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Educação e Filosofia

versión impresa ISSN 0102-6801versión On-line ISSN 1982-596X

Educação e Filosofia vol.35 no.73 Uberlândia ene./apr 2021  Epub 11-Ene-2024

https://doi.org/10.14393/revedfil.v35n73a2021-58772 

Artigos

Filosofia, educação a descolonização epistêmica do saber1

Philosophy, education and the epistemic decolonization of knowledge

Filosofía, educación y descolonización epistémica del conocimiento

Dannyel Teles de Castro* 
http://orcid.org/0000-0003-4061-3664; lattes: 2403700849744420

Ivanilde Apoluceno de Oliveira** 
http://orcid.org/0000-0002-3458-584X; lattes: 6486192420682817

*Doutorando em Educação na Universidade do Estado do Pará (UEPA). E-mail: dannyeltelesdecastro@gmail.com

**Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Professora na Universidade do Estado do Pará (UEPA). E-mail: nildeapoluceno@uol.com.br


Resumo

O artigo pretende abordar as possíveis contribuições da filosofia latino-americana e das filosofias e pedagogias indígenas na descolonização epistêmica do saber. Para tanto, investiga o trabalho de libertação da filosofia proposto Enrique Dussel e Raúl Fornet-Bettancourt, bem como a noção de colonialidade do saber, pensada por diferentes teóricos da concepção decolonial. Identifica-se a necessidade de compreender o Outro a partir dele mesmo como matriz de um processo decolonizador, e por isso propomos a leitura do trabalho do autor, filósofo e educador indígena Daniel Munduruku, a fim de identificar aspectos que nos ajudem a empreender um trabalho de reconfiguração e descolonização epistemológica.

Palavras chave: Filosofia indígena; Pedagogias decoloniais; Colonialidade do saber

Abstract

The article intends to approach the possible contributions of Latin American philosophy and indigenous philosophies and pedagogies for the epistemic decolonization of knowledge. To this end, we investigates the work of liberating philosophy proposed by Enrique Dussel and Raúl Fornet-Bettancourt, as well as the notion of coloniality of knowledge, thought by different theorists of the decolonial conception. The need to understand the other from himself is identified as the matrix of a decolonizing process, and for this reason we propose the reading of the work of the author, philosopher and indigenous educator Daniel Munduruku, in order to identify aspects that help us to undertake a work of epistemological reconfiguration and decolonization.

Key-words: Indigenous philosophy; Decolonial pedagogies; Cooloniality of knowledge

Resumen

El artículo pretende abordar los posibles aportes de la filosofía latinoamericana y las filosofías y pedagogías indígenas en la descolonización epistémica del conocimiento. Para ello, investiga el trabajo de filosofía liberadora propuesto por Enrique Dussel y Raúl Fornet-Bettancourt, así como la noción de colonialidad del conocimiento, pensada por diferentes teóricos de la concepción descolonial. La necesidad de comprender al otro desde sí mismo se identifica como la matriz de un proceso descolonizador, por lo que proponemos la lectura de la obra del autor, filósofo y educador indígena Daniel Munduruku, a fin de identificar aspectos que nos ayuden a emprender un trabajo. de reconfiguración y descolonización epistemológica.

Palabras clave: Filosofía indígena; Pedagogías decoloniales; Colonialidad del saber

Introdução

Quando falamos em filosofia, logo nos remetemos aos complexos pensamentos esboçados por alguns homens europeus, tomados como símbolos máximos de sabedoria e intelectualidade pela civilização moderna ocidental. Para nós, acadêmicos, que caminhamos hoje em um contexto de crítica ao paradigma dominante, não somente no que diz respeito ao modus operandi científico, mas como também ao conhecimento em uma perspectiva mais ampla, convém repensar a própria noção de filosofia tornada vigente no processo de reprogramação das mentes empreendido pelo colonialismo europeu.

Atualmente, com o avanço de contribuições epistemológicas advindas da problematização acerca da dominação eurocêntrica, sobretudo por meio do campo de estudos que se convencionou chamar de decolonialidade, é possível vislumbrar os horizontes de um pensamento filosófico decolonial. Este, segundo Nelson Maldonado-Torres (2011), possui origens assentadas não em gabinetes acadêmicos, mas no processo de resistência dos povos que vivenciaram a dominação colonial (no caso da Ameríndia, desde cerca de 500 anos atrás) e tiveram sua existência ameaçada por um genocídio sem paralelos na história da humanidade, sendo submetidos aos domínios de povos que se consideravam superiores a eles em todas as searas do existir humano:

La conquista y colonización de las Américas, el genocídio indígena, y la esclavitud racial de poblaciones llamadas índias y de negros africanos a finales de los siglos XV y XVI, no representan simplesmente un episodio más en la história del imperialismo en la humanidad. Para pensadores de la descolonización lo que surge con el llamado descubrimiento de las Américas es nada menos que una nueva forma de ser y poder en el mundo. Contra ese nuevo orden de carácter moderno y colonial, se levanta una ola de pensamento y de prácticas que buscan reconstituir la humanidade de los sujetos y pueblos deshumanizados, no volviendo a un pasado irrecuperable pero tampoco simplemente reconciliándose con el punto de vista y las filosofías del colonizador (MALDONADO-TORRES, 2011, p.1683).

Para Raúl Fornet-Bettancourt (2011), ainda que o termo filosofia seja de origem grega, ele diz respeito a uma potencialidade humana que pode ser e é cultivada em todas as culturas da humanidade. Contrariando a opinião de alguns filósofos modernos, como Martin Heidegger, onde encontramos o entendimento da filosofia como sendo essencialmente grega (dotada de um “espírito grego”), Bettancourt compreende a filosofia como uma pluralidade de formas de pensar e agir.

Segundo Enrique Dussel (2017), o desenvolvimento da civilização capitalista, aliado ao colonialismo, permitiu à filosofia latino-medieval, antes regional e restrita ao continente europeu, posicionar-se como a filosofia moderna europeia. Isto se deu, por um lado, pela decaída de outras filosofias regionais, como a chinesa, a árabe, a hindu, a budista, entre outras, e por outro, pela total negação e invisibilização das filosofias indígenas e africanas.

La expansión colonial moderna, por la apertura de Portugal al Atlántico, en la África, y después en el océano Índico, que superó entonces el “muro” del Império otomano, y la de España hacia el Caribe y América, sitió al mundo islámico y paralizó su desarollo civilizatorio (y filosófico por lo tanto) desde finales del siglo XV. La clássica filosofia árabe no pudo sobreponerse a la crisis del Califato de Bagdad y decayó definitivamente. Asimismo, la presencia del Imperio mongol destruyó igualmente la possibilidad de un novo desarollo de las filosofias budista y vedanta em el siglo XVI. Por su parte, desde finales del siglo XVIII, China comienza a sentir el peso de no haber podido realizar la Revolución Industrial como la haria Gran Bretaña, e igualmente deja de producir nueva filosofía hegemónica desde finales del siglo XVIII. En América Latina, el processo de conquista española destruyó todos los recursos teóricos de las grandes culturas ameríndias y, posteriormente, las colonias españolas e lusitanas tampoco pudieron superar los logros de la escolástica renacentista del siglo XVI, no alcanzando gran creatividad por medio de la escolástica barroca (DUSSEL, 2017, p.22).

Desse modo, a filosofia moderna europeia logrou a si mesma e ao resto do mundo colonial em extrema prostração o título de filosofia universal. Tal universalidade, nos diz Dussel, é inválida, pois na realidade se trata de uma filosofia particular, regional, que foi imposta, de forma tirana, por meio da ação colonial, como a melhor e mais segura maneira de produção do conhecimento.

Também a história da institucionalização acadêmica da filosofia atuou em prol da ocultação da pluralidade filosófica, segundo Fornet-Bettancourt (2011), reduzindo o ato de filosofar a uma disciplina de estudos que possui os textos de filósofos europeus como cânones. A filosofia perdeu, assim, o sentido de uma confrontação prático-reflexiva com distintos contextos de vida, tornando-se prisioneira de uma tradição prepotente que se pretende centro exclusivo de todo o desenvolvimento possível (FORNET-BETTANCOURT, 2011).

Nesse construto, este artigo pretende investigar como os conhecimentos filosóficos e pedagógicos indígenas, isto é, sua maneira de ser, sentir, pensar e agir no mundo, podem auxiliar na descolonização epistêmica do saber, especialmente no que diz respeito ao contexto filosófico latino-americano.

Faz-se importante mencionar que assumimos a perspectiva tratada por diferentes intelectuais latino-americanos, entre os quais Aníbal Quijano (1992), Walter Mingolo (2007), Catherine Walsh (2009), Santiago Castro-Gómez e Ramón Grofoguel (2007), de que o projeto europeu de dominação iniciado com a colonização das Américas não findou com a descolonização jurídico-política empreendida entre os séculos XIX e XX. À perpetuação da negação e inferiorização das culturas dominadas, tornadas periféricas, após o fim da colonização jurídico-política, estes autores nomeiam de colonialidade. Nesse sentido, postula-se que a modernidade está intrinsecamente vinculada ao projeto de dominação da mentalidade eurocêntrica, e desta forma a colonialidade é sua constituinte.

Segundo Castro-Gómez e Grosfoguel (2007), o primeiro processo de descolonização, iniciado no século XIX pelas colônias espanholas e seguida no século XX pelas colônias inglesas e francesas, foi incompleta por ter se limitado à independência jurídico-política das periferias. Caberia à decolonialidade completar este processo:

En cambio, la segunda descolonialización -a la cual nosotros aludimos con la categoria decolonialidad- tendrá que dirigirse a la heterarquía de las múltiples relaciones raciales, étnicas, sexuales, epistémicas, económicas y de género que la primera descolonialización dejó intactas. Como resultado, el mundo de comienzos del siglo XXI necesita una decolonialidad que complemente la descolonización llevada a cabo en los siglos XIX y XX. Al contrario de esa descolonialización, la decolonialidad es un proceso de resignificación a largo plazo, que no se puede reducir a un acontecimiento jurídico-político (CASTRO-GÓMES & GROSFOGUEL, 2007, p.17).

Desse modo, o termo decolonialidade designa, para os autores, uma opção política e epistêmica que se propõe a ir além das suposições de certos discursos acadêmicos e políticos “según la cual, con el fin de las administraciones coloniales y la formación de los Estados-nación en la periferia, vivimos ahora en un mundo descolonizado y pós-colonial” (CASTRO-GÓMES; GROSFOGUEL, 2007, p.13).

Em sua tese de doutorado, Mota Neto (2015, p.49) propõe que o conceito de decolonialidade seja entendido como:

Um questionamento radical e uma busca de superação das mais distintas formas de opressão perpetradas pela modernidade/colonialidade contra as classes e os grupos sociais subalternos, sobretudo das regiões colonizadas e neocolonizadas pelas metrópoles euro-norte-americanas, nos planos do existir humano, das relações sociais e econômicas, do pensamento e da educação. Trata-se de uma concepção, [...] marcada por uma busca persistente pela autonomia, o que só pode ser entendido se tivermos em conta que a decolonialidade tem sido elaborada a partir das ruínas, das feridas, das fendas provocadas pela situação colonial. Portanto, é a partir da dor existencial, da negação de direitos (incluindo os mais elementares, como o direito à vida), da submissão de corpos e formas de pensamento, da interdição a uma educação autônoma que nasce a concepção decolonial.

Conforme Fleuri (2020) e Walsh (2009), o termo decolonial difere-se de descolonial no sentido de que a supressão do ‘s’ indica não ser possível desfazer ou desconstruir a ação colonial, e por isso mesmo nos convida a um estado de permanente alerta e vigilância contra as armadilhas das diferentes colonialidades.

A colonização epistêmica do saber

O paradigma atualmente dominante nas diversas searas da civilização moderna ocidental reflete uma imposição eurocêntrica dos modelos europeus de conhecimento, política, estética e demais formas de existência. O eurocentrismo assume o posto de paradigma universal da história. Conforme a percepção de pensadores como Enrique Dussel (1993), Walter Mignolo (2007), Aníbal Quijano (1992) e Santiago Castro-Gómez (2005), a invasão da Ameríndia vivenciada a partir de 1492 marca a experiência fundante deste paradigma e, portanto, do pensamento moderno.

Para Enrique Dussel, o “descobrimento” das terras americanas alcançado pela expansão ultramarina de portugueses e espanhois foi o ponto de partida para a criação do que chama de mito da modernidade, que consiste em “vitimar o inocente (o Outro), declarando-o causa culpável de sua própria vitimação e atribuindo-se ao sujeito moderno plena inocência com respeito ao ato sacrifical” (DUSSEL, 1993, p.76). Ou seja, Dussel sustenta que o estabelecimento da modernidade se deu a partir da conquista e subordinação dos povos indígenas, onde os subordinadores europeus autodefiniram-se como culturalmente superiores. Isto não aconteceu sem que o Outro, a cultura dominada, vista como inferior, rude, bárbara, fosse tida como culpada por sua “imaturidade”, e por isso passível de dominação (guerra, violência) para que se “desenvolva”, se “modernize”: “A chamada conquista é, na realidade, um ato emancipatório, porque permite que o bárbaro saia de sua ‘imaturidade’, de sua barbárie” (DUSSEL, 1992, p.77).

Na lógica de Dussel, a modernidade é um mito porque evidencia o sentido emancipador da razão moderna europeia ao mesmo tempo em que oculta o processo de violência e dominação que exerce sobre outras culturas. Dessa forma, o sofrimento produzido no Outro fica justificado pela intenção de salvá-lo daquilo que se enxerga como selvageria e primitivismo cultural. A opressão constitui-se como um “processo civilizador” capaz de tirar outras culturas de sua própria barbárie, o que configura um progresso, um desenvolvimento, um bem para elas mesmas (DUSSEL, 1993). Assim, “o ego cogito moderno foi antecedido em mais de um século pelo ego conquiro (eu conquisto) prático do luso-hispano que impôs sua vontade (a primeira ‘Vontade-de-poder’ moderna) sobre o índio americano” (DUSSEL, 2005, p.28).

A colonização, segundo Aníbal Quijano (1992), ultrapassou a mera subordinação de outras culturas pela europeia em uma relação externa e atuou no interior das culturas oprimidas, na colonização do imaginário daqueles que foram dominados. Em um primeiro momento, houve a repressão não apenas de crenças, ideias, imagens, símbolos e conhecimentos que não serviam para a dominação colonial global, mas também do modo de conhecer e produzir conhecimento e perspectivas, dos recursos, padrões e instrumentos de expressão formalizada e objetivada, intelectual ou visual (QUIJANO, 1992). Foi, assim, seguida pela imposição do uso dos padrões de expressão, crenças e produção de conhecimento dos dominadores europeus, como forma de impedir a produção cultural dos dominados e desta forma obter controle social e cultural sobre eles.

Conforme Quijano, os colonizadores europeus impuseram também uma imagem mistificada de seus próprios padrões de produção de conhecimento e significações, o que foi responsável por tornar a europeização cultural uma aspiração para as outras culturas:

Entonces, la cultura europea se convirtio, ademas, em una seducción: daba acceso al poder. Despues de todo, mas alIa de la represion, el instrumento principal de todo poder es su seducción. La europeización cultural se convirtió en una aspiración. Era un modo de participar en el poder colonial pero tambien podia servir para destruirlo y, despues, para alcanzar los mismos beneficios materiales y el mismo poder que los europeos; para conquistar la naturaleza. En fin, para el "desarrollo". La cultura europea pasó a ser un modelo cultural universal. El imaginario en las culturas no-europeas, hoy dificilmente podria existir y, sobre todo, reproducirse, fuera de esas relaciones (QUIJANO, 1992, p.13).

Santiago Castro-Gómez e Ramón Grofoguel (2007) sustentam que a divisão internacional do trabalho entre centros e periferias, bem como a hierarquia étnico-racial das populações, formada durante séculos de expansão colonial europeia, não se transformaram significativamente após o fim do colonialismo e a formação dos estados-nação na periferia global. Para os autores, o que houve foi uma transição do colonialismo moderno para a colonialidade global, que perpetua a estrutura das relações desiguais de poder entre centro e periferia. O capitalismo contemporâneo é responsável por manter essa estrutura, ressignificando “las exclusiones provocadas por las jerarquías epistémicas, espirituales, raciales/étnicas y de género/sexualidad desplegadas por la modernidad. De este modo, las estructuras de larga duración formadas durante los siglos XVI y XVII continúan jugando un rol importante en el presente” (CASTRO-GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007, p.14).

É nesse contexto que vemos a atuação da dominação colonial no interior do imaginário dos dominados, sendo reproduzida através da repressão às crenças, ideias, representações, símbolos, enfim, ao conhecimento como um todo, daqueles que foram inferiorizados pelo sistema colonialista, isto é, os povos originários da Ameríndia, ou Abya Yala - que é a expressão designada ao continente americano pelo povo Kuna, e na sua língua significa “Terra madura”, “Terra viva” ou “Terra em florescimento” -, bem com os povos africanos e afrodescendentes.

Como pontua Quijano (1992), trata-se de uma repressão aos diferentes modos de conhecer e de produzir conhecimento, cujos elementos não se encaixam nos padrões da visão eurocêntrica de mundo.

A este problema Catherine Walsh (2005) dá o nome de colonialidade do saber, responsável pela negação do legado intelectual dos povos indígenas e africanos em detrimento da hegemonia da epistemologia moderna europeia e seus meios de produção do conhecimento. Segundo Walsh (2005, p.19):

la colonialidad del saber debe ser entendida como la represión de otras formas de producción del conocimiento (que no sean blancas, europeas y científicas), elevando una perspectiva eurocêntrica del conocimiento y negando el legado intelectual de los pueblos indígenas y negros, reduciéndolos como primitivos a partir de la categoria básica y natural de raza.

Sendo a colonialidade um processo de dominação generalizada, isto é, com dimensões políticas, econômicas, culturais, epistemológicas, estéticas, filosóficas e teológicas, podemos compreender a colonialidade do saber como a sua dimensão epistêmica, que se refere ao efeito de “subalternização, folclorização ou invisibilização de uma multiplicidade de conhecimentos que não respondem às modalidades de produção de conhecimento ocidental associadas à ciência convencional” (RESTREPO; ROJAS, 2010, p.136).

Mignolo (2005) chama atenção para o fato de que essa afirmação da hegemonia epistêmica europeia foi reproduzida ao longo do tempo pelas ciências humanas, responsáveis por legitimar a invenção do Outro. Castro-Gómez (2005) acrescenta que a história e áreas afins, como a etnografia, a geografia, a antropologia, a paleontologia, a arqueologia, etc., justificam o colonialismo quando realizam comparações com o mundo europeu ao estudarem o passado das civilizações e seus produtos culturais e institucionais.

A opressão epistemológica empreendida com a colonialidade do saber causa o apagamento das formas de produção de conhecimento operadas pelos povos dominados pela ação colonial.2 O resultado disso se traduz na marginalização, folclorização e até demonização dos conhecimentos indígenas e africanos, como pode facilmente ser percebido na sociedade brasileira hoje. Assim, a epistemologia moderna ocidental é responsável pela negação e inferiorização das epistemologias indígenas, africanas, e outras.

Conforme Eduardo Restrepo e Axel Rojas (2010, p.137):

la colonialidad del saber opera dentro del eurocentrismo ya que considera las modalidades de conocimiento teológico, filosófico y científico no sólo como propriamente europeas, sino como superiores epistémicamente o incluso como las únicas válidas. La superioridad assumida de estas modalidades de conocimiento ha estado estrechamente ligada a la dominación europea de otras poblaciones y regiones. De tales modalidades se ha derivado una serie de tecnologias de sujeción y explotación de las poblaciones y regiones de la periferia colonial y postcolonial. Por tanto se puede afirmar que el núcleo de la colonialidad del saber consiste el gobierno de los otros y de sí en nombre de la verdad producida por el saber experto (del teólogo, filósofo, gramático o científico).

A dita superioridade da epistemologia moderna afinca-se na pretenciosa noção do conhecimento ocidental como detentor de universalidade, objetividade e neutralidade, o que, na retórica da modernidade, é suficiente para tornar inferiores outras formas de conceber e produzir conhecimento, ou seja, o saber científico, moderno, tido como válido, com pretensão de universalidade, está assentado nas supostas objetividade e neutralidade de uma epistemologia onde o sujeito deve distanciar-se de si mesmo para produzir um conhecimento supostamente não contaminado pelas suas particularidades e interesses (RESTREPO; ROJAS, 2010; CASTRO-GÓMEZ, 2007).

Para Santiago Castro-Gómez (2007), tal distanciamento de si com pretensão de produzir um conhecimento de alcance universal ocorre desde um ponto de vista que subsume todos os outros pontos de vista, mas não se mostra como tal. Nesse interim, ainda de acordo com o autor, a ciência moderna produz conhecimento através de um modo de observação que julga onipresente e onisciente, que tudo vê, mas não pode ser visto:

Como Dios, el observador observa el mundo desde una plataforma inobservada de observación, com el fin de generar una observación veraz e fuera de toda duda. Como el Dios de la metáfora, la ciencia moderna occidental se sitúa fuera del mundo, pero a diferencia de Dios, no consigue obtener uma mirada orgânica sobre el mundo sino tan sólo una mirada analítica (CASTRO-GÓMEZ, 2007, p.83).

O modo de produção de conhecimento moderno ocidental evidencia, portanto, um ponto de vista particular que se esconde e se disfarça de universal como se estivesse além dos demais pontos de vista (GROSFOGUEL, 2006; DUSSEL, 2017). Esta é, para Castro-Gómez, a dimensão epistêmica do colonialismo, e o que Restrepo e Rojas (2010) consideram como o marco da colonialidade do saber, que parte da visão colonialista da incapacidade de produção do conhecimento por parte dos sujeitos não modernos.

Ramon Grosfoguel (2006) utiliza o termo ego-política do conhecimento para se referir a esta forma de proceder da epistemologia moderna ocidental. Trata-se de privilegiar um ego não situado, pois na filosofia e ciência ocidentais o sujeito que fala está sempre escondido ou disfarçado, borrando-se da análise, não sendo expostas relações entre a explicação epistêmica do sujeito que produz conhecimento, o conhecimento gerado e suas articulações com processos de dominação. Grosfoguel (2006, p.22) entende que todos os conhecimentos estão situados epistemologicamente do lado dominante ou do lado subalterno das relações de poder, e, portanto, a neutralidade e objetividade “desencorpadas e deslocalizadas” desta ego-política do conhecimento são um mito ocidental.

Essa é a estratégia epistêmica adotada desde a fundação da filosofia moderna ocidental, e por meio dela se legitima a construção de uma hierarquia de conhecimento superior e inferior. Segundo Grosfoguel (2006, p.23):

Rene Descartes, fundador de la filosofía occidental moderna, inaugura un nuevo momento en la historia del pensamiento occidental. Reemplaza a Dios, como base del conocimiento en la Teo-política del conocimiento de la Edad Media europea, com el Hombre (occidental) como la base del conocimiento en los tiempos modernos europeos. Todos los atributos de Dios se extrapolan ahora al Hombre (occidental). Verdad universal más allá del tiempo y el espacio, acceso privilegiado a las leyes del Universo y la capacidad de producir el conocimiento y la teoría científicos se colocan ahora en la mente del Hombre Occidental. El «ego-cogito» cartesiano («pienso, luego soy») es la base de las ciencias modernas occidentales. Al producir un dualismo entre mente y cuerpo y entre mente y naturaleza, Descartes logro reclamar un conocimiento no situado, universal y de visión omnipresente. [...] Históricamente, esto ha permitido al hombre occidental (el término sexuado se usa intencionalmente aquí) para representar su conocimiento como el único capaz de lograr una conciencia universal y desechar el conocimiento no occidental tildándolo de particularista y, por ende, incapaz de alcanzar la universalidad.

Nesse interim, para Mignolo (2007), a decolonialidade é precisamente a energia de descontentamento, desconfiança e distanciamento entre aqueles que reagem em face da violência produzida pela lógica opressiva da colonialidade. Uma energia “que no se deja manejar por la lógica de la colonialidad, ni se cree los cuentos de hadas de la retórica de la modernidad”, uma vez que o par modernidade/colonialidade “genera necesariamente la energía irreductible de seres humanos humillados, vilipendiados, olvidados y marginados” (MIGNOLO, 2007, p.27).

Assim, a decolonialidade tem se mostrado não como um conceito teoricamente fechado, mas uma “energia”, um questionamento radical, um enfrentamento político e epistêmico ao eurocentrismo dominante, que se traduz não somente em uma teoria crítica da modernidade/colonialidade e seus desdobramentos, mas na busca pela construção de outras práticas e reflexões epistêmicas.

A proposta do coletivo, ou rede, de intelectuais que compõem este movimento epistemológico fundamental para a renovação crítica das ciências sociais no século XXI é de que se empreenda aquilo que Nelson Maldonado-Torres (2008, 2011) chamou de giro decolonial. Isto é, uma mudança, um giro, nas coordenadas do pensamento, até então orientadas pela razão moderna (e, portanto, pela colonialidade), tendo como projeto ou horizonte possível de mudança a descolonização (epistêmica, filosófica, cultural, estética, etc.).

Filosofia latino-americana: uma ruptura histórica

Em consonância com a constatação de que a colonialidade do saber tem sido a base para a sistematização da filosofia moderna ocidental, atualmente desenvolve-se com vigor na América Latina um campo filosófico crítico ao paradigma epistemológico vigente.

Um dos principais argumentos que emergem deste campo em favor da descolonização epistêmica da filosofia é a natureza plural desta. De acordo com o filósofo cubano Raul Fornet-Bettancourt (2011), a filosofia é uma potencialidade humana cultivada em todas as culturas da humanidade. Tal potencialidade sempre existiu na história da humanidade, e na Grécia recebeu o nome de filosofia. Nesse sentido, conforme vimos anteriormente, o autor entende que tornar absoluto o pensamento filosófico de uma dessas culturas e propagá-lo como o único válido é uma posição etnocêntrica que converte em centro do mundo o que na realidade é apenas uma região do mesmo.

A pluralidade da filosofia, para Fornet-Bettancourt, se deve não apenas às suas muitas formas de produção e línguas em que é feita, mas também a sua natureza contextual. Essa natureza encontra-se ocultada, pois na história da institucionalização acadêmica da filosofia houve a sua redução a uma disciplina, ou ramo do saber acadêmico, ou ainda a uma “carreira”, que consequentemente responde aos interesses sociais e culturais de formações fomentadas por instituições de ensino nacionais e estatais (FORNET-BETTANCOURT, 2011).

Por isso, para libertar a filosofia desses interesses implícitos na formação acadêmica institucionalizada, bem como da tradição eurocêntrica que se apoderou dela, Fornet-Bettancourt considera necessário tratá-la como um ato contextual plural, “haciendo así posible el ecuentro con ella en muchos lugares distintos y en una multiplicidad irreductible de formas de expresión” (FORNET-BETTANCOURT, 2011, p.640). Ao invés de priorizar o estudo de textos tidos como clássicos, assumir o caráter contextual da filosofia possibilita a observação da sua capacidade de constituir-se como um saber que sabe intervir no curso da história em nome do que foi negado como realidade possível. Trata-se de um saber:

articulado a los processos historicos correspondientes; un saber que sabe de las interpretaciones de su contexto y de cómo en elas se reflejan planes para hacer que la realidad sea de esta u outra forma, siga este o aquel curso; o sea, que sabe del conflito de interpretaciones de su contexto y que la realidad sea de ésta u otra forma, siga este o aquel curso; o sea, que sabe del conflicto de interpretaciones de la realidad en tanto que conflicto en el que está en juego la realidad en su marcha misma, la realidad por hacer; o, si se quiere, sabe que ese conflicto decide también sobre las realidades que serán o no posibles. Pero por eso mismo, por saber que sabe que lo que se juega en ese conflicto es nada menos que el poder hacer realidad, el saber filosófico contextual es fundamentalmente práctico; esto es, un saber que, con base en el discernimento del conflicto entre los modelos de interpretación de la realidad, se articula en los movimentos sociales alternativos y libertadores, y de esta forma se integra a un plan o provecto para realizar esas otras realidades que hoy parecen imposibles (Ibid.).

É precisamente com esta característica de um saber libertador que a filosofia latino-americana apresenta-se diante da problemática da colonialidade do saber. De acordo com Enrique Dussel (1986, p.211), a filosofia latino-americana é um movimento constituído no pensar a partir do Outro, “que sabe escutar discipularmente a palavra analética, analógica do oprimido, que sabe comprometer-se com o movimento ou com a mobilização de libertação”.

Para engajar-se numa tarefa de pensar filosoficamente desde a América Latina, é preciso levar em consideração a filosofia como saber contextual, que enxerga os processos de dominação e sofrimento vivenciados pelos povos de Abya Yala desde a invasão hispânica.

Com esse intuito surgiu, na década de 1970 (portanto, herdeiro dos movimentos de 1968), o movimento chamado de Filosofia da Libertação, cuja principal voz é a de Enrique Dussel, filósofo argentino radicado no México. Para o autor, não se trata simplesmente de um pensamento latino-americano ou historiografia deste, mas de um fazer filosófico crítico e localizado autocriticamente na periferia ou nos grupos subalternos (DUSSEL, 2017).

Esse pensar filosoficamente de forma libertadora, conforme Dussel, parte de uma crítica à razão moderna e ao sujeito cartesiano, assumindo um caráter ontológico fundamental. A principal retórica postulada pela filosofia moderna ocidental é a da racionalidade como sendo exclusiva ao sujeito moderno. Os demais são caracterizados como irracionais ou desprovidos de faculdades cognitivas elevadas. O ego cogito cartesiano relaciona-se diretamente com o ego conquiro apontado por Dussel nesta lógica, onde o homem branco europeu assume a condição de ser, enquanto o Outro, subalterno, dominado, é o não-ser. Não pensar é uma marca do não-ser na modernidade, ao passo em que apenas o “eu” europeu civilizador está na luz da razão.

Dussel considera que todo o discurso da modernidade é um fenômeno eurocêntrico pois revela nas entrelinhas um processo civilizatório da cultura europeia, cujo pensamento está assentado erroneamente na ideia de que “a Europa teve características excepcionais internas que permitiram que ela superasse, essencialmente por sua racionalidade, todas as outras culturas” (DUSSEL, 2000, p.51). Nesse interim:

Dussel questiona: que direito tem o sujeito dessa cultura eurocêntrica de se considerar autorreferente e superior ao Outro, de outra cultura, etnia, gênero, classe, capacidade ou idade? O mito da modernidade nega o Outro e a sua cultura, apresentando-o como culpado, e o vitimador, como inocente, bem como legitima a violência para compelir o Outro a fazer parte da civilização. A cultura do Outro é negada porque é vista como barbárie, mas sua cultura não precisa ser destruída e sim melhorada e aperfeiçoada (OLIVEIRA; DIAS, 2012, p.97).

A partir desta constatação, Dussel propõe o método epistemológico analético como forma de reconhecer o Outro a partir dele mesmo:

O Outro, para nós, é a América Latina em relação à totalidade europeia: é o povo pobre e oprimido da América Latina em relação às oligarquias dominadoras e, contudo, dependentes. O método do qual queremos falar, o ana-lético, vai mais além, mais acima, vem de um nível mais alto (aná-) que o do mero método dia-lético. O método dia-lético é o caminho que a totalidade realiza em si mesma: dos entes ao fundamento e do fundamento aos entes. Trata-se agora de um método (ou do domínio explícito das condições de possibilidade) que parte do Outro enquanto livre, como um além do sistema da totalidade; que parte, então, de sua palavra, da revelação do Outro e que con-fiado em sua palavra, atua, trabalha, serve, cria. O método dia-lético é a expansão dominadora da totalidade desde si; a passagem da potência para o ato de “o mesmo”. O método ana-lético é a passagem ao justo crescimento da totalidade desde o Outro e para “servi-lo” criativamente. A passagem da totalidade a um novo momento de si mesma e sempre dia-lética; tinha, porém, razão Feuerbach ao dizer que “a verdadeira dialética” (há, pois, uma falsa) parte do diálogo do Outro e não do “pensador solitário consigo mesmo”. A verdadeira dia-lética tem um ponto de apoio ana-lético (é um movimento ana-dia-lético); enquanto a falsa, a dominadora e imoral dialética é simplesmente um movimento conquistador: dia-lético (DUSSEL, 1986, pp.196-197).

Trata-se de uma contribuição filosófica que visa superar as limitações criadas pela epistemologia moderna ocidental ao voltar-se para o Outro, sua cultura, sua sabedoria, símbolos, crenças, práticas sociais, etc. Por isso, considera o Outro desde ele mesmo, e não mais a partir de si, do eu racional, moderno, conquistador, eurocêntrico, como tem sido empreendido no contexto moderno.

Na modernidade, o Outro (mulheres, negros, indígenas, não-cristãos, etc.) é sempre em referência ao eu dominante (homem, branco, civilizado, cristão). A filosofia da libertação, bem como o seu exercício epistemológico analético, consiste justamente no reconhecimento do Outro em sua totalidade, das suas práticas, ações, cosmovisões, saberes. Assim como também de suas filosofias, pedagogias e epistemologias. Trata-se de fazer emergir modelos outros de conhecimento a partir daqueles que foram silenciados e invisibilizados pelo processo civilizatório de dominação europeia.

Filosofia e educação no contexto indígena: um outro tipo de conhecimento

Parafraseando o filósofo sul-africano Mogobe Ramose (2011), negar a existência das filosofias indígenas é precisamente questionar o estatuto ontológico de seres humanos dos povos indígenas, perpetuando o exercício de silenciamento empreendido pelos europeus na modernidade. Se os dominadores tornaram marginais os saberes indígenas por supor que eles são destituídos de filosofia, ciência e do verdadeiro espírito religioso (NOGUERA, 2012), ao ir na contramão desta ideia e propor a descolonização do conhecimento, devemos aprioristicamente assumir que, sim, os povos indígenas possuem tudo isso.

Para esta tarefa, traremos à tona o pensamento de Daniel Munduruku, autor, filósofo e educador indígena paraense pertencente à etnia Munduruku. O autor graduou-se em filosofia, história e psicologia, fez mestrado em antropologia social pela USP, doutorado em educação também pela USP e pós-doutorado em literatura pela UFSCar. É diretor-presidente do Instituto Uk´a - Casa dos Saberes Ancestrais, autor de mais de 50 livros e engajado politicamente no movimento indígena brasileiro. O texto de Munduruku que tomaremos por base para compreender a filosofia indígena é Educação Indígena: do corpo, da mente, do espírito, publicado em 2009 na Revista Múltiplas Leituras.

Neste texto, Munduruku (2009) explica que a filosofia indígena é baseada na unidade entre corpo-mente-espírito, e por isso a educação indígena é uma educação voltada para o corpo, a mente e o espírito. Uma educação holística, na qual prevalece a noção de circularidade (do tempo, dos acontecimentos, das relações intra e interpessoais, etc). Conforme o autor:

A educação indígena é muito concreta, mas, ao mesmo tempo, mágica. Ela se realiza em distintos espaços sociais que nos lembram sempre que não pode haver distinção entre o concreto dos afazeres e aprendizados e a mágica da própria existência que se “concretiza” pelos sonhos e pela busca de harmonia cotidiana. Isso, é claro, pode parecer contraditório à primeira vista, mas segue uma lógica bastante compreensível para nossos povos, pois não é uma negação dos diferentes modos de coexistência como se tudo fosse uma coisa única, mas um modo da mente operacionalizar o que temos a pensar e viver (MUNDURUKU, 2009, p.23).

Nesta realidade concreta e mágica, surge também uma outra noção de temporalidade. Segundo Munduruku, para alguns povos originários a noção de futuro, por exemplo, é inexistente, pois a filosofia indígena “se baseia na ideia do presente como um presente que recebemos de nossos ancestrais e pela certeza de que somos seres de passagem, portanto desejosos de viver o momento como ele se nos apresenta”. A filosofia indígena, então, expõe uma noção de tempo alicerçada na ancestralidade, no passado memorial, onde a orientação para o futuro não aparece de forma tão evidente como no contexto moderno ocidental, no qual se tem a valorização do futuro em um sentido utilitarista, associado à economia e à produção de riqueza (MUNDURUKU, 2009).

O “futuro” é, pois, um tempo que não se materializou, não se tornou presente e, por isso, impensável para a lógica que rege nossa existência. Em alguns povos sequer existe palavra para expressar futuro tal como elaborou o ocidente mais no sentido utilitarista ligado à economia e à produção de riqueza. Para o pensar indígena a ideia de acumular, produzir, poupar ou guardar traz consigo uma concepção de tempo que empobrece a própria existência porque torna as pessoas mais vazias e egoístas. Claro está que pensar assim dentro de um mundo marcado pela especulação - esta sim uma visão utilitarista do tempo - nos leva a uma compreensão dos motivos que marcaram a relação do ocidente com os povos originários. Foi uma relação impositiva regida pela violência tanto secular quanto religiosa. Ambos os olhares negavam humanidade aos povos indígenas porque traziam consigo uma noção de tempo e trabalho calcada no mito judaico- cristão da criação que pregava que o homem deveria dominar a natureza, submetê-la a seus caprichos e tirar dela tudo o que pudesse. Negavam, assim, a possibilidade destes povos terem construído uma cosmovisão baseada na unidade corpo/mente/espírito, pois isso jogava por terra a doutrina do poder cristão do rei e da igreja. Daí a cruz ser trazida para ser carregada pelos originários da terra e nunca pelos que a trouxeram; daí a espada que atravessou não apenas o corpo dos antepassados, mas também o seu espírito (MUNDURUKU, 2009, p.23).

Diante disso, a filosofia indígena é hoje um patrimônio ancestral e de resistência que os povos originários nos legaram, pois, para o autor: “ainda que ignorado, negado ou transformado pelos colonizadores - do corpo e da alma - o saber que sempre alimentou nossas tradições se manteve fiel aos princípios fundadores”. Munduruku (2009) entende que os principais fenômenos aos quais a filosofia indígena deve resistir são o capitalismo e a economia moderna, por exaltarem a dominação do ser humano sobre a natureza e a consequente destruição e subordinação desta para obtenção de lucro e poder. Porém, segundo o autor, entre os povos indígenas, tal resistência não ocorre sem “muitas baixas ao canto da sereia do capitalismo selvagem, cujo olhar frio concentra-se na fragilidade humana que é capaz de vender sua dignidade e ancestralidade em troca de um conforto e bem estar ilusórios” (MUNDURUKU, 2009, p.24).

Para Munduruku, é justamente na visão holística concentrada na tríplice compreensão a respeito da educação corpo-mente-espírito que está um dos principais fatores de resistência da filosofia indígena, pois, trata-se de uma teoria elaborada “pela experiência de vida, pela observação meticulosa dos fenômenos naturais e pela certeza de que somos fios na teia”.

Na filosofia indígena, a educação do corpo é caracterizada pelo autor como uma educação dos sentidos. O corpo é visto como sagrado, e aqui é importante salientar que se ressalta uma visão de sagrado que não condiz com o significado atribuído pelo ocidente ao termo, de santificado, ou imaculado; na visão indígena, a sacralidade do corpo diz respeito à valorização do cuidado que se deve ter com ele para que ele cuide de nossas necessidades básicas. Mas, além disso, a filosofia indígena compreende também as limitações do corpo humano, devido à existência transcende-lo através da alma, por isso o corpo também pode ser considerado como uma prisão desta (MUNDURUKU, 2009).

Segundo Munduruku, a filosofia indígena considera que os vazios do corpo precisam ser preenchidos com os sentidos, e desse modo a educação do corpo orienta-se, desde a infância, para o aprendizado e conhecimento de coisas que possam preencher esses vazios:

É, portanto, necessário valorizar o próprio corpo e dá a ele os instrumentos para que possa cuidar da gente. Assim, é de extrema importância conviver com meu grupo de idade por ser ele que me vai “guiar”, dar um norte para as descobertas que meu corpo infantil precisa fazer. É nesta convivência que a criança indígena vai treinar a vida comunitária como uma necessidade ímpar para sua realização e compreensão do todo. Além disso, vai oferecer-lhe o olhar para seu entorno e descobrir que os sentidos, junto com os comportamentos que eles vão criando, representam sua única segurança e garantia de sobrevivência contra os perigos que a floresta traz. Ao descobrir estes vazios que o corpo possui a criança indígena não vê com desprezo a necessidade de adquirir conhecimentos complementares. Ao contrário, ela percebe como é importante deleitar-se com eles num processo de aprendizagem que passa pela leitura do entorno ambiental. Vai compreendendo, então, que o ambiente a ser observado vai deixando marcas que dão sentido ao seu ser criança e à sua própria vida. Entende, então, que o uso dos sentidos confere sentido às suas ações: ganha sentido a leitura das pegadas dos animais, do voo dos pássaros, dos sons do vento nas árvores, do criptar do fogo, das vozes da floresta em suas diferentes manifestações. Conscientiza-se de que andar pela mata é mais que um passeio de distração ou diversão; que subir na árvore é mais que um exercício físico; que nadar no rio é mais que brincadeira; que produzir seus brinquedos é mais que um desejo de satisfação; que ficar horas confeccionando a cultura material de sua gente é mais que uma necessidade. A criança vai, aos poucos, entendendo que no seu corpo o Sentido ganha vida. Suas ações são norteadas pela ausência que mora em seu corpo e que precisam ser preenchidas por aquilo que dá razão à sua existência (MUNDURUKU, 2009, p.25).

Vemos, assim, um outro olhar sobre a educação do corpo, na qual o sentido das coisas vivenciadas, o contato íntimo com a natureza e a simplicidade possuem mais importância no processo de aprendizagem. Outra ruptura com a visão moderna ocidental estabelecida pela orientação indígena para a educação do corpo está no modo de encarar o corpo como instrumento de trabalho. Se no contexto capitalista o corpo humano é visto como instrumento gerador de lucros para uma economia desigual, na qual uns são muito mais favorecidos que outros, na visão indígena o trabalho exercido pelo corpo é encarado como a forma que cada um sustenta os fios que conectam uma mesma teia, isto é, a aldeia. Todos têm responsabilidade na sustentação da teia, e essa concepção é responsável por conferir sentido aos trabalhos desempenhados (MUNDURUKU, 2009).

Segundo Munduruku, a noção de tempo para o corpo é dada por uma necessidade de viver intensamente cada momento, pois ao iniciar a fase adulta, por exemplo, é exigido um abandono ou esquecimento do momento anterior vivenciado pelo corpo. E isso não é visto com pesar: “meninas e meninos não deverão sentir saudades da fase anterior, pois a terão vivido plenamente” (MUNDURUKU, 2009, p.26).

Nesse processo da mudança de fase, conforme o autor, vai surgindo o protagonismo de um outro alimento para os vazios do corpo (o que não significa que este não tenha acompanhado a fase anterior, pois todos se relacionam neste pensar que é holístico), e no momento de transição da fase infantil para a fase adulta de um corpo ganha importância a educação da mente:

Se educar o corpo é fundamental para dar importância ao seu estar no mundo, a educação da mente é indispensável para dar sentido a este estar no mundo. Se no corpo o Sentido ganha vida, é na educação da mente que o corpo o elabora. Dizia ainda há pouco que na concepção do tempo indígena o presente é o único tempo real. O passado é memorial e o futuro uma especulação que quase não entra na esfera mental dos povos indígenas. Dizia isso para refletir como isso se choca frontalmente com a concepção linear, histórica que o ocidente desenvolveu. Para o homem pós-moderno o tempo passou a ter utilidade produtiva. A revolução industrial trouxe à tona a ideia de que “tempo é dinheiro”. A academia, por sua vez, concentrou suas pesquisas buscando dividir o conhecimento em tantas vezes quanto necessárias para dele tirar um produto consumível. Isso tornou o ocidental alguém voltado apenas para si e para seu sucesso individual. Tirou o foco do coletivo e lançou-o a busca da felicidade capaz de ser comprada pelo dinheiro. Para o indígena, no entanto, o tempo é circular, holístico, de modo que vez ou outra os acontecimentos se encontram sem, no entanto, se chocarem. O passado e o presente ganham dimensões semelhantes e se autoreforçam mutuamente. Por isso o discurso indígena se apossa de elementos aparentemente distantes entre si, mas perfeitamente compreensíveis no contexto em que se encontram. É a lógica da ressignificação dos símbolos que permite às gentes indígenas passear pelo passado utilizando instrumentos do presente e vice-versa também. É o momento em que a memória se atualiza e absorve elementos novos fazendo com que a cultura se autorressignifique e dê respostas criativas às novas demandas trazidas pelo des-encontro iniciado com a chegada dos europeus às terras tupinambás (MUNDURUKU, 2009, pp. 26-27).

E então, nesse interim, ganha sentido para a educação da mente no contexto indígena a aprendizagem transmitida pelos contadores de história, pouco valorizados no caso moderno ocidental. De acordo com Munduruku, esses educadores são responsáveis por manter acesa a chama do passado memorial legado pelos espíritos ancestrais. Tratam-se de homens e mulheres, geralmente mais velhos (isto é, bons conhecedores da passagem do tempo por vivenciarem-na em seus corpos), vistos como verdadeiras “bibliotecas” para muitos povos originários. Por intermédio deles a memória de um povo se mantém viva, “através das histórias que carregam consigo, contadas, elas também, por outros antepassados numa teia sem fim que se une ao princípio de tudo” (MUNDURUKU, 2009, p.27).

Nesse caso, vemos uma outra ruptura em relação ao paradigma ocidental, no qual a educação da mente é feita por meio do aprendizado das disciplinas (conhecimento fragmentado), teorias, métodos e fórmulas complexas. No contexto da educação indígena, tem importância um outro tipo de aprendizado, que, assim como a educação do corpo, passa pelo plano do sentido:

É, pois, através do ato de ouvir histórias, contadas pelos guardiões da memória, que nossa gente educa sua mente de modo que o indígena vive no corpo aquilo que sua mente elabora pela silenciosa e constante atenção aos símbolos que as histórias nos trazem. O corpo que vive o tempo presente alimenta-se, preenche seu vazio, por aquilo que a memória evoca do tempo imemorial. Não é, portanto, uma vida sem sentido, próxima ao reino animal como queriam os colonizadores de antigamente. Pelo contrário, é uma vivência plena de significações que reverberam pelo corpo. Nossos povos são, portanto, leitores assíduos dos sentidos da existência. Educa-se, portanto, para a compreensão do mundo tal qual ele nos foi presenteado pelos espíritos ancestrais. Educa-se para viver esta verdade que para nossa gente é plena e nos mostra o caminho do bem estar, da alegria, da liberdade e do sentido (MUNDURUKU, 2009, p.27).

Parece perceptível que a filosofia indígena, seguindo os rastros de Munduruku, compreende a interrelação entre concreto e mágico, isto é, a realidade material e a realidade imaterial, daí a importância atribuída ao sentido. Essa realidade não concreta, mágica, imaterial, é a dimensão do espírito. Mais profunda, a dimensão do espírito precede a dimensão da matéria e coloca o ser humano em contato com a “alma” de todas as coisas, das árvores, plantas, animais, rios, espíritos-guias, deuses, etc (MUNDURUKU, 2009). De outra forma, o torna mais consciente da própria interrelação entre os diferentes aspectos da existência. Assim, ressalta-se não apenas a relação de continuidade entre natureza e ser humano, como também destes em relação a outros níveis de consciência, mais mágicos, sutis, e, portanto, espirituais, os quais estão contidos no todo, ou na teia, termo utilizado pelo autor.

É por crerem em outras realidades, outros mundos, que os povos indígenas atribuem importância à educação do espírito mediada pelos sonhos, onde é possível acessar esses planos da existência:

O sonho é a linguagem do universo para nos lembrar que somos parentes de todos os seres vivos que co-habitam conosco este planeta. Pelo aprendizado do sonho instalamos em nós uma espécie de software que atualiza a memória que nos torna pertencentes a uma coletividade universal e nos faz sair da prisão que o corpo nos impõe. Daí que entendemos como o saber de um povo é, ao mesmo tempo, local e universal mesmo que ele não tenha consciência disso (MUNDURUKU, 2009, p.28).

Desta forma, tomando por base o modelo de educação indígena exposto por Munduruku, caberia aferir que o conhecimento, nas filosofias indígenas, ao contrário da filosofia moderna ocidental, está orientado por uma visão holística e por uma inteligência que não é racionalista ou materialista, mas material-espiritual. Por isso mesmo, as pedagogias responsáveis pela circulação desse conhecimento assumem outros contornos, sendo mediadas não somente por professores humanos (neste caso, através da oralidade), mas também por acontecimentos, sensações, plantas, animais, guias espirituais, entre outros.

Considerações finais

O projeto colonial europeu alcançou muitas vitórias políticas, econômicas, territoriais, culturais, etc. Porém, a tarefa de submeter o Outro, “conquistá-lo”, vencê-lo, dominá-lo, não se encerra com o fim da ação colonial, pois a colonialidade implantada nas formas de produção e reprodução do conhecimento e na filosofia permanece surtindo efeito, como uma espécie de programação mental, até os dias de hoje.

Esta é uma das razões que levaram diferentes filósofos latino-americanos a acreditar na necessidade de reconstruir a integridade histórico-filosófica da América Latina. Um dos principais problemas acarretados pela pretensa universalidade da filosofia moderna europeia, identificados por Dussel (2017), Leonardo Tovar González (2011) e Nelson Maldonado-Torres (2011), é ressaltar a herança helenocêntrica do pensamento fundado na razão. De um ponto de vista moderno europeu, a noção de racionalidade é responsável por respaldar a discriminação de outros tipos de pensamentos, como os dos povos ameríndios e africanos, considerados, pelos critérios da racionalidade moderna, irracionais.

A mudança de paradigma ocorre, segundo Dussel (2017), quando os integrantes de outras tradições filosófico-culturais tomam consciência de sua própria história filosófica, bem como de seu valor.

Neste trabalho, verificamos algumas possibilidades de descolonização epistêmica do saber proporcionadas pelo estudo e conhecimento das filosofias indígenas, especificamente indígena brasileira, dos povos Munduruku. Na tarefa de descortinar os véus existentes sobre o pensamento do Outro, nos propomos a ler os escritos de um filósofo indígena paraense, Daniel Munduruku, e nos deparamos com outras noções de temporalidade, de espaço, de corpo, de educação. Outras possibilidades epistemológicas que desvelam outras pedagogias, outras formas de produção e reprodução do conhecimento. Estas, por sua vez, podem nos ajudar a pensar, criar, realizar ações pedagógicas, saber-fazeres epistemológicos, ideias que nos possibilitem rumar em outras direções que não a do eurocentrismo epistêmico.

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1O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Brasil - Código de Financiamento 001

2Este mecanismo de opressão epistêmica é designado pelo sociólogo português Boaventura de Sousa Santos (2010) pelos termos racismo epistemológico e epistemicídio.

Recebido: 08 de Janeiro de 2021; Aceito: 28 de Abril de 2021

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