e imobilizantes na escola infantil. É tratar das diferenças que o atravessam, como as questões de raça, gênero, cultura, sexualidade, geração etc. Mediante à necessidade de aprimorarmos as discussões sobre a infância, no tocante à formação dos professores que atuam nesta etapa educativa, traremos a seguir os elementos teóricos que nos auxiliaram a pensar o brincar e o corpo em movimento, elementos de análise deste estudo.

MODOS DE PENSAR, FALAR, DISCUTIR E BRINCAR PARA ENTENDER O BRINCAR

O que é este brincar? Quais suas possibilidades no espaço da educação infantil? Para pensar o brincar neste estudo, tomamos a criança como produtora de cultura1, fundamentados nos escritos de Sarmento (2005) e Corsaro (2011); o brincar como elemento da cultura infantil, amparado nos escritos de Brougère (1998); e pensamos as possibilidades de experiências e as restrições impostas ao brincar (e ao corpo que se movimenta, se manifesta, se constitui ao brincar) pautadas nas reflexões de Larossa (2002; 2016); e o corpo como modo de subjetivação, de acordo com Foucault (2009).

Sobre a importância do brincar, seu reconhecimento histórico-social e sua relevância para a criança, apresentamos a seguir um fragmento do texto das diretrizes curriculares nacionais para a educação infantil (2009). Embora não nos aprofundemos e, muitas vezes, coloquemos em suspenção os pressupostos vigentes na legislação da educação infantil, é importante compreender como brincar é concebido e tratado nos escritos legais que fundamentam as práticas pedagógicas com os pequenos no país.

Para Redin (2009), a “[....] dimensão lúdica humana, caracterizada pela liberdade de imaginar, fantasiar e poetizar o mundo, e que está na base e de todo o processo de criação, está cada vez mais restrita e institucionalizada” (REDIN, 2009, p. 123). Na continuidade de suas reflexões, Redin (2009) destaca o brincar como característica essencial das crianças, por meio da qual, com seus pares, compartilham e produzem significados no mundo que as cerca. Aponta que há uma divisão entre lazer e trabalho, brinquedo e estudo, atividade livre e dirigida, o que fragiliza a dimensão criativa e transforma tais categorias em binárias e não compreendidas como articuladas/complementares. Ou brinca, ou estuda, nos ensinam. Aqui, nos dedicamos a pensar o contexto das decisões e dos distanciamentos impostos aos elementos do brincar, a partir de um texto de Cecília Meireles:

Fonte: imagens Google

Figura 6 poema “Ou isto ou aquilo”, de Cecília Meireles 

A escolha constante, destacada nos versos de Cecília Meireles, nos faz pensar: seria possível, na dimensão pedagógica do brincar, escapar do isto ou aquilo? Entendemos que a criança está por completo nos espaços educativos, que suas interações são complexas, contextualizadas, integrais. Por que nós, adultos, – adultocêntricos – insistimos em fragmentá-las? Será que não podemos incluir no brincar das crianças o isto e o aquilo, o brincar disto e daquilo? Assim, ampliamos a discussão para o brincar com as crianças e suas múltiplas possibilidades de inventar isto e aquilo.

Consideramos o valor humanizante do brincar e sua riqueza enquanto elemento da cultura infantil, morada de possibilidades de ação pedagógica (entendemos aqui espaço de ação, da prática pedagógica da educação infantil e não o direcionamento/limitação/restrição do brincar) e compreensão das crianças pelo viés do brincar, que se realiza por um corpo, por diferentes corpos que agem, interagem, compartilham, movimentam e silenciam, experienciando e significando o mundo em que vivem.

Recorrendo à menção “Somos seres brincantes”, de Redin (2009), trazemos outros conceitos instigantes encontrados nos estudos sobre o brincar, que nos auxiliam a pensar o brincar para além da criança, pois é preciso constituir alicerce para a prática do professor de educação infantil. Encontramos em Fortuna (2011) a referência ao adulto brincante e às raízes crianceiras, expressão que aparece lindamente no poema “Menino do mato”2, de Manoel de Barros; a dimensão brincalhona trazida por Ghedini (1994) e reiterada por Faria (1999); a disponibilidade corporal e lúdica, encontrada nos escritos de Camargo (2011); a metáfora da professora acesa3 presente nos estudos de Martins Filho (2013); e o repensar a todo instante que “[...] todo mundo brinca se você brinca”, de Dornelles (2001).

A expressão disponibilidade corporal e lúdica4, utilizada em estudos anteriores ao tratarmos da prática pedagógica na EI, remete ao professor que precisa estar amparado teoricamente para compreender a criança e o brincar, estar disposto a brincar, exaltando o ouvir, o brincar, o organizar o brincar, o olhar o brincar e o brincar por brincar.

Fundamentamos, dessa maneira, a seguinte premissa: a postura do professor – aberta ao brincar, postura brincante, crianceira, disponível e sempre acesa – pode diferenciar a prática pedagógica na educação infantil. Tais práticas necessitam ser permeadas por espaços de formação, numa relação de ir ao encontro dos conhecimentos sobre crianças e infância, seu modo de ser e estar no mundo. Repensar quais são as funções do jogo5, do brincar e do brinquedo e as relações professor/criança, criança/criança, criança/ambiente, que diferem de acordo com o referencial teórico utilizado.

BRINCAR, CORPO EM MOVIMENTO

Entendemos que tratar do corpo na pedagogia das infâncias, na pedagogia Crianceira, é temática recente, de produção ainda escassa, porém, em diferentes áreas de conhecimento, encontramos teóricos 1 para nos auxiliar a pensar o corpo da criança pequena na educação infantil. O brincar integra a cultura da criança e por meio deste brincar a criança pequena explora, experimenta, interpreta e significa suas ações no contexto histórico-cultural.

Entendemos, assim, que o brincar é também elemento da ludicidade6, constitui uma experiência lúdica e agrega ações corporais e afetivas. Daí a importância de discutirmos a amplitude do tema ludicidade e a necessidade de contextualização do brincar como componente da cultura infantil.

A análise do currículo de alguns dos cursos de pedagogia realizada por Silva (2003) destaca que o brincar ainda é tema pouco abordado na organização deste curso de formação, aparecendo como um tema que trata da brincadeira ora como recurso didático (prática comum ao ensino fundamental enquanto recurso de alfabetização), ora como suporte das disciplinas de Psicologia. Desse modo, carece ainda de um olhar mais amplo, que favoreça o entendimento do brincar em diferentes perspectivas antropológicas, sociológicas, históricas, filosóficas e culturais.

Acreditamos que a formação oferecida nos cursos de pedagogia pode propiciar aos futuros professores diferentes estudos e reflexões sobre o brincar, tendo em vista que, muitas vezes, os alunos da pedagogia buscam no curso apenas receitas e atividades para brincar com as crianças. Os estudos sobre corpo e movimento são mais do que isso, são modos de acessar e entender pressupostos que fundamentam e ampliam nosso olhar sobre o corpo, o brincar e o movimento. Ainda se faz necessário buscar nessas discussões movimentos que pudessem conhecer e entrelaçar esses estudos a partir das especificidades da educação infantil.

Sob as lentes do brincar como espaço do corpo e do movimento, entendemos que as relações construídas pelas crianças perpassam o corpo, cobrindo-o de diversas sensações e emoções. Ao interagir num espaço ou constituir um grupo, a criança pequena está de corpo inteiro, seus movimentos permitem intensa exploração e aprendizagem. As interações consigo mesma, com outras crianças ou entre criança e adultos são sobretudo corpóreas, tendo como base o toque, o cuidado, a linguagem corporal, as brincadeiras de imitação, a exploração dos espaços e dos objetos. “A brincadeira é algo de pertença à criança. Através da brincadeira a criança experimenta, organizase, regula-se, constrói normas para si e para o outro” (DORNELLES, 2001, p. 104). Esta exploração articula-se à citada dimensão da criação, e é por meio deste corpo em movimento que a criança constrói/apropria-se dos conhecimentos.

Com relação à escola, são recorrentes as ações que restringem espaços e tempos, limitam brinquedos e brincadeira, limitam experimentações, limitam o prazer de brincar por brincar, correr por correr, passear por passear, se mexer por se mexer. Essas escolas insistem, com suas rotinas engessadas, em produzir corpos de crianças para serem disciplinadas, dóceis e controladas, a exemplo do que nos ensina Foucault (2007). Escolas ainda rígidas em suas rotinas, que tendem a se repetir por todo o ano letivo. O que nos remete novamente a Foucault (2007) e suas discussões a respeito das possibilidades de resistência. As crianças resistem, escapam e criam formas de reinventar seu brincar, novos modos de, nas brincadeiras, explorar seu corpo e colocar-se em movimento. Como ressalta Castro (2009), a resistência para Foucault está na ordem estratégica da luta.

As formas de resistência permitem que as crianças escapem e brinquem, criem, por vezes de forma velada, quase escondida, outras aos olhos dos professores, que insistem em não reconhecer e não possibilitar o brincar. As crianças, em muitos lugares, ainda permanecem longo período na instituição educativa, separadas por idades, com portas fechadas. Para os bebês, isso se torna ainda mais restritivo; o mundo dos bebês é como uma caverna misteriosa de restrito acesso aos maiores. O mundo das crianças maiores é a floresta repleta de perigos, todas as crianças, de diferentes idades e potenciais, restritas em possibilidades de interação, de movimento, de brincar e de construir cultura. É possível uma vida humanizada e humanizante sem passar por esse jogo lúdico de conhecer o mundo? questiona Dornelles (2001).

Assim, podemos dizer que, ao brincar, os adultos e as crianças reaprendem a brincar, conhecer e controlar um universo simbólico que constitui a cultura lúdica de cada grupo. Esta, porém, não é uma experiência que se transfere, pois, ao mesmo tempo que se aprende, constrói-se essa cultura por meio de experiências lúdicas (SILVA, 2003).

RELAÇÃO ENTRE O BRINCAR, O CORPO E O MOVIMENTO

Defendendo a inteireza do brincar da criança, do brincar que perpassa o corpo e o movimento, é fundamental ao futuro professor de crianças investigar, estudar, pesquisar sobre o brincar, sobre o corpo e o movimento. Além disso, é preciso saber que, nesse sentido, a integração entre a teoria e a prática possibilita que ele possa sentir-se capaz de constituir-se como um professorbrincante, um professor crianceiro.

No que se refere ao corpo, é importante ressaltar que concordamos com Foucault (2013) quando ele afirma que

[...] O corpo é o ponto zero do mundo, lá onde os caminhos e os espaços se cruzam; o corpo está em parte alguma: ele está no coração do mundo, este pequeno fulcro utópico, a partir do qual eu sonho, falo, avanço, imagino, percebo as coisas em seu lugar e também as nego pelo poder indefinido das utopias que imagino (FOUCAULT, 2013, p. 14 grifos nossos).

De algum modo, esse corpo, pequeno fulcro, se constitui nos sujeitos, desde muito cedo, entretanto, muitas vezes isso é negado aos bebês ou às crianças bem pequenas. Por isso, indagamos: Como compreender a relação entre o brincar, o corpo e o movimento na medida em que pensamos a formação para atuação com a criança pequena? Há relação entre estes três elementos? Qual?

Fazendo uma troca entre as perspectivas teóricas rapidamente apresentadas até aqui, nos debruçaremos agora sobre estas questões, com base no ponto de vista dos acadêmicos de pedagogia da UEPG na pesquisa.

Quanto ao nosso percurso metodológico, trazemos para a análise as vozes dos estudantes acerca de seu processo formativo e das interlocuções deste percurso /currículo com as abordagens do brincar. Os partícipes desta pesquisa foram acadêmicos do 3º ano do curso, os quais já passaram pela disciplina de estágio curricular supervisionado de docência na educação infantil, tendo em vista o momento de encontro7 com a criança pequena, além de egressos do curso, totalizando 35 respondentes no instrumento questionário e 15 entrevistados.

Os participantes afirmaram que, durante a formação acadêmica, discutiram questões referentes ao brincar, ao corpo e ao movimento.

Esses reconhecem que há relação entre estes três eixos, e as palavras de forte presença nos seus discursos são: essencial, indissociáveis, intrínseco e fundamental.

[...]. Quando fazemos uma brincadeira, o corpo e o movimento estão intrínsecos (informação verbal).

[...] é indispensável que a formação docente seja voltada para esse viés, considerado, acima de tudo, que o trabalho pedagógico é feito com crianças (informação verbal8).

São essenciais para o desenvolvimento da criança, logo não podem ser dissociados, a criança aprende quando brinca, se desenvolve, se expressa, se inventa e reinventa (informação verbal)9.

Ponderamos que o reconhecimento da relação entre o brincar, o corpo e o movimento é um passo importante quando nos referimos à formação de professores para a educação infantil. Essa é uma etapa de educação básica em que a maioria dos professores – (pedagogos) e/ou demais profissionais (auxiliares, estagiários) – têm formação no curso de pedagogia ou em espaços de formação de docentes em nível médio (magistério). Reiteramos, assim, a pertinência de que brincarcorpo-movimento devem integrar, compor, cada vez mais os espaços de formação de professores.

Estudos realizados por Camargo (2011) apontam que, devido à ausência de conhecimentos teórico/prático s no que se refere ao brincar, ao corpo e ao movimento, as professoras de educação infantil delegavam o trabalho corporal ao profissional da educação física. Tal atitude pode estar vinculada às concepções teóricas que ainda separam corpo e mente, o que também pode ser observado num tipo de escolarização que acomoda crianças, organiza-as em fileiras, disciplina seus corpos, restringindo-as à chamada expressão corporal e limitando suas múltiplas possibilidades de expressão. Pensar acerca de tal dualidade (corpo/mente) nos leva a indagar se, com essa perspectiva, não estamos colaborando cada vez mais para produzir sujeitos adaptáveis à sociedade do controle e da vigilância, da docilidade e da disciplina, imposta pelos tempos atuais.

Entendemos que esta deva ser também uma pergunta para a formação de professores, visto que a Pedagogia não pode ignorar a criança e seu corpo que se movimenta, que cresce e aos poucos aprende de si, do outro, de seus limites e possibilidades. Deve-se buscar entender o espaço do brincar, do corpo e do movimento no curso de pedagogia e as relações entre estas categorias. Como afirma Eduarda, “[...] é indispensável que a formação docente seja voltada para esse viés, considerando, acima de tudo, que o trabalho pedagógico é feito com crianças” (informação verbal)10.

Por outro lado, com base na pesquisa, também é possível identificar alguns dos modos de constituição desses professores e o efeito das teorias do desenvolvimento em sua formação, tendo em vista que há o entendimento de que o brincar, o corpo e o movimento são somente formas de expressão. Sobre a relação entre o brincar, o corpo e o movimento como facilitadora do desenvolvimento, eles discorrem:

[...] se faz necessário que, enquanto acadêmicos do curso de Pedagogia, nos aprofundemos em tais conhecimentos, para que possamos trabalhar na instância da educação infantil visando o desenvolvimento pleno de todas as crianças (informação verbal).

[...] faz com que a mesma se desenvolva por completo, portanto, tendo uma infância significativa (informação verbal).

[...] o brincar possibilita o desenvolvimento da criança, sua imaginação, criatividade e sua atuação no mundo (informação verbal)11.

Os discursos apontados enfatizam o brincar com vistas ao desenvolvimento integral da criança, mas não há uma preocupação ou sequer citação das categorias corpo e movimento. Sem renegar a validade dos estudos da Psicologia e os diversos autores que discutem o desenvolvimento das crianças, marcas que se imprimem fortemente na pedagogia, como já abordado no texto, consideramos importante articular os princípios das teorias do desenvolvimento, como apontam Rossetti-Ferreira e Oliveira (2009, p. 59):

Cada vez mais, perspectivas de diferentes áreas do conhecimento são aplicadas para um melhor entendimento desse fenômeno que, por parecer tão familiar [como o brincar], corre o risco de ser naturalizado, de ter sua importância subestimada ou sua função no desenvolvimento sociocultural da criança menos investigada.

Como salientam as autoras, há estudos das demais áreas de conhecimento que visam tratar da criança hoje, sua cultura, suas relações com o outro e com o mundo, haja vista as investigações de Cohn (2005), Corsaro (2011), Sarmento (2005) e tantos outros.

A expressão atuação no mundo, utilizada por Camila, nos remete às marcas da educação da criança como promessa de futuro, marca de estudiosos como Froebel (regar, para florescer, uma das premissas de seu Kindergarten). Entretanto, num meio adultocêntrico, esta mesma criança, que seria a esperança do futuro, é também vista como criadora de problemas para a sociedade. Trata-se do que ela irá tornar-se, negligenciando a criança que ela é e o que faz no tempo presente. Cohn (2005) tem em perspectiva a criança atuante, conceituando-a como aquela que tem papel ativo nas relações sociais, não mais passivo, não é o adulto em miniatura, que é treinado para a vida.

A criança interage com adultos, com outras crianças, com o mundo, e de algum modo contribui ativamente para a formação do professor-pesquisador, tendo em vista que os sujeitos envolvidos nas pesquisas de formação têm a possibilidade de construir bases epistemológicas reflexivas, podendo desse modo tentar garantir que as crianças, embora tenham competências distintas das dos adultos, sejam também sujeitos competentes, pois, quando comparadas com os adultos, essas são as únicas experts dos seus mundos.

Outro aspecto elencado para esta questão é o entendimento do brincar, do corpo e do movimento como expressão/comunicação, como apontam as graduandas:

Compreendo o quão a dimensão corporal é importante quando o sujeito em questão é a criança pequena, visto que é pelas expressões corporais que elas se comunicam com o mundo ao seu redor, que deixam transparecer suas necessidades e suas emoções. [...] Possibilitar o movimento e o brincar na primeira infância é indiscutível e extremamente necessário, e os professores assim devem fazê-lo, pois ampliarão as capacidades, as potencialidades das crianças para conhecerem a si mesmas e o mundo. O movimento e as brincadeiras dão liberdade de expressão às crianças e estimulam a dimensão criativa e imaginária delas (informação verbal).

[...] e desde muito pequenas as crianças usam o corpo, o movimento, para expressar-se (informação verbal)12.

Claudia e Alice mostram a expressão/comunicação contida no brincar, nas potencialidades do corpo e do movimento cujo entendimento consideramos fundamental quando tratamos de professores em formação. Porém, tais premissas carecem de estar vinculadas às capacidades de observação, participação e iniciativa para redimensionar as práticas, os espaços e as rotinas que permitam brincar, mover-se e fazer uso das possibilidades corporais. A relação entre o brincar, o corpo e o movimento nos dizem muito da criança quando se refere a olhar, ver e ouvir.

É possível verificar atualmente um significativo avanço nos escritos que remetem à expressividade das crianças, ao reconhecimento das diferentes linguagens e à valorização das experiências vividas por elas, seja no âmbito das pesquisas como no aspecto da legislação educacional para a EI. Ressaltamos o texto do parecer CEB 20/2009, a respeito da revisão das diretrizes curriculares nacionais para a educação infantil, no qual o relator destaca “As práticas pedagógicas devem ocorrer de modo a não fragmentar a criança nas suas possibilidades de viver experiências, na sua compreensão do mundo feita pela totalidade de seus sentidos [...]” (BRASIL, 2013, p. 88)

A não fragmentação da criança nas práticas pedagógicas requer colocá-la na centralidade do processo educativo, a fim de instaurarmos outras práticas, outros modos de pensar e agir com os pequenos. Estar atento à criança consiste em perceber de que forma ela aprende, se expressa, se organiza, brinca, se movimenta, se reinventa e cria cotidianamente em contato com seus pares, com adultos e com o mundo: “[...] a participação não vai por si mesma. Exige uma acção pedagógica capaz de favorecer o exercício da decisão pelas crianças. [...] exige um trabalho pedagógico da facilitação e mediação” (SARMENTO, 2007, p. 38).

Partindo do olhar sobre a criança, da investigação com crianças e do que elas têm a nos dizer, é possível rever a estrutura, tanto física quanto organizacional, das instituições de educação infantil; atentar para o que se tem, o que se faz com tempos e espaços, o que se pode fazer de outras maneiras, quando fazer, como fazer etc., quando se trata da criança e sua educação; pensar sobre as práticas dos professores e de toda a equipe da escola, pois a equipe gestora e os docentes precisam estar em sintonia, entender e respeitar a criança da EI. Pensar a criança, seu corpo, seu movimento, exige o vislumbre de um outro modo de ver e agir na EI; exige que se o conhecimento sobre as crianças venha necessariamente delas, do seu modo de pensar e agir, através do que “[...] poderão surgir potenciais emancipatórios para as crianças, que para se realizarem precisam que os adultos aceitem negociar princípios e discursos sobre e com elas, infundindo desta forma outros significados à acção educativa e às relações intergeracionais” (SARMENTO, 2007, p. 39).

Tal perspectiva, se correta, nos mostrará que a escola é transformadora e atende às especificidades da educação infantil. Especificidades existem também no âmbito da gestão escolar, cuja equipe precisa estar em consonância quanto às concepções de criança, educação infantil e todas as particularidades desta etapa educativa. A articulação entre a gestão escolar e os docentes é essencial para o redimensionamento do brincar, para rever tempos, espaços e possibilidades de brincar e se as crianças são compreendidas em sua expressão e movimento. Entendemos, como Larrosa (2016), que experiência é o que nos toca e, portanto, uma educação restritiva ou cheia de sanções precisa ficar cada vez mais de lado, para que se dê espaço para experiências do bagunçar, desmontar, barulhar, sujar, sair de espaços delimitados e criar outros espaços. Comunicar-se, cada vez mais pela voz, pelo corpo e pela arte.

Dentre as possibilidades de trabalho corporal na pedagogia, entendemos o reconhecimento do corpo e do movimento como linguagens, como formas de maior proximidade com os fundamentos/especificidades da área, que têm em vista possibilitar as diversas outras linguagens que constituem as ações infantis e precisam estruturar as práticas pedagógicas com crianças.

Recorremos aos escritos de Gobbi (2010) e Garanhani (2010) para tratarmos do corpo e do movimento como linguagens. As crianças fazem uso de diferentes linguagens para expressar-se, dentre as quais estão palavras e sons, e vão constituindo a si mesmas, com movimentos corporais, enquanto constroem sua cultura infantil. Os usos destas linguagens precisam tanto ser compreendidos pelos professores quanto estar garantidos nos espaços de educação infantil. Linguagens que inicialmente passam pelo corpo e seus movimentos, visto que, desde bebês, “[...] é pelo movimento que descobrirá e se surpreenderá com as imprevisibilidades que lhe acompanham desde o nascimento” (ABREU; DORNELLES, 2021, p. 78).

Para Garanhani (2010), uma prática pedagógica que atenda às necessidades e especificidades da criança deve proporcionar o conhecimento e o domínio de sua movimentação corporal, mobilizando e aprimorando a sua expressão e comunicação. Estas atividades corporais devem auxiliar na constituição da identidade e da autonomia, da socialização e da ampliação do conhecimento de práticas corporais. Partindo das considerações da autora, retomamos o tema da formação de professores sobre o qual Brustolin (2009, p. 78) nos diz:

Conscientizar-se das sensações do corpo e seus limites, e expressar-se através dele, são maneiras que contribuem para o indivíduo percebê-lo enquanto forma de se comunicar e interagir com o mundo. Através do corpo, ele é capaz de se expressar e mostrar seus desejos, anseios e sentimentos, tornando pública uma personalidade individual e contida. Na formação de futuros/as docentes, perceber o corpo como expressão de si e como forma de interação com o mundo possibilita a maior compreensão das interações que irão ocorrer entre seus corpos e de seus/suas alunos/as na escola.

Tendo apontado o brincar, o corpo e o movimento como indissociáveis e como forma de expressão/linguagem, reiteramos aqui a importância deste tema perpassar todo o currículo de formação de professores. Para ir além da superação da dualidade entre corpo/mente e do disciplinamento dos corpos, não incorrermos no erro de fortalecer mitos como brincar não é coisa séria, brincar X fazer atividade, brincar/ brinquedo de menino e brincar/ brinquedo de menina, que encontramos naturalizados em muitas práticas com crianças pequenas.

Estas marcas de controle por vezes podem ser percebidas tanto nas ações das crianças, que já nem tentam explorar novos espaços, e isso nos deixa intrigados, quanto no controle exercido para que as prateleiras permaneçam minuciosamente organizadas, os brinquedos embalados, os cantinhos respeitados. Isso também aparece nas falas e práticas de algumas professoras, que, na rodaviva da rotina, podem nem perceber a intensidade das múltiplas naturalizações de seu fazer.

ESTAR EM FORMAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO E RESISTÊNCIA

A pesquisa aponta para a importância do fortalecimento da formação dos professores de crianças, a fim de que suas necessidades, sua cultura, seu brincar, seu corpo e seu movimento deixem de ser vistos como algo menor, de pouca relevância. Defendemos que as práticas executadas com as crianças não podem, mesmo que tenhamos o maior respeito por seu trabalho, estar apenas nas mãos de profissionais com reduzida formação.

A importância do brincar vai além de um direito da criança, pois diz respeito ao princípio de dignidade humana, respeito àquilo que lhe é próprio, que lhe garante saúde física e emocional. Brincar é construção e apropriação de cultura, é espaço do corpo em movimento, do olhar para si, para seu corpo e suas possibilidades. É por seus modos de brincar e por realizar diferentes brincadeiras que a criança aprende sobre a diferença, a diversidade, o respeito e a cidadania, visto que tudo isso está ativamente implicado na sua experiência de conhecimento e de vida.

A legislação educacional brasileira – que determina a organização dos currículos do curso de formação de professores – tem enfatizado a formação para a docência. Vale destacar que, para além da inserção de disciplinas ou reformulação de ementas e programas, é fundamental pensar o perfil do docente em formação para que se possa atender à necessidade real de professores de crianças.

Defendemos que a formação em pedagogia permita questionamentos e indagações sobre a criança idealizada, as normas e as formas ensinadas para controlar, policiar e vigiar a aprendizagem das crianças. Que tais práticas não sejam naturalizadas e sim enfrentadas, e que, a partir daí, se instaurem novas maneiras de agir com e para as crianças, rompendo com espaços, tempos e estruturas preestabelecidas em prol da vivência plena das crianças nos espaços educativos. Tal vivência plena pode ser experimentada como uma experiência do pensamento, da imaginação, do processo de aprender das crianças. Deve possibilitar de tal forma a “[...] importância de a intencionalidade pedagógica favorecer acontecimentos de maravilhamento, surpresa, estranhamento e padecimento no mundo como modo de complexificar experiências de sentir/pensar, ou seja, de abarcar que imaginar é estar em ato no mundo” (RICHTER; LINO, 2019, p.216)

Os denominados modos de governamento, ou seja, o governo de si e do outro, incidem diretamente sobre a ação do professor com as crianças, no que podemos observar, quando permite ou controla, brinca ou preenche papel, constrói ou busca receita pronta, possibilita a criatividade ou copia o modelo, não há sujeira no fazer arte, convive com o barulho ou exige sempre o silêncio, propõe atividades na natureza ou se encerra na sala de aula etc. Essas ações deveriam sempre ser problematizadas na formação dos professores, tendo em vista que constituem importantes temas de discussão e compreensão da sua professoralidade, como futuro professor da Educação da Infância. Que professores e professoras de crianças possam inventar a si e ao mundo, pois,

[...] aprender é experimentar incessantemente, é fugir ao controle da representação. É também, nesse mesmo sentido, impedir que a aprendizagem forme hábitos cristalizados. [...] Aprender é, antes de tudo, ser capaz de problematizar, ser sensível às variações materiais que têm lugar em nossa cognição presente (KASTRUP, 1999, p. 152-153).

Aprender de si e do mundo e atentar para uma formação em que não se perca de vista a imaginação, o desaprender, a experiência, a brincadeira, a corporeidade, o movimento, a sensorialidade e a sensibilidade da vivência plena da infância. Apostar numa infância vivida na escola do agora, não numa perspectiva preparatória para a próxima etapa educativa ou para a vida adulta, mas na possibilidade de constituição de uma criança hoje; apostar naquelas muitas crianças brasileiras que passam muitas horas de seu dia numa instituição educativa.

Defendemos, com base no que aprendemos com as crianças em nossas pesquisas, estudos e discussões, que ao tratar do brincar, do corpo e da acrobacia cotidiana que é educar e aprender com as crianças, a formação de professores de educação infantil precisa estar vinculada à vivência estética, à compreensão da arte e da cultura infantil. As muitas ações na Educação Infantil precisam ser planejadas e organizadas pelos professores/as, de modo a compor o cotidiano de experimentações nesse segmento de educação.

Crianças e professores estiveram, por medida de saúde e segurança, em função do Coronavírus, confinadas em casa por cerca de dois anos. Trancafiados, interditados e reprimidos, momento em que “Pais, crianças e professores foram instados a participar de um processo de reformulação do seu fazer pedagógico” (DORNELLES; WÜRFEL, 2020, p. 17). Seguimos com a pergunta destas autoras, “Qual o efeito das marcas desse tempo para a vida, seja na sua constituição como sujeitos, seja na formação como cidadãos, seja enfim, na sua construção como pessoa”. Pergunta essa que se estende à formação de professores, à constituição de modos de ser adulto diante dessa criança.

Talvez para isso tenhamos que rever e buscar novos olhares e fazeres com as crianças. Buscar respostas potenciais de crianças aprendizes atentas ao mundo. Como canta Paulinho da Viola, “[...] as coisas estão no mundo só que eu preciso aprender”, ao que Milton Nascimento parece responder – “[...] há que se cuidar do mundo”. Acreditamos que o mundo não estará bem cuidado se as crianças, em sua ontologia, em suas diversas condições e manifestações, não tiverem a devida existência nos currículos de formação de professores e nas políticas públicas. Infâncias e crianças que, com seus corpos em movimento, têm muito a ensinar ao mundo institucional estático.

1[...] ao invés de receptáculos de papéis e funções, os indivíduos passam a ser vistos como atores sociais. Se antes eles eram atores no sentido de atuar em um papel, agora eles o são no sentido de atuar na sociedade, recriando-a a todo momento. São atores não por serem intérpretes de um papel que não criaram, mas por criarem seus papéis enquanto vivem em sociedade (COHN, 2005, p. 20).

2“Porque se a gente fala a partir de ser criança, a gente faz comunhão: / de um orvalho e sua aranha,/ de uma tarde e suas garças,/ de um pássaro e sua árvore./ Então eu trago das minhas raízes crianceiras/ a visão comungante e oblíqua das coisas” (BARROS, 2003)

3A metáfora acesa se direcionava particularmente à professora Patrícia, isto pelo fato de ela acompanhar e compartilhar muitas das propostas das crianças nos momentos de brincadeiras. (MARTINS FILHO, 2013, p. 271)

4Disponibilidade corporal frente ao trabalho docente com as crianças pequenas tende a possibilitar ao professor/educador o reconhecimento de suas possibilidades e limitações corporais na docência e, principalmente, a utilização de sua expressividade corporal como estratégia na prática pedagógica da Educação Infantil (aspectos que caracterizam uma formação pessoal). (GARANHANI, 2005, p. 12)

5Faria (1999b) ressalta que se, no ambiente educativo, se denomine jogos pedagógicos, perde-se parte de sua essência, que é livre, cultural e criativa.

6É estado de ânimo, emergente das atividades praticadas com plenitude. A experiência lúdica está fora, além de todas as diferenças, é única. Por isso, possibilita ao sujeito experimentar a igualdade entre todos e tudo que existe. Estimula a aprendizagem da ética, das estratégias mentais e, sobretudo, da harmonia entre as pessoas (MASSA, 2015, p. 127)

7Informação verbal fornecida respectivamente por Mariana, Eduarda e Silvana, durante entrevistas realizadas em local, 2017

8Informação verbal fornecida durante entrevistas realizadas em local, 2017

9Informação verbal fornecida respectivamente por Mariana, Eduarda e Silvana, durante entrevistas realizadas em local, 2017.

10Informação verbal fornecida durante entrevistas realizadas em local, 2017.

11Informação verbal fornecida respectivamente por Gustavo, Maria Luiza e Camila, durante entrevistas realizadas em local, 2018.

12Informação verbal fornecida, respectivamente, por Claudia e Alice durante entrevistas realizadas em local, 2018.

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Recebido: Setembro de 2022; Aceito: Março de 2023

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