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Revista Teias

Print version ISSN 1518-5370On-line version ISSN 1982-0305

Revista Teias vol.25 no.76 Rio de Janeiro  2024  Epub Mar 07, 2024

https://doi.org/10.12957/teias.2024.74667 

Artigo de Demanda Contínua

HISTÓRIA, CAPITALISMO E MUDANÇAS CLIMÁTICAS: reflexões a partir do documentário Before the Flood

HISTORY, CAPITALISM AND CLIMATE CHANGES: reflections from Before the Flood documentary

HISTORIA, CAPITALISMO Y CAMBIO CLIMÁTICO: reflexiones del documental Before the Flood

Karine Oliveira das Neves1 
http://orcid.org/0000-0001-8051-0809; lattes: 1605871587444404

Michele Mezari Oliveira2 
http://orcid.org/0000-0001-9845-9888; lattes: 8382889236991545

Gildo Volpato3 
http://orcid.org/0000-0001-9167-7559; lattes: 6138659405678020

1UNESC

2UNESC

3UNESC


Resumo

Buscou-se analisar qualitativamente o documentário Before the Flood (2016), intitulado no Brasil como Seremos história?, que retrata as consequências ocasionadas pelas mudanças climáticas devido à ação antrópica. Nesse sentido, o estudo teve como objetivo compreender as mudanças climáticas provocadas pela ação humana no planeta e identificar as possibilidades de evitar o aumento dessas catástrofes, a partir da análise de cenas do documentário Before the Flood (2016). A fim de elucidação e compreensão do documentário, procurou-se estabelecer diálogo com autores, como Gomes (2012), Sagan (2017), Harari (2017) e com o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (IPCC, 2022). O estudo nos permitiu compreender que a preservação planetária e a recuperação ambiental se fazem necessárias e que, para que a espécie humana sobreviva, é preciso haver consciência ambiental. Apesar de muito negacionismo, as mudanças climáticas podem ser evidenciadas pelas imagens do degelo das calotas polares, furacões, desertificação, excesso de gás carbônico na atmosfera, inundações e terremotos. Assim, o contexto atual, repleto de exploração ao meio ambiente desenfreada pelo capital, instiga a reflexão sobre a necessidade de uma consciência cósmica, histórica, ambiental e educacional. O documentário Before the Flood (2016) e os autores em que foi baseado o estudo corroboram a importância da conscientização dos cidadãos e a necessidade urgente de recuperação e preservação do meio ambiente. Se não mudarmos nosso estilo de vida e os princípios nocivos estimulados pela sociedade capitalista de competição, produção, acumulação e consumo, podemos estar no caminho da extinção de nossa espécie e de todas as outras.

Palavras-chave: consciência ambiental; before the flood; mudanças climáticas

Abstract

It has been sought to analyze the documentary Before the Flood (2016) qualitatively, entitled in Brazil as Seremos história?, which portraits the consequences of climate change due to anthropic actions. In this regard the study had as objective understanding climate changes from human actions on the planet and identifying the possibilities of avoiding increase in disasters, having as a starting point from the analyzes of Before the flood (2016) documentary scenes. To elucidate and to comprehend the documentary a connection was established with authors such as Gomes (2012), Sagan (2017), Harari (2017) and with the Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC, 2022). The study allowed us to comprehend that the planetary preservation and the environmental reclaiming is necessary, and for the human species to survive it is necessary to have an environmental awareness. Despite so much denialism, the Climate changes can be evidenced by the images of the polar ice caps melting, hurricanes, desertification, carbon dioxide excess in the atmosphere, floods, earthquakes. The current context full of environmental exploration led by capitalism instigates the reflection about the necessity of a cosmic, historical, environmental, and educational awareness. The documentary Before the flood (2016), as well as the authors on which the study was based corroborate about the importance of citizen’s awareness about the urgent necessity of reclaiming and preserving the environment. If we don´t change our life stale and our harmful principles stimulated by the capitalist society, competition, production, accumulation, and consumption we could be on the way to our species extinction and all others.

Keywords: environmental awareness; before the flood; climate changes

Resumen

Se buscó analizar cualitativamente el documental Before The Flood (2016), titulado en Brasil como '¿Seremos historia?', que retrata las consecuencias ocasionadas por los cambios climáticos, debido a la acción antrópica. En ese sentido el estudio tuvo como objetivo comprender los cambios climáticos provocados por la acción humana en el planeta e identificar las posibilidades de evitar el aumento de esas catástrofes, a partir del análisis de escenas del documental Before The Flood (2016). Con el fin de dilucidar y comprender el documental, se buscó establecer diálogo con autores como Gomes (2012), Sagan (2017), Harari (2017), y con el informe del Panel de Cambio Climático de la ONU (IPCC, 2022). El estudio nos permitió comprender que la preservación planetaria y la recuperación ambiental, se hace necesaria, y para que la especie humana sobreviva, es necesario tener una conciencia ambiental. A pesar de mucho negacionismo, los cambios climáticos pueden ser evidenciados por las imágenes del deshielo de los casquetes polares, huracanes, desertificación, exceso de gas carbónico en la atmósfera, inundaciones, terremotos. El contexto actual, repleto de explotación al medio ambiente desenfrenado por el capital, instiga la reflexión sobre la necesidad de una conciencia cósmica, histórica, ambiental y educativa. El documental Before The Flood (2016), así como los autores en los que se basó el estudio, corroboran la importancia de la concienciación ciudadana, acerca de la necesidad urgente de recuperación y preservación del medio ambiente. Si no cambiamos nuestro estilo de vida y los principios nocivos estimulados por la sociedad capitalista, de competición, producción, acumulación y consumo, podemos estar en el camino de la extinción de nuestra especie y de todas las demás.

Palabras clave: conciencia ambiental; before the flood; cambios climáticos

INTRODUÇÃO

Entramos na terceira década do século XXI e vivenciamos, com uma frequência cada vez maior, os efeitos das alterações climáticas. O sexto e último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU), intitulado Mudanças climáticas 2022: Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade, aponta para uma realidade preocupante que assola diversos países, pede urgência e sinaliza que impactos ainda mais severos podem ocorrer caso não diminuamos as emissões de gases do efeito estufa. O relatório observou que os ecossistemas são interconectados e, por isso, as alterações do clima afetam a diversidade das espécies, assim como a vida das pessoas. O IPCC (2022) salienta, desde o relatório publicado em 2021,

[...] que os impactos detectados são atribuídos às mudanças climáticas, incluindo os impactos de eventos externos. Ele ilustra como os perigos compostos se tornaram mais frequentes em todas as regiões do mundo, com consequências generalizadas. Aumentos regionais de temperatura, aridez e seca aumentaram a frequência e a intensidade dos incêndios. A interação entre fogo, mudanças no uso da terra, particularmente desmatamento e mudança climática, está impactando diretamente a saúde humana, o funcionamento do ecossistema, a estrutura florestal, a segurança alimentar e os meios de subsistência de comunidades dependentes de recursos. (IPCC, 2021, p. 9). (tradução nossa)

A partir dessas preocupações com as questões ambientais globais, este estudo buscou analisar cenas do documentário Before the Flood (2016), intitulado no Brasil Seremos história?, que retrata as consequências ocasionadas pelas mudanças climáticas, devido à ação antrópica, e as perspectivas de recuperação e preservação do meio ambiente. Além disso, teve como objetivo, a partir da análise do documentário mencionado, compreender as mudanças climáticas provocadas pela ação humana e identificar as possibilidades de recuperar e evitar o aumento dessas catástrofes. Ainda, a escolha do referido documentário se deu por sua pertinência e qualidade ao expor tanto as consequências do aquecimento global provocado pelo homem quanto às medidas que vêm sendo definidas e realizadas para sua diminuição.

Foram objeto de reflexão três cenas do documentário Before the Flood (2016): a cena 1 (tempo de início em 00h00min45s e final em 00h03min06s) apresenta uma reflexão sobre a obra O Jardim das Delícias Terrenas, do pintor holandês Hieronymus Bosch; a cena 2 (com o tempo de 00h21min44s a 00h27min58s) apresenta exemplos da divulgação negacionista e de falsas informações sobre as mudanças climáticas, principalmente por políticos e por personalidades da mídia; e a cena 3 (de tempo 00h45min49s até 00h53min55s) retrata os impactos ao meio ambiente causados pelo aquecimento global nos diferentes ecossistemas. Portanto, para atingir o objetivo deste estudo, seguiu-se uma abordagem qualitativa, e os dados foram retirados diretamente da fonte de pesquisa (Bogdan, Biklen, 1994).

Ressaltamos que partimos do documentário por entendermos que o cinema, os filmes, assim como a leitura, desempenham um importante papel na educação, na formação cultural e na socialização dos cidadãos, uma vez que a arte enriquece o acervo pessoal da humanidade (Duarte, 2002). Sabemos, no entanto, que cinema, filmes e documentários são uma invenção moderna que atendem a diferentes interesses de ordem econômica e condicionamentos culturais. Na variedade de gêneros, há filmes e documentários para diferentes públicos e com objetivos diversos, desde os que são produzidos para serem consumidos como mera mercadoria para fins lucrativos, como os que são como arte para fins educacionais ou culturais. Há, também, filmes que reproduzem preconceitos e ideologias, e outros com propósitos reflexivos e até revolucionários, buscando transformar realidades. Então, partimos do entendimento de que o recurso do vídeo, nesse caso em forma de documentário, pode ser usado como arte e expressão humana e pode servir de via de acesso ao conhecimento no meio acadêmico, estimulando um amplo debate capaz de abordar reflexões sobre diferentes conceitos, teorias e temas fundamentais em nosso contexto.

Before the Flood (2016), do qual emergiu as reflexões que aqui apresentamos, foi narrado e apresentado pelo ator, produtor e militante ambiental Leonardo DiCaprio, teve a direção de Fisher Stevens e o roteiro de Mark Monroe. Tal documentário, lançado em outubro de 2016 pela National Geographic, retrata algumas das consequências ocasionadas pelas mudanças climáticas devido à ação antrópica, buscando entender o que tem sido feito para evitar o aumento das catástrofes. Nele, Leonardo DiCaprio viajou por dois anos a alguns países do globo explorando e registrando os impactos destrutivos das alterações climáticas, por isso, sugere atitudes às pessoas a fim de mitigar tão intensos efeitos.

Fonte: Documentário Before the Flood, 2016.

Figura 1 Cartaz de divulgação do documentário Before the Flood (2016), retratando o ambiente natural preservado coexistindo com o ambiente modificado. 

Nesse contexto, em que todos os seres vivos do planeta estão expostos a alterações climáticas e vivenciam modificações que podem causar sérios danos à saúde e à vida, este artigo se propõe a refletir sobre as mudanças climáticas, discutindo sobre suas causas e consequências, a partir do documentário Before the Flood. Portanto, a proposta se caracteriza por descrever algumas cenas, procurando estabelecer diálogos à luz de autores, como Gomes (2012), que, no ensaio Terra, nossa morada no Universo, propõe uma viagem ao universo, de onde poderemos ver a Terra, nosso planeta e lar, e de lá ver sua estrutura e todas os seus recursos disponíveis. Logo, o autor se pontua que muitas pessoas ainda têm a ideia de que nosso planeta possui uma fonte infinita de suprimentos, ou seja, que os alimentos nunca acabarão. Salienta também que essa visão, denominada de síndrome da inesgotabilidade do planeta, é resultado de uma “[...] cultura que ainda não desenvolveu uma mentalidade ambiental” (Gomes, 2012, online).

Para realizar a análise das cenas, propôs-se uma viagem que nos possibilitasse consciência cósmica, consciência histórica e consciência educacional. Nesse percurso, que favoreceu o olhar sobre o Planeta Terra, nos deparamos com a pequenez do ser humano perante a imensidão do universo. Assim, foi inevitável algumas reflexões: quem somos? O que fazemos aqui? O que vemos como importante para nós? Como imaginamos o futuro deste planeta? Essas reflexões nos instigaram a conhecer melhor a nossa história, a nossa relação com o universo e a analisar as possibilidades de futuro.

Na viagem histórica, podemos compreender melhor nossa trajetória enquanto seres humanos, a partir de um contexto histórico e cultural de formação, e perceber as mudanças na sociedade a partir do modo de produção capitalista. Tal modelo é a base da vida em sociedade, muitas vezes, marcado pela exploração sem se importar com os possíveis impactos sobre o ambiente natural (desmatamento, mineração, desenvolvimento agropecuário sem preservação, dentre outros), sobre o consumo e sobre o que nos faz consumir (grandes mídias com base em ideologias consumistas, utilitaristas e imediatistas).

Outro autor utilizado foi Carl Sagan (1934-1996), professor, cientista, escritor e ativista social contra o armamento nuclear. Sua formação científica e intelectual ocorreu no contexto da Guerra Fria (1945-1991) e sua maior produção intelectual se desenvolveu nas décadas de 1970 e 1980. A partir dos ensinamentos no seu livro Cosmos, publicado inicialmente em 1980, foi possível analisar argumentações apresentadas no documentário e ratificar a nossa responsabilidade com o Planeta Terra.

Sendo de contexto histórico diferente de Carl Sagan (1934-1996), Yuval Harari é cidadão israelense, nascido em 1976. Professor de história que se tornou mundialmente conhecido pela obra Sapiens: Uma breve História da Humanidade, publicada originalmente em 2011, colaborou com ideias e questionamentos sobre: de onde viemos? Onde estamos? E para onde vamos?

Já o relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC, 2022) contribuiu na medida em que apresentou a divulgação de conhecimentos sobre as mudanças climáticas. Esses conhecimentos foram reunidos no sexto relatório, destacando as ameaças e de que forma podemos amenizar tais impactos.

O presente artigo se estrutura da seguinte maneira: inicialmente, é feita uma contextualização do tema da pesquisa mudanças climáticas, caracterizando a situação ambiental do planeta na visão de cientistas, e se apresentam perspectivas teóricas. Em seguida, traz-se uma reflexão sobre as mudanças climáticas a partir das três cenas selecionadas do documentário, dialogando com autores, como Gomes (2012), Sagan (2017), Harari (2017), com o relatório do Painel de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC, 2022), dentre outros. Por fim, tece-se algumas considerações finais sobre as mudanças climáticas e sua abordagem no documentário Before the Flood.

A SITUAÇÃO AMBIENTAL DO PLANETA NA VISÃO DOS CIENTISTAS: PERSPECTIVAS TEÓRICAS

O Planeta Terra tem uma história muito antiga, a qual se estima que tenha sido formada há, aproximadamente, 4,6 bilhões de anos. Durante esse tempo, ele passou por muitas mudanças e continua se modificando a cada dia, principalmente em decorrência das ações humanas.

A evolução biológica da espécie humana aconteceu muito rapidamente, se comparada a muitas outras espécies animais. No decorrer desse percurso evolutivo, a fisiologia e a anatomia corporal mudaram, uma vez que iniciamos a produção e o uso de ferramentas, formamos laços sociais e adquirimos diversas habilidades que proporcionaram um salto evolutivo rápido.

Esse salto evolutivo não aconteceu de maneira simples, mas foi uma trajetória com muitas consequências para o próprio ser humano, para os demais animais e todos os outros seres vivos, pois os ecossistemas não tiveram tempo suficiente para se ajustar e se adaptar ao homo sapiens. Nossa história mostra que o caminho traçado pelos sapiens foi marcado por lutas pela sobrevivência, mas também por ganâncias por adquirir, explorar e tomar posse dos recursos. Tornamo-nos, assim, rapidamente, o topo da cadeia alimentar e isso reflete no que vivenciamos hoje com a degradação ambiental e social. Para Harari (2017, p. 15),

O sapiens, diferentemente, está mais para um ditador de uma república de bananas. Tendo sido até tão pouco tempo atrás um dos oprimidos das savanas, somos tomados por medos e ansiedades quanto à nossa posição, o que nos torna duplamente cruéis e perigosos. Muitas calamidades históricas, de guerras mortais a catástrofes ecológicas, resultaram desse salto apressado.

É a partir deste salto apressado, segundo Capra (2006), que nossa espécie não compreendeu os processos evolutivos ao longo dos milhares de anos. Assim, atropelamos a natureza, a história, o conhecimento, a ciência, as certezas e incertezas já concebidas e tudo que envolvia e ainda envolve os processos de transformação climática, política e social. Ao falar sobre os avanços criativos, científicos e tecnológicos, o autor afirma que:

Uma das características mais recompensadoras da emergente teoria dos sistemas vivos é a nova compreensão da evolução que ela implica. Em vez de ver a evolução como o resultado de mutações aleatórias e de seleção natural, estamos começando a reconhecer o desdobramento criativo da vida em formas de diversidade e de complexidade sempre crescentes como uma característica inerente de todos os sistemas vivos (Capra, 2006, p. 179).

Com base nisso, destaca-se que evoluir não é apenas condição biológica, anatômica ou fisiológica. A evolução é a construção de uma consciência que pode se manifestar nos seres humanos, ampliando a relação mente e corpo, razão e emoção, proporcionando aumento da consciência e autoconhecimento.

A autopercepção, até onde sabemos, manifesta-se apenas em animais superiores, e só se desdobra de maneira plena na mente humana. Enquanto seres humanos, não estamos apenas cientes de nosso meio ambiente; também estamos cientes de nós mesmos e do nosso mundo interior. Em outras palavras, estamos cientes de que estamos cientes. Não somente sabemos; também sabemos que sabemos. É a essa faculdade especial de autopercepção que me refiro quando utilizo o termo “consciência” (Capra, 2006, p. 179).

Segundo Artaxo (2014), “[...] o período geológico chamado de Holoceno, que se iniciou há 11.700 anos e continua até o presente, tem sido uma época relativamente estável do ponto de vista climático (Crutzen, 2002 apudArtaxo, 2014, p. 3). Porém, alguns autores sugerem que vivemos atualmente em uma outra era geológica, chamada Antropoceno, ou seja, época geológica do homem, ou o período em que a população humana e suas atividades passaram a afetar o planeta de maneira global. Discute-se, sobretudo, o poder que a espécie humana adquiriu até se tornar uma força destrutiva do planeta. Para Artaxo (2014, p. 3), no Antropoceno, “A humanidade emerge como uma força significante globalmente, capaz de interferir em processos críticos de nosso planeta, como a composição da atmosfera e outras propriedades”. Entretanto, há ainda pessoas que remetem às causas e consequências da apropriação dos recursos naturais e dos desastres ambientais à organização econômica capitalista, isto é, consideram que a destruição não provém da atividade humana em abstrato. Essa era é chamada Capitaloceno.

Certamente, estas duas perspectivas nos conduzem a diferentes interpretações sobre o desenvolvimento material das sociedades e sobre as versões fenomenológicas da crise ecológica. A “era do humanus” significa postular uma centralidade particular de um tipo de sujeito, o Anthropos, daí o Antropoceno como a “época da dominação humana” sobre a Terra; enquanto que a “era do capital” revela uma centralidade no projeto histórico-estrutural de co-produção da humanidade na ampla teia da vida, ou seja, a interpenetração eco-histórica e de longa duração da atividade social humana dentro da essência da vida sob uma lógica de acumulação (Moore, 2016 apudBarcelos, 2019, p. 4).

Também, Sagan (2017) relata sobre a necessidade de reflexão sobre nosso lugar no universo para que se consiga perceber que, dentro dessa imensidão, nosso planeta é minúsculo e precisa ser cuidado a fim de que não caminhemos para a destruição. Para ele,

Em nossa posse deste planeta acumulamos uma perigosa bagagem evolucionária, propensões hereditárias para agressão e ritual, submissão a líderes, hostilidade com forasteiros, o que de algum modo põe em questão nossa sobrevivência. Mas também adquirimos compaixão para com os outros, amor a nossos filhos e aos filhos de nossos filhos, vontade de aprender com a história e uma grande, sublime e apaixonada inteligência - que são os evidentes instrumentos de nossa continuada sobrevivência e prosperidade. Não há certeza quanto a quais aspectos de nossa natureza prevalecerão, sobretudo quando nossa visão, nosso entendimento e nossas perspectivas estão ligados exclusivamente à Terra - ou, pior, a uma pequena parte dela. Porém lá em cima, na imensidão do cosmos, uma perspectiva inescapável nos aguarda (Sagan, 2017, p. 334).

Logo, é preocupante e real a exploração de recursos e os impactos sobre o ambiente natural (desmatamento, mineração, desenvolvimento agropecuário, queimadas, tráfico de animais silvestres, ausência de reciclagem e aproveitamento da matéria, geração de resíduos tóxicos, dentre outros), sobre o consumo, sobre o que nos faz consumir (grandes mídias) e sobre políticas e ideologias que nos enganam. Conforme Guattari (1990), a questão da subjetividade que permeia o ser humano na sua condição individual precisa estar em equilíbrio com as relações sociais estabelecidas para manter a homeostasia entre o homem e a natureza.

Os movimentos ecológicos atuais têm certamente muitos méritos, mas, penso que na verdade, a questão ecosófica global é importante demais para ser deixada a algumas de suas correntes arcaizantes e folclorizantes, que às vezes optam deliberadamente por recusar todo e qualquer engajamento político em grande escala. A conotação da ecologia deveria deixar de ser vinculada à imagem de uma pequena minoria de amantes da natureza ou de especialistas diplomados. Ela põe em causa o conjunto da subjetividade e das formações de poder capitalísticos - os quais não estão, de modo algum, seguros que continuarão a vencê-la, como foi o caso na última década (Guattari, 1990, p. 36).

O autor nos provoca, portanto, a pensar sobre a crise ecológica planetária sob a perspectiva de condições sociais, políticas e culturais, uma vez que o modelo de vida adotado e seguido pela espécie homo sapiens aniquila com seu próprio habitat. Para Guattari (1990, p. 9), as mudanças precisam ocorrer “[...] em grande escala, mas também em domínios moleculares de sensibilidade, de inteligência e de desejo”. Assim, enquanto os seres humanos não internalizarem a verdadeira intenção de mudar seu estilo de pensamento e de vida, estaremos todos fadados ao caos. É com base nesse arcabouço teórico que passamos, então, a apresentar as reflexões e análises levando em conta a abordagem suscitada no documentário.

O QUE OU QUEM ESTÁ CAUSANDO AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS: BEFORE THE FLOOD

A partir da análise de três cenas do documentário, buscamos estabelecer um diálogo no que diz respeito às mudanças climáticas, suas causas e consequências. A primeira cena escolhida, cena 1 (tempo de início em 00h00min45s e final em 00h03min06s), atenta para a obra O Jardim das Delícias Terrenas, do pintor holandês Hieronymus Bosch, pintada aproximadamente nos anos de 1500, e retratou a história da criação do mundo, o paraíso terrestre. Bosch apresenta uma visão pessimista da humanidade, demonstrando, em sua pintura, a destruição da natureza, provocada pelos humanos e a expulsão deles do paraíso, relacionando isso com o inferno.

Esse trecho inicial do documentário nos possibilita refletir sobre a ação antrópica do ser humano sobre os recursos naturais. A disponibilidade de recursos naturais que os seres humanos tinham disponíveis é retratada como o paraíso na terra, mas, com o desmatamento, o aumento da emissão de gases do efeito estufa etc., levando à possibilidade de destruição do planeta, também retrata a possibilidade de vivermos um inferno na terra, caso não agirmos com urgência para evitar tamanhas perdas e danos.

Embora as evidências da destruição e do risco sejam muitas, “[...] a maioria das pessoas ainda vê a Terra como fonte inesgotável e eterna, fruto de um pensamento gerado numa cultura que ainda não desenvolveu uma mentalidade ambiental, no sentido de ver nossas limitações” (Gomes, 2012, online). Outrossim, apesar das muitas vozes denunciando a devastação ambiental no mundo todo, ainda há um conformismo hegemônico global, domesticado pelo poder de sedução da modernidade.

Fonte: Documentário Before the Flood, 2016.

Figura 2 Cena do documentário Before the Flood, retratando o quadro de Hieronymus Bosch (1500). 

A segunda cena selecionada (com o tempo de 00h21min44s a 00h27min58s) mostra a relação do negacionismo e falsas informações que se confrontam com a ciência, muitas vezes difundidas por influentes políticos. Na cena escolhida do documentário, alguns políticos americanos se posicionam em relação às mudanças climáticas. O então senador americano Marco Rubio, do estado da Flórida, em entrevistas às mídias no período de gravação do documentário, deixa explícita sua opinião negacionista sobre as mudanças no clima e, em seus discursos, enfatiza: “Não acredito que a atividade humana esteja causando todas essas mudanças climáticas da forma como os cientistas estão dizendo” (Before the Flood, 2016). Na mesma cena, o ex-presidente americano Donald Trump debocha das evidências científicas quanto à problemática do aquecimento global: “Hoje deveria fazer 20 graus, e está muito frio. Falando em aquecimento global, onde ele está? Precisamos dele” (Before the Flood, 2016). Pode-se perceber nessas falas que há muita oposição à ciência, no entanto, no meio científico, há consenso e preocupação quanto às mudanças climáticas (Before the Flood, 2016).

Fonte: Documentário Before the Flood, 2016.

Figura 3 Cena do documentário Before the Flood, expressando o posicionamento do expresidente americano Donald Trump sobre o aquecimento global. 

Desse modo, uma grande barreira enfrentada na luta contra as mudanças climáticas ocorre em relação às falsas informações difundidas pelas mídias. Entende-se, portanto, a necessidade da formação de cidadãos que sejam críticos quanto a sua realidade, que consigam identificar, classificar e selecionar as informações a que têm acesso, que possam verificar quem é o autor ou autores daquela informação e quais intencionalidades estão por trás do que é dito e divulgado (Oliveira, 2017). A partir dessa formação crítica, poderá ser desenvolvida uma consciência ambiental que compreenda a importância da ciência e que entenda as intenções políticas e financeiras atreladas ao negacionismo do aquecimento global.

Cabe, aqui, uma citação de Harari (2017) que fala sobre as relações de dominação exercidas pelas grandes corporações, pelos governos e que, muitas vezes, não são percebidas, ou seja, acabamos por incorporar práticas, ideias e ideologias de interesse daqueles que dominam. Conforme o autor,

Desde a Revolução Cognitiva, os sapiens vivem, portanto, em uma realidade dual. Por um lado, a realidade objetiva dos rios, das árvores e dos leões; por outro, a realidade imaginada de deuses, nações e corporações. Com o passar do tempo, a realidade imaginada se tornou ainda mais poderosa, de modo que hoje a própria sobrevivência de rios, árvores e leões depende da graça de entidades imaginadas, tais como deuses, nações e corporações (Harari, 2017, p. 17).

Harari (2017) sugere a reflexão acerca de dois mundos ou duas realidades construídas por uma sociedade egocêntrica e causadora de desastres irreversíveis. Conscientemente, as nações tomam suas decisões a partir das necessidades que lhes convêm. Não há mais espaço e tempo para crermos em duas realidades. Estamos vivendo a era da consciência destrutiva, exercendo um papel misantrópico.

O ambiente que é diariamente construído e o ambiente que consideramos natural caminham juntos quando se trata de políticas públicas e capitalismo mundial. O ambiente construído leva em conta os interesses políticos individuais, coletivos e mais localizados, enquanto o ambiente natural permeia em escala mundial, escalando em níveis desastrosos, como os altos níveis de gases causadores do efeito estufa e a destruição da camada de ozônio. Ambos, ambiente construído e ambiente natural, deveriam caminhar juntos e não em lados opostos (MontibellerFilho, 2008).

De acordo com Montibeller-Filho (2008, p. 196), “para as teorias que não tomam o ambiente natural como elemento ativo do processo capitalista, as crises periódicas são vistas como crises de realização (transmudação da mais-valia em lucro, mediante a venda da mercadoria na esfera da circulação)”. Assim, as incoerências nas relações sociais, políticas, culturais e ambientais apresentam contradições nos modos de produção, consumo e disponibilidade de recursos.

Em se tratando de biodiversidade, é importante ressaltar que sua preservação depende da consciência e da racionalidade moral de cada um. Shiva (2003) expõe a produtividade e a eficiência dos modos de produção como modelos que causam vantagens e desvantagens ao ambiente.

[...] a lógica perversa do financiamento da preservação da biodiversidade em troca de uma pequena porcentagem dos lucros gerados pela destruição da biodiversidade equivale a dar licença para a destruição e reduz a preservação a um espetáculo, não a uma base de vida e produção. As desvantagens de preservar os sistemas derivam dos privilégios dados à destruição dos sistemas; não há como chegar à preservação aumentando esses privilégios e aprofundando as desvantagens. Os governos do Terceiro Mundo precisam se lembrar de que não é possível proteger a própria casa contra o roubo pedindo ao ladrão para devolver uma pequena parte do saque. Para haver proteção, é necessário impedir que o assalto aconteça (Shiva, 2003, p. 112).

A autora (Shiva, 2003) ainda se preocupa e alerta para a destruição das diversas variedades de espécies de vida existentes no Planeta Terra, analisando com propriedade o desaparecimento de inúmeros grupos de seres vivos, que serviam para a manutenção do equilíbrio do ambiente. Tal fato ocorre em função da instauração de monoculturas de produção por parte de países dominantes.

No documentário, DiCaprio procurou apresentar diferentes lugares do globo terrestre onde os impactos ao ambiente já são evidentes, como na China, na Índia, nos Estados Unidos e no Brasil. A título de exemplo, na Índia, o segundo país mais populoso do mundo, 30% das moradias não possuem eletricidade e seus habitantes usam biomassa (esterco) para cozinhar.

A pesquisadora, ativista política e ambiental indiana, Sunita Naran1, do Centro de Ciência e Ambiente, alerta para o fato de que, se todos os indianos utilizassem o carvão, o mundo entraria em colapso (Before the Flood, 2016). Portanto, deixa evidente seu posicionamento ambiental, social e político, ao alegar, com propriedade, que o estilo de vida e de consumo precisa estar no centro das atenções durante as negociações e eventos sobre o clima.

A terceira cena (de tempo 00h45min49s até 00h53min55s) selecionada do documentário Before the Flood retrata os impactos ao meio ambiente causados pelo aquecimento global. Nessa passagem, procurou-se mostrar que os diversos tipos de ecossistemas (aquáticos e terrestres, florestas ou oceanos e rios) estão sobrecarregados com os excessos das atividades de nossas espécies. Assim como mostra que desmatamentos, queimadas e altas emissões de gás carbônico na atmosfera são resultado da busca de grandes empresas para reduzir seus custos e aumentar seus lucros. A obra analisada cita, por exemplo, empresas que financiam o desmatamento e queimadas de florestas tropicais, como na Indonésia, para plantação do óleo de palma, considerado o óleo vegetal mais barato do mundo e que é usado para cozinhar alimentos processados, em detergentes e cosméticos (Before the Flood, 2016). Ainda, questiona-se, no documentário, o porquê de os governos não impedirem as ações dessas empresas que provocam tantos danos ao ambiente e chama-se a atenção para a corrupção de governos em favor da aprovação de desmatamentos e queimadas por grandes empresas, ou seja, a corrupção contribui para que o clima sofra alterações.

Fonte: Documentário Before the Flood, 2016.

Figura 4 Cena do documentário Before the Flood, mostrando grandes empresas que utilizam o óleo de palma em seus produtos, contribuindo para a devastação de florestas tropicais. 

Sagan (2017, p. 335) afirma que “[...] o bem-estar de nossa civilização e de nossa espécie está em nossas mãos. Se não falarmos em nome da Terra, quem o fará? Se não estivermos comprometidos com nossa própria sobrevivência, quem estará?”. Essas indagações que faz aos seres humanos nos chama à responsabilidade de unirmos nossas vozes, questionarmos e denunciarmos práticas que não são compatíveis à preservação do nosso ambiente.

Na continuidade, a última cena selecionada mostra como as florestas tropicais vêm sendo devastadas em prol da criação de gado, plantio, mineração e outras atividades destrutivas. Um exemplo citado é o da Amazônia, em que o documentário exibe a progressão exponencial de devastação ocorrida nessa porção do bioma no Brasil, a partir da década de 70 até o ano de 2016, e aponta a criação de bovinos como a principal causa (Before the Flood, 2016).

Fonte: Documentário Before the Flood, 2016.

Figura 5 Cena do documentário Before the Flood, mostrando o aumento exponencial do desmatamento na Amazônia, Brasil (2016). 

Apesar do apelo da comunidade científica, que vem demonstrando os impactos do capitalismo sobre o ambiente e informando causas e consequências, a fim da humanidade compreender que a vida está ameaçada e, assim, mude seus hábitos e cuide dos recursos naturais e do clima de maneira sustentável, na prática, pouca coisa tem se modificado.

Segundo dados do Painel de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC, 2013 apudIPCC, 2022), o limite de aumento de temperatura do planeta seria de 1,5 graus Celsius entre 2030 e 2052 para que não ocorressem tantos impactos. Para isso, seria necessário reduzir pela metade a emissão de gases do efeito estufa e zerar essa emissão até o ano de 2050. No cenário atual, com altas emissões de carbono na atmosfera, as previsões são de que esse limite possivelmente será ultrapassado entre os anos de 2030 e 2040 (IPCC, 2022). De acordo com o relatório, tais mudanças climáticas estão interconectadas e incidem em “outras mudanças sociais” (IPCC, 2022, p. 8) que se tornaram colossais afetando diretamente os seres humanos.

Os impactos das mudanças climáticas são simultâneos e interagem com outras mudanças sociais significativas que se tornaram mais evidentes desde AR5, incluindo a população global em crescimento e urbanização; desigualdade significativa e demandas por justiça social; rápida mudança tecnológica; pobreza contínua, degradação da terra e da água, perda de biodiversidade; insegurança alimentar; e uma pandemia mundial (IPCC, 2022, p. 8). (tradução nossa)

As consequências já estão diante de todos nós. Tempestades de ventos, areia e chuvas, tornados, ciclones, inundações, migração climática e disputa por água e alimento. Diante desse cenário, não podemos permanecer na escuridão, mas devemos, urgentemente, buscar a luz e mudar nossas atitudes nessa atual geração, pois, caso contrário, não teremos gerações futuras.

Conforme Gomes (2012), a educação tem papel essencial para as mudanças de atitudes na formação de crianças e jovens que sejam críticos diante da realidade global de perdas ambientais e consequências climáticas catastróficas.

Na verdade, o ser humano sabe que os problemas com o meio ambiente devem ser prevenidos e não remediados, e a prevenção só é possível pela educação. Daí o único remédio para a “síndrome da inesgotabilidade” é o trabalho educativo, que disciplinará o consumo, e provocará a sustentabilidade em sua existência em todos os aspectos, promovendo uma verdadeira conscientização planetária. A educação fará com que o homem viva desde o nascimento até a morte de maneira sustentável; e esta será a palavra do século, a senha da vida e deve ser despertada desde tenra idade, e em todas as instituições humanas (Gomes, 2012, online)

Como reitera Sagan (2017, p. 357), “A história humana pode ser vista como um lento amanhecer da consciência de que somos membros de um grupo maior”. Assim, espera-se por essa mudança de consciência individual para uma consciência coletiva - da consciência consumista para uma consciência ambiental. Ademais, o autor diz que “Se é para sobrevivermos, nossas lealdades devem ser ampliadas ainda mais, para incluir toda a comunidade humana, todo o Planeta Terra” (Sagan, 2017, p. 357). Entretanto, é preciso unir ainda mais essas vozes para a exigência de ações efetivas por parte dos governos, se empenhando na diminuição do aquecimento global e não apoiando políticas que promovam danos ambientais.

Muitos dirigentes de nações acharão essa ideia desagradável. Terão medo de perder o poder. Ouviremos muitos discursos sobre traição e deslealdade. Estados-nação ricos terão de dividir sua riqueza com os pobres. Mas a opção, como disse uma vez H. G. Wells num contexto diferente, é, claramente, ou o universo ou nada. (Sagan, 2017, p. 357)

Nessa jornada, em que fomos desafiados a pensar e compreender sobre o contexto histórico e cultural do nosso percurso enquanto seres humanos, compreendemos, assim como Capra (2006), que todos os organismos vivos estão interligados em uma grande teia da vida, da qual nós, seres humanos, fazemos parte. Assim, para que a mantenhamos unida, entende-se que a educação é fundamental, uma vez que contribui para a preservação do ambiente quando possibilita reflexões a partir de situações que mostram o cenário ambiental atual, evidenciando como nossas ações influenciam para a desordem ambiental, mas, principalmente, que demonstram que há um sistema econômico que estimula o consumo, a exploração e produz ideologias e falsas informações que culpabilizam a humanidade, em sentido abstrato e genérico, pela devastação ambiental, desvirtuando a responsabilidade primeira da modernidade capitalista.

A preservação planetária e a recuperação ambiental se fazem necessárias e, para tais, apostamos na consciência ambiental. Dessa forma, acredita-se que a reflexão interior pode ser expressa em ações exteriores e influenciar um número maior de pessoas na causa mais importante da espécie humana: a sobrevivência e a manutenção do nosso habitat.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa viagem cósmica, ambiental e educacional podemos compreender nossa trajetória enquanto seres humanos, a partir de um contexto histórico e cultural de formação. Essa visão histórica e cultural nos propiciou pensar sobre a caminhada evolutiva dos seres humanos e sobre os efeitos de nossas ações durante essa trajetória.

As mudanças climáticas já estão ocorrendo e podem ser evidenciadas pelas imagens do degelo das calotas polares, furacões, desertificação, excesso de gás carbônico na atmosfera, inundações e terremotos. No entanto, mesmo com tantas evidências, há negacionistas, que não acreditam ou dizem não acreditar (a fim de satisfazer grupos políticos e grandes empresas exploradoras do ambiente) nas mudanças climáticas causadas pelos humanos. Segundo Leff (2008, p. 15), “[...] a crise ambiental veio questionar a racionalidade e os paradigmas teóricos que impulsionam e legitimaram o crescimento econômico, negando a natureza”.

O documentário Before the Food (2016), de maneira discreta, aponta o efeito do capitalismo no estilo de vida e no consumo exagerado e alerta sobre a necessidade de mudanças de nossas ações individuais e coletivas. Ademais, sugere a implementação de políticas públicas que auxiliem na conscientização sobre a importância da preservação e da recuperação do que foi devastado de forma inconsequente. Ainda, adverte quando mostra que as paisagens naturais e estonteantes também estão sendo vítimas de todo esse processo de mudanças do clima, além de trazer opiniões de pesquisadores sobre as atitudes que o ser humano deve adquirir a fim de mitigar os efeitos das alterações climáticas.

Os autores analisados neste estudo, assim como o documentário, expõem a gravidade das ações humanas no nosso habitat e salientam que não podemos testemunhar as mudanças climáticas de forma passiva, aceitando a degradação dos ecossistemas, mas precisamos juntar as nossas vozes e ecoar em um único tom, refletindo sobre o nosso papel e o da coletividade na continuidade da vida no nosso Planeta. Todavia, enfatizam que, além disso, é necessário ter o apoio dos governantes para atender aos anseios do povo e do ambiente.

Finaliza-se este texto com o entendimento de que o documentário e os autores estudados corroboram acerca da importância da conscientização dos cidadãos para a necessidade urgente de recuperação e preservação do meio ambiente. Além disso, é prudente ressaltar que, se não mudarmos nosso estilo de vida e os princípios nocivos estimulados pela sociedade capitalista, de competição, produção, acumulação e consumo, podemos estar no caminho da extinção de nossa espécie e de todas as outras.

1Para maiores informações sobra a autora, confiram em https://www.cseindia.org/page/sunita-narain

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Recebido: Março de 2023; Aceito: Dezembro de 2023

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